Luna Valente
Sentir o ar puro batendo no rosto faz com que eu me anime e renove minhas energias. É claro que se eu estivesse sobre meus patins, estaria sentindo isso em dobro, mas caminhar sem destino, apenas conhecendo a cidade, tirou de mim as sensações ruins que o não-casamento deixou. Ou pelo menos parte delas.
Enquanto esperava o café que pedi ficar pronto, pensei que o mais sensato seria me livrar de todas as roupas e acessórios que comprei para o casamento. E isso infelizmente incluía o vestido, que era lindo. Assim que voltar para o hotel, vou pensar no que fazer. Talvez eu jogue na late de lixo. Ou rasgue.
É. Rasgar é uma ótima opção.
Agradeço a jovem atendente que me entrega o café e sigo meu passeio pelas ruas de Las Vegas. Ver a quantidade de pessoas estranhas que anda por aqui me faz soltar alguns bons risos. Essa cidade realmente é tudo o que dizem dela. Parece que aqui cada um se sente livre o suficiente para ser estranho a sua maneira.
Depois de andar por mais algumas ruas, uma imensa placa me chama a atenção. Um letreiro indicando uma pequena salinha onde, segundo o mesmo, era possível deixar qualquer etapa da vida para trás, através de um corte de cabelo. Olhei para baixo e passei os dedos entre as pontas castanhas do meu cabelo comprido. Pensei nas pessoas com diversos tipos de cabelo que vi no caminho até aqui e cogitei a possibilidade de mudar. Joguei o copo de café vazio na lixeira mais próxima e bati algumas vezes na porta, esperando que alguém viesse me atender. É possível que me chamem de loca por estar entrando em um lugar totalmente desconhecido para cortar o cabelo. Mas preciso de uma mudança. E arriscar tudo foi o que me fez chegar até onde estou em todos os aspectos da minha vida.
Depois de algum tempo nas mãos de uma mulher de uns 40 anos, e cabelos totalmente coloridos, me olhei no espelho e sorri com a imagem refletida. Passei as mãos pelos fios e fiquei algum tempo apenas admirando a mim mesma. Não foi uma grande transformação, mas de certa forma foi libertador, como se com a mudança de visual eu também pudesse começar uma nova etapa da minha vida, onde Henry seria passado e a traição dele também.
Agradeci a dona do pequeno estabelecimento. Tivemos uma conversa interessante, onde ela me contou seu drama com os dois ex-maridos e como eu tive sido afortunada em ter mi livrado de me casar tão jovem. Ela me deu alguns conselhos sobre o amor e sobre como devemos ter cuidado com ele. Eu sabia disso. Sabia perfeitamente.
Minha vida amorosa não é igual à de nenhuma das pessoas que eu conheço. Tive dois namorados; meu melhor amigo, por quem eu pensava estar apaixonada, e o cara que me traia com a minha colega de trabalho. Tive dois caras com quem sai depois de ser mãe; um deles praticamente fugiu de mim quando contei da Sol e o outro esteve a ponto ir um passo mais a fundo, até achei que seriamos ficantes sérios, mas ele foi me levar em casa um dia e viu brinquedos pela sala, fugindo também. E para terminar a quantia total dos cinco homens com quem eu tive algum tipo de envolvimento, temos o pai da minha filha, que apesar de nunca ter sido oficialmente nada meu, pode ser considerado o cara com qual tive a relação mais intensa.
Com esses pensamentos andei de volta ao hotel e em poucos minutos já estava tomando o elevador para o andar da Nina. Tirei o celular da bolsa e liguei o aparelho. Tinha desligado porque queria esse tempo só meu, para pensar em mim, sem ninguém me perturbando. Avisei Nina que sairia, mas não disse em quanto tempo estaria de volta, então é compreensível que ela tenha me ligado algumas vezes.
- Estou entrando. – falei e entrei no quarto do meu casal de amigos. Não me julguem. A porta estava aberta.
- O que? – Nina ajeitou os óculos no rosto – Você não fez isso.
Andou até mim e mexeu nos meus cabelos, ainda incrédula. Assenti com a minha melhor expressão de “estou me sentindo poderosa com esse cabelo” e ela riu.
