Capítulo 15 – Alguém percebeu
“Enquanto eu recobrava minha compostura e arrumava meu fone de ouvido, ele se virou para mim. Não consegui conter o espanto. Ele era incrivelmente lindo. Era uma cabeça mais baixo do que eu, magro e pequenino, parecendo uma criança, mas quando ele falou, sua voz surgiu como um trovão.”
“Ele tinha um jeito diferente, percebi, um rostinho de aparência muito frágil para um garoto da minha idade. Seus olhos eram escuros e suas bochechas formavam covinhas quando sorria, ele sempre abaixava o rosto quando o fazia, e pés-de-galinha formavam-se ao redor de seus olhos. Pisquei, tentando parar de olhar para ele.”
“A voz de Larry era inconfundível, provavelmente a voz mais grave que eu já havia escutado. Eu conseguia ouvi-lo através das palavras da professora, conversando com Pierre. Os dois sorriam a cada frase e eu tive uma vontade súbita de me levantar e ir até ele, abraçá-lo. Me segurei. Era impossível uma pessoa se apaixonar tão rapidamente por outra.”
“Ele parecia tão magnificamente pequeno para um garoto de dezessete anos, mas lá estava, se dirigindo para a mesa da professora. Eu ficava a uma distância de quatro mesas, mas, ainda assim, ele podia me ver. Tentei me esconder atrás de Alison, mas não deu certo. A professora e ele começaram a conversar sobre algo, mas não foi essa parte que me deixou nervoso. Eu olhava para ele, quero dizer, realmente olhava para ele – tentava absorver o máximo de características dele: o jeito que falava, sua altura, sua voz, seu olhar – quando nossos olhares se encontraram subitamente. Ficamos por um tempo nos entreolhando. Ele deu um sorrisinho e se voltou para trás, voltando para seu lugar.”
“Não estava suficientemente apaixonado por Larry, mas também não posso negar que queria ficar com ele. É claro que eu queria; quase qualquer um na minha situação iria gostar disso. Ele era bonito, mas não era só seu corpo que me atraía, mas seu jeito de olhar, sua voz. Tudo (bom, quase tudo) me atraía nele.”
“Naquela noite, eu não consegui dormir. Não conseguia tirar a imagem do sorriso de Larry da minha mente, simplesmente não conseguia. Não conseguia afastar a imagem dele se retirando. Mas, tudo estava sendo diferente para nós. Muito diferente de Andrew. Melhor, talvez.”
“Ele estava ao meu lado, com o quadril encostando-se à minha mesa. Seus olhos castanhos me perfuravam como lasers e senti a tensão em sua expressão: seus lábios, agora brancos, estavam comprimidos numa linha tão rija que inibia a passagem de sangue; seus olhos tinham uma inclinação aparentemente irritada e frustrada. Desviei o olhar do dele. Era estranho olhá-lo daquela maneira. Ele parecia irritado com alguma coisa, eu só não sabia com o quê. Olhei para baixo e vi que sua mão estava em cima da minha mesa, segurando um pedaço de papel que eu já tinha visto.
— Greg, preciso falar com você. — Ele disse, seriamente.”
“Ele se aproximou. Não havia nada entre nós e a parede do corredor me impedia de ir mais para trás. Estávamos tão próximos que eu podia sentir seu perfume e sua respiração.”
“Meu coração provavelmente deve ter feito ginástica quando eu ainda era um feto, pois pulou de lado à lado no meu peito. Minha garganta se trancou, inibindo as palavras. Tudo que eu queria fazer era pular no lago e me afogar drasticamente, mas, mesmo assim, estiquei um braço e toquei o peitoral de Larry. Uma rede de sensações subiu por mim, deixando-me arrepiado e com calor. Eu realmente havia tocado nele.”
“Isso significava que Larry tinha brincado comigo? Tinha feito, de propósito, eu me apaixonar por ele, para depois falar que estava brincando? Espere, eu não estava apaixonado por ele. Não podia estar. Sentia que não ia dar certo.”
“No final, fomos nós três – eu, Andrew e Larry – contra a multidão, saindo do caos para a calmaria. Conduzidos apenas por nossos sentimentos. Não era Andrew que estava segurando a minha mão, mas Larry. Ele apertava meus dedos com uma pressão gentil, deixando-me com vontade de abraçá-lo. Mas não o fiz. Não porque Andrew estava ali, mas porque senti que não devia.”
