Capítulo 10 - Bilhete
Domingo a noite, voltei para Purgatory, Olivia se sentia muito melhor e Clarissa com um peso na consciência que iria durar semanas. Eu nunca tinha me dado conta que eu era melhor amiga da Olívia e que a partir do momento que a gente não tinha mais um relacionamento-quase-namoro e eu a vendo com menos frequência fazia com que ela se sentisse sozinha, quase depressiva. Tentei me desculpar como eu pude, mas eu não tinha como resolver os problemas emocionais de todo mundo.
Parei o carro próximo ao shorty’s para pegar um capuccino e encontrei Wynonna lá conversando com um homem de bigode e chapéu, chamado John Henry, quando ela me viu me entregou uma cerveja, me fazendo sentar numa cadeira no balcão com ela. Wynonna estava muito bêbada e falava arrastado coisas que não faziam sentido nenhum, mas era preocupante vê-la contando que mandou um cara para o inferno, com a arma numa mão e a cerveja na outra.
Wynonna, guarda, você não quer que ninguém se machuque, certo? - Tirei a arma da mão dela e tentei fazê-la andar. - Vem, vou te levar para casa.
Acho melhor mesmo. - Disse o homem de bigode,.
Depois de um pouco de discussão, ela aceitou a carona. Parei o carro em frente a casa e Waverly apareceu na porta, logo correu para ajudar.
Eu consigo andar sozinha, dá licença? - Empurrou as duas de leve e saiu do carro. Quando ela entrou em casa, Waverly me olhou.
Ela disse que a polícia quer interrogá-la, ela estava falando sério ou era a bebida? - Perguntei.
Caso Bleaker? - Perguntou Waverly respirando fundo e encostando no carro.
Acho que ela disse algo parecido. - Me encostei no carro também, ficando de frente para ela.
É complicado. - Explicou pausadamente - Wynonna foi obrigada a fazer algumas coisas para o oficial de condicional dela e agora ele está morto, então vai ser difícil de provar algo. - Respondeu as últimas palavras já com a voz um pouco mais baixa e continuou me olhando, com a respiração um pouco mais pesada. Dei um passo a frente, ficando poucos centímetros de distância dela.
Se eu puder ajudar… - Falei com a voz um pouco mais baixa e devagar. Chegando mais perto do rosto dela. Ela mantinha o contato visual. Deu um pequeno passo para frente, quase encostando em mim. Encostei minha testa na dela e a vi fechar os olhos. A boca dela veio lentamente na direção da minha. Eu conseguia sentir a respiração pesada no ar. Coloquei a mão na cintura dela. Os lábios dela se encostaram nos meus. Ela parecia leve. Puxei a cintura dela para mim. Nossas bocas foram se abrindo, mas ela recuou e abaixou a cabeça. Minha mão permanecia no mesmo lugar.
Ei. O que foi? - Perguntei, quase sussurrando.
Eu… eu preciso ver como ela está. - Apontou para a casa.
Ok. - Disse, ainda a segurando. Waverly não se mexeu por um momento. Senti seus dedos encostarem em minha outra mão. Depois de quase um minuto com a mão dela na minha, ela engoliu em seco, piscando demoradamente e se afastou. Ela voltou a me olhar. Eu não queria deixá-la ir, mas não queria que ela fizesse algo que não estava pronta.
Preciso ir. - Deu alguns passos para a casa dela, ainda me olhando.
Espera! - Entrei no carro e peguei a arma de Wynonna e andei até Waverly. - Ela esqueceu de pegar. Ela a pegou, encostando os dedos nos meus. Não olhou mais para trás.
Voltei para o carro e encostei a cabeça no banco, sorrindo.
Sexta-feira, quando estava acabando o expediente do Nedley, Chrissy e Stephanie Jones foram até a delegacia para pedir carona para a casa das Earps, pois o carro da Chrissy estava no conserto e Waverly daria uma festa. A gente não tinha se falado a semana inteira e eu estava com tanto trabalho que minha cabeça não parou um minuto, mas por quê ela não me chamou? Não era como se nós fossemos amigas ou qualquer coisa do tipo, mas a gente estava começando a se entender ou será que ela coisa da minha cabeça? Ou ela estava tão carente a ponto de ter me beijado? Já que faz pouco tempo que ela terminou com o Champs.
O caso da Dini e da Julia estava tomando quase todo o meu tempo. Elas pareciam inofensivas de longe, mas eu ia ter que me aproximar para ter um melhor resultado, mas não sabia de nenhuma estratégia ainda.
Nedley levou as meninas embora e eu teria que ficar até tarde na delegacia. Então Wynonna apareceu com uma garrafa de Whiskey e a gente foi para o escritório do Nedley beber atrás da mesa dele.
Quando eu tinha 13 anos - Pegou a garrafa da minha mão e deu alguns goles, depois passou para mim de novo - eu tinha sido internada em hospital psiquiátrico, chamava Santa Victória. Eu tinha que fazer uma maquete da cidade, ai eu… - Fez silêncio como se fosse mudar a história ou pensar melhor nas palavras. - passei a noite inteira fazendo aquilo. A professora odiou e me deu F. Quando deu o intervalo eu peguei um isqueiro eu queimei as coisas dela e a sala pegou fogo, ligaram para a Gus, esposa do meu tio Curtis, para avisar que ela tinha que me buscar, porque eu havia sido expulsa.
Você foi expulsa de um hospital psiquiátrico? - Passei a garrafa para ela - Com certeza você precisa mais disso do que eu.
E você? Qual foi a maior coisa que você fez?
Claro que eu nunca vou conseguir te superar, mas talvez entrar escondida no carro da minha mãe e passar a noite escondida da casa de outra pessoa? Nada muito interessante.
É, criatividade não é seu forte. - Comentou me devolvendo a garrafa.
E a Waverly? - Arrisquei perguntar.
Precisei fazer com que ela esquecesse a morte do meu pai e da Willa. Os tempo que eu fiquei afastada em reformatórios e hospitais fez com que as pessoas esquecessem um pouco que ela era minha irmã, então ela conseguiu fazer tudo o que eu não pude. - Esticou as pernas- Você acredita que ela deu uma surra no Champs quando eles eram menores? Chrissy era alvo de bullying quando era pequena, Waverly sempre a defendia. - Disse Wynonna orgulhosa da irmã mais nova. - Mas eu nunca gostei das amigas da Waves, uma vez a Stephanie Jones disse que eu precisava de uma plástica na bunda.
Mas sua bunda é incrível, cara. - Eu já estava um pouco bêbada, mas parecia que eu estava dando em cima da irmã da garota que eu beijei 6 dias atrás? Espero que não.
Obrigada. Você acha que eu protejo muito a Waverly?
Eu acho que ela passou muito tempo se moldando para ser inclusa, mas agora ela começou a perceber o que ela quer de verdade. - Dei mais um gole e passei a garrafa.
Você parece um letreiro de caminhão ambulante, e armada. Waverly deveria andar com você.
Eu concordo.
Começamos a falar sobre o caso que eu estava trabalhando e ela se interessou o bastante para dizer que se eu precisasