História Confused Feelings of a Demon - Esse mordomo, o beijo

Ciel sentiu um frio se formar em seu estômago. ‘O que devo fazer?’ 

Ele olhou para a noiva que esperava pela resposta. Era inegável a beleza de Elizabeth, mas ele não conseguia se sentir atraído por ela, não sentia as mesmas sensações que o inquietavam quando estava na presença de certa... pessoa. 

Isso não era bom. Era errado. Ele não deveria sentir isso por outro homem, principalmente quando esse ‘homem’ era um demônio, o mesmo que devoraria sua alma no término do contrato. Esse pensamento lhe causou estranheza.

Ele agarrava-se na esperança de que essa confusão se devesse ao grande tempo passado na presença do mordomo, Sebastian era o primeiro que via ao acordar e o último ao dormir. Essa era uma explicação aceitável, visto que seu orgulho jamais o deixaria admitir sentir algo por uma criatura que nem era humana.

Ele tomou sua decisão. Olhou para a noiva e aproximou seu rosto do dela. Sua resposta não seria dita com palavras, mas com ação. Ele segurou delicadamente o rosto de Elizabeth e acariciou sua bochecha. Ela entendeu o que suas ações queriam dizer, então fechou os olhos esperando o contato. 

Ele fechou os olhos também e finalmente seus lábios se uniram. Inicialmente foi apenas um toque suave, era o primeiro beijo de ambos, então eles não sabiam bem o que fazer. Mas Ciel não poderia passar vergonha justamente nesse momento e ele logo abriu mão de seu acanhamento.

Ele selou outra vez os lábios de sua noiva, dessa vez se demorando um pouco mais, capturando seu lábio inferior enquanto ela tentava corresponder como achava ser o certo. Por fim ele pediu passagem com a língua e ela timidamente cedeu. 

Elizabeth enlaçou os braços em seu pescoço, colando seu corpo ao dele. O contato foi tímido e desengonçado. Eles não demoram a finalizar o beijo. Ela encontrava-se ofegante, seus batimentos acelerados. Ciel continuava inalterado. O beijo não foi de todo ruim por assim dizer, foi apenas normal. Ele não sentiu  nada de tão extraordinário quanto falavam os rumores sobre esse assunto.

Lizzy continuou abraçada a ele, repousando a cabeça em seu ombro, isso fazia com que Ciel pudesse sentir seus batimentos ainda desordenados. Ele então achou que era hora de retornarem à mansão antes que ela resolvesse repetir a dose, além disso, já estava ficando tarde.

S&C

Na mansão, os criados não entendiam por que Sebastian estava tão irritado. Na cozinha, ele preparava um cervo abatido há poucas horas, esquartejando o animal com a habilidade de um excelente açougueiro. Foi quando sentiu a presença de seu mestre, ele parou o que fazia e foi para a entrada recebê-lo.

“Seja bem vindo bocchan, Lady Elizabeth.” Cumprimentou-os com uma reverência.

Quando o conde passou por ele, Sebastian pôde sentir um aroma peculiar vindo do rapaz, era o perfume de Elizabeth. Seu rosto endureceu, pensando no porquê de um estar com o cheiro do outro. Era lógico, Elizabeth seria a futura esposa daquele garoto, então coisas assim não tardariam em acontecer.

Os lábios de Sebastian se curvaram ardilosamente. O que sentia era nada menos que o esperado de um predador em relação a sua presa. O sentimento de posse. Ciel era seu e Sebastian apenas não gostava que tocassem em sua refeição. Era apenas isso que o arrogante conde era: seu alimento. Quando chegasse a hora, ele iria degustá-lo lentamente para compensar os anos que se submeteu ao seu comportamento arrogante e mimado.

Felizmente não tardou para que Elizabeth fosse embora, pois a noite se fazia presente e era perigoso para uma dama andar pela estrada naquele horário, mesmo que fosse em uma carruagem. 

S&C

Era pouco mais de oito horas da noite, Ciel fazia sua refeição, sentindo o olhar pesado do demônio a observá-lo. Apesar de incomodado, ele agiu o naturalmente e ignorou a situação. 

Assim como o demônio, ele não imaginou que o contrato se prolongaria por tanto tempo, e foi por ter a certeza que viveria muito pouco, que nunca ligou para coisas como sentimentos. Achava que eram uma perda de tempo, servindo apenas para enfraquecer as pessoas. Ciel suportaria tudo, menos se sentir fraco.