“Eu nunca tive noção de como uma verdadeira festa era. Já tinha visto filmes e seriados com cenas de adolescentes bêbados em piscinas, pessoas largadas nos sofás, outras vomitando nos banheiros, mas acreditava que nem todas as festas eram daquela forma. Não sabia nem com qual roupa iria, ou se Larry realmente queria me acompanhar. E ele queria.”
“Parado embaixo de um poste de luz branca, ele quase parecia uma criança, com exceção a seu modo de olhar. Ele estava usando um blazer preto, com calças jeans da mesma cor. Ainda não tinha colocado a máscara, e eu preferi daquela forma. Queria ver o rosto dele, não só os olhos ou a boca. Queria vê-lo por completo.”
“— Larry, espere um pouco. Se acalme.
— Me acalmar? Você quer que me acalme? — Ele perguntou, se aproximando de mim novamente, mas, naquela vez, não gostei de sua aproximação. — Diga que nunca mais vai falar comigo, que nunca mais vai olhar na minha cara, diga que nunca mais vai gostar de mim, aí sim eu irei me acalmar.
Não respondi. A voz dele parecia grave demais em contraste com a música. Apenas fiquei fitando seus olhos.
— DIGA! — Ele gritou novamente. Tenho certeza que, se eu fosse escrever aquela cena, teria escrito seus gritos em caixa alta.”
“— Greg, por favor, se você ainda está aí, responda. Por favor. Eu sei que não deveria ter me afastado de você, não deveria ter ido tão longe. Me desculpe, me perdoe por tudo. Eu te amo. Não como você me ama, mas ainda assim... Não quero que algo aconteça a você. Você é meu melhor amigo, agora que William mostrou quem verdadeiramente é. Por favor, me escute. Volte para mim.”
“Ele estava ajoelhado ao meu lado, segurando a minha mão. Ele estava com a cabeça abaixada, mas presumi que estava chorando simplesmente pela entonação da voz. E ele estava. Senti, com uma grande pontada de dó, que suas lágrimas estavam escorrendo por minha mão. E, quando ele levantou a cabeça, seus olhos estavam vermelhos. Ele me viu olhando-o e sorriu.”
“Larry era (sempre foi) muito mais prático do que eu, preferia agir ao invés de planejar. Por isso tinha falado e feito coisas tão estúpidas quando abri o jogo para ele. Não foi como se pudesse manter o controle; e sobre a vingança contra Alexia não seria diferente. Porém, realmente quis deixá-lo aprender com as próprias atitudes, todavia, não queria que Alexia tocasse um dedo nele, por isso deixei os olhos bem abertos.”
“Nós ficamos muito pertos um do outro, podia sentir seu calor perto da minha pele. Ele abaixou as mãos e segurou as minhas, olhando-me seriamente nos olhos. Queria dizer que aquilo não ajudava, que apenas me daria esperanças de algo que nunca ia acontecer, que 'criar um clima' entre nós era a última coisa que eu queria. Mas ele sorriu.”
“Larry gritou meu nome no meio da correria, quando os policiais renderam Andrew e separam a briga, mas eu não me virei. Ele não conseguiu se aguentar e correu atrás de mim. Senti um puxão em meu ombro e senti braços me envolvendo. Ele estava me abraçando.”
“— São flores, veja. — Ele esticou ambos os braços, segurando o blazer com uma mão. Vi seus músculos expandindo-se, as veias por baixo da pele, seus pelos finos quase loiros. — E aqui está um olho, considerado por muitos como “Illuminate”. — Ele arqueou as sobrancelhas. — Significa um recomeço. Significa que a beleza sempre observa os maus momentos, sabe, tipo a calmaria que sempre vem depois da tempestade.
— Recomeço? Agora você parece como um poeta. — Respondi, franzindo o cenho para ele com um sorrisinho. Ele deu de ombros.
— Bom, sabe o que dizem, não sabe? Quando você já perdeu tudo, o recomeço é bem mais fácil.
— Quem disse isso? — Perguntei. Ele abaixou a visão e apareceu timidamente envergonhado.
— Eu.”