- Dizem que mudar o cabelo também trás uma mudança de energia. Estou precisando disso. – entrei e não estranhei o fato de Gastón não estar ali. Ele e Matteo só se desgrudaram ontem a noite, porque meu amigo fotógrafo já tinha planos com a senhorita Simonetti.
- Você sai daqui para dar um passeio e volta quase loira. – Nina tinha certa dificuldade de lidar com mudanças, e para ela não era tão fácil.
- Não estou quase loira. – olhei-me no espelho – Só dei uma pequena clareada e tirei as pontas.
- Ficou incrível. Você é linda e ficou ainda mais linda, amiga.
- Obrigada. Quem sabe você não se anima a mudar também. – pisquei para ela.
- Nina você esta demo... – Gastón se interrompeu – Uou. Ela fez isso mesmo? – olhou para Nina.
- Aham.
- Ei, eu estou aqui. Você pode se dirigir a mim. – dei um soco no braço dele, para segundos depois encontrar outro olhar sobre mim.
- É... – tossiu – Caramba. – os olhos castanhos café pousaram sobre mim com a intensidade que costumavam ter quando éramos adolescentes – Você está incrível.
Apenas sorri e ele pareceu ficar sem graça por ter feito o comentário.
- Vocês estavam indo para algum lugar? - perguntei já que Gastón entrou falando sobre a demora da Nina.
- Te procurar. – Nina foi quem respondeu.
- O que? – ri – Por quê?
- Porque você não atendeu minhas ligações e ficamos preocupados. – pendeu a cabeça para a direção onde Matteo estava.
- O Henry ainda está por aqui. Ele poderia ter te visto saindo e ido atrás de você. Quer dizer, não que eu tenha fico pensando só nisso desde que você saiu, mas eu achei que poderia te acontecer alguma coisa já que a cidade é cheia de todo tipo de gente. – Matteo se embolou para dizer as coisas e tanto eu, quanto Nina e Gastón, seguramos o riso.
- Eu sei me cuidar, Matteo. E se Henry aparecesse na minha frente ele levaria um belo chute entre as pernas.
- Você sabe como os dois são exagerados e preocupados. Eu só estava indo por ir mesmo. – Gastón se jogou no sofá de um dos ambientes do quarto – Agora que você está aqui, não precisamos mais sair. Porque para ser bem sincero, não estava com muita vontade de sair. – olhou para Nina, que corou e abaixou a cabeça.
Eu e Matteo fizemos sons com a garganta, indicando que também estávamos ali, e Gastón deu de língua, em claro sinal de que nossa presença não era bem vinda nesse quarto. Não nesse momento, pelo menos.
- Vocês querem que a gente saia? – Matteo apontou a porta, zombando – Porque sei lá, eu estava pensando em ficar aqui mais tempo.
- Eu também. É um ambiente tão aconchegante e familiar. – Nina negou com a cabeça e Gastón jogou duas almofadas. Uma em mim e outra em Matteo.
É uma confortável sensação de ter voltado alguns anos e estar no Blake. Aquelas pessoas, incluindo Matteo, estavam me fazendo bem e quase esquecer o que aconteceu. Quase.
- Vocês são dois estraga prazeres. – bufou, mas riu em seguida.
- O que vocês querem fazer? Pelo que me consta ainda temos algumas horas em Las Vegas até pegarmos a estrada para San Diego.
As cinco da manhã vamos sair daqui direto para a Califórnia. Não era bem desse jeito que eu esperava voltar, mas melhor voltar solteira que casada e com um par de chifres. E sim, estou tentando lidar com a situação da melhor maneira possível.
- Eu vou ficar aqui mesmo. Arrumar minhas malas e pedir o jantar no quarto. Se vocês quiserem, descobri uns lugares legais pelo passeio e vocês podem visitar. – falo com pouco animo.
A realidade é que apesar do meu dia ter sido ótimo e cheio de momentos bons, eu ainda queria estar num buraco na terra, quieta e sozinha, esperando essa estranha sensação, que é uma mistura de raiva, tristeza e decepção, passar.
- Amiga, eu posso te ajudar, se quiser. – não era a toa que Nina era minha melhor amiga. Ela está comigo em todas as horas, não importa o motivo ou o porquê, se eu precisar, lá está ela disposta a tudo para me ajudar.
