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História Coraline - 07


Escrita por: Bella56

Notas do Autor


Pessoas me perdoem pelos erros. É que eu escrevo pelo Wattped e as vezes meu celular muda as palavras sem eu perceber. Espero que estejam gostando, beijos.

Capítulo 8 - 07


Fanfic / Fanfiction Coraline - 07

Abro os olhos, sem fôlego em minha cama. Me levanto de uma vez e sinto o pavor enrijecer meus músculos. Choro freneticamente imóvel, sentada na cama.
Foi só um sonho. Digo repetidas vezes a mim mesma. Sinto uma forte dor nas costas e com os braços doendo de tensão levo até as costas. Meu corpo congela ao sentir um líquido viscoso nas minhas costas.
Sangue!!
Meu coração explode batendo o mais rápido que pode, mas minha respiração piora me dando falta de ar. Sinto o suor em minha testa e minhas pernas não respondem ao meu comando. Choro sem parar e é a única coisa que ouço no quarto até Amêndoa começar com latidos baixos de filhote. Sinto um pequeno alívio por Amêndoa não ter sido uma coisa da minha cabeça. Respiro fundo e tento controlar minha ansiedade para tentar andar. Quando paro um pouco de chorar ouço barulho de galhos se partindo como se alguém estivesse andando lá fora rodiando a sacada do meu quarto.
Os latidos de Amêndoa se intensificam e posso ouvir o barulho de suas patinhas. Acendo o abajur e vejo a pequena latindo perto da sacada o que me faz quase perder o sentido de tanto medo.
10 segundos de coragem, é tudo que preciso!
Me incentivo a levantar da cama, o medo paralisando cada parte do meu corpo. O vento gelado faz arder ainda mais as minhas costas quando me levanto da cama. Sinto o chão gelado sob meus pés e os firmo pressionando o machucado.
Fecho os olhos e sou bombardeada por lembranças daquela noite, a chuva, a música, tudo volta a minha cabeça me fazendo bambear. O que está havendo comigo? Me apoio na mesinha do lado da minha cama com a mão ensanguentada e tento ir até a porta.
Ouço a música como se estivesse tocando aqui, agora, e ela me causa arrepios.
Mesmo cambaleando consigo chegar a porta e a abrir. Amêndoa me segue sem parar de latir, seus latidos de filhote ecoam pelo grande corredor.
Tentando tirar as imagens da minha cabeça, um sentimento de culpa me consome. Eu sei que não tive culpa, mas é como se eu tivesse que ter feito algo pra impedir, como o fato de eu estar sangrando agora fosse minha culpa. Ouço todas aquelas vozes cantando na minha cabeça como se algo horrível estivesse pra acontecer, como se fosse um aviso como no acidente.
Mozart, desgraçado!
Penso e quase digo.
Sigo me apoiando na parede até o quarto de Lucio que parece mais longe agora.
O medo se intensifica ainda mais com a escuridão do corredor e sinto meus sentidos indo pouco a pouco parando de receber comandos.
Bato na porta e ninguém abre. Uso quase toda minha força para bater de novo, mas de novo, ninguém atende. Ainda apoiada por uma mão na parede abro a porta e me deparo com um quarto vazio com algumas luzes acesas.
Respiro fundo tentando me controlar, controlar o medo, frustração, e apoio a cabeça da parede. Ouço algo no corredor e o medo volta com tudo. Respiro fundo sentindo meus pulmões arderem e minha garganta seca. Ando mancando e me apoiando nas paredes com uma mão e segurando o ferimento em minhas costas com outra. Chego as escadas e sinto meu consciente se perdendo talvez pela falta de sangue. Desço segurando com toda força no corrimão que escorrega por causa da minha mão suja e os degraus parecem se duplicar a minha frente, nunca acabam. O vento lá fora uiva e eu sei que está chovendo. Nos últimos degraus tropeço em meus próprios pés e caio para o lado do corrimão batendo e escoltando meu corpo nele.
- Aí! - gemo já sem forças. Amêndoa late sem parar e eu perco totalmente as forças. Ouço o barulho da chuva lá fora, mas não há mais nada que eu possa fazer. Não vejo mais nada, está tudo escuro e eu me rendo, me rendo ao medo, me rendo a dor, me tendo a tudo, me tendo a morte.
Fecho os olhos e ouço uma porta abrir perto da onde estou. Abro os olhos e olho para o escuro, então vejo uma sombra se aproximando e eu não consigo gritar, só chorar.
- Coraline! - ouço a voz abafada de Lucio.
- Lucio - digo em meio a um suspiro - É você mesmo?
Ouço passos apressados e então a luz ascende. Vejo Lucio com uma camisa e uma calça social, as que ele estava, molhadas e seu cabelo encharcado.
- Cora, ta me ouvindo? - ele se aproxima de mim e em seu rosto duro eu consigo ver uma expressão de terror.
Lucio me examina rapidamente com os olhos procurando um jeito de me tirar daqui, acredito eu.
- Você caiu?
Não consigo responder, meu cérebro está pouco a pouco se desligando. A dor é crescente, e agora nas pernas e na cabeça. A última coisa que sinto é a mão quente de Lucio no meu rosto e ele chamar meu nome e então fecho os olhos, sem perder a consciência, mas o cansado físico me consome. Ainda posso ouvir ele me chamar e sentir a adrenalina tentar fazer meu corpo lutar, mas só que meus músculos estão doendo de tão rígidos.
Ouço o silêncio e então o alarme da casa desperta fazendo um som alto, eu nem sabia que a casa tinha um alarme.
- Droga! - ouço ele gritar e então não sinto mais suas mãos.
Faço esforço para abrir os olhos e vejo tudo embaçado. Vejo uma luz e vejo meus braços com manchas de sangue e minhas pernas também.
