História Colecionador de Lágrimas - Nona Lágrima

Capítulo IX : Nona Lágrima.

Mudanças.

O que são mudanças?

Muitos podem entrar em pavor com essa palavra e simplesmente não ser deixado a mudar por medo do novo e do que lhe espera durante e após todo o processo.

Outros não temem arriscar e mergulham de cabeça naquilo que está para se renovar ou até mesmo alcançar um nível maior e melhor, e mesmo depois de tudo, não ser como o planejado, sabe recolher os pedaços do que foi destruído e os colar novamente para novas oportunidades de mudanças.

Mudar pode ser a forma que você ver o mundo em sua volta passando assim a modificar sua perspectiva – acrescentando ou retirando - detalhes aos pensamentos e tudo o que o cerca.

Mudar pode ser recolher tudo o que lhe pertence e passar a ir a outro lugar, uma outra rua, um outro bairro, uma outra cidade ou até mesmo um outro país, acompanhando desse ato novas ideias, novas pessoas, novos pensamentos, novas rotinas, novo tudo.

Mudar é permitir que você mesmo deixe um pouco de si de lado e se abra para que algo transforme o seu eu.

E assim, Namjoon e Seokjin fizeram.

Um mês e meio já havia se passado desde que a vida de ambos deu um pequeno passo para a mudança e o novo lhes foi apresentado.

Nesses pouco mais de trinta e alguns dias, o loiro estava se saindo muito bem cada vez mais na loja onde trabalhava. Continuava a manter uma boa relação com a Senhora Choi – sem perder o hábito de lhe apertar as covinhas – e era mais e mais adorado pelos outros funcionários do estabelecimento, o que lhe deixava um tanto envergonhado ao ser elogiado e tratado tão agradavelmente por ser o mais novo entre os demais.

Suas idas para o pequeno palco, onde ocorriam as apresentações improvisadas se seguiram por todos os sábados daqueles dias que passaram, ato esse que lhe enchia de disposição para a escrita de novas músicas e uma porta a mais aberta para que treinasse seu freestyle.

Algumas vezes tinha a companhia de Hoseok consigo, porém, quando o mais velho não se sentia muito bem ou algumas crises depressivas fazia com que a vontade de sair fosse nula, o Kim preferia que o amigo ficasse em casa onde sabia que se sentia melhor com a companhia de Taehyung.

Já o moreno mais velho aceitara depois de muita insistência e pedidos manhosos de seus dongsaengs, a vaga vazia no restaurante onde o alaranjado trabalhava, o qual havia ido com o loiro e conhecido o jovem. Juntara-se com Taehyung para que atendesse as mesas ou às vezes recebesse os clientes no caixa.

Nesse tempo pôde perceber que o laranjinha era um bom rapaz e já na segunda semana estava se dando bem, apesar de que era o lado de Taehyung o qual transbordava mais sentimentos para o começo dessa amizade, e o hyung mais velho até mesmo o confortava quando chegava o fim do expediente e seu semblante era totalmente triste. Escutava os medos do mais novo sobre o futuro junto do namorado Jung e até mesmo lhe enxugava as lágrimas quando essas se faziam presente durante as conversas.

Afinal, Seokjin não perderia sequer uma oportunidade de tê-las entre as pontinhas de seus dedos, o mantendo demasiadamente intenso.

E por conta disso, na semana fria de inverno, que após uma parte do segundo salário adiantado de Namjoon e metade do de Seokjin, que os dois conseguiram pagar o primeiro aluguel de um apartamento bem pequeno de fachada composta por algumas pichações e tinta descascada, um tanto próximo à outra casa miúda onde viviam, já que por aquela área os preços eram mais baixos e aceitáveis para a situação financeira dos dois rapazes.

Havia se passado somente uma semana desde a mudança ao novo lar como Namjoon gostava de chamar e brincar. Poucas coisas foram levadas para lá, já que o loiro não as tinha em uma boa quantidade.

