História Chaos - Mais um dia frio

Era noite, as ruas estavam frias e o vento gélido. Algumas poucas pessoas conversavam entre si. Geralmente pessoas que haviam acabado de sair de um culto de domingo, conversando em frente à igreja. Alguns eram homens e meninos que passavam de bicicletas, motos, carros e andando. Alguns deles conversaram, mas era só eu passar que eu podia sentir. Seus olhares de desejo pairando sobre mim. Meu ego apenas se inflava, porque eu sabia que se algum deles tentasse algo, eu não me controlaria. Não aquela hora, não nas ruas desertas e no asfalto frio da rua, não me controlaria porque naquela hora quem estava nos domínios não era a inocente e ingênua Michelle, ali era uma outra face, a sombria, ali era Lauren. Lauren era impiedosa e impaciente, tinha prazer em colocar homens imundos e pervesos como aqueles em seu devido lugar. E era isso o que eu queria fazer, era isso que eu faria se estivesse lendo a mente daqueles homens agora. Eu os mataria, ou melhor, se eles tentassem algo comigo, eu os torturaria e os mataria. 

Mas tudo o que fiz foi colocar em meus fones a música "Pumped Up Kicks". Apenas comecei a andar olhando fixamente para frente e apreciar a canção.

"Robert's got a quick hand

He'll look around the room he won't tell you his plan"

(Robert tem uma mão ágil

Ele dá uma olhada no lugar e não conta seus planos)

Sim, eu olhava o lugar e planos de homicídio já começavam a surgir. Eu já podia sentir os olhares daqueles homens imundos com pensamentos de coisas que eu chamaria de nojentas, enquanto não desprendiam seus olhares de mim. Acendi meu velho Marlboro Vermelho. Eu apenas caminhava.

"He's got a rolled cigarette
Hanging out his mouth, he's a cowboy kid"

(Ele tem um cigarro enrolado
Pendurado em sua boca, ele é um cowboy)

"Yeah, he found a six shooter gun

In his dad's closet, in a box of fun things"

(É, ele encontrou um revólver

No armário do seu pai, numa caixa de coisas engraçadas)

Sorri ironicamente, isso me lembra a primeira vez que toquei em uma arma na minha vida. Eu devia ter uns 9 anos, ainda era criança, mas já sentia esses meus dois lados. Era a arma do meu tio Steve. Ele era casado com Ana, porém nunca foi um homem puro ou bom, era alcoólatra, sempre envolvido com adultérios, mulheres(tanto cis quanto transgênero), e eu já ouvi relatos de pessoas próximas de que ele era pedófilo, e suspeitas de que já havia cometido estupro. Mas ele tinha uma arma, meu primo que devia ter uns 6 anos alguma vez murmurou algo sobre "arma" "caixa" e "armário". Até que eu tive a curiosidade de saber como era, se era pesada e a textura. Então eu achei a caixa, e fiquei assustada com o que encontrei lá: uns negócios estranhos, era da cor rosa e grande, também encontrei algo que era parecido com o que as meninas tem entre as pernas, só que era de borracha, isso havia sido nojento de se ver. Infelizmente hoje em dia sei que são "brinquedos" sexuais, consolos, objetos de masturbação, e coisas nojentas que eu não esperava encontrar. Mas então, logo ali eu vi, hoje reconheço como Calibre 38. Mas a sensação de segurar aquele peso, me deu poder, tirou o meu medo, eu sentia confiança em saber que com aquilo ali nas mãos, ninguém me faria mal.

"And I don't even know what
But he's coming for you, yeah, he's coming for you"

(E não sei nem o que aconteceu
Mas ele virá atrás de você, é, ele virá atrás de você)

"All the other kids with the pumped up kicks
You better run, better run, outrun my gun
All the other kids with the pumped up kicks
You better run, better run faster than my bullet"

(Todas as outras crianças com sapatos caros

É melhor correrem, correrem mais rápido que a minha arma

Todas as outras crianças com sapatos caros

É melhor correrem, correrem mais rápido que as minhas balas)

Isso me lembra a sensação que tive quando peguei a arma de meu tio escondida pela primeira vez, e levei ela no bolso do casaco para a escola, eu sentia adrenalina, nem mesmo aquelas crianças mais velhas com suas roupas e sapatos caros poderiam me abater, não naquele dia. Eu me senti confiante na escola nova, pela primeira vez.

"Daddy works a long day
He be coming home late, yeah, he's coming home late
And he's bringing me a surprise
Cause dinner's in the kitchen and it's packed in ice"

(Papai trabalha o dia todo
Vai chegar tarde em casa, é, chegar tarde em casa
E vai me trazer uma surpresa
Pois o jantar está na cozinha e embrulhado em gelo)

Aquilo era basicamente a verdade sobre meu pai. Ele literalmente trabalhava o dia todo, e alguns dias da semana quando folgava, ele me levava pra sair. Mas isso não se repete mais com muita frequência. Olho pro meu cigarro e trago como se fosse a última vez.

"I've waited for a long time
Yeah, the slight of my hand is now a quick pull trigger
I reason with my cigarette
Then say: Your hair's on fire
You must have lost your wits, yeah"

(Eu esperei muito tempo
É, e a agilidade da minha mão puxa gatilhos
Eu debato com o meu cigarro
E digo: Seu cabelo está com tudo
Você deve ter perdido o juízo, yeah)

Isso é a mais pura verdade, eu tenho esperado por tanto tempo para puxar o gatilho pela primeira vez em alguém, basta saber se será para os outros, ou se será para mim mesma.

Posso dizer que ainda não matei ninguém. Por dois motivos: eu espero ter o motivo que vá me satisfazer de fazer isso. E a minha outra personalidade me trava as vezes, quando menos espero.

"All the other kids with the pumped up kicks
You better run, better run, outrun my gun
All the other kids with the pumped up kicks
You better run, better run faster than my bullet"

(Todas as outras crianças com sapatos caros
É melhor correrem, correrem mais rápido que a minha arma
Todas as outras crianças com sapatos caros
É melhor correrem, correrem mais rápido que as minhas balas)

Finalmente a música havia terminado. E eu tinha chegado em casa. Tinha sido um longo dia, era melhor acender mais um cigarro e dormir. Afinal, amanhã era meu primeiro dia de trabalho depois de algum tempo, sinceramente não sei no que isso vai dar. E sinceramente, não dou a mínima.