- Não precisa. Já estraguei o suficiente seus momentos com o Gastón aqui. Vocês estão merecendo um tempo sem mim. De verdade, eu vou ficar bem. Tenho que estar bem para encontrar a minha pequena amanhã. – instintivamente ao falar da Sol, meu olhar foi ao encontro de Matteo – Ela está na sua casa ou na casa da Katherine?
Matteo me contou que deixou Sol com ex e eu achei bem estranho. Mas a pequena me contou, quando liguei para ela ontem, que “papai e Kate agora são melhores amigos assim como o tio Simón e você”. Matteo me explicou tudo certo e entendi a situação e como tudo tinha chegado a isso.
- Em casa. – respondeu e coçou a nuca – Digamos que a casa da Kate não é exatamente feita para uma criança. É cheia de quadros, obras de arte, esculturas de artistas famosos. E conhecendo nossa filha como conheci nesses últimos meses, nada disso estaria a salvo.
- Então é para lá que vamos primeiro amanhã? – Nina pergunta. Ela e Gastón vão ficar lá em casa – Estou com saudades da minha afilhada.
- Sim. – Gastón respondeu – Porque quero conhecer o apartamento do Matteo também.
- Ok. Daqui sairemos diretamente para a Balsano’s house. Vou avisar a Kate para não levar Sol a escola.
- Isso. – assenti – Quero passar o dia abraçada a minha miniatura. – os três me olharam torto – Tá legal, a miniatura dele. – olhei para Matteo e bufei de leve. Ele riu e passou a língua para umedecer a boca. Essa mania também continua viva – Vejo vocês amanhã. Aproveitem as ultimas horas em Las Vegas e de preferência não percam dinheiro nos cassinos.
Sai do quarto e dei um suspiro aleatório enquanto esperava o elevador. Mexi nos meus cabelos e sorri sozinha, a Luna Valente quase loira ainda teria muitas coisas para enfrentar.
(...)
Colocar em prática minha ideia sobre rasgar meu vestido de noiva tomou grande parte da minha noite. As costuras e a sobreposição de renda com toda certeza travaram uma batalha comigo. Eu quase diria que o vestido tinha sido feito para não ser rasgado, mas depois de varias tentativas, uma unha quebrada e alguns arranhões nas minhas mãos, consegui deixar o tecido branco em pedacinhos.
Aliviou um pouco da raiva. Mas também me fez chorar. Descarreguei no vestido mais uma parte das minhas lágrimas. Dediquei tempo e amor a um relacionamento onde eu era só um objeto. Isso é o que mais me dói.
Estranho as batidas na porta, mas imagino que deva ser o serviço de quarto vindo trazer a sobremesa que pedi junto com o jantar e não veio. Enxuguei o rosto e dei algumas batidinhas para que a pessoa do serviço de quarto não visse meu estado.
A pessoa do outro lado da porta não era bem quem eu estava pensando.
- Você chorou. Odeio te ver chorar. – soltou um suspiro fraco.
- O que está fazendo aqui? – levantei o olhar. Nossa diferença de altura era ridícula.
- Vim te ver. – ele parecia tenso – Sei que quer ficar sozinha, mas eu não quero te deixar sozinha. Sei que está mal. Fiquei esse tempo todo no quarto pensando em você.
Não sabia o que responder e a única coisa que saiu foi um sussurro do nome dele.
- Matteo. – fechei os olhos.
- Idiota. – disse baixinho – Eu sou um idiota. – abri os olhos – Desculpa, Luna. Não deveria ter vindo até aqui te incomodar. Já estou indo.
- Espera. – relei de leve nossas mãos – Eu aceito um abraço.
Do jeito mais terno e delicado do mundo Matteo me puxou e me encaixou num abraço exatamente igual ao que ele me deu duas noites atrás. A diferença é que agora minhas mãos não estavam contra o peito dele e eu retribuía o abraço. Fechei os olhos e me deixei, por alguns segundos, estar imersa naquela proteção que parecia tão confortável, mas da qual eu tinha medo.
