It's Time To Run, Bitch — É hora de correr, vadia.
LOLA THOMPSON POINT OF VIEW
TERÇA-FEIRA, 07H13
Acordei um pouco atordoada ouvindo passos e mais passos, gritos de Rafael vindo do lado de fora. Cocei meus olhos ainda um pouco sonolentos e me levantei, lavei o rosto rapidamente e logo sai.
— Puta que pariu! Como ninguém viu isso?! Onde que aqueles inúteis filhos da puta estavam na hora?!
A me ver o olhando assustada ele suspira fundo passando a mão na cabeça.
— Eu quero todos eles daqui uma hora no calabouço! Eu vou matar um por um! Não os avise, apenas os levem até lá! — ele faz uma pausa — Eu não quero saber, se vira! Pega a porra das filmagens também, eu vou descobrir quem fez isso.
Ele desliga e lança o celular no sofá com muita raiva e sai caminhando nervoso até o quarto, passando por mim sem dizer nada. Ele bate a porta e eu chego a tremer de susto. Arrumo meu cabelo enquanto caminho com passos medrosos até a porta de seu quarto.
— Rafael — o chamo calmamente com a testa na porta.
A mesma se abre e Rafael aparece ainda muito nervoso e suspirando fundo. Eu o abraço imediatamente colocando a cabeça em seu peito nu, forte e acolhedor, logo sentindo seu calor me aquecer.
— Se acalma — digo baixinho. Ele demora, mas me abraça também, alisando meu cabelo.
— Precisamos conversar, amor — diz baixinho — Acho melhor você se sentar.
RAFAEL SALVIATTI POINT OF VIEW
Primeiramente Lola ficou imóvel, digerindo a informação, então pequenas lágrimas se formaram em seus olhos e logo inundaram sua face enquanto, e ela chorava ainda sem acreditar muito em nenhuma palavra que eu disse.
— Se ela morrer eu não vou conseguir viver com isso — ela diz chorando e eu a abraço.
— Ela não vai morrer, okay. Vai tomar um banho, a gente vai até onde ela está.
LOLA THOMPSON POINT OF VIEW
Acabamos de chegar a um galpão e já no centro vejo uma enorme espécie de tenda, um enorme quadrado feito de um plástico grosso transparente com três faixas foscas que impede um pouco da visão de lá de dentro. A luz branca hospitalar central se mistura com outras de equipamentos e mais equipamentos. É simplesmente uma UTI privada, uma equipe médica própria. Insano.
— Cadê ela, cadê a Valentina? — digo já começando a correr na direção da enorme caixa.
— Você não vai vê-la! — Lucas puxa meu braço com força que até dói, e me faz voltar o corpo bruscamente para cima dele — Tudo isso é sua culpa! — ele grita comigo.
Vejo a dor em seus olhos raivosos.
— Todos aqui estão pagando pelos seus erros, os erros de vocês dois! — Lucas me larga brutamente e cospe de forma rude as palavras em nossos rostos enquanto o dele é tomado por lágrimas — To cansado de ver as pessoas que eu gosto se machucarem — ele chora.
— Não venha jogar toda a culpa para nossos ombros por que ela não é só nossa! — Rafael o rebate rápido entrando na minha frente — Acha que eu gosto disso também?
— Para mim já deu. Quero sair — Lucas diz balançando a cabeça olhando para baixo — Nunca pensei que iria, mas eu quero. Nós matamos pessoas, Rafael! — diz agora o peitando — Vejo elas se afogarem, queimarem, sangrarem até a morte. Eu estou cansado de ferir as pessoas e receber em troca quem eu amo ferido — diz calmo o olhando sério — Não quero tripudiar, mas cara, se você tivesse se afastado, feito o que sua mãe sempre lhe implorou talvez seu filho ainda estivesse aqui — Lucas diz calmo o olhando então é acertado por um soco certeiro de Rafael.
— Parem! — grito entrando no meio dos dois.