A sala do apartamento não era muito grande e apenas dois grandes pufs beges comprados em uma loja de segunda mão e uma estante ocupava a área. O sofá duro onde Seokjin dormia permanecia ali no cômodo também – apesar dos protestos do moreno, já que Namjoon não deixou que o Kim mais velho queimasse e o usasse como uma fogueira na parte de trás do prédio.

A cozinha por sua vez permanecia da mesma forma que antes com alguns armários, utensílios básicos, a geladeira e o fogão.

O apartamento possuía uma única suíte, o que após muitos cálculos sobre preços de móveis e medidas de área fez com que os dois chegassem à conclusão que ali não caberia duas camas de solteiro, se os mesmo quisessem também um guarda-roupa e uma escrivaninha, fazendo então que a decisão fosse comprar uma cama de casal, já que ambos concordavam que não viam problema em dividi-la.

--

- Por favor Jinnie, vamos comigo só hoje.

Namjoon seguia o mais velho que estava terminando de se arrumar para sair pelos cômodos pequenos, lhe implorando para que o acompanhasse àquela noite e o visse se apresentar. Taehyung havia pego duas semanas de férias no emprego e ido junto de Hoseok até Daegu visitar a avó do Kim que não se encontrava muito bem de saúde, o que significava que teria de ir sozinho.

- Eu já falei que não Namjoon. – o moreno parou de andar, fazendo o mais alto tropeçar em seus próprios pés. – Preciso cobrir o horário do seu amigo laranjinha no restaurante.

- Mas você disse que ia ter outro funcionário lá. – resmungou baixinho. – Vamos hyung, por favor! – fingiu um choro manhoso para ver se amolecia aquele coração duro como pedra gelada de Jin.

- Falei sim, e sabe que de sábado o movimento é maior e um só não dá conta. – colocou o casaco preto e pesado por cima do uniforme, já que lá fora o vento castigava as peles descobertas.

- Só está indo pra lá porque seu amiguinho Jeongguk vai cantar né? – cruzou os braços emburrado, voltando até a sala e se sentando no sofá duro. – Vive saindo com ele pra lá e pra cá... – disse a última parte baixa, mas a distância do quarto para sala não era tanta, fazendo Jin escutar seus murmúrios.

Seokjin bufou e revirou os olhos para a atitude do mais novo, parecia uma criancinha ali e isso lhe tirava do sério, ainda mais por não ir muito bem com os pequenos, não tinha paciência e nem de longe sabia lidar com aquilo.

- Não seja chato Kim. Só falta chorar e virar o bebezão que sempre foi. – parou em frente ao mais novo. – Preciso ir e sabe, - encarou o loiro, já rindo da possível expressão do outro para o que iria dizer, lhe provocando. – Você me vê todo dia e dorme abraçadinho comigo na mesma cama, não precisa ter ciúmes do Jeon.

Namjoon arregalou os olhos e sentiu seu rosto explodir ao que seu hyung havia insinuado como se houvesse algo a mais entre os dois. Ele não estava com ciúmes de Seokjin e Jeongguk, muito menos por que não existiam motivos para isso. Apesar de achar o rapaz o mais bonito que já vira e ficar bobo com o sorriso alheio, aquilo não era ciúmes, apenas admiração. Certo?

- Ei Seokjin! – gritou indignado. – Eu não estou com ciúmes, ok? Está frio esses dias e a coberta não esquenta direito, tá? – viu o mais velho rir de suas desculpas enquanto calçava o tênis próximo à porta. – Só queria que você fosse comigo, nada demais.

- Vou acreditar então. – soltou debochado. – Quando eu voltar e você estiver acordado, leio aquela música que queria me mostrar. Só não morra de saudades até eu chegar, certo? – se aproximou, abaixando até a altura do Kim, lhe dando um beijinho rápido na testa, o provocando para que ficasse envergonhado novamente. – Tchau, Nammie.

Namjoon teria reclamado mais sobre aquela ceninha e batido o pé insistindo para que ele parasse com aquela brincadeira, se Seokjin não fosse tão rápido e saísse apressado pela porta, carregando consigo a mochila preta e seu sorriso irritante no rosto.