- O que houve com o seu quarto? – perguntou ainda me abraçando – Um tornado passou por aqui.
- Rasguei meu vestido de noiva. – funguei de leve e me soltei.
- Sabia que você não ficaria bem sozinha.
- Eu precisava fazer isso. – dei alguns passos para dentro do quarto e Matteo também.
- Isso te fez chorar. – olhou a bagunça que eu tinha feito – E olha isso, tem pedaços de tecido para todos os lados. Posso pelo menos te ajudar a juntar tudo isso e colocar no lixo?
- Se quiser. – suspirei.
- Você não está no melhor animo para fazer isso e não pode devolver o quarto nessa bagunça. – fechou a porta atrás de si.
- Depois que você me ajudar, vai embora. – deixei claro para ele que em hipótese alguma ficaríamos os dois no mesmo quarto além disso.
- Tá. – colocou a mão no bolso da calça e andou até o outro lado do quarto – Vai rasgar essas coisas também? – apontou uma pilha de roupas no chão.
- Não. Até pensei em fazer isso, mas vou devolver na loja e trocar por outra coisa.
Antes que eu pudesse chegar até lá, ele puxou uma camisola fina, branca e rendada, talvez a coisa mais sensual que eu já comprei, e a segurou nas mãos.
- Você... É... Esse tipo de coisa, é... Achei que não fosse seu estilo.
Pude sentir meu rosto esquentar. Não era para ele ver aquilo. E muito menos para me olhar como se estivesse me imaginando vestida naquilo.
- Tem muitas coisas sobre mim que você não sabe. – soltei com um pouco de veneno – E isso é coisa minha. – puxei a peça das mãos dele.
- Desculpa. Não tinha como saber que esses panos eram essas coisas. – parou de olhar para mim, mas não deu um passo sequer para mais longe.
- Você vai me ajudar com os restos do vestido ou vai ficar me olhando como se eu fosse um objeto também? Porque se for isso, pode ir embora, estou cansada de me sentir assim.
Ele pareceu estar envergonhado e me mandou um olhar de desculpas. Andou até o outro lado do quarto e ficou encarando a parede por alguns segundos. Era uma droga ele agir assim. Não sei lidar com isso. Não quero lidar com isso. Estamos em uma situação peculiar demais.
- Nunca te vi como um objeto. Foi mal se você se sentiu assim. É só que... – suspirou – Tenho que aprender a lidar com isso. Com você, com nós, com essa situação. Até dois dias eu estava sufocado, corroendo por dentro por te ver casar, e agora estou aqui, num quarto com você, sendo uma espécie de amigo que te ajuda a jogar os restos do seu vestido fora. Sei que esse é um péssimo jeito de começar, então vou te pedir um único favor; ignora isso que aconteceu agora, não estava nos meus planos agir assim e te deixar constrangida. O que quero é totalmente o contrário disso, quero que se sinta confortável comigo. – Matteo tem uma pequena ruga na testa que aparece quando ele fica nervoso e ela estava ali – Então vou ir lá fora, bater na porta e você vai atender e me convidar para ajudar você a desfazer essa bagunça.
- Acho melhor você ir embora.
- Por favor. Vou passar o resto da noite achando que arruinei tudo se você me mandar embora.
- Você já arruinou tudo uma vez. – não era para magoá-lo, era para deixá-lo consciente disso.
- Não me deixa arruinar de novo. Por favor.
Senti meu coração bombardear sangue com intensidade. A súplica nas palavras dele causou um calafrio em mim. Eu não conseguia. Era simples. Eu jamais conseguiria afastá-lo por completo.
- Tudo bem. – inalei a quantidade suficiente de ar para fazer meu coração bater num ritmo normal – Volte e seja esse amigo que você falou.
Ele agradeceu com um sorriso e andou para fora do quarto.
Nesse exato instante percebi que não tenho a menor ideia do que sinto por ele.
(...)
Matteo girou as chaves do apartamento e deixou que Nina e Gastón entrassem primeiro para que a surpresa para Sol pudesse ter mais impacto. Quando entramos no prédio ele avisou Katherine que deixasse Sol na sala e não se assustasse com a porta sendo aberta.
- Surpresa! – Nina e Gastón falaram juntos.
