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História Crônicas de Althunrain - O Caçador e a Raposa - O Dono das Chaves


Escrita por: Tulyan

Notas do Autor


:3

Capítulo 2 - O Dono das Chaves


Fanfic / Fanfiction Crônicas de Althunrain - O Caçador e a Raposa - O Dono das Chaves

 

Corto uma tira longa, mas pouco larga de couro e a coloco sob minha mesa, aquele grilhão ficou justo no Nanci, mas ainda assim vi alguns lugares mais soltos, e foi assim que manejei o couro, não iria deixa-lo pronto, pois posso estar fazendo maior ou menor do que o necessário, mas já adianto a magia rúnica, pego o pote com pó arcano azulado e retiro minha pena oca da base alta e negra, enfio na areia e levo ao couro para entalhá-lo, pensando direito, dessa forma é impossível mexer na magia, sem a chave claro, mas se tiverem ela, é inútil mexer na magia não? Vou escrevendo com cautela, magia é algo forte, exigente quanto à perfeição, porém, é fácil para mim fazer algo assim, minhas mãos firmes me deram títulos na arquearia e me fizeram matar inimigos antes mesmo de saberem quem foi.

Termino já mais a noite e olho para minha gaiolinha com vaga-lumes Drinkas, eles piscam em azul celeste intenso, em falar em azul, me lembro que não levei água ao Nanci, ele deve tomar grandes quantidades para liberar o veneno do corpo, também é bom para fortalecê-lo. Suspiro e bato a mão na beirada da mesa, irritado, levanto-me arrastando a cadeira negra e jogo minha pena na mobília enquanto passo pela escada, entre ela e a porta para minha forja há um balde de madeira, igual ao que deixei na cela dele, entro na forja e encho o balde com água que uso para esfriar as lâminas, é agua boa no fim das contas. Olhei para o pedaço de couro na mesa pensando em como ele reagiria se pedisse para me dar o grilhão, jogando as chaves para ele e... Espera, eu estou no comando aqui, a raposa que segue minhas regras...

Passo pela mesa pegando o couro e vou a minha bolsa reavendo um pouco de corda, faço um laço em dois deles e os deixo prontos enquanto vou descendo as escadas de pedra. Sei bem que o escravo me ouve, e isso é bom para evitar surpresas... Abro a porta dali e já olho para a de sua cela, a tampa afrente das barras não me deixa vê-lo, mas o ouço, coloco o balde de lado e bato na madeira, só para garantir.

— Nanci! – o chamo e abro a tampa leve pelas dobradiças. Em reação vejo a raposa de pé ao lado do monte de feno e o fito, havia sujeira em todo seu corpo, e restos de comida na boca longa, ele treme, não creio que seja de frio já que a tocha deve fornecer um certo calor, pode ser medo, medo é bom. – Fica de costas pra mim. – ele obedece e coloca as mãos sob a pedra. – De joelhos. – meu segundo comando o faz cair no chão.

Abro a porta da cela, coloco o balde para dentro e puxo minha espada. – Mãos para trás! – minha ordem é seguida rapidamente e me aproximo, deixo minha arma fincada ao meu lado no chão e levo o laço a seus pulsos, faço uma amarra mais simples, o suficiente para que não se solte sem muito tempo e esforço, acima dele, a base metálica da tocha me dá uma ideia, amarro a ponta reversa do segundo laço que trago e faço um tipo de forca. – Vira e levanta devagar... – minha voz ecoa por aqui. A raposa usa a pata esquerda primeiro e fica de pé enquanto vira-se mais lentamente que gostaria, mas tenho paciência e uma espada arcana mirada em seu pescoço, ao vê-la é perceptível o espanto do Nanci, suas orelhas negras caem e com mais confiança chego perto o suficiente do animal fedido, passo o laço da forca em seu pescoço, era a forma de deixa-lo incapaz de atacar e ou fugir enquanto faço o que quero.

 

Fico muito assustado, ele vai me matar? Porquê? O que eu fiz? Ele me salvou e agora vai me matar assim? Que tipo de monstro ele é? O vejo abaixar-se a minha frente e buscar uma chave, iria me libertar? Não, amarrado assim não, e também não teria trazido água para mim, ou seria para limpar a si depois do serviço?

Minha mente fica um caos, tremo todo de horror, queria correr daqui. – Sugiro que não escorregue... – diz levantando-se e trazendo a algema consigo, bom, a peça de metal que prendia meu tornozelo usa o mesmo cadeado para se ligar a corrente, assim, sinto o peso fora, o homem me olha de lado e mudo o meu olhar, jamais vou desafiar esse cara... Ele me dá muito medo, devo minha vida a ele e... Quero pagar por isso e ir embora.

O humano leva a algema para fora e deixa a porta aberta, minhas patas tremem, logo quando estava quase dormindo um pouco, mas, minha garganta seca me faz desejar muito beber daquele balde, engulo seco várias vezes ao imaginar, nunca senti tanta sede na vida do que ultimamente, e eu achando que ser escravo era ruim...

Minhas pernas começavam a doer de tanto ficar de pé, é obvio que preciso de descanso, mas o humano me tortura, mordo meus dentes por isso, pode ter me salvado, me dado comida e ter agido com mais gentileza do que recebi em anos, porém jamais ficarei agradecido por sofrer. E então, como se adivinhando meu atrevimento mental, vejo o homem retornando, a algema em sua mão esquerda ganhou algo no interior, eu não perguntaria nada, mas ele fala sozinho para mim.

— Coloquei magia aqui para te rastrear e te manter a dez metros daqui, então Nanci, se arranjar um jeito de escapar, não vai muito longe não... – seus olhos firmes me forçam a muda-los de direção. Com uma corrente extra ele abaixa-se ao meu lado e traz a corrente que já havia aqui, encosta dois elos de cada uma e passa um cadeado negro e médio entre quatro elos. E mais um, pequeno até, o que fiquei observando depois de comer aquela carne divina a alguns minutos, é usado para prender o metal que envolve meu tornozelo. – Coloquei couro para deixar mais confortável. – sua voz sobe junto ao dono dela. – Porque isso não vai sair até resolvermos tua situação. Vira...

Baixo os olhos, concordando e obedecendo meu captor, pelos deuses, ele solta meus pulsos e paro de sentir o perigo constante da força, ele recua e ouço fechar a porta, mas do outro lado fala. – Me dê isso ai. – tiro a corda do pescoço e desato um nó firme, eu poderia colocar todo meu peso nele, não cederia. Entrego aquilo ao humano e noto, o grilhão me permite ir muito mais longe, conseguiria ficar de pé afrente da porta se... ahh entendi...

Quando o ouço fechar a tampa dessa porta e a que dá acesso ao lado de fora desse buraco, vou em direção ao balde e bebo aquilo, era muito bom, me estimulava a dar goladas até me sentir completamente cheio, fico sem ar por um tempo e acabo de perdoá-lo por tudo que fez, tenho que entender sua posição, e por isso, quero sair daqui logo para poder pagar minha dívida e seguir em frente. Satisfeito e até feliz por ter sido capturado, me sento no fardo de feno e sinto um leve refluxo, massageio meus pulsos doloridos e deito-me no feno, o espalhei bem o suficiente para improvisar uma cama, era macio ao menos, muito melhor do que a floresta, claro, terei a primeira noite seca, quente e confortável em semanas...

 

Acordo com o som de madeira sendo cortada, o som que me lembra de casa, bom, de meus antigos donos, sorrio levemente e inspiro o ar gelado, meus olhos veem minha cela escura e fria agora, a tocha havia extinguido até o final, mas a palha que me cobre é tão quentinha que me nego a sair dela, havia me deitado com a cabeça apontada a porta a fim de diminuir a extensão da corrente em meu tornozelo direito. Em falar nela, qualquer movimento dessa perna faz um som escandaloso, ficaria aqui o dia todo, mas meu corpo dói por manter a mesma posição, e quando a faço, noto que a necessidade é outra, levanto-me rapidamente e procuro o balde próprio para isso, quase não tenho tempo de tirar a tanga da frente para aliviar a bexiga.

— Aaahhh... – o alívio me toma todo, apoio uma mão na parede e sorrio para o teto.

E é aqui que vejo a única entrada de luz que tenho, é uma fresta horizontal tão pequena que nem minha mão passaria, entretanto, o ar que entra dali é suficiente para manter aqui aquecido e arejado ao mesmo tempo, e estava alto demais para que eu visse alguma coisa por ele. Então me limito a sentar no feno e abraçar minhas pernas, estava fedendo, o único banho que tomei nessas últimas semanas foi de chuva, e pela primeira vez desde a arrumação, toco na algema do grilhão e suspiro pesado. O último que usei me impediu de salvar minha mestra, se eles não tivessem me prendido no porão, eu poderia ter ajudado seja lá no que foi que causou o incêndio, por sorte a queda de uma das tábuas arrebentou a corrente que me prendia, logo contei com meu conhecimento da casa para fugir e fortuitamente achar as chaves dela e da coleira, por mais que amasse meus mestres, foi bom vê-los queimar...

O som quase rítmico da madeira sendo cortada me permite pensar longe, mas assim que para fico atento outra vez, ouço a porta desse lugar ser aberto, me assusto com o som repentino e me escoro no canto da cela fria, o mais longe da porta, no entanto o humano passa e pega algo só para voltar, no entanto, no meio do caminho ouço seus passos parando, quando chega afrente da porta, sinto meu coração acelerando, estava mais esperto do que ontem, a fome, a sede e a toxina me entorpeceram. Ele abre a tampa das grades e me olha diretamente, trocamos olhares por dois segundos antes que o humano voltasse a me impedir de ver fora da cela e retornar ao que fazia.

Bom, não posso sair daqui, não posso fazer nada, só me resta, felizmente, dormir mais um pouco com um sorriso no rosto.

 

Finalmente pensei em algo para que me compense, fui rever o veio de ferro que minero e até tirei um pouco dali, depois de cortar lenha para derreter o metal, fui ver o Nanci e felizmente, está muito melhor que antes, se não mostrar quem manda logo de cara, corro o risco de um ataque, melhor ser mais duro com ele, fazer seu trabalho refletir no que ganha, isso é bom...

Cavo um buraco no solo a sombra da montanha, coloco um tronco grosso no meio dele e enterro um pouco a fim de usá-lo como sustento, rodeando ele coloco mais madeira grossa e quando acaba o que quero, adiciono graveto, busco galhos e folhas secas na mata e os trago rodeados por corda de palha com uma cesta e cubro toda a lenha, ai uso a terra por perto, junto a água, para fazer barro e cobrir as folhas secas, dou alguns minutos para que tudo seque e faço um buraco no topo e alguns na base, acendo fogo encima e aproveito para verificar se não há fendas, estas que vejo ao expelir fumaça e fecho com mais barro, passados alguns minutos, o fogo chegou a base da lenha e passo a fechar todos os buracos... Agora é só esperar... Fazer carvão é tedioso demais...

Me sento num dos bancos afrente da montanha que aloja minha casa, como um pouco de carne seca enquanto espero sob o sol do meio dia, o processo é lento e eu acabo por me entreter com outra coisa, o lago perto daqui é uma ótima fonte, a cachoeira que cai nas águas de até três metros de profundidade tem seus vinte metros de altura, sei bem onde é sua nascente, esta que congela no inverno, mas tudo bem... Os peixes gordos que crio nadam tranquilos, pois não deixei um predador grande ali, logo tem muitos pequenos e poucos grandes, um equilíbrio eu diria. Mais abaixo, depois da barragem que construí, há o córrego original, e caindo nele, duas pequenas quedas d’água, verifico a integridade da barragem todo mês para manter meu represado, mas nunca até hoje havia visto um vazamento sequer, fiz bons pilares de pedra e cimento como base, foi um trabalho árduo, mas só de não ter que me desgastar concertando frestas e rachaduras já compensa. Passam horas até que meu carvão esteja bom, busco um par de cestas de palha e uma pá, chego próximo a estrutura de barro e cuspo nela, como ele não evaporou como um diabo fugindo da luz, estava bom, bato a pá na parede e a derrubo, dentro, meu prêmio negro estava aos montes, um leve calor ainda estava por aqui, mas não havia brasa nenhuma, enfio a pá lá dentro e puxo o monte de carvão, os pequenos vão para a fogueira e os maiores, para a forja, e assim os divido nas duas cestas que ficam cheias com rapidez, minhas mãos ficam sujas, da mesma forma que meus braços, porém, fiquei sem blusa e uso apenas minha calça de couro de urso e minhas botas de peles.

Atravesso o cabo da pá nas asas centrais das cestas e levo-as para casa, trabalho feito, vou rumo a janela da minha sala, suo um pouco ainda então tomo água de meu cantil pessoal, e isso me faz lembrar de um animal. Olho para o nada, incrédulo, inconformado, poderia ter me livrado do trabalho apenas ignorando, puta merda... Pego um pano qualquer e um balde enquanto vou para fora, mas paro, melhor não. Deixo tudo ao lado da porta de minha casa e só retorno para buscar minha espada, e uma picareta, presente de um bom e antigo amigo baixinho. Entro no lugar escuro e já bato na porta da cela abrindo a tampa dela.

— Levanta! – falo e sou atendido, o Nanci fica de pé afrente do feno que deixei ali, mostro para ele a corda que trouxe e aponto com o queixo. – De costas afrente da porta Nanci.

— Não precisa, e... Eu não farei mal algum. – só de ver minha expressão facial a raposa encaminha-se a cumprir a ordem, reclamando com murmúrios.

A corrente barulhenta o faz escandaloso a qualquer movimento, ele vira-se e passa os pulsos pela mesma barra, mas o faço realizar o contrário, o prendo junto ao metal, pois tenho que tirar o grilhão, e é isso que faço.

 

Ele se levanta a minha frente, muito perto de mim, engulo seco e me escoro mais na porta que já quase bate contra a parede que sinto ir contra as minhas mãos, o humano me fita e me mostra sua espada, pronta, entendo o que quer dizer. – Tá bem... – falo tão baixo que mais parece um cochicho.

Puxando a porta para dentro outra vez ele solta meus pulsos só para amarrá-los unidos, assim, posso sair daqui, mesmo limitado, e claro, com a tornozeleira. Esta que mal sinto agora com o couro a amaciando, mas claro, quero arrancá-la fora na primeira oportunidade... – Você vai pagar a poção que te dei, e tudo que usufruir daqui, comida principalmente... Tenho um estoque pronto para mim, então trate de terminar seu serviço antes do inverno, ou um vai ter que morrer. – seu tom me faz arrepiar, esse humano me assusta com poucas palavras.

Ele me puxa de dentro da cela pelo braço esquerdo e me faz bater contra a parede ao lado direito da porta. – Sem uma palavra, você vai extrair ferro para mim. – apontando a uma picareta colocada escorada na porta que dá acesso a saída, sou informado de minha função agora, bom, ao menos tenho uma ferramenta. – Se fizer qualquer coisa fora da linha, te dou de comida para os meus peixes. – baixo a cabeça, confirmando o que ele dizia. Assim o humano puxa meu pêlo e me coloca a sua frente. – Aposto que carne de raposa deve ser boa...

Esse comentário me traz outro arrepio, menos intenso, mas perigoso.

Quando saio, a luz me ofusca um pouco, e por não conseguir coçar os olhos, aperto-os com força a ponto de lacrimejar, mas quando vejo, há uma floresta bonita a minha frente, um punhado de montanhas no horizonte que vem a minha esquerda até essa que estive e é a última da cadeia, falando nessa, há uma casa construída entre a rocha, parece muito grande, pois vidros largos e altos compõem uma janela, e seguindo um pequeno lance de escadas de pedra, uma porta semelhante a ponta de uma flecha exibe uma cor avermelhada e reforços de metal. O humano me nega ver mais, pois me empurra para frente, sinto sua mão firme entre as amarras que prendem meus pulsos, não seria difícil para mim passa-las para frente e morder a corda até soltar, entretanto o problema é o metal que, segundo ele, tem propriedades mágicas.

Seguimos no rumo de um lago barrado por forças não naturais, uma cachoeira branca traz espuma a água transparente, e é por entre ela e a montanha que passamos, sinto o vapor de água em meu pêlo, chego a esboçar um sorriso leve, mas não deixo o humano ver. – Mais afrente. – a ponta de sua espada branca mostra o caminho bem ao lado do meu rosto. – Vou te mostrar uma coisa primeiro.

Passamos por uma região onde a rocha cinza-escuro parece suja de terra e paramos em um ponto sem motivo algum, fora o vale agora aberto a nossa direita, nisso, o homem me empurra, mas não me acompanha. – Ande. – perco um pouco o equilíbrio, mas faço o que pede, mesmo estranhando a atitude eu caminho devagar, pois as pedras que compõem o chão machucam minhas patas.

Mas, com uma súbita parada, minha pata direita é puxada para trás, chego a achar que é o humano, porém, o vejo sentado em uma pedra grande por cima de meu ombro esquerdo. Curioso noto símbolos acenderem no metal negro e me puxam de volta, eu não iria mais além, isso se não fosse mais um empurrão do homano, vou para frente, mas não saio do lugar, bom, caio de cara no chão, ou faria isso se ele não tivesse me segurado. Mesmo que puxando o couro do meu pescoço por trás, evitou que eu fosse de encontro com o chão frio e duro, e me mostrou bem que fala a verdade, assim, me solta, bato o peito contra as pedrinhas, mas mordo os dentes apenas, sinto ele desatando os nós dos meus pulsos e quando estou livre me viro, isso para encarar uma espada mirada em mim. – Fica sentadinho... – levando as mãos, mostrando nenhuma reação ameaçadora, e então, ele joga a picareta pelo chão até se aproximar de mim.

— Sem minha chave você não sai daqui, o centro da magia está muito bem escondido, afinal, pode ser qualquer coisa... Vê aquela cesta ali? – aponta com a espada para um objeto feito de tiras de palha posto perto das pedras. – Dez desses cheios serão suficientes.

Pego a picareta enquanto limpo minhas pernas, era hora de pagar. E assim soa o metal contra a rocha pela primeira vez, a primeira de muitas...



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