“Estávamos a um passo de distância, de modo que eu mal podia sentir sua presença. Mas, subitamente, senti-o se aproximar, com a respiração tocando o meu rosto. Seu perfume inundou o ar quando ele chegou mais perto. Sua forma tomou conta de toda a minha visão. Tudo o que eu via era ele, tudo o que eu sentia era ele. Eu apenas estava ali por ele, e, graças a ele, conseguiria descobrir a verdade. Mas, por mais que soubesse que aquilo estava sendo complicado... Não, Larry nunca foi previsível, ele tinha que deixar mais complicado ainda. Nossos corpos se aproximaram. Mantive minhas costas apoiadas ao muro enquanto ele se pressionava contra mim. Olho no olho. Face a face. Nossos lábios se encontraram gentilmente, lentamente, evoluindo para algo mais gélido, carregado de emoção e força. Ele se pressionou contra mim por um momento, com seus lábios se movendo levemente, suas mãos contra meu quadril. E eu o senti por completo naquele instante.”
“Foi apenas quando ele se afastou que percebi o que havia acontecido. Ele tinha... Larry me beijou.”
— Ei, garoto, você ainda está aí? — O homem perguntou ao telefone. Eu limpei minha garganta antes de responder, ouvindo os sons de sirenes no fundo da ligação.
— O que você disse não pode ser verdade. — Respondi. — Larry está bem. Nós conversamos há uma hora.
— O acidente ocorreu há menos de dez minutos. — Disse o homem. — Eu sei que é difícil para você, mas... Mas eu sinto muito. Não sei o que dizer.
— Você pode me contar a verdade. — Rebati.
Ouvi-o praguejando com palavrões absurdos. Um ruído passou rapidamente pela ligação, um som de uma voz. Gritos. Vários gritos. Pessoas chamavam por ajuda, em esperança de salvar um pobre garoto num acidente.
— Eu estou falando a verdade.
— Não! Eu não posso acreditar que ele está morto! — Gritei, machucando minhas cordas vocais.
— Greg? — Era a voz de minha mãe. Meus impulsos nervosos me levaram a olhar para a porta e lá estava ela, parada do lado de fora com um olhar de horror. — O que houve?
— Um homem no telefone está me falando que Larry está morto. — Respondi.
Minha mãe entrou no quarto, limpando as mãos nas laterais da blusa. Ela parecia um emaranhado de piedade, dó e vontade de ajudar. Com as mãos trêmulas, ela retirou o telefone das minhas mãos.
— Deixe-me ver.
Encostando o telefone no ouvido, ela pronunciou qualquer coisa (realmente não me lembro) e depois fez várias caretas que variaram de tristeza até desentendimento. Quando retirou o telefone de perto do rosto, seu olhar estava carregado de algo muito mais terrível do que a tristeza: a verdade.
— Greg, ele não parece estar mentindo. — Disse ela. — Eu acho que é verdade.
— Mas... — Eu hesitei. Não conseguia falar, mal conseguia respirar. A sensação era sufocante, me dava vontade de gritar. — Mas eu conversei com ele há pouco tempo. Não, não pode ser.
Minha mãe colocou o telefone na orelha novamente e murmurou o que eu tinha acabado de dizer. Seus olhos se encheram de lágrimas, e eu fiquei imaginando por quê. Inúmeras coisas passaram pelos meus pensamentos naquela hora, qualquer tipo de coisa: tudo. Lágrimas se formaram nos meus olhos quando ela desligou a ligação, com a boca rígida, e veio na minha direção.
— Eu sinto muito. — Disse ela, me abraçando.
— Não, não, não, não. — Resmunguei. — Não pode ser ele. Deve ser outra pessoa. Ele... Larry não pode estar morto.
— Querido...
— Eu o amo, mãe. — Interrompi. — Demorei demais para perceber, mas o amo; não tanto quanto amo o Lucas, mas, ainda sim... Ele não pode estar morto.
As lágrimas romperam quando eu pensei no sorriso dele, naquele incrível sorriso que poderia iluminar um cômodo inteiro. Ele sorria como se nunca tivesse algum problema, como se qualquer coisa pudesse ser feita ou resolvida através da sua felicidade. Lembrei-me dele, do recomeço, das brincadeiras, do diferente. Ele não podia estar morto, eu não conseguia acreditar. Não conseguia. Larry era como um pedaço de mim, algo que eu não podia viver sem. Eu o amava. Droga, como eu o amava. Não chegava a ser um amor romântico ou passional, digno de um namoro ou algo parecido, porém ainda o amava. Eu queria ele por perto, queria estar com ele, mesmo que não ficássemos juntos como namorados. Então, quando aquele homem e minha mãe falaram aquilo, eu simplesmente não pude acreditar.