Seguro o peito de Rafael que olha Lucas de uma forma assustadoramente furiosa. O brilho de seus olhos azuis sumiu e agora vejo lágrimas se formarem neles. Lucas tocou num ponto muito fraco para nós dois. Olho Lucas e ponho a mão em seu peito, o afastando de Rafael, mas ele pega minhas mãos e me empurra com força no chão. Eu caio e agora sim, sou tomada de assalto por uma fúria sem controle e avassaladora.
Ninguém me trata desse jeito.
Ninguém.
Não vejo mais nada minha frente, apenas me levanto e parto para cima de Lucas urrando de ódio, sacando e segurando uma Glock com a direita e com a esquerda já puxando a parte de cima, fazendo um tilintar engatilhando que eu já gosto. Eu o puxo pelo colarinho de sua camiseta e lhe aponto a arma na testa, com o dedo no gatilho.
Se eu enlouqueci? Sim.
— Você me escuta bem — digo entre os dentes respirando fundo o olhando diretamente nos olhos — Valentina é a minha melhor amiga, eu daria a minha vida por ela — ajeito o dedo no gatilho e suspiro fundo inúmeras vezes já sem controle do meu próprio corpo — Não vai ser qualquer macho que vai me fazer ficar longe dela, e se eu to falando que vou entrar naquela porra, é por que eu vou! — grito o olhando
Então Lucas baixa a bola, se acalmando na medida do possível e eu baixo aos pouco a arma, mas levanto a outra mão e lhe acerto um tapa estalado no rosto. O olho com desgosto e saio caminhando em direção a caixa de plástico. Nem notei a presença de Gutierre fardada de branco com um estetoscópio no pescoço, Nanda, Branco e Negão sentados em um sofá, então, em pé atrás, está Dante. Sim, aquele mesmo que levei para casa e dei uns amassos há uns dias atrás. Ele me olha completamente embasbacado, e eu provavelmente tenho a mesma feição na cara.
Ele é amigo do Rafael.
Passo por eles sem dar muita atenção, voltando ao foco e atravesso as faixas da entrada. Suspiro fundo vendo Tina naquela cama com alguns aparelhos ligados a ela. Tento regularizar minha respiração segurando na barra ao lado da cama de Tina.
— Ela está bem? Como o bebê está? — pergunto a médica ao lado dela.
— Ela está bem, o bebê também. Foi um tiro na coxa, sem atingir o osso ou artéria. Ela está bem — ela sorri tentando me confortar.
Suspiro aliviada, então Valentina me olha. Ela estava acordada o tempo todo, apenas com os olhos fechados.
— Hey — digo sorrindo e tento lhe abraçar, mas Valentina me empurra calmamente com uma das mãos e isso me assustada — O que foi? — a olho sem entender.
— O que foi? — ela repete minha pergunta me olhando estranha — Lola... Eu quase morri sua culpa! — ela diz com frieza e triste — Foi por muito pouco que não acertaram minhas costelas, foi por que eu reagi que não me acertaram — diz me olhando com certa indignação na voz — Elas queriam saber onde você estava, eu disse que não sabia e paguei por isso — diz com lágrimas nos olhos — Todo mundo que se aproxima de você se machuca, Lola.
— Não diga isso — franzo o cenho sentindo lágrimas nos olhos.
— Você quase matou seu próprio pai! — ela diz assustada e ver Valentina jogando isso na minha cara me machuca muito.
Sinto uma dor no coração e minha garganta se fecha, fazendo minha respiração pesar.
— Já conversei com Lucas, nós vamos nos afastar de vocês, de todos vocês.
— Como assim, Valentina? — digo a olhando sem entender me aproximando mais da cama — Nã...
— Sim, Lola! — ela me interrompe — Você não é mais a mesma Lola, olha para você! — ela diz apontando para mim já chorando e isso me faz chorar também — Você não é mais a garota que cresceu comigo, que tinha sonhos, planos pro futuro — suspiro revirando os olhos — prezava por um nome e queria ter uma carreira.