- Tios! – Sol correu na direção deles. Sorri verdadeiramente pela primeira vez nesses últimos dias. Um sorriso com gosto, um sorriso de amor. Nada na minha vida representa mais amor que Sol.
- Eu falei que viria te ver, princesa. – Gastón girou com ela no colo.
- E a madrinha aqui não ganha nem um beijinho? – Nina cruzou os braços quando Gastón monopolizou o abraço.
- Todos os beijinhos do mundo. – abraçou Nina.
Matteo também observava a cena com um sorriso no rosto. Ele olha para Sol tão orgulhoso quanto eu.
- Mãe! Pai! – correu para fora do apartamento e veio até nós – Eu senti saudade. Um monte de saudade. – se jogou nos nossos braços ao mesmo tempo.
Apertamos ela num abraço compartilhado. Inalei o perfume de flores que ela usa e corri os dedos pelo cabelo castanho. Poderia parar o mundo. Esquecer tudo. Ouvir a felicidade na voz dela e ver os olhos brilhando enquanto corria até nós, preencheu meu coração de um amor que é único.
- Seu cabelo, mamãe. – girou os dedos em uma mecha bem mais clara do que ela estava acostumada a ver.
- Você gostou?
- Sim. Você é a mulher mais linda do universo, mami. – coloquei a mão no peito e mordi os lábios fazendo uma careta, ela era a melhor parte de mim – Não é, papai?
Claro. É claro que ela falaria isso. Só tem uma pessoa que quer mais que Matteo que alguma coisa aconteça entre nós, e obviamente essa pessoa é Sol.
- Sua mãe é linda de qualquer jeito, filha. – Sol deu um sorriso divertido e encostou a cabeça no peito do pai.
- Eu sou a pessoa mais feliz do mundo. – ela suspirou.
- E posso saber o motivo disso? – toquei seu nariz e ela assentiu.
- Porque você e o papai estão comigo, e a tia Nina, e o tio Gastón, e a Kate. – olhei para a porta do apartamento e a morena dos olhos verdes acenou. Ela estava conversando com nossos amigos, mas eu me concentrei tanto em Sol que acabei não reparando neles – Só faltou... – Matteo interrompeu.
- Não precisa dizer. O guitarrista carrapato. – todos nós rimos do jeito que ela falou.
- E a tia Jazmín. – ela acrescentou – A Kate tem que conhecer a tia Jazmín.
- Tem sim. – Matteo colocou Sol no chão e andou até Katherine – Viu, segundo a Sol você já faz parte da família.
- É claro que faço. A melhor amiga do pai dela é tão parte da família quanto o melhor amigo da mãe, não é? – direcionou o olhar para mim e passou uma confiança que eu não esperava ver. Sorri em afirmação. Katherine era uma pessoa que fazia bem a Sol e isso já a fazia ter pontos comigo.
- Papai? – sou cutucou Matteo.
- O que foi, pequena?
Ela fez sinal para que ele se abaixasse e como bom mandado que é, ele fez o que ela mandou. Ela colocou as mãozinhas na boca e se aproximou do ouvido dele, dizendo alguma coisa, enquanto nós esperávamos para ver o que sairia da mente tão criativa da pequena gigante Sol Valente. Matteo fez o mesmo que ela para responder.
- Tio Gastón, você pode tirar uma foto de mim com a minha mãe e o meu pai? É que a mamãe está tão linda. – deu um pequeno suspiro.
- Posso. É claro que posso. – Gastón estava com a câmera na mão porque veio fotografando a cidade.
- Mami, você quer tirar uma foto? – e é ai que se engana quem acha que ela estava me perguntando. Essa era a estratégia de convencimento. Chegar perto, fazer um pedido ou pergunta, projetar os grandes olhinhos verdes para cima e fazer a maior carinha inocente.
- Uma só? – e essa sou eu impondo limites.
- Uma só.
Nina estava de braços cruzados, observando tudo como ela sempre fazia. Felicity ForNow ainda existe dentro ela. Katherine estava, assim como eu, na tentativa de se acostumar com a situação. Gastón ajustava a lente da câmera. E Matteo e Sol andaram até mim.