Mas era verdade.
***
HORAS DEPOIS...
O Sol estava se inclinando sobre o horizonte quando permiti abrir meus olhos. Uma luz avermelhada entrava pela janela, derramando-se sobre minha cama, minhas paredes e meu chão. Era lindo, lindo demais para ser verdade. Tudo estava lindo. Tudo estava ótimo, exceto... A cor vermelha me lembrava ele, minha cama me lembrava dele, as paredes me lembravam dele, tudo me lembrava dele. Olhar para cada centímetro do meu quarto me fazia lembrar de Larry. Por isso, fechei os olhos novamente. Era uma sensação vazia, de choque: eu simplesmente não conseguia acreditar que aquilo realmente estava acontecendo. Minha mãe me deixou sozinho para pensar, embora tivesse protestado quando eu pedi isso a ela. As lágrimas cessaram. Fiquei completamente paralisado, olhando para a janela e para o céu além dela, pensando em tudo e ao mesmo tempo em nada.
Ninguém me perturbou, nem meus pais nem meu irmão ou irmã. Eles pareciam entender pelo que eu estava passando. Parecia simples, para falar a verdade, a perda. Mas, se você olhasse nos meus olhos, poderia perceber a dor que eu estava sentindo. A realidade veio uma hora depois, quando não recebi mais alguma ligação de Larry ou alguma mensagem. Foi aí que eu parei para pensar pela primeira vez. Deitei-me com o rosto virado para cima, olhando o teto escurecido pela luz do crepúsculo.
— Larry está morto. — Eu sussurrei para mim mesmo. — Ele nunca mais vai voltar. Eu não acredito.
O ato de falar parecia queimar a minha garganta, então permaneci em silêncio durante o restante do tempo. Pensei nas consequências daquilo, primeiro, não nas causas. Por mais que eu achasse que não o amava, estava errado. Eu o amava. Eu precisava dele. Ele era... Larry.
Abrindo os olhos, me virei para o lado e peguei o celular, que estava começando a ficar sem bateria. Uma pontada passou por todo meu corpo, como uma agulha na minha medula espinal. Eu nunca mais veria aquela tela se acendendo com uma mensagem dele. Eu nunca mais acordaria à noite com uma ligação dele, me pedindo para nos encontrarmos no parque. Eu nunca mais...
Desbloqueei a tela e vi as notificações. Havia dezenas de mensagens, de todas as pessoas possíveis: desde Aimee até Aqua, passando por Andrew e até mesmo Pierre. Respirei fundo, pensando qual visualizaria primeiro. Com coragem, abri a conversa da segunda pessoa mais importante para mim (guardando a mensagem do meu namorado para depois).
Andrew: “Greg”
“Greg, você está aí?”
“Você viu o noticiário? Estão falando algo sobre algum acidente envolvendo um estudante do Colégio Vargas”
Dez minutos mais tarde ele mandou outra mensagem, mas eu apenas li elas de uma vez só.
Ele: “Eu vi.”
“Greg, eu sinto muito”
Já faziam mais de quarenta minutos que ele havia me mandado aquilo, e pensei que talvez eu tenha sido um babaca sobre ter demorado tanto para responder. Mas, afinal, ele não podia me culpar. Eu não consegui fazer nada além de ficar deitado na cama.
Eu: “É verdade. Ele morreu”
Dizer aquilo, mesmo que por mensagem, me fez ter outro senso de realidade. Eu pensei, por um momento do meu choque, que aquilo podia ser um sonho ruim, um pesadelo, mas ter outra pessoa que também confirmou a morte dele... Aquilo apenas me provou que não era uma alucinação.
Andrew leu a mensagem imediatamente e começou a digitar, mas, antes que eu pudesse ler o que ele estava escrevendo, mudei de conversa.
Aqua: “Greg. O Larry...”
“É verdade?”
Eu: “É”
Respondi-a antes das outras, modelando a minha resposta para as mesmas perguntas. Todos perguntaram sobre Larry, se era verdade que ele estava morto, e eu não tinha mais argumentos. Comecei a responder sem pensar muito, apenas com “sim’s”. Eles e elas faziam justamente a pergunta que eu queria evitar.