— A culpa não é só minha. Quando descobriu que Lucas era envolvido com isso você quis continuar mesmo sabendo de tudo — digo e ela baixa a cabeça — É fácil jogar tudo nas costas dos outros! — digo alto já alterada e ela chora com as mãos no rosto — Porra, Valentina! — digo com raiva chorando — Olha para nós duas! — aponto para mim e para ela a olhando com os olhos estreitados um pouco turvos pelas lágrimas incessantes — E o que prometemos uma a outra quando tínhamos oito anos?
Ela ri pelo nariz virando o rosto para o outro lado balançando a cabeça.
"— Você promete que nunca nunca nunca brigaremos pro resto das nossas vidas? — Tina me estende o dedinho e eu o pego com o meu, o apertando sorrindo.
— Prometo. E promete que sempre ficaremos juntas? — digo a olhando.
— Prometo — e nos abraçamos sorrindo.
E ali selamos um compromisso nosso, somente nosso."
— Não somos mais aquelas garotinhas inocentes e puras — Tina diz calma.
Pego a nossa “pulseira da força” do meu bolso e então a olho.
"— Não, eu achei primeiro! — digo a Tina.
— Não, fui eu! — ela diz tentando puxar a pulseira colorida com vários pingentes de bichinhos coloridos da minha mão.
— Ta, então você usa hoje e amanhã é a minha vez — eu digo cedendo a ela."
Eu sorrio me lembrando a olhando na palma da minha mão. Eu não sei por que, eu não lembro como, mas essa pulseira se tornou um amuleto para nós duas. Quando passávamos por situações difíceis nas nossas vidas, uma entregava a outra a pulseira e dizia que tudo ficaria bem, e no final ficava mesmo. Quando os pais de Tina faleceram eu entreguei a ela e ela sempre a usou mesmo sendo um adereço muito infantil. Ela me devolveu quando fui para Nova York, e agora devolvo a ela. É um ciclo.
— Toma — lhe estendo e ela volta os olhos a mim e olha minha mão — Vai ficar tudo bem — digo segurando o choro.
— Você precisa muito mais do que eu — ela diz com a voz embargada e fecha meus dedos — Sai daqui, Lola, por favor — ela diz calma.
Assinto com a cabeça e saio de lá com ela baixa. Coloco a pulseira e a ajeito no pulso.
— Vai ficar tudo bem, Lola — digo bem baixinho para mim mesma enquanto caminho para longe dali.
Passo o torço das mãos nos olhos secando as lágrimas então olho todos ali silenciosos apenas me olhando. Rafael levanta-se e vem na minha direção, mas eu desvio com as mãos no rosto e volto a chorar. Ele me abraça por trás, me vira e coloca minha cabeça em seu peito, logo me acolhendo em seus braços fortes. Eu desabo sem me importar com quem está olhando. Eu não aguento mais chorar, ainda acho que irei despedaçar e derreter de tanto chorar, por que meu Deus, ultimamente é tudo que sei fazer.
Valentina me mostrou que uma amiga pode sim se tornar uma irmã, me mostrou que a vida fica mais leve quando se tem alguém do seu lado para segurar sua mão e dizer que tudo ficará bem quando uma turbulência nos atinge, me mostrou que tenho alguém que me quer bem, mas agora não sei se ela quer tanto assim. Meu coração dói, ele foi despedaçado pela minha melhor amiga, e agora eu apenas quero sumir, me esconder, eu não aguento essa dor no meu peito.
— Shhhh... Está tudo bem, tudo bem — Rafael diz baixinho próximo ao meu ouvido enquanto alisa meu cabelo.
Eu amo quando Rafael me abraça e diz que tudo ficará bem por que eu acredito nele, mesmo não querendo, tudo em mim acredita nele e isso me acalma, aos poucos, mas ele consegue, ele tem esse efeito sobre mim. É meu calmante, meu relaxante, minha droga, que me vicia e sinceramente não quero viver sem e acho que já nem sei.
— Me tira daqui, Rafael — é tudo que consegui dizer.
RAFAEL SALVIATTI POINT OF VIEW
Eu precisava olhar e atirar na cara daqueles merdas inúteis que são pagos para ficarem de olho em todo movimento em torno da nossa casa, mas tirar Lola dali foi prioridade, ela sempre será prioridade.