Ouço passos firmes no assoalho de madeira a minha volta, meu coração dispara. Agora é a minha hora. Penso, sinto mãos envolta do meu corpo e posso identificar o olhar aflito de Lucio sobre o meu corpo.
- O que aconteceu com você Cora? - ele diz perto do meu ouvido ao me pegar no colo. Seu corpo está molhado. Não respondo, estou cansada demais, mal sinto ele me carregar. Ele chama por Amêndoa que late sem parar.
Ele chuta a porta do quarto que deixei meio aberta e liga a luz, posso ver sua expressão quando ele olha para o quarto.
Ele me coloca na cama com cuidado e vai até as portas da sacada e as fecha.
- Cora, você abriu? - ele diz, mas me sinto tonta demais para lembrar. Não sei o que é verdade e o que é alucinação.
- Lucio... - digo baixo.
- Eu to aqui. - ele chega perto.
- O alarme...
- Eu já desliguei, não se preocupe com isso. - ele diz e posso ver um leve desespero em seus olhos.
- Não fui eu Lucio. - choro.
- Quem foi? - ele pergunta firme.
Choro mais confusa.
- Você. - digo baixo e ele petrifica.
Lucio não fala nada, só me pede para virar. Me deito de costas na cama e então ele sobe meu vestido. Nessa hora já não sinto mais nada, nem medo, nem vergonha nem excitação, só quero que tudo acabe.
- Está machucada. - ele diz se levantando. - Vou buscar curativos.
Ele sai do quarto, mas em segundos está de volta.
- Sente alguma coisa?
- Não. - digo baixo.
Sei o que ele está pensando, que fui eu quem fez isso, mas como? Eu estava dormindo.
- Acho que vou leva-la ao hospital. - ele diz com a voz firme, não consigo detectar nenhum tipo de sentimento.
- Ta tão ruim assim?
Ele respira fundo e não me responde.
- Precisa de ajuda para se vestir? - ele diz me ignorando e agindo como se fosse realmente meu médico.
- Acho que não. - digo me virando de vagar.
- Então tudo bem, vou pegar a chave do carro. - ele diz saindo do meu quarto sem nem olhar pra mim. Ou ele está muito bravo comigo ou não liga, e pelo jeito dele eu aposto na segunda.
Me levanto com cuidado.
- Coraline, não precisa se trocar, só coloque um casaco. - Lucio volta já com a chave na mão.
Olho pra ele e não consigo raciocinar direito, eu só quero dormir. Ele vem até mim e joga um sobretudo preto por cima dos meus ombros e depois ele fecha, eu não faço nada, só fico olhando pra ele.
- Vamos.
Ele vai na frente e eu vou andando bem mais de vagar. Encosto na parede cansada e com dor.
- Lucio, não da. - digo encostada na parede de tanta dor.
Lucio me olha como quem vai resolver um enigma.
Ele vem e me cerca com um braço.
- Vou pega-la no colo, quero que me diga se doer.
Ele me pega no colo e eu sinto uma ardência nas costas. Gemo de dor, mas logo me controlo.
- Vamos então.
Lucio me carrega pela escada como se eu não pesasse nada, sem vacilar uma vez.
- Amêndoa. - digo me lembrando do meu filhote.
- Ela vai ficar bem. - suas palavras são carinhosas, mas sua voz não.
Ele vai pela cozinha e então abre uma porta que da direto na garagem.
Respiro fundo quando vejo o carro.
- Lucio, não da. - digo sentindo o medo tomar conta de mim.
Ele não me da bola, vai até a porta do passageiro e me coloca e depois passa o cinto me prendendo.
Ele da a volta no carro pela frente. Posso ver que ainda está com roupa social, mas toda desarrumada.
Ele entra pela porta do motorista e coloca a chave na ignição.
- Coraline, me escuta. Eu quero que se controle agora. Isso tudo é uma armadilha do seu cérebro. - ele diz sem me olhar, olhando pra frente.
Sinto meus olhos arderem com as lágrimas. Ele da a partida e meu coração dispara.
- Não vou conseguir, por favor, eu prefiro sangrar até morrer. - digo em pânico.
- Não me faça ter que te amarrar. - ele diz sério.
Inclino a cabeça pra trás e fecho os olhos. Lucio sai de ré me dando enjôo no estômago. Não vou abrir os olhos!! Penso, mas as sensações ficam piores com os olhos fechados. Ouço gotas de chuva cair no carro e então abro os olhos. Vejo o clarão do farol e volto aquela noite, onde minha mãe me olha, mal consigo ve-la, minha visão ta embaçada, meus olhos querem ficar fechados como se soubessem o que iria acontecer.
A chuva fica mais forte, se eu não tivesse insistido naquela viagem nada teria acontecido. Sinto o gosto amargo da culpa, foi tudo culpa minha.
- Coraline, sai dessa!! - Lucio grita comigo.
Olho pra ele e ele parece nervoso. Não consigo parar de chorar um segundo.
- Não, para, por favor!!! - grito e choro ao mesmo tempo.
Tento me soltar do cinto, preciso sair desse carro! A sensação de medo me toma, eu sei que vai acontecer de novo, é como antes. Meu corpo esta no modo automático, tudo que consigo pensar é que preciso sair daqui. A musica, a mesma musica daquela noite toca de novo na minha cabeça e é como se eu só precisasse esperar, porque eu sei o que vai acontecer. Não tenho mais o controle do meu corpo, sinto espasmos tomarem conta do meu tronco e eu não consigo falar. Tento tirar o sinto mesmo Lucio gritando para eu parar.
Me viro para tentar abrir a porta e então sinto uma dor aguda na minha perna. Grito de dor. Olho para Lúcio, vejo algo em seus olhos, mas não sei o que é, então olho para a mão dele que está segurando uma seringa cravada na minha perna.
Ele tira a seringa e volta sua atenção para a estrada. Minha visão vai ficando turva, como naquela noite, não sinto mais nada, não sinto meu corpo, mas a música ainda toca na minha cabeça, e como naquele dia, meu cérebro desliga depois de ver o clarão dos faróis.