Larry está morto?
É verdade?
Minutos mais tarde, meu celular vibrou com um toque diferente. Aquela mesma música foi o anúncio do inferno na minha vida, minutos atrás, mas não era mais o Larry. Era Andrew.
— Alô? — Perguntei, com a voz baixa, atendendo-o.
— Greg, eu sinto muito, muito, muito mesmo. — Ele respondeu. — Sério, eu estou sem palavras. Minha mãe me disse para assistir o noticiário local, porque estava passando algo sobre algum estudante do colégio, e quando liguei a televisão... Era ele, Greg. Eu sinto muito. Eu não consigo acreditar.
— Eu também não.
— Ele... Larry... — Andrew hesitou ao telefone. Ele parecia confuso, talvez até mais consternado do que eu. — Ele era a melhor pessoa que eu já conheci. Eu nem sei o que te falar.
— Não precisa dizer nada. — Respondi. — Eu sei que você sente muito.
— Me desculpe. Sério, eu... Eu fui muito negligente com vocês, devia ter ficado aí, para não deixar que algo ruim acontecesse.
— Andrew, não se culpe. Foi um acidente. Você não poderia fazer nada. — Rebati.
— Eu sei, mas... Eu não sei. Eu estou confuso. Acho que dá pra perceber. — Ele respondeu.
Ficamos em silêncio por um tempo, deixando a chamada correr. Eu não me importava com a maldita conta de telefone, eu não me importava com a maldita opinião dos outros sobre o silêncio.
— A vida é um sopro. — Disse ele. — Num momento, ela está aqui. Em outro, já se foi.
Andrew desligou sem se despedir, deixando-me com a consciência cheia e o coração vazio. Sem saber o que fazer, ou o que falar, ou com quem falar, voltei-me para a cama, sentando-me, e fiquei esperando por qualquer coisa que me tirasse do choque.
***
Uma hora depois, mais ou menos, meus pais e meu irmão entraram no meu quarto. Eu me arrumei, secando as lágrimas e me sentando em posição ereta. Minha mãe passou a mão por meus cabelos antes de sentar ao meu lado, meu pai me deu uma leve batida no ombro e também se sentou ao meu lado.
— Filho, você está bem? — Meu pai perguntou. Eu confirmei com acenos.
— Estou.
Minha mãe segurou na minha mão, com uma leve pressão. Foi apenas nesse momento que percebi que os três estavam usando roupas inteiramente pretas. Luto.
— O velório começará daqui a pouco. — Minha mãe disse. — Você foi convidado.
— Eu não vou.
Todos olharam para mim como se eu tivesse falado que tinha assassinado alguém. Não entendi porque tanta problematização. Eu apenas não queria ir.
— Como assim? Ele era seu melhor amigo. — Disse Ryan.
— Eu sei. Continuo não querendo ir. — Respondi, erguendo meu olhar para ele.
— Mas, até a Alanis vai. Greg, você tem que...
— Ryan! — Minha mãe interrompeu. — Essa é uma decisão dele. Se ele não quer ir, então tudo bem. Vamos apoiá-lo.
Vi meu irmão engolir em seco antes de assentir levemente.
— Mas, Greg, querido... — Disse minha mãe. — Tem certeza que quer ficar sozinho?
— Isso é o que eu mais quero fazer. — Respondi com a voz baixa, desviando o olhar. Eu não conseguia olhá-los nos olhos. Cada olhar parecia me machucar como uma faca.
No final, eles foram e eu fiquei. É claro, aquilo me rendeu uma tremenda consciência pesada: fiquei imaginando que deveria ter ido ao velório, que deveria ter visto-o mais uma vez. Mas esse era o problema. Eu não queria vê-lo machucado, arrumado como um cadáver, com uma flor branca sobre o paletó e os cabelos bem penteados. Eu queria lembrar-me dele como ele era: uma regata, uma bermuda, um sorriso no rosto e os cabelos despenteados. Eu queria lembrar-me dele. Minha última lembrança de Larry era o nosso beijo, o corpo dele pressionado contra o meu, o jeito como ele me olhou antes de nossos lábios se encontrarem.
Sem pensar em mais nada (e pensando em tudo ao mesmo tempo), deitei-me novamente na cama e fiquei esperando a noite passar.
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