- Podem dar um abraço como antes. – Gastón olhou através da câmera – Com naturalidade, um abraço como aquele. E depois, olhem para mim.
- Eu disse uma foto.
- O fotógrafo aqui sou eu. – olhei séria para ele e ele nem me deu atenção.
Às vezes Gastón conseguia ser tão insuportável como Matteo. Ta ai o motivo deles serem tão amigos.
Matteo pegou Sol no colo e ela passou aos braços ao redor dos nossos pescoços, como antes. Voltei a colocar a mão não cabelos castanhos ondulados e a abraçar os dois. Com a mão que não estava segurando Sol, Matteo me abraçou pela cintura. Eu não podia surtar. Não agora. Ele já me abraçou em Las Vegas. É só um abraço.
A vontade de sair correndo por instinto de proteção é imensa, porque sei o que esse abraço significa para ele. Mas tem outro instinto que ganha. O de mãe. E é esse que me faz ficar ali. Sorrimos para Gastón e aos poucos a minha vontade de sair correndo dali vai passando. Olhar algumas vezes para Nina também me dá a confiança necessária para isso.
Deixo alguns beijos na bochecha da minha filha antes de colocar ela no chão outra vez. Enquanto todos entram no apartamento levando as malas, eu fico assimilando todas as mudanças. Perco-me nos meus próprios pensamentos e acabo não tendo a noção do tempo e espaço.
- Luna. – a voz de Katherine me tira da órbita na qual eu viajei – Tudo bem? Você parece perdida.
- Estou pensando. – sorrio fraco – Obrigada por tudo. Por ter cuidado da Sol e por ter arquitetado todo esse plano. Sei que o Matteo nunca teria feito isso sozinho.
Ela ri e abaixa o olhar.
- Não precisa me agradecer pela Sol. Criei um afeto muito grande por ela nesse tempo e não quero perder isso. Espero que não seja um problema para você pelo fato de eu ser ex namorada do Matteo.
- De jeito nenhum. Sol te adora. Faço questão de manter esse contato entre vocês.
Sinto que o assunto acaba. Mas não.
- Luna, você é consciente que ele te ama, não é? Porque o que eu descobri nesses últimos dois meses é que ele nunca vai ser capaz de soltar esse amor. Você faz parte dele.
- Por que está me dizendo isso?
- Só quero que saiba. Entendo seus motivos e suas razões. Mas o maior motivo de eu ter recuado completamente e desistido dele, é porque sei que você sente o mesmo. Sei que não tenho forças nem lugar para lutar contra o que vocês dois sentem. Vocês têm uma história muito maior e mais forte do que qualquer um de nós pode imaginar.
- Você o ama também. – os olhos dela diziam isso.
- Com todo amor que tenho para dar. Mas percebi que meu amor por ele é outro. Que acima de amor passional, é amor de amigo. – pausou – Não te falei nada disso para te pressionar ou induzir a algo, e muito menos porque Matteo pediu, estou dizendo porque se fosse comigo, talvez eu quisesse ouvir o outro lado da história também.
- Obrigada, Kate.
Nos abraçamos. Um abraço mais sincero do que o de muitas outras pessoas. Ela queria o bem dele, isso era nítido, mas o modo como ela tratou a situação, também me mostrou que ela quer o bem de todos nós.
- Vocês duas estão bem? - Matteo se aproximou.
- Ótimas. – Kate girou e falou – Estava aqui contando para a Luna as coisas que a Sol aprontou.
- É isso. Kate veio me contar o que a baixinha fez nesses dias.
- Ah, ok. Eu só achei que. Nada.
- Que estávamos falando de você? – ela riu – Matteo Balsano, pare de achar que você é o assunto preferido de todos.
- Sol é muito mais interessante que você. – apontei para ela, que estava se divertindo com os tios.
- E falando em Sol, tenho que me despedir dela. Daqui a alguns minutos tenho uma reunião. Por sorte vocês não se atrasaram. – olhou o relógio – Vou lá dar um beijo nela.
Eu e Matteo nos encaramos sem jeito. Coloquei meu cabelo atrás da orelha e ele as mãos nos bolsos.
Aqui começa uma nova etapa nas nossas vidas.
E que seja o que meu coração quiser.
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