- Cora... - a voz parece distante.
- Cora, acorde. - ouço uma voz masculina dessa vez.
Minhas pálpebras pesam toneladas e envolta dos meus olhos doi como se eu tivesse levado um soco ou chorado durante um mês.
- Ela acordou. - ouço uma voz feminina comemorar.
Abro os olhos que ardem com a luz forte no quarto branco de hospital. Reconheço pelo cheiro.
- Você está bem? - olho para a dona da voz e reconheço Kate, mesmo com a visão turva.
- Oi. - digo. O som que sai é mais um som gutural e abafado.
- Você vai ficar bem. - dessa vez é uma voz masculina que eu logo identifico com a do Maxwell.
Vejo nitidamente agora, Max parado do lado da minha cama com uma camisa azul escuro meio aberta, uma calça social preta e o jaleco branco. Ele parece cansado, como quem não dormiu a noite toda, mas seu sorriso é o mesmo. Kate está do meu outro lado, sentada na cama com os cabelos loiros soltos pela primeira vez desde que cheguei.
- Que susto você nos deu. - diz Kate.
- Me sinto.... Destruída.
Kate ri um pouco e Max avalia os aparelhos ao meu lado. Sinto como se cada membro meu tivesse sido arrancado e costurado sem anestesia.
- Muita adrenalina no seu corpo. Na hora você não sente a dor nos músculos dos movimentos fortes que seu corpo fez, quando não podia ou não estava preparado. Mas quando a adrenalina passa, a dor aparece. - diz Max não olhando pra mim e sim para um aparelho do meu lado.
Mesmo estando em outro país, o quarto me faz lembrar a primeira vez que eu acordei no Brasil depois do acidente. É mesmo cheiro e o mesmo barulho dos aparelhos que eu conheço desde pequena.
- Você está com fome? Sede? Precisa de algo? - pergunta Kate emocionada.
- Quantas perguntas. - não consigo assimilar direito o que ela está me perguntando.
- Ela fica chata quando está grogue. - diz Kate para o Max que sorri.
- Cade o Lucio? - digo seria não compartilhando da graça da piada que Kate fez.
Kate para de sorrir e me olha confusa.
Seus olhos castanhos parecem maiores de onde estou  Ela está com um casaco caramelo fechado.
- Seu tio estava na recepção falando no telefone da última vez que o vi.
- Esta se sentindo bem? - interrompe Max.
- Me sinto cansada.
- É o efeito dos remédios e da noite mau dormida. Você teve uma crise de TEPT.
- O que é isso? - pergunta Kate sentada na beirada da cama.
- Trastorno de Estresse pós-traumático. - digo baixo reconhecendo as siglas. Já li sobre, muito pouco, mas em uma das revistas de medicina psiquiátrica do meu pai tinha um artigo sobre pessoas que passam anos revivendo traumas que sofreram.
- Vejo que a Dra. Hattway já te falou sobre isso. - diz Max.
- Na verdade não. Foi um artigo que eu li.
- Kate, posso ficar um momento a sós com a Cora, por favor? - diz Max encostando no braço da Kate.
Kate fica indecisa por um momento, mas logo se levanta, me da um beijo na testa e sai fechando a porta atrás de si.
- Cora, você sabe que só quero seu bem não é? - diz Max sentando do lado esquerdo da minha cama.
- Fala Max.
- Quero que se trate e Tomé seus remédios direito.
- Mas eu os tomo. - digo ainda com a voz fraca.
- Todas as noites?
- Tomo todas as noites. Só não tomo quando eu durmo vendo TV ou lendo.
- Quando tiver outra crise, se agarre a algo que você sabe que é real e por favor, não seja refém da sua própria mente. Você tem que lutar contra isso.
- Max... - interrompo inspirando fundo, sinto falta de ar - Não consigo. É uma coisa que não consigo controlar.
- Consegue sim. Você só tem que fazer o tratamento certinho e mudar alguns hábitos.
- Lucio me deu um cachorro.
- O que? - a cara de espanto de Max é muito perceptível.
- O nome dela é Amêndoa.
Max abaixa a cabeça e mexe na caneta em sua mão.
- Quero que tome cuidado com o Lucio. - ele diz de uma vez.
- Por que?
- Só tome cuidado. - ele se levanta sem me olhar nos olhos.
- Você tem que me dizer por que eu deveria tomar cuidado com o meu tio Max.
- É que... - ele para e passa a mão no cabelo nervoso. - Seu tio foi o melhor médico desse hospital.
- E por que isso é ruim?
- Cora, o Dr. Lucio é famoso nesse hospital por não ter sentimentos e sempre fazer o que ele acha que é preciso ignorando qualquer lei ou regra.
- Mas...
- Lucio é o melhor médico que eu conheço, mas ele é apático e até mesmo meio sádico.
Respiro fundo e viro o rosto para o lado. Flashs do meu sonho vem em minha cabeça.
- Está tudo bem Max. Lucio não passa tanto tempo comigo. Na verdade, mal o vejo.
- Acredite Cora, isso é melhor. - ele se levanta da cama.
Max pega uma seringa e aplica em mim. Eu já nem me importo mais. Depois de tantos remédios, tantos tratamentos e agulhadas, eu já estou até gostando da parte onde tudo vai ficando distante e eu caio no sono.

