História Contos em Quimera - Sonho passado

Megg acordou depois de uma noite como todas as outras, sem sonhos, nem pesadelos, nem nada. Na verdade, a palavra "nada" define precisamente com o que ela sonhou. Isso são coisas comuns para pessoas da família Mynos. Afinal, "Saber mexer com sonhos é sempre saber a hora de se sonhar"
É um dos ditos mais famosos passados por gerações de Mynos e consequentemente chegou aos pensamentos de Megg, nessa manhã.

Ela acordou esperando encontrar metade de sua cama vazia, afinal seu marido já teria ido trabalhar com as coisas de Daloo, como todos os dias, desde que se casaram.
Ela começou uma família na hora certa disse sua falecida mãe anos atrás "21 anos é a hora exata de se casa e continuar por gerações a cultura dos Mynos" dizia ela, e como Megg era filha única, bem... a responsabilidade ficou toda pra ela. Um ronco alto ao seu lado acabara de atrapalhar seus devaneios, o que a preocupou, pois, pelo que saiba, não há ninguém com ela. Só ela e Buck que moram aqui e ele está trabalhando com as "coisas da cidade".

Mas o volume dos lençóis, onde surgia o barulho, e aqueles cabelos vermelhos do lado de fora, que pareciam terem sido cortado pelo pior barbeiro da cidade, dizia definitivamente o contrário.

"Buck, acorde, vai se atrasar, e não quero ver você correndo por essa casa derrubando tudo, tentando não se atrasar, mais do que estaria, como da última vez." Disse Megg, puxando seu coberto enquanto falava.
"Umpfh". Ouviu em resposta.
"O que você..." Megg foi interrompida, por seu marido se levantando abruptamente, antes de terminar sua frase.
"Megg você sabe que dia é hoje? Não sabe?"
A felicidade com que Buck perguntou isso a fez sorrir, ele a olhou nos olhos e ela sentiu, não a primeira vez, que ele conseguia saber tudo que ela sentia, como se ele lesse um livro pela quinta vez e soubesse sobre o que se tratava, ela não podia deixar de sorrir de volta para alguém como o Buck mesmo que estivesse com medo de que seus cálculos estivessem certos. Ele era alto e forte, sua barba rubra mais parecia com as de lenhadores das fazendas as margens da cidade, mas sua brutalidade física não falava muito sobre suas maneiras. Seu marido levava a honestidade acima de tudo, e sempre colocava os outros a sua volta com maior importância que ele.
Ele queria proteger o reino como um soldado, tinha contado a Megg,  mas o único jeito de cuidar de sua família seria deixar de lado esse seu sonho, sua família dependia dele, e ele não poderia estar perto dela se estivesse protegendo o reino. Para confortar ele mesmo, sempre falava que "não adianta cuidar do reino se ao menos não conseguir cuidar da família".

Ao se casar com Megg, as coisas mudaram, afinal ela era uma Mynos, e todos sabem a relação da cidade Daloo e a família Mynos. A família de Buck se tornou protegida e cuidada pelo Sheddk de Daloo e assim Buck pode realizar seu sonho, se tornando um cavaleiro e chefe da guarda real.
"É hoje não é? Pelo que contei, faz um mês que você sonhou que ele irá nascer, e eu sei que quando você sonha com algo não planejado é meio que um sinal do futuro certo?" perguntou novamente, sem perder o brilho dos olhos.
Megg apertou os lábios, e Buck percebendo o ligeiro e singular movimento, a abraçou sabendo mais do que ninguém que era a hora de 'uma palavra de conforto' coisa que raramente ela precisava. Sempre determinada e corajosa, até morder a boca. Brincou em seu pensamento.
"Olha Megg" chamou Buck, enquanto segurava no rosto de Megg e olhando em seus olhos continuou "seja como for, seja o que for, ou o que seja o que seja, eu sempre..."
"...estarei com você" completou ela. Era uma brincadeira entre eles, desde antes de se casarem, uma forma de mostrar que um sempre lembraria do outro, e estaria sempre perto. Ela sempre amou isso nele, pra falar a verdade, ela conseguia amar tudo nele, principalmente o modo com que conseguia conforta-la apenas com poucas palavras...
"Obrigado" Disse simplesmente, tentando esconder o nervosismo de sua voz, afinal, seu filho talvez nasça hoje, e se isso não for motivo de estar nervosa, eu não sei o que é. Pensou.

A família Mynos quando sonha consegue ver vestígios do futuro. Não é comum isso acontecer e não são informações tão importantes assim, são só pequenos avisos que as vezes são desnecessários, como cubos de gelo... Afinal, eles não são importantes pra quem está tomando café.

Em seu sonho, ela tinha visto um bebê muito parecido com Buck e ela, e como ela está esperando um filho... bem... caiu como uma luva. A sua preocupação é que esse menino vai ser um Mynos, isso significa que o desejo de criar uma utopia vai ser natural dele, criar a cidade dos sonhos.
Ela terá que ensina-lo como realmente deve ser, que não existe predestinação, existem escolhas. Ele aprenderia como ser um líder.

Enquanto Megg pensava, Buck a observava com alegre preocupação, observando cada onda de seus cabelos castanhos que combinavam perfeitamente com seus olhos claros, e se perguntava no que ela estaria pensando, será que no bebê? Ele pensou que sim, tinha certeza. Quase sete anos convivendo lado a lado o fazia compreender cada traço de personalidade dela e naquele momento ele sabia dizer que ela estava preocupada... com o bebê.
"Então é hoje não é?" Essa foi mais uma afirmação que uma pergunta, então, ela notou que ele ainda esperava uma resposta.
"Bem, sim, é..." sua frase foi interrompida novamente, mas não por Buck e sim por ela. Não, não foi ela, foi uma sensação de que algo tinha sido...
"Buck, a bolsa, o bebê, ele...".