Suspirou e foi direto para o quarto logo se jogando na cama, fazendo com que encarasse o teto sem nenhuma reação. Seus pensamentos estavam bagunçados pelos acontecimentos anteriores e corriam tão rápidos que até mesmo não conseguia o acompanhar e tentar entender o que estava se passando dentro de sua própria mente.

Poderia ser considerado ciúmes, o fato de ficar emburrado quando Seokjin saía pela porta dizendo que se encontraria com o Jeon como já aconteceu inúmeras vezes durante esses dias?

Não conseguia enxergar dessa forma esse sentimento um tanto... possessivo?

Em sua cabeça passava que isso se seguia por até então ter o mais velho como o único que ficava consigo em casa e simplesmente não o ter mais lhe deixava desconfortável perante a ausência do mesmo.

“Será que estou gostando de Seokjin?”

Sua mente travou.

Balançou a cabeça de um lado para o outro como se fosse aliviar o rumo de seus pensamentos sobre aquele assunto. Não poderia estar ficando tão louco e dependente da companhia do outro ao ponto de nutrir sentimentos diferentes da amizade que tinha com o moreno.

Aquilo estava uma total loucura e poderia dizer que seus pensamentos por Kim Seokjin era tão insanos quanto.

--

O movimento daquele final de semana estava incrivelmente baixo, o que assustava o moreno que não corria por entre as mesas carregando o bloco de anotações para a cozinha e voltando de lá com bandejas, levando os pedidos para seus respectivos donos como sempre acontecia quando havia um funcionário a menos.

Um pequeno palco foi improvisado de frente para a fachada de vidro retro do estabelecimento. O banquinho de madeira e um pedestal para o microfone e pequenas caixas de som com um fio conectado ao violão se fazia presente em cima da estrutura, acompanhadas da silhueta do menino de cabelos escuros.

A voz melodiosa e doce de Jeongguk passava pelos ouvidos dos poucos clientes que ali estavam e era evidente a forma como cada nota alcançada e cada acorde dedilhado acolhia a atenção para o dono das mesmas. Seus lábios sustentavam um sorriso gentil, deixando clara a forma como o garoto se conectava profundamente a música.

Just like a star across my sky,

Just like a bird flying at dawn

I have a dream of the freedom

Feel like I’ll never be the same.

Seokjin tinha o tronco encostado no balcão vermelho enquanto em sussurros acompanhava o menor na música e lhe retribuía o sorriso que era lançado para si. Tinha se apegado demais ao saeng e não poderia mentir dizendo que não o achava incrível e um rapaz de uma beleza imensurável.

Espantou os pensamentos assim que escutou seu nome ser chamado pelo dono dali para que limpasse o chão quadriculado de preto e branco, já que passará tanto tempo analisando o cantor que nem sequer percebeu que o horário para fechar se passou.

--

- Jin-hyung, me espera!

Jeongguk corria com o violão dentro da capa em um dos ombros ao mesmo tempo que tentava equilibrar a mochila azul marinho no outro livre, o que tornava a cena engraçada aos olhos de Seokjin ainda mais que o menor mal conseguia se mexer pela quantidade de blusas de frio que usava em seu corpo.

- Como você consegue andar tão rápido assim? – sentou arfando ao lado do moreno no banco da parada de ônibus.

- Você que é devagar demais Jeon, ainda mais com esse monte de roupa e essas coisas nas costas. Devia ter te filmado correndo todo desengonçado até aqui. – gargalhou da careta emburrada que o mesmo fez.

- Pare de rir, não tem graça. – recebeu um afago nos fios lisos e logo desmanchou o biquinho que havia se formado.

- O que você queria comigo? – o mais velho perguntou, olhando para o céu e vendo que algumas gotinhas de água gelada começavam a pingar das nuvens carregadas.

- Err... Sinceramente? Não sei. – riu sem graça, se enrolando nas palavras. – Só queria saber se gostaria de companhia pra voltar, já que é quase caminho para a minha... E eu também gravei aquele CD que te falei semana passada com as músicas que você gostou quando foi jantar lá em casa. – falou rápido demais, dando mais motivos para Seokjin aumentar o sorrisinho pequeno nos lábios pelo nervosismo do menor.