“Bocchan, após terminar sua refeição, prepararei seu banho. Você está com um cheiro desagradável.” Um brilho suave passou pelos olhos do demônio.

“E por acaso você anda me cheirando?” Ciel perguntou apático.

"Só estou avisando." O demônio continuava com a expressão neutra.

Ciel terminou a refeição o mais rápido que conseguiu, por algum motivo o clima à mesa estava insuportável. O mais irritante era que Sebastian não parecia nem um pouco incomodado. Ele saiu da sala de jantar e foi para o quarto, sentou na cama e aspirou o cheiro de seu corpo, constatando ser o mesmo de sempre. ‘Tcs, imbecil’.

“Entre.” Ele ouviu batidas na porta.

“Vim preparar seu banho.” O demônio disse com sua voz calma e profunda.

"Hum." Ciel ficou observando o mordomo da cama. Quando Sebastian retornou, ele desviou o olhar.

O demônio se ajoelhou em sua frente, pegou um de seus pés e tirou seu sapato. Depois o outro. Sebastian levantou o olhar novamente, cruzando com o olhar de Ciel. O conde sabia que se desviasse o olhar agora pareceria estranho, então ele sustentou o olhar. Sebastian deslizou a mão para dentro de sua calça, puxando lentamente a meia escura. Ciel sentiu uma estranha inquietude quando aquela palma acariciou seu tornozelo.

Retirado os sapatos e meias, Sebastian se levantou para desabotoar o terno que ele vestia, seguido do colete, gravata, camisa... Descasava cada botão de forma vagarosa, sempre mantendo o contato visual, Ciel por sua vez também não desviou o olhar. Logo ele percebeu que não deveria ter feito isso. Ele sentia que lentamente estava afundando, se afogando na beleza daquele demônio. Ele piscou voltando a realidade.

“Por que tanta demora? Está perdendo a prática?” 

“Perdoe a minha demora, jovem mestre.” Sebastian retirou rapidamente o restante das roupas.

No banheiro, Ciel mergulhou na água de temperatura agradável, permitindo que seu corpo relaxasse. Sebastian sentou em um banquinho ao lado da louça, arregaçou as mangas e pegou a esponja, começando sua tarefa diária.

As sensações estranhas começavam a voltar. A pele pálida do garoto era convidativa ao toque e o cheiro de seu corpo era agradável. Tudo no conde mexia com ele de uma forma que não o agradava. Seus olhos adquiriram um tom de róseo, denunciando sua natureza demoníaca. Sua boca salivou, ele já não sabia dizer se realmente era apenas por causa da fome ou também pelo desejo desconhecido que só aumentava toda vez que fazia essa tarefa.

Ele analisou os detalhes do rosto delicado do rapaz, os lábios levemente entreabertos, as maçãs ruborizadas pelo calor da água, a elegante curva do pescoço, a pele branca e macia. Sebastian já havia estado com humanos de beleza inigualável, ainda assim, nenhum lhe chamou tanta atenção quanto Ciel.

Ciel abriu os olhos repentinamente, dando de cara com os olhos intensos e brilhantes do demônio cravados em sua pele. Nunca Sebastian o olhou desse jeito antes. Ciel se viu indefeso e uma fraqueza pareceu tomar conta de seu corpo. 

Sebastian sustentou o olhar, não se importando em ter sido pego naquele momento de luxúria. Os olhares se fixaram, como se estivessem hipnotizados. Emoções afloravam em igual intensidade de ambos os lados, mas ninguém deixou isso transparecer. Ao longe, um trovão os despertou do transe, e eles colocaram novamente a máscara de indiferença. Sebastian o secou e vestiu sem trocarem qualquer palavra ou provocação.

“Boa noite, Bocchan.”

Ciel não respondeu, também evitou olhar para o demônio. 

Com o castiçal em mãos, Sebastian se dirigiu para a porta, ao tocar a maçaneta um sorriso surgiu em seus lábios. Ele sussurrou. “Tenha bons sonhos, meu senhor.”

O conde não soube dizer se o que ouviu foi real ou fruto da sua mente já entrando no mundo dos sonhos, o fato foi que naquela noite, pela primeira vez em sua vida, ele teve sonhos molhados, e não foi com sua noiva.