História Cliche - Aposta

Quinta-feira.

Esse dia pode ser descrito como agonizante. Não está na metade da semana, mas também não está no fim porque ainda tem sexta. 

Pelo menos era isso que eu sempre pensei.

Quando cheguei no colégio, Bret não perdeu tempo em me trocar pelos seus amigos -tudo bem é maldade eu falar assim- e eu fui até meu armário, deixar alguns livros para diminuir o peso da minha mochila. Jenna provavelmente estava chegando, sempre encontro-a sentada na sala ou correndo até a mesma por ter perdido a hora.  

Então, eu voltei a prestar atenção no que eu estava fazendo para não pegar um livro errado. Comecei a cantar uma música de uma propaganda que tinha visto ontem à noite, fechando meu armário; ao levantar a cabeça, me deparei com uma cena que nunca pensei que veria de novo. 

Harry estava com um braço apoiando seu peso num armário, seu corpo prendendo uma menina em sua frente e, diferente dela que precisava de óculos para ter uma boa visão, eu reconheci quem era. 

Oreana*.

Ela era a sua típica menina que por usar roupas dois números maiores e esquecer de lavar o cabelo, era taxada de nerd. Sem falar que a sua nota mais baixa era nove. 

Eu normalmente não sinto inveja de outras pessoas, sou bem contente com as minhas gordurinhas e o que me tornei, mas dizer que eu sentia inveja do boletim de Oreana era um eufemismo. 

Eu realmente não sabia o que raios Harry estava fazendo posicionado daquele jeito, quer dizer, ele queria que ela cheirasse sua axila? Ele estava querendo mostrar o seu novo perfume? 

Eu estou aí para isso mesmo, meu querido! 

P.S.: apenas para último.

Tranquei meu armário e decidi descobrir o que era aquela palhaçada toda e, sete passos depois, eu estava na frente dos dois, meu braço subindo até o pulso de Harry e o abaixando com força. Sem o armário como apoio, o acéfalo desequilibrou-se e foi com o rosto para frente, quase beijando Oreana. 

Opa, não era isso que eu queria fazer.

-Harry, cuidado! -alertei-o, cruzando meus braços- Você quase bateu na menina.

Harry me olhou, as sobrancelhas franzidas e os lábios entreabertos. Se a sua irritação não fosse tão aparente, o seu tom de voz com certeza mostrou.

-Se você não tivesse me empurrado. 

Balancei a cabeça, ignorando seu comentário.

-D-desculpa, eu vou embora -a voz tímida de Oreana ecoou, seus olhos fixados no chão.

-Olha pra pessoa quando você falar -eu pedi- eu não sei sobre Harry, mas a minha beleza é para ser admirada.

Harry levou a cabeça para trás, formando um queixo duplo, os olhos levemente arregalados. 

-Okay, okay -suspirei- a sua também é admirável.

-Abby!

-O quê?! 

Harry respirou fundo e percebi que ele estava procurando paciência porque eu sempre fazia isso quando não encontrava o chocolate que escondi na geladeira, apenas para lembrar que eu já tinha comido.

-Será que você poderia nos dar licença? Estávamos no meio de uma conversa -ele pediu me olhando duro.

Não duro lá embaixo, ainda não estamos nesse nível. 

Ainda.

-Você falou certo, "estávamos" -fiz as aspas com meus dedos para enfatizar- verbo no passado. 

-T-tudo bem, Abby -Oreana disse- eu já estava de saída.

Por que ela gaguejava tanto? Não era como se eu fosse batê-la com um martelo.

-Não estava não -Harry interveio rápido. 

Revirei os olhos e apoiei meu peso em uma perna.

-Eu quero conversar com você, Ore -Harry fez uma voz melosa- a sós, sobre a minha proposta.

-Que voz é essa? Comeu açúcar antes de vir pra cá? -eu perguntei, fazendo careta.

Espera, Ore? Que tipo de apelido é esse? 

-Eu j-já disse que não, Harry -Oreana falou baixo e ele apenas sorriu maroto. 