Recobro a consciência. Sinto como se tivesse sido desligada e agora me ligaram de novo. Abro os olhos lentamente e vejo Kate sentada lendo, do lado da minha cama. Antes de eu poder falar algo alguém abre a porta. Fecho os olhos instintivamente quando percebo que Lucio entra no quarto.
- Kate. - ouço a voz autoritária que usa com ela e me arrepio toda. Mesmo com o cheiro forte de hospital, seu perfume invade todo o quarto fazendo meu coração bater mais forte.
- Doutor Lucio, deseja algo?
- Comi ela está?
- Sedada como o senhor pediu.
- Bom. - ele diz com total frieza na voz. Agora entendo a preocupação de Max. Lucio pediu para me sedar.
- Senhor, sei que o senhor também é médico, mas não acha prejudicial deixar a senhorita Coraline só dormindo? - a cautela na voz de Kate me assusta também. Percebo como as pessoas tratam Lucio como se ele fosse Deus. Seja feita sua vontade senhor e todo o resto.
- É saudável para ela ficar inconsciente.
- Por que?
- Para que ela não se machuque.
- Mas, ficar dormindo não vai ajudar.
- Eu sei o que estou fazendo Kate. Quando foi que se formou em medicina? - Lucio diz com a voz firme, mas sem gritar.
Me seguro pra não sair dessa cama e ir dar na cara dele. Minha respiração fica irregular com a raiva.
- Kate, como Cora tem passado seus dias enquanto está consciente?
- Bom. - Kate pensa - Ela come, dorme, come e depois dorme.
- Ela só dorme? Tem certeza?
- Sim senhor.
Ouço Lucio respirar fundo e caminhar até mais perto.
- Ela está magra. Tem certeza que está comendo?
- Sim senhor. Eu mesma levo até seu quarto e não saio até que ela tenha comido tudo.
- Bom. E os banhos?
- Ela já toma sozinha, mas eu ajudo sempre que ela pede.
-Você percebeu alguma hostilidade dela para com ela mesma?
Agradeço por estar com o corpo virado para o lado contrário ao da porta. Meu corpo continua deitado reto, mas meu rosto está virado.
- Senhor, para ser sincera, eu nunca vi Coraline tentar causar algum tipo de mal a si mesma. - a voz de Kate fica mais firme e eu me sinto agradecida por alguém me defender.
- Rachel me disse que Carolina tem ido ver a Coraline. Quantas vezes ela apareceu?
- Duas Doutor Lucio.
- E o que elas conversam?
- Eu não sei senhor. Terá que perguntar a senhora Carolina ou a Senhorita Coraline.
- Coraline não me diria. - é a primeira sentença normal que Lucio diz.
- Kate, sei que como governanta você tem muito a fazer, mas quero que não deixe Coraline sozinha. Vigie enquanto ela dorme, ajude-a no banho sem violar sua privacidade, certifique-se de que ela está comendo e eu vou pedir pessoalmente para um dos nutricionistas do hospital faça um cardápio para deixar ela mais forte e por último, me ligue caso Carolina for vista-la.
- Senhor...
- Vou contatar uma ajudante pra você. Você diz o que ela tem que fazer enquanto estiver com Coraline.
- Senhor, eu já vi a senhorita Cora dormindo e eu nunca vi ela se machucar.
- Ontem eu descobri o que está acontecendo e já estou tomando providências.
- Tudo bem. Mais alguma coisa?
- Sim. Está acontecendo alguma coisa fora do normal entre Maxwell e Coraline?
- Não senhor. - diz Kate de uma vez assustada. Sinto meu corpo pesar na cama de tanta raiva. Desgraçado !
- Então tudo bem Kate. Assim que Cora acordar receberá alta e poderá ir.
- O senhor vai junto?
- Não. Eu vou agora.
O silêncio se instala no quarto. Sinto a presença de Lucio e o ouço respirar.
- Qualquer coisa me ligue.
- Sim senhor.
- Tchau Kate. E você está muito bonita essa manhã.
- Obrigada Senhor. - sinto meu rosto ruborizar por Kate.
- Tem um rosto bonito, ficaria muito bem com o cabelo castanho. - ele diz e então ouço a porta abrir e depois fechar.
Ouço Kate suspirar e fico confusa. Não sabia que Lucio sabia fazer elogios e isso de alguma forma me deixou desconfortável. Fico com raiva. Não de Kate, dele.
- Kate, quem estava aí? - digo fingindo estar sonolenta.
- Seu tio querida. - olho pra ela e vejo suas bochechas vermelhas.
- O que ele queria?
- Avisar que você já pode ir.- ela diz se levantando rapidamente tentando disfarçar algo que está em seu rosto.