Se eu dissesse que não fiquei excitado com aquilo que ela fez com Lucas eu estaria mentindo muito. Puta merda, essa mulher me impressiona cada dia mais, e nossa, minha bandidinha é foda.
Ela não disse uma palavra desde que saímos do galpão, apenas observa tudo em volta em silêncio enquanto mexe na pulseira colorida em seu pulso e isso está me matando. Todos nós ouvimos a briga dela com Valentina, não está sendo fácil para ninguém, mas juntos somos mais fortes.
Meu celular começa a tocar. Will.
—E aí — atendo e Lola me olha.
— Suave parceiro — ele diz — Tá melhor?
— To indo — franzo a testa.
— E as digitais?
Estalo a língua e bato a mão no volante.
— Tinha até me esquecido disso, foi uma semana turbulenta. Vou dar um jeito, essa semana mesmo te envio.
— Até parece que não quer descobrir — ele ri um pouco tentando descontrair, mas em vão.
— Não é que não quero, tenho medo de descobrir e tinha esquecido completamente — reviro os olhos — Essa semana te envio. Mais alguma coisa?
— Suave. O que posso dizer sobre a impressão de sangue é que era de um sapato de salto alto, um tamanho trinta e sete. A forma da sola é lisa, então pode ser qualquer marca, mas estou comparando com alguns modelos, te envio os mais próximos e você vê se alguma das suas ex-namoradas tem igual — ele ri pelo nariz — Aproveita e vê se acha vestígio de sangue.
— Já fiz isso em alguns da Montenegro — suspiro fundo — Obrigada, cara.
— Agora deixa ir trabalhar que os gambé daqui a pouco chega aqui me enchendo o saco — diz baixo e eu dou uma risada pequena.
— Falou — e desligo.
Lola me olha sem entender e eu apenas volto os olhos à pista. Nem sei para onde estamos indo, apenas dirijo.
Fui nessa de apenas dirigir e já estamos no litoral. Levo Lola a uma praia um pouco deserta que eu conheço bem, amava esse lugar, vinha aqui com meu pai quando era mais jovem. Descemos do carro e ela continua calada. Isso está me matando! Ela tira o tênis, as meias e deixa ao lado do carro. Caminha pela areia branca fofa e tira a camiseta, então ela tira um pouco desastrada sua calça e calcinha de uma vez, e corre, logo se libertando também de seu sutiã então Lola mergulha na água. De longe posso vê-la emergir e passar as mãos no cabelo, então abrir os braço e se jogar de costas na água. Sorrio a olhando encostado ao carro.
Ela sai da água, e é como aqueles comerciais, a mulher andando lindamente pela areia, passando as mãos no cabelo. Ela é tão linda, tão confiante, desvergonha e certa de sua beleza, que tudo isso me encanta ainda mais. Sorrio a olhando de longe e ela senta-se na parte molhada da areia, então algo toma sua atenção. Ela pega com dois dedos, o levanta e inspeciona de todos os ângulos, então dá um grito e o larga, logo se levantando e correndo alguns passos de onde estava balançando a mão direita e leva o dedo até a boca. Dou uma risada a olhando. Caranguejos.
Abro o carro, pego uma camisa xadrez e vou até ela depois de tirar o tênis e as meias.
— Ele me mordeu! — ela diz rindo com o polegar entre os lábios de uma forma sexy.
Coloquei a camiseta em suas costas e abaixei ao seu lado. Ela me olhou e então me empurrou fazendo-me cair de bunda na areia molhada. Ela começou a rir, e em todo esse tempo é a primeira vez que a vejo rir. Deveria estar bravo, mas dou risada junto dela.
— Sua bobona — digo me agachando novamente — Vou ali pegar outro caranguejo.
— Tira essa calça, olha o calor que está — ela diz olhando o céu azul completamente limpo e um sol escaldante.
Levanto-me e tiro a calça, ficando apenas de cueca boxer preta. Tiro também a camiseta e me sento ao seu lado. Ela se cobre com a camiseta.