-Eu não aceito não como resposta, anjo. 

Anjo? Sorriso maroto? O que estava acontecendo? 

-Com licença, mas eu acho que eu vou ali vomitar e já volto -avisei, apenas para ser ignorada também.

Eu não estava entendendo nada, até ontem Harry parecia estar me paquerando, me chamando para um festa e levando as minhas esperanças até os céus, apenas para que no dia seguinte ele estar agindo todo galanteador numa nerd? A qual, eu devo dizer, ele nunca mostrou interesse ou conversou.

Não aguentando mais assistir aquela cena patética, decidi fazer alguma coisa a respeito.

-Quer saber, chega -eu voltei até onde eles estavam- Oreana, ignora esse acéfalo -pedi para a garota que provavelmente estava confusa e depois peguei a gola da blusa de Harry e me virei para ele- Acéfalo, vamos bater um papo ali no bebedouro. 

-Quê? Não, mas- 

Eu não deixei Harry terminar de falar, puxando seu corpo atrás de mim e longe de Oreana.

-Agora que estamos longe dela e eu tenho a porta do banheiro, pra te matar afogado na privada, na minha diagonal, me fala o que você estava fazendo -mandei, puxando meu cabelo para um lado.

-Não sei do que você está falando -Harry deu de ombros- e para de chamar de acéfalo.

-Você sabe o que é acéfalo? 

-Não. 

-Então não vou parar -disse brava- para de me enrolar e me responde. 

Harry começou a assobiar e olhar para a parede, me ignorando pela segunda vez. 

Não sei se alguém percebeu, mas eu não levo desaforo. Tendo isso em mente, entendam o porquê das ações que se seguiram da minha parte.

Levantei meu pé direito e afundei no sapato sujo e acabado de Harry. O assobio parou e o grunhido de dor que escapou dos lábios de Harry me alegrou. 

-Vai continuar a me ignorar? 

-Abby, porra, meu pé! -ele falou dramático. 

Levantei a sobrancelha, esperando que ele me dissesse logo.

-Tá legal -ele bufou- eu te conto, mas você não pode espalhar.

-E eu lá tenho cara de fofoqueira? 

-Sabe o Niall? 

Eu assenti, querendo que ele elaborasse porque ele me perguntar sobre um ser insignificante não ajudou em nada.

-O que que têm ele? -perguntei.

-Eu fiz uma aposta com ele que se eu levasse a nerd do colégio pra cama, ele me dava duzentas libras**

Meu queixo quase foi parar no chão, já a minha mão foi de encontro com o braço de Harry. 

-Você é idiota? -eu perguntei  raivosa- Que merda você tem dentro da cabeça? 

-Abby, nem-

-Não diz "nem vem" -eu engrossei a voz, tentando imitar a sua- você tem quantos anos? Que brincadeira sem graça. 

Eu podia estar brava por fora, entretanto, no interior eu estava jogando confete para cima, comemorando que Harry não estava realmente interessado em Oreana, porque poxa, eu era apaixonada pelo cara que estava na minha frente e ele mostrou sinais de interesse por mim há menos de 24 horas atrás, não deu nem tempo de registrar o que aconteceu até ele ir atrás de outra. 

-É grana fácil, não vejo o porquê de não fazer -ele deu de ombros.

-Talvez porque ela tem sentimentos? -perguntei incrédula.

Eu suspirei, vendo Harry pensar numa resposta. 

-Eu esperava mais de você, Styles -neguei com a cabeça. 

Decidindo que se eu fosse embora agora iria dar uma saída dramática e teatral, virei de costas pronta para marchar até a sala de aula. 

Senti a mão de Harry envolver meu pulso, me segurando no lugar e meu coração quase derreteu. 

-Abby, espera... -ele me chamou.

Mordi meu lábios inferior e olhei para o teto, agradecendo aos poderes superiores por Harry estar indo atrás de mim. Claro, eu tinha que dar uma de difícil para manter a posse, então quando me virei para olhá-lo, meu rosto neutralizou-se. 