Kate pega um vestido vermelho escuro, que ela trouxe pra mim. Não gosto da ideia de colocar ele, mas foi a única roupa que ela trouxe.
- Vamos, temos que te dar um pouco de cor. - ela diz tentando me animar.
A conversa que ela teve com Lucio ainda ronda minha cabeça, mas eu tento não parecer muito distraída.
O vestido e grudado no corpo até a cintura com a parte da frente coberta mas uma grande abertura atrás coberta por um pano transparente da cor da minha pele e alguns enfeites de renda sobre o pano da mesma cor que o vestido. O pano transparente fez parecer que os enfeites estavam sobre a minha pele. A cor me deixou parecendo um fantasma de filmes de terror. O quarto do hospital é maior que o do Brasil. Parece mais um apartamento pequeno.
O espelho que vai do chão até uma altura de 2 metros mais ou menos está iluminado pela luz do quarto. O dia está nublado como sempre e cheio de nuvens, inverno.
- Onde achou esse vestido? - pergunto confusa. Era bonito e delicado, mas muito social, e eu não tinha nada assim.
- Seu tio trouxe para você colocar. Não é lindo?
- É bonito, mas me deixa pálida como um fantasma e com cara de mais velha. - digo parada, em pé na frenre do espelho com Kate do meu lado, como Lucio mandou.
- Você está linda Coraline. Agora vou arrumar você, sente aqui. - Kate puxa uma cadeira e coloca atrás de mim.
Olho minha imagem de novo no espelho. Vejo os machucados em meus braços e como o vestido vai até o meio da coxa, vejo um curativo na batata da minha perna que eu não tinha antes.
- Que curativo é esse?
- Você se machucou ontem. Uma enfermeira o fez. Não é nada muito feio, mas é bom proteger pra não ficar cicatriz.
Isso me deixa ainda mais triste. Outra marca. Como se eu já não tivesse o suficiente.
- E as minhas costas?
- Está tudo bem. Só rompeu dois pontos.
- Não está doendo. - noto e sinto um pequeno alívio, quase imperceptível, mas eu aproveito casa segundo.
- São os remédios.
Kate joga meu cabelo para frente dos meus ombros. Noto o quanto estão grandes quando as pontas dobram a curva do meu colo.
- Seu cabelo é lindo. - ela diz passando a mão em meu cabelo. - Tão brilhante, macio e forte. - ela diz escovando meu cabelo.
Vejo Kate como uma amiga e não como uma pessoa que trabalha para mim. Ela é a única naquela casa que se importa comigo de verdade e nunca me fez nenhum mal, e não tenta me manipular de alguma forma.
- Obrigada Kate. - digo fazendo força pra tentar sorrir.
- Vamos deixamos soltos hoje.
Ela diz.
- Kate, não quero sair assim, com o corpo todo a mostra. - digo baixo.
- Por que? Você e tão bonita.
- Porque eu estou toda marcada. - digo tão baixo que quase sussurro.
Ela me olha com aqueles olhos castanhos, aqueles cheios de carinho.
- Aqui tem um sobretudo pra você também querida.
- Tudo bem.
Kate escova meu cabelo. Demora um tempo por causa do tamanho. Ele está mais liso que o normal. No Brasil ele tinha volume, mas aqui ele vai liso até as pontas e depois faz algumas ondulações destacando as cores mais loiras nas pontas. Quase imperceptível, é natural, então é uma pequena diferenciação de cor de um loiro castanho meio ruivo, não sei explicar muito bem.
mate joga meu cabelo todo para o lado esquerdo deixando só algumas mechas soltas no lado direito.
- Você tem cílios lindos também. Vou passar só um rímel neles.
Faço careta de desgosto pra ela, mas não tem como dizer não para ela sorrindo daquele jeito. Ela fica feliz me arrumando, como se eu fosse sua boneca.
- Vamos realçar esses olhos lindos, suas jóias de família. - ela diz passando rímel em mim. Confesso que Cloe é melhor nisso, mas ela termina rápido. Meus olhos ficam marcados com os cílios mais marcados.
- Agora um batom na sua boca e acabou.
Respiro fundo mantendo a calma e a ansiedade de ir embora sobre controle. Mas a verdade é que me sinto mais confortável no hospital agora do que na casa de Lucio.
Ela passa um batom escuro em mim quase da cor do vestido. Pronto, agora sim esyou mais pálida que o Michael Jackson. Que ridículo. Se Cloe me visse agora, ela iria me levar para fazer bronzeamento artificial com certeza, já que eu não pego cor com o sol. O pálido da minha pele é um pálido doente misturado com os cortes em meus braços e alguns pontos eixos nas minhas pernas que eu prefiro nem perguntar da onde apareceram.
- Pronto, está linda. - diz Kate mais animada que o normal.
- Kate, solta o cabelo.
- Para que? - ela fica confusa.
- Pra eu não me sentir tão deslocada. - minto.
Kate pensa um pouco e então leva as mãos a altura da cabeça dos fazendo o coque.
Seu cabelo é lindo. Um loiro mel brilhante com cachos nas pontas por causa do coque. Ele vai até a altura dos seios mais ou menos. Seus olhos castanhos se encaixam perfeitamente com o seu cabelo.
- Sabe, minha mãe tinha olhos castanhos como os seus. - digo e ela sorri, um sorriso largo que me deixa até meio constrangida.
- E seu pai?
- Meu pai tem os mesmos olhos que os meus e os do Lucio, e os da Carolina também.
- É de se imaginar. São suas jóias de família. - diz Kate vindo até mim e me ajudando a levantar. Ela pega o sobretudo preto e coloca sobre meus ombros, eu faço o resto.
Ela pega meu celular e então me sento na cadeira de rodas, ainda sentindo dor nas pernas.
Vou digitando, contando o que aconteceu para Cloe e Bianca e então ouço passos fortes vindo em nossa direção.
- Coraline!! - Max grita vindo correndo.
Olho pra ele e fico meio assustada com o jeito que ele me olha.
- Que foi Max? - diz Kate quando ele se aproxima.
- Alguém do hospital contou sobre a existência da Cora para a imprensa e eles estão na porta do hospital.
- Malditos. - ouço Kate praguejar.
- Vamos sair pelos fundos.
Kate da lugar a Max que empurra a cadeira mais rápido. Ele está vestido com um uniforme azul de médico e um jaleco.
- Como se chama esse hospital? - pergunto curiosa ao ver a grandiosidade da construção.
- Northwest Hospital. - diz Kate.
- Ele é lindo.
Suas paredes são brancas como as de todo hospital do que com janelas de grandes de onde da para ver canteiros de flores e carros, e da para ver a cidade cheia de prédios e luzes. Pessoas andando pra lá e pra cá.
Muitos enfermeiros saem da nossa frente. O hospital é enorme por dentro então não parece tão cheio.
- Aqui vai dar direto no estacionamento coberto onde tem um carro esperando por Cora.
O estacionamento é um típico estacionamento de hospital, cinza, com muitos sinais e cheio de carros. O cheiro de carbono no ar é notável.
- O carro está ligado já.
Olho para o carro e agora consigo identifica-lo. Uma BMW preta grande, com um homem parado com a porta aberta.
- Não deixe que os jornalistas encontrem elas. - ele diz para o motorista.
Me levanto da cadeira de rodas e antes que o motorista me guie para dentro do veículo volto e dou um beijo na bochecha de Max grata por ele me ajudar sempre.
- Obrigada por tudo.
- É um prazer te proteger.
Max vem e me abraça. Ele enterra seu rosto em meu cabelo e mesmo não o conhecendo muito bem eu retribuo o abraço que é reconfortante.
- Vamos. - diz Kate impaciente como se estivéssemos fugindo da polícia.
Solto Max devagar. Ele é mais alto que eu e seu corpo é mais forte. Características que eu sempre gostei em um homem.
Entro no carro e Kate vem logo atrás colocando o cinto em mim e nela.
O carro sai cantando pneus. Não consigo deixar de olhar Max ficando para trás. No que a minha visa de tornou? Sinto meus nervos enrijecerem com o movimento do carro. Meu coração dispara, mas Kate segura minha mão. Mesmo assim, ainda sinto medo como se algo ruim fosse acontecer, como se alguma coisa fosse bater na gente, como se eu fosse perder Kate também.
O motorista passa por uma rua onde da para ver a multidão de fotógrafos na frente do hospital. Eles percebem o carro, mas já é tarde demais.
- Meu Deus, por que tudo isso? Eu não sou nenhuma celebridade. - digo angustiada.
- Não minha querida, você só integrante de uma das famílias reais dos Estados Unidos.
- Como assim?
Kate me olha com admiração e eu posso ver isso.
- Existe pessoas que ficam famosas por algo que fizeram, e existe outras pessoas que já nasceram com a fama em seu sangue. Sua família é antiga aqui, tem muitas posses e isso tudo será seu um dia.
- Eu não... - Kate me interrompe.
- Xii... Fique calma, ainda está longe de acontecer.
- Eu não sabia.
- Sabe, até entendo seu pai. Te criar longe de tudo isso, de toda essa vida, eu faria o mesmo.
Sinto instantaneamente uma forte saudade dos meus país que vem como um soco no estômago. É como se eu nunca fosse me recuperar do maior machucado que carrego, como se cada lembrança boa ou ruim machucasse mais ainda, não consigo falar neles.
Olho para Sattle que está nublada, mas muito movimentada por pessoas de todo tipo.
- Aproveite a vista querida. - diz Kate olhando para o outro lado.
Kate faz sinal para o motorista andar mais devagar. Sinto a falta de ar me atingindo. Não fique nervosa. Tento me acalmar, outra crise não.
Aperto minhas mãos e sinto o suor nelas. Paro de olhar pela janela. Apesar de estar curiosa para conhecer este lugar não consigo mais olhar para o lado de fora sem ficar tonta.
- Coloque fones de ouvido, se controle Princesa Cora. - ela diz com palavras carinhosas. Me sinto segura perto dela. Ela pega fones de sua bolsa e me da. Coloco música para tentar me destrair e fecho os olhos. Me concentro totalmente na música para tentar aliviar a pressão do medo em meu corpo, como se eu fosse sua escrava.
- Quer um calmante? - pergunta Kate.
- Não quero dormir.
- Vou te dar um fraquinho então, só vai te deixar calma.
Ela me da um comprimido pequeno e eu o engulo e depois bebo a água que ela carregava na bolsa também. Como uma verdadeira babá.
Não demora muito para que eu sinta meu corpo amolecer. Deito a cabeça no vidro, não sentindo sono, mas sentindo prazer em sentir meu corpo relaxado.
- Kate, estou com vontade de comer chocolate.
- O bolo ta lá pronto para quando chegar.