— Estava precisando de um banho desses — ela diz olhando o mar.
— Eu gostava desse lugar. Vinha aqui com meu pai espairecer. Ele gostava de pescar naquelas pedras ali — digo apontando para elas à nossa esquerda.
— Você nunca me contou nada sobre ele — ela me olha curiosa.
Respiro fundo. Ela tem razão, nunca disse nada.
— Ele era chato. Insuportavelmente chato, mas eu amava aquele homem — dou uma gargalhada de cabeça baixa — Lembro até hoje do dia que eu contei que perdi minha virgindade — ela ri — Ele faltou me colocar num pedestal e minha mãe ficou toda preocupada.
Fiz uma pausa por que me machuca muito se lembrar do meu velho. A falta que ele faz dói muito.
— Ele cresceu na favela, conheceu minha mãe, rica, bonitona, e eu aconteci. Meus avós maternos não aceitaram, então minha mãe fugiu com ele. Casaram-se, tiveram a Nanda e se mantiveram juntos até o último dia — respiro fundo — Ele morreu nos meus braços com um tiro próximo do coração e mais dois no abdome — franzo a testa ao lembrar — Eu não sei quem foi que mandou, e até hoje procuro saber, e já faz três anos.
Lola franze a testa olhando para baixo e abre a boca tentando dizer algo, mas nada sai.
— Lembra um pouco a gente — ela me olha sem sorrir, apenas me olha.
— É, mas não sou um pé rapado como meu pai era — digo rindo.
— Você é um homem muito peculiar, Rafael — ela me olha franzindo o cenho — Você tem tudo para dar certo na vida e é um bandidinho — reviro meus olhos e bufo reclamando.
— Você me subestima, senhorita Thompson.
— E você, senhor Salviatti — ela levanta-se se cobrindo com minha camisa — É um bandidinho — diz bem perto de mim e sai correndo.
Reviro meus olhos e saio correndo atrás dela, que a me ver fazer isso, grita e corre para dentro da água após soltar minha camisa na areia. Vou atrás dela e a seguro por trás, ela grita e ri ao mesmo tempo, se debatendo em meus braços. Meu Deus, essa risada é música para meus ouvidos.
— Olha quem fala, a bandidinha — digo do mesmo jeito que ela diz — Conhece de armas, sabe atirar melhor que muitos.
— São talentos adquiridos com o tempo — diz se gabando.
— Ah sim, claro — digo rindo revirando os olhos.
— Fazemos uma bela dupla, tipo Bonnie e Clyde.
— É sim — sorrio e a viro para mim, mas ela aproveita-se e corre mais uma vez, me fazendo ir mais fundo na água.
Depois de cansarmos de tanto correr um atrás do outro, apenas a tenho em meus braços boiando. Ela abre os braços com os olhos fechados, relaxando e totalmente a vontade comigo. Olho o corpo dela, e nossa, que saudade. Se controle, Rafael. Tenho-a tão perto, mas tão longe. Estamos nos dando bem nos últimos dias, mas será que ela me odeia? Será que ela me perdoou? Será que ela ainda me ama?
Ficamos ali mais alguns instantes, depois saímos e fomos andar pelas pedras.
— Me fala dos seus sonhos — digo a olhando sentada ao meu lado — O que você quer, o que você almeja.
Ela franze a testa e baixa a cabeça entre os braços dobrados sobre os joelhos flexionados.
— Antes de toda essa bagunça, eu queria viajar o mundo, conhecer novos lugares, novas sensações, novas bocas — ela dá de ombros — Estudar, ser uma arquiteta famosa. Nunca quis trabalhar com meu pai, mas querendo ou não aquilo ali será meu e de Mike, ou agora só dele — ela ri pelo nariz e balança a cabeça — Queria construir uma família, ter uma casa bonita com meus filhos correndo por ela atrás dos cachorros — ela suspira fundo e morde o lábio olhando para a frente — Mas nem isso poderei ter mais graças a... — ela está se segurando para não chorar — Graças a alguém de mau coração, de má fé. Tirou de mim de uma forma medieval, ridícula — ela já tem lágrimas correndo pelo rosto e diz nervosa — Tudo que eu mais queria na vida. Eu nunca mais vou poder engravidar, ter alguém com características minhas, sentir chutar dentro de mim, amamentar! Porra! — ela limpa as lágrimas — Sempre achei que não nasci pra ser feliz, e acho que nunca vou ser, por que tudo que acontece na minha vida é coisa ruim, eu não aguento mais! Eu iria fugir, eu ia para outro lugar, Paris, Itália, não sei, eu queria me encontrar em algum lugar, pode construir uma vida diferente, mas...