- Tudo bem, aceito sua companhia hoje. – viu os olhinhos a sua frente brilharem, enquanto o mesmo puxava da bolsa cor de mar o saquinho branco com o CD dentro, lhe entregando logo em seguida. – Para Jinnie-hyung, de seu dongsaeng favorito. Coraçãozinho, coraçãozinho. Uau, acho que alguém tá se achando demais. – brincou, lendo a capa.

- Eu acho que você vai gostar bastante dessas músicas. – virou o rosto na direção oposta mudando de assunto, para esconder as bochechas coradas. – A última faixa é Like a Star, a mesma que eu cantei no restaurante, gravei com a minha própria voz.

Seokjin sorriu largo e sincero, percebendo o quanto Jeongguk dedicou tempo e esforço para lhe entregar aquele presente. Isso o deixava mais adorável ainda.

--

- Chegamos.

O moreno mais velho segurava o guarda-chuva amarelo sobre a cabeça dos dois, os protegendo da chuva forte que desabara com mais intensidade no caminho até o bairro mais simples da região. Jeongguk tinha um dos braços entrelaçados ao do hyung, já que a cobertura do objeto não era tão grande para que protegesse ambos totalmente.

- Quer entrar e esperar a chuva passar? – Seokjin perguntou frente a frente ao outro, entregando o cabo da proteção para Jeon segurar para que pudesse procurar as chaves no bolso da mochila.

- Não precisa hyung, consigo chegar vivo até em casa. – riu baixo, encarando o outro.

Os dois não sabiam dizer ao certo quanto tempo passou se encarando e gravando cada parte do rosto alheio em suas memórias, tendo algumas gotículas transparentes lhes escorrendo o cenho e o barulho das mesmas ao se chocar com o plástico do guarda-chuva.

Jeongguk possuía olhos escuros como a noite tempestuosa acima dos dois, eram negros e brilhantes como uma linda constelação banhada de Supernovas explodindo a cada centímetro que se aproximava do rosto de Jin.

Esse por sua vez parecia ter pedido os movimentos do corpo assim que os lábios fininhos do jovem a sua frente encostou levemente com os seus. Era uma sensação um tanto nova, afinal, Seokjin durante todas suas vidas como um viajante entre os planos em busca de lágrimas salgadas, nunca havia encostado em outra boca e aquilo era assustadoramente estranho.

Sempre ouvia falar pelos demais que nesses momentos quando um toque tão intimo era findado o estômago revirava como borboletas em guerra e as mãos suavam de nervosismo, mas não sentia nenhum daqueles ‘sintomas’ de um beijo apaixonado.

Talvez porque o sentimento da paixão só existisse apenas de um dos lados.

Tão rápido quanto juntou, Jeongguk afastou-se do maior, lhe olhando assustado e com os olhos saltando pela cavidade ocular. Sua expressão carregava um misto de desespero e arrependimento por ter feito aquilo e colocado tudo ao chão com suas atitudes impensadas.

- Céus, hyung, me desculpe, eu não queria ter fei...

 Foi cortado enquanto falava pelo susto, assim que sentiu uma terceira presença próxima aos dois. Pela extremidade do guarda-chuva era impossível de se ter a visão do rosto do homem ali parado entre ambos.

A figura estava completamente encharcada e o cheiro de álcool causava ânsia naqueles abaixo da proteção, era forte e enjoativo ao ponto de arder as narinas de quem passava por metros de distância. Por isso, era evidente o motivo do mesmo se esforçar, mas não conseguir parar total e fixamente no chão, como se o mundo daquele desconhecido ali estivesse rodando e pronto para desabar sob si.

- Jinnie?

A voz era de Namjoon.

E por mais que o moreno e o mais novo sequer soubesse, a visão de suas bocas unidas, fazia mesmo seu mundo totalmente despedaçar e desabar. Assim como seu coração.

As I look at the raindrops dripping on the window, I feel that

They are like the tears that have run down my heart.

Like this strange feeling, I look out and it looks like my situation