Fecho os olhos e aproveito a música.

30 minutos depois chegamos. Vejo um carro diferente parado na frente da casa, um carro que não parece ser do Lucio. Uma Caminhoneta preta e grande. Penso logo ser de Rachel e isso me desanima, mas então penso ser de Carolina e isso me faz querer entrar mais rápido.
Saio do carro sem esperar que o motorista abra a porta. Kate me fez usar um sapato fechado preto com um salto médio e isso atrapalha muito.
Adentro a casa silenciosa e escura. A escada é a primeira que vejo. Lembranças ruins da noite passada me assombram, mas mesmo assim as controlo. Entro e abro o casaco, já está calor. Kate vem por trás e tira meu casaco. A casa é fria e silenciosa, não vejo uma alma viva.
Vejo uma moça com uma bandeja com algumas coisas encima ir em direção ao escritório de Lucio.
- Hey! - chamo sua atenção.
Ela para de uma vez.
- Senhorita Coraline. - ela fala.
- Aonde vai com isso?
- Levar ao senhor Lucio, senhorita. - ela nem faz contato visual comigo e isso me incomoda.
- Quem está com ele? - pergunto curiosa.
- Como assim senhora?
- Tem três xícaras aí. - olho para a bandeja. Vejo a mulher querer se esconder e não entendo porque ela está agindo como um animal com medo perto de mim.
- Dois agentes do FBI senhora.
Olho para trás e vejo Kate parada com meu casaco na mão e ela me olha como se estivesse vendo um filme.
Não penso duas vezes e vou em direção ao escritório de Lucio.
Me escondo atrás da porta e faço um sinal de silêncio para a moça que entra com o bandeja, ela nem me olha.
- Isso é errado. - diz Kate sussurrando.
- Não segundo minhas regras. - digo convencida.

- O senhor compreende não é Senhor Hastings? - diz um homem, com certeza, pela voz ríspida, mas educadamente moderada.
- Perfeitamente Agente Obell.
- A moça foi encontrada muito perto de sua propriedade senhor Hastings. - dessa vez é uma voz de mulher.
- Isso é muito perigoso. - diz o homem com o tom de voz moderado.
- Entendo perfeitamente. No que eu puder ajudar, contém comigo.
- Obrigada senhor. - diz o homem.
- Gostaríamos de dar uma olhada em sua propriedade para ver se o assassino deixou a arma do crime aqui. - diz a mulher com menos medo.
- Tem a minha permissão. O que acham que aconteceu?
- Senhor Hastings, não sei se sabe, mas tem acontecido assassinatos em série na cidade com um tipo único de vítima.
- Sei sim, continue. - a voz de Lucio é autoritária como se ele estivesse falando com Kate.
- A moça encontrada bate com esse tipo único. Levamos o corpo hoje de manhã e vamos ver se o modus operandi é o mesmo.
- Compreendo. - diz Lucio mais pensativo.
- Senhor, o senhor tem muitos empregadas não é mesmo? - diz a mulher.
- Sim, onde quer chegar?
- Alguma delas tem entre 15 a 20 anos, pele clara e cabelo castanho?
Minhas pernas amolecem. Não consigo conter a surpresa e o medo ao mesmo tempo. Ele está perto. Meu subconsciente grita.
- Como disse, eu tenho muitos empregadas, terá que ser mais específica.
- O perfil que temos das vítimas é esse senhor. - o homem assume. - Cabelo longo, castanho, pele clara, entre 15 a 20 anos, magra e geralmente de olhos claros, o último não é nem uma regra.

Sinto minha respiração falhar. Ele está me descrevendo, eu sei. Sinto o medo invadir e me preparo para ouvir Lucio citar meu nome.
- Não. Acho que não temos ninguém assim. Vou pedir para minha governanta checar.
Fico perplexa com Lucio não ter falado sobre mim. Kate me olha com os olhos arregalados e faz um sinal negativo pra mim como se lesse em minha mente o que estou prestes a fazer.
Mas não a tempo de me impedir.
Bato na porta e ouço o silêncio se instalar no escritório.
- Espere um minuto. - diz Lucio.
Ignorando sua resposta bato de novo e então abro a porta.
- Com licença tio. - sobrecarregou bem a palavra tio.
- Coraline. - Lucio respira fundo e passa a mão no rosto.
Abro a porta e vejo os dois agentes me encararem. A mulher não consegue esconder o espanto, e o homem não sabe o que fazer. A mulher é ruiva, tem o cabelo curto e com ondas, tem seus trinta e tantos anos e está com um terninho preto com uma camisa aberta branca por baixo. Sua expressão é carinhosa e seus olhos são castanhos.
O homem por outro lado deve ter por volta dos 30 também, cabelo cortado no estilo militar, loiro, forte, de olhos castanhos. Está de terno também, mas seu palito está aberto mostrando uma camisa branca e um corpo malhado. Posso ver a sua arma de relance.
- Coraline. - meu tio me chama a atenção.
- Só... - gaguejo - Só queria avisar que já cheguei do hospital e perguntar se o senhor quer almoçar.
Foi a única coisa que pensei na hora. Sinto o frio penetrar minha pele e então fico com vergonha por estar sem casaco e com o corpo a mostra no vestido mostrando todas as minhas cicatrizes.
Má ideia! Grita minha consciência.
- Já são 16;30 Coraline.
Sinto meu rosto corar, mas eu vim aqui por um motivo, minha segurança.
- O senhor nos disse que... - Lucio interrompe a mulher.
- Nenhuma empregada. Essa é minha sobrinha, Coraline Hastings.
- Muito prazer. - a mulher se levanta e vem em minha direção me analisando. O homem fica petrificado na cadeira.
- Filha de Richard Hastings, Doutor? - enfim o homem se manifesta.
- Sim. - posso ver o descontentamento de Lucio nitidamente, mas parece que só eu percebi.
- É um prazer conhece-la - diz o agente.
- Eu sou a agente Sara Campbell e esse e o meu parceiro, agente Hans Obell. Viemos... - Lucio se levanta.
- Agente Campbell, minha sobrinha está muito cansada. Acaba de voltar do hospital.
Lucio está com as mãos dentro do bolso do palito. Se ele está nervoso, ansioso ou impaciente, ele não aparenta. Seu cabelo está arrumado e seus olhos me penetram a carne como estacas de prata.
- Claro, nos entendemos. - o homem se levanta e puxa a detetive levemente pelo braço.

Sara Campbell.
A garota apareceu como uma assombração. A pele branca e com alguns ferimentos que me fizeram lembrar das vítimas, o corpo magro e os olhos confusos. Hans me puxa pelo braço, ele e o meu superior estão pisando em ovos com essa família o que me incomoda. Estamos falando de vidas e ter que pedir permissão para investigar um assassinato não é o que deve ser feito.
- Kate, leve Coraline para descansar em seu quarto. - diz Lucio Hastings para uma mulher loira que eu não tinha notado. A garota parece confusa e nova, ela se encaixa tanto no perfil que meu corpo se arrepia em um alerta e eu quase nunca erro. A garota tem cabelos longos e castanhos como todas as vítimas, a pele é mais branca que o normal, mas ainda é como os das outras vítimas, seus olhos são claros e grandes, o que bate com o perfil também. Desvio o olhar para o Senhor Hastings, ele está diferente, parece inquieto, quase não se nota, ele é bom em esconder coisas, principalmente uma vítima em potencial, quem teria mais potencial que ela para ser a próxima?
Os crimes vem sendo cometidos a mais ou menos duas semanas e até agora só temos um meio perfil psicológico, cinco corpos e um perfil de vítima.
A menina se retira junto com a mulher loira e um silêncio frio se instala no escritório. Meu coração doi, sinto que tenho de ficar de olho na garota.
- Senhor Hastings, antes de ir, eu poderia ir ao banheiro? - peço com a maior educação do mundo e tentando demonstrar total descaso por sua sobrinha.
Olho para o homem em minha frente e ele parece mergulhado em si, percebo que um traço em sua feição mudou com a presença da garota. Eu sei pouco sobre a família, mas Hans parece saber muito.
- Claro. Vou pedir que a levem até o banheiro. - ele diz com toda educação, mas com uma frieza sobrenatural.
Ele pede que uma de suas empregadas me leve ate o banheiro. Saio pelo corredor com a mulher uniformizada completamente muda, não cheguei a pensar como eu faria para chegar até a garota, mas antes que eu pudesse inventar uma mentira, a mulher loira que levou a menina aparece já uniformizada.
- Anne, por favor, prepare um lanche para a senhorita Hastings e deixe em uma bandeja encima do balcão da cozinha para mim por favor. - a mulher diz com autoridade e carinho ao mesmo tempo.
- O senhor Hastings pediu que eu levasse a Senhorita Campbell até o banheiro. - Anne responde sem jeito.
- Eu a levo. Já estava indo por esse lado mesmo.
A mulher parece confusa, mas então sai pelo corredor me deixando sozinha com a mulher que Lucio chamou de Kate.
- Kate não é mesmo?
- Sim, por favor, venha comigo.
- Eu... - tento inventar algo, mas ela me interrompe.
- Só me siga senhorita.
Ela pisca para mim e vai na frente pelo lado oposto ao que eu estava indo. A casa é grande e o corredor largo com luzes centrais e algumas plantas e obras de arte enfeitando. O corredor se ramificação em vários corredores como se a casa fosse mais um prédio do governo, Kate anda rápido na minha frente parando na frente de uma porta de correr grande.
- Estou fazendo isso por ela. - a mulher diz e depois abre a porta dando acesso a uma sala com portas de vidro que dão para um lugar arborizado, sendo essa a única donde de iluminação do cômodo, mais a frente um sofá grande e escuro, uma mesa de centro de vidro, uma TV mais parecendo a tela de algum cinema e alguns enfeites como vasos e pesos de papel.
Olho para a porta de correr que ilumina o cômodo e vejo a garota fantasma parada olhando para mim. Vou em sua direção, sinto uma preocupação enorme ao ver seus machucados de novo.
- Por favor, sente-se, não temos muito tempo. - diz a garota com a voz firme, mas vacilante como se ela não tivesse certeza do que está fazendo.
Ela me guia até o sofá e se senta ao meu lado.
- Coraline, certo? - pergunto sorrindo tentando deixa-lá menos tensa. Vejo em seu rosto, ela é uma criança ainda, aparenta ter no máximo 17 anos, tem os traços do rosto finos e delicados tirando os olhos que são grandes e azuis, sinto que já vi esses olhos antes.
- Sim. E o seu é Sara. - ela respira fundo - Está mesmo investigando os casos que tenho visto na TV? - seu inglês tem um sotaque muito grande, evidentemente ela não é daqui.
- Sim. - digo intrigada.
- Por que está aqui?
- Achamos uma vítima em potencial muito perto da propriedade da sua família, quase na divisa.
- Elas se parecem comigo. - p que a garota diz soa mais como um desabafo do que como uma afirmação.
- Está com medo? - pergunto tentando de alguma forma confortar ela.
- Um pouco, por isso quis falar com a senhorita.
- Por que está machucada? - não consigo mais conter a curiosidade.
A garota parece sofrer o impacto da minha pergunta. Ela abaixa a cabeça e depois passa a mão pelo cabelo mostrando nervosismo.
- Eu sofri um acidente, mas não vem ao caso agora.
Entendo que nada tem a ver com o caso quando vejo o rosto da garota mudar.
- De onde é? Mora aqui a muito tempo?
- Não. Eu sou do Brasil, moro aqui a mais ou menos duas semanas. - ela responde como se eu a estivesse interrogando. De forma prática.
- Duas semanas? - fico surpresa a ver a segunda ligação dela com o caso. Talvez não seja uma ligação, mas é uma conhecidencia.
- Sim.
- Mora com seu tio agora?
- Sim. - ela volta a me olhar nos olhos.
- Por que?
Ela trava de novo. Ela abre a boca para responder, mas depois fecha, repensando.
- Meus país morreram, eu só tenho ele e minha avó agora.
Vejo a dor estampada na menina e então entendo o porquê do Doutor Hastings te-la escondido, ela está de luto. Juntando os machucados, suas informações e as reações que a menina demonstrou percebo que ela sofreu um trauma recente. Olho para suas mãos juntas em seu colo, e sua postura ao sentar a uma distância maior do que o normal. Sinto culpa por ter tocado no assunto, mas é para proteger ela.
- Quero que fique com o meu número e se precisar, a qualquer hora, pode me ligar.
Ela pega o cartão que eu ofereço a ela de forma tímida e fechada, com certeza estou certa sobre o trauma, mas ela é uma vítima em potencial, merece proteção policial.
Me levanto do sofá e ela se levanta também. Parece cansada e com dor, me comovo com ela. Ela me guia até a porta e quando eu saio ela fecha sem dizer nada. Volto pelo corredor rápido encontrando Hans e o Senhor Hastings parados na porta do escritório.
- Sara, vamos. - diz Hans.
- Sim. Obrigada pela hospitalidade senhor Hastings.
Ele assente com a cabeça e nos guia até a porta conversando com Hans, se prontificado a ajudar. Imagino que seja a maneira fechada dele de proteger a sobrinha. Hans me olha toda hora como se suplicasse para eu não falar nada.
Assim que o Senhor Hastings fecha a porta e nos afastamos rompo o silêncio.
- Você não pode fingir que não notou. - digo a ele.
- E você não pode fingir que não foi atrás da garota. - ele diz sério.
- Hans, você a viu! Ela é uma vítima em potencial. Um potencial muito grande.
- Eu sei, mas... - o interrompo.
- E sabe a quanto tempo ela está na cidade? Mais ou menos duas semanas. E ele tentou claramente esconder ela. - digo já dentro do carro com ele.
- Sara, os país dela morreram a um mês. - ele diz sério.
- Como sabe?
- O Doutor Hastings me contou.
- Como assim? -fico intrigada e perplexa.
- Ele pediu para que não envolver a sobrinha nisso, que a menina já sofre com pesadelos e ele não quer que ela fique nervosa.
- Mas...
- Sara, ele está cuidando da menina.
- Mas Hans, e se ela for pega? A família vai cair matando encima da gente dizendo que não fizemos nosso trabalho.
- Não disse que não vamos protege-la. Só que não vamos ficar atrás dela, interrogando ela, como se ela fosse uma vítima viva.
Penso um pouco. Ele está certo. Coraline não parece estar bem de saúde.
- Você percebeu como ele é frio? - digo lembrando do Doutor Lucio. Uma mistura de homem bonito, atraente e misterioso com sombrio e não confiável.
- Deveria conhecer a mãe dele.
Hans faz a cara dele de sarcástico. Ele já está nessa divisão a bastante tempo, com certeza ele sabe de coisas que eu não sei.
- Mas ele mostra sinais claros de apatia, como você me garante que ele vai manter a garota segura?
- Se ele não a estivesse protegendo apresentaria ela pra gente. Sarah, você mesma viu a garota, ela parece um fantasma, não tem expressão, está machucada, por favor, se você não quer perder esse caso, não aja com impulso. - diz Hans com cautela.
Sei que ele está certo, mas não posso simplesmente deixar isso acontecer.
O meu telefone toca e eu vejo que é do laboratório então coloco no viva-voz.
- O que tem pra mim Clare. - digo torcendo para ter alguma novidade nesse novo corpo.
- As mesmas coisas Sarah. Menina, branca, cabelo castanho, dessa vez com olhos claros, cortes pelo corpo feitos antes dela morrer, cortes superficiais, só um que é mais profundo e é nas costas.
- Nenhum órgão roubado? - pergunta Hans.
- Nenhum. Como em todos os casos. O assassino parece sentir empatia pelas vítimas. - diz Alex pelo celular, nosso especialista em traçar perfis.
- Como assim? - pergunto confusa.
- Os corpos vem em bom estado tirando os cortes e o sangue todo. Eles vem lavados, com os cabelos arrumados, o assassino parece sentir um tipo de carinho pelas vítimas.
- Então porque ele as mata? - digo meio impaciente.
- Talvez porque em alguma hora ele percebe algo que eu não sei o que é ainda.
- Ele pode estar fazendo isso visualizando outra pessoa, alguém que ele não pode matar. - diz Clare.
- Boa Clare - diz Hans um pouco mais animado.
- Bom, talvez, realmente exista alguém que ele visualiza ao fazer essas coisas e ao sair da psicose, ao perceber que não é a pessoa ele as mata. - diz Alez mais animado e mais rápido.
Cada dia que passa nos empenhados mais em resolver esse caso. O prefeito está fazendo pressão para que isso acabe e até mesmo nosso superior já não aguenta mais. Ninguém dorme direito desde que esse caso surgiu.
- O que me intriga é como ele pode ser tão organizado, limpo, e colocar um corpo em um local sem ninguém ver.
- Esse corpo também foi posto ali? - pergunto sentindo o sangue gelar.
- Sim. A morte não aconteceu ali. - diz Clare. - O corpo já estava morto a mais ou menos umas 5 horas, ou mais.
- Não pode ser... - figo baixo.
O rosto de Cora vem em minha mente como uma epifania.
- E se ele está querendo mostrar quem vai ser a próxima vítima? - pergunto e Hans me encara com reprovação.
- Pode ser. Por que? - pergunta Alex.
- Coraline Hastings. Ela bate perfeitamente com o perfil das vítimas.
- Coraline Hastings? Nunca ouvi falar. - diz Clare.
- Sobrinha de Lucio Hastings. - digo eufórica, sentindo a ansiedade correr em meu cérebro. Será que conseguimos prever o próximo passo desse monstro?
- Clare, tem certeza que essa vítima bate com o perfil das outras vítimas? Tem certeza que não se trata de um estupro ou algo assim.
- Tenho Hans.Não tem nenhum sinal de estupro no corpo. Sem saliva, sem sêmen, sem machucados na região sexual, está intacto.
- Como nas outras vitimas... - digo mais pra mim do que pra eles.
- Obrigada Clare, obrigada Alex, estamos indo ver o corpo. - diz Hans de forma seca e desliga o telefone.
- Sarah, nossa conversa ainda está de pé.
- Mas Hans, e se estivermos a um passo a frente dele. Talvez ele soubesse que a polícia teria essa restrição quanto aos Hastings. E talvez ele sabia sobre Coraline, e então ele está ficando mais ousado. Ele vai atrás dela. Imagina o quanto ele ficaria famoso se matar ela? Mais do que já está. - minha mente começa a produzir respostas de forma rápida, mal consigo acompanhar.
Hans passa a mão no rosto. Ele sabe que eu estou certa, mas algo o impede.
- Hans, por que você tem tanta restrição com essa família? O que eles fizeram?
Hans me olha com um olhar duro, coisa que ele deve ter aprendido no exército. Então decido que já estamos estressados o bastante. Mas ainda vou descobrir o por quê dele ele estar agindo assim.



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