Ela respira fundo e limpa as lágrimas olhando para baixo balançando a cabeça.
— Mas? — pergunto baixinho.
— Mas nada — ela diz e solta um suspiro cansada — Eu estou com fome — ela muda de assunto rápido.
— Vamos procurar algo para comer então.
Me levanto e a ajudo a levantar. Caminhamos lado a lado e eu a ajudo a pegar suas roupas jogadas pela areia. Nos vestimos e então já estamos no carro novamente indo para outro lugar procurar um restaurante.
Depois de um bom tempo chegamos à civilização em outra praia bem frequentada. Paramos em frente a um restaurante, almoçamos, voltamos a caminhar na areia, brincamos, e por longos instantes podemos esquecer todos os nossos problemas, incluindo, principalmente referentes a nós dois.
21h12 — Chegamos cansados e mortos em casa, precisava sair para resolver algumas coisas com um parceiro meu, mas me recuso a sair de casa hoje, só quero um banho e cama.
Cada um foi para seu quarto tomar um banho, e logo depois de meia hora ela aparece na cozinha de cabelo molhado usando uma camisola de seda com renda preta, que valoriza muito seu corpo e deixa bem a mostra seus seios fartos e suas coxas. Preciso me controlar, mas ela não facilita as coisas.
— Não sabia que você sabe cozinhar, ta um cheiro muito gostoso — ela diz.
— A senhorita não sabe muitas coisas sobre mim — sorrio de canto e pisco para ela, que revira os olhos e se aproxima.
— Ahhhhhh, você só colocou para descongelar! Não vale! Ahhh — ela diz e sai jogando a mão para trás e eu dou risada de seu jeito.
Ela pega os pratos no armário, os talheres e arruma a mesa direitinho para nós dois. Poderia me acostumar fácil com essa vida de casal com Lola. Jantamos juntos conversando sobre coisas que fizemos hoje, depois fomos para o sofá assistir televisão e ela logo adormeceu lá, e eu a levei para o quarto dela, por mais que quisesse levá-la para o meu e dormir ao seu lado.
LOLA THOMPSON POINT OF VIEW
QUARTA-FEIRA — Acordei misteriosamente na minha cama e sorrio toda boda por saber quem me trouxe até aqui naqueles braços fortes que tiram o meu sossego e me deixam molhada. Ai Lola, logo cedo! Penso e balanço a cabeça afastando os pensamentos. Levanto-me, faço minha rotina matinal e depois saio do quarto espreguiçando. Está um silêncio danado. Vou até seu quarto e a cama está desarrumada e roupas jogadas na cama. Ele saiu e me deixou sozinha! De novo! Bufo irritada e vou para a cozinha. Não tem pão! Não tem nada para tomar café, nem bolacha. Vou para o quarto, visto um cardigan por cima da camisola preta e um short jeans a colocando para dentro, – bem coisa de preguiçosa mesmo – pego um óculos escuro e minha carteira. Saio de casa e desço. É um condomínio muito bonito aqui. Vejo uma padaria na esquina do outro lado da rua, e paro na faixa de pedestres logo na frente do prédio e o farol abre para nós, e eu atravesso olhando para os carros, como sempre fiz, então sinto conhecer aquela moto que acaba de chegar ao semáforo, o capacete e principalmente aqueles olhos pela viseira transparente. Abaixo a cabeça e continuo caminhando entre as pessoas com passos apressados. Olho para trás e o homem da moto me olha. O semáforo abre e ele se vai. Entro na padaria um pouco atordoada.
Tente lembrar, Lola, tente lembrar-se de quem eram aqueles olhos.
Volto para o prédio depois de olhar muito em volta, então entro correndo e subo rápido para o apartamento. Rafael não deixou a droga da chave para eu fechar a porta. Tomo meu café da manhã e resolvo ir dar uma geral no apartamento. Rafael faz muita bagunça! Fui recolhendo os tênis e roupas que ia achando da sala para o quarto dele. Pego seu travesseiro e levo até o rosto, aspirando o cheiro gostoso dele com os olhos fechados. Sorrio e começo a forrar sua cama.
Ouço o barulho da porta se abrir. Paro e tento ouvir mais. Não é o Rafael, ele sempre chega fazendo barulho, jogando as coisas na mesinha perto da porta, e agora ouço a porta se fechar. Meu coração já bate preocupado. Se eu ainda fosse aquela Lola de antes eu simplesmente iria ver quem é, mas ela não existe mais, então corro para o closet de Rafael para me esconder. Acho uma arma jogada no sofázinho e a pego, puxo bem devagar a parte de cima para engatilhar tentando fazer o mínimo barulho. Entro no meio de suas roupas penduradas e me abaixo no chão como uma criança medrosa. Lembro-me do dia que vi aquela mulher morrer naquela loja e eu fiquei do mesmo jeito que estou agora, com medo do que viria.
Não ouço nada, mas não sairei daqui. Fecho os olhos. Meu corpo inteiro treme, um arrepio o percorre inteiro, me fazendo se mexer repentinamente, minha respiração pesa e tento controlá-la para não fazer barulho. O medo é uma doença, ela paralisa seu corpo e sua mente, e agora me sinto assim, paralisada. Ouço a porta do closet se abrir lentamente. Aperto meus olhos e levo a mão à boca, cerrando os dentes impedindo um grito desesperado sair por ela. Ouço passos no chão de carpete então meu corpo se arrepia novamente, não aguento isso.
— Não há fotos, não há nada que diga que esse é o apartamento. Tem certeza que é aqui? — um homem diz.
Tento me concentrar e lembrar se deixei algo que diga sobre mim, mas nada vem em mente, na verdade não consigo pensar em nada no momento. O medo é uma invenção da nossa mente, uma mentira projetada para nos proteger, mas não é não. Continuo paralisa por causa do medo, ele é falso, o perigo é real, ele pode me ferir, preciso fugir do perigo. Preciso controlar meu medo, preciso me atrever a ser maior que ele. Continuo ali querendo morrer então ouço passos saindo. Aproximadamente cinco minutos depois eu ouço a porta bater alto. Respiro fundo algumas vezes controlando a tremedeira, então coloco a cabeça para fora e olho em volta. Limpo. Levanto-me e caminho com a arma em mãos em direção a porta. Olho para o quarto e limpo. Saio dali e vou para o corredor, que também não há ninguém e nenhum barulho. Ah meu Deus, preciso sair daqui, e se voltarem? Pego meu coldre de costas dentro da caixa debaixo da minha cama, visto um casaco que fica no meio das coxas por cima da camisola cobrindo também o coldre; chinelos, celular e saio dali com a arma em mãos, é tudo bem rápido. Coloco o ouvido na porta para ver se há algum barulho do hall e nada. Saio após abrir a porta e desço pelas escadas descalça. Pouco depois já estou no hall do prédio. Escondi a arma debaixo do casaco e saio apressada pela portaria. Meu coração continua batendo fora do normal, e parece que vou desmaiar de tanta adrenalina e energia percorrendo meu corpo.
Vejo um carro preto grande parado do outro lado da rua e um homem do lado de fora olha para o prédio. Ele deve estar esperando alguém. Guardo a arma no coldre e começo a andar mais rápido, logo virando na esquina, mas antes de virar, olho para trás então um homem sai do prédio e começa a correr atrás de mim após me ver.
Não, não é possível que isso esteja acontecendo comigo.
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