-Eu não sabia que isso iria te magoar, nem ela -Harry gesticulou com a cabeça para trás, mencionando Orena.

-Coisa desse tipo não se faz com ninguém, Harry. 

-Desculpa -ele suspirou- eu não estava pensando.

-Pensando você estava, mas com a cabeça errada -eu olhei para baixo, mostrando o que eu queria dizer.

-Cristo, não -deu risada- ela não faz meu tipo.

É o que sempre falam...

Sorri de lado, dando de ombros. Ele estava pensando mais no dinheiro do que na Oreana em si, isso era muito errado e o fato dele ter reconhecido que não deveria nem ter aceitado a proposta, já me fez ficar um pouco menos brava com ele.

-Só vê se dá próxima vez pensa antes de fazer algo do tipo. 

Ele confirmou, soltando meu pulso. Quase briguei com ele de novo, perguntando quem tinha deixado ele me soltar, mas mordi a língua, sabendo que essa não seria a hora certa.

-Estamos bem? 

Era oficial: Harry Styles estava querendo acabar comigo, me olhando daquele jeito e fazendo uma pergunta daquelas, sua voz soando sem graça, como se ele estivesse com medo da resposta. 

-É claro, -sorri, mesmo querendo dar uns beijos nele de vez.

Certamente, eu me surpreendia com o meu auto controle. 

•••

A sala estava estranhamente silenciosa, era quase anormal. Eu conseguia ouvir até o barulho que meu lado fazia contra o papel enquanto eu escrevia a redação. Uma coisa que eu não gostava era silêncio, me recusava a ficar sem conversar com alguém, eu sempre invento alguma coisa para falar, pode ser a coisa mais desnecessária do mundo, mas eu falo. 

Obviamente, eu não ia começar a puxar assunto naquele momento, eu estava terminando de escrever e toda a sala estava também. Então, acelerei a escrita e entreguei a folha para o professor, pedindo para ir ao banheiro. Era a última aula e não fazia sentindo pedir ir no banheiro sendo que em menos de vinte minutos eu ia ser dispensada para, finalmente, ir para minha casa. 

Antes de sair da sala, eu guardei meu material e dei uma olhada na folha de redação de Harry.

Meus olhos se arregalaram levemente quando notei o garrancho que ele chamava de letra. Eu não conseguia entender nem o artigo que ele usou para começar, aquilo era um 'O' ou 'U'? 

Depois dessa, eu já até sei o que dar para ele em seu aniversário: um caderno de ortografia. 

Assentindo com a cabeça pela minha nova ideia, sai da sala para ir aliviar a minha bexiga e sair daquela sala de aula que parecia mais um funeral.

Meu tênis, aparentemente,  ainda estava sujo mesmo depois de quase vinte capítulos -sendo que foi graças a eles que trombei em Harry- e provavelmente, iriam continuar sujos até o fim. Dei de ombros, concluindo que era realmente verdade e levantei a cabeça, lembrando de olhar para onde eu estava andando para não bater com alguém de novo. 

No fim do corredor, meus olhos caíram na pessoa que eu estava procurando. Tecnicamente, eu não estava realmente procurando, mas tinha colocado um lembrete mental para ir atrás ele, sabe. 

Sentado com as costas encostadas na parede, o loiro de farmácia, a.k.a. capitão do time de futebol ou O Pegador -sim, com letra maiúscula para sentir o ênfase-, estava mexendo no celular. Ele parecia bem concentrado e eu me questionei se ele estava mandando mensagem para alguém e decidi ir até lá, afinal, eu precisava mesmo conversar com ele.

Quando me aproximei, percebi que ele estava jogando Candy Crush e revirei os olhos. 

Tanta coisa boa nesse mundo virtual de jogos e ele escolhe logo esse para matar aula.

Mas, tudo bem, isso só entrou para as coisas que eu iria reclamar com ele sobre sua pessoa. 

Abrindo um sorriso maléfico, me sentei ao seu lado e abaixei a cabeça para o lado.

-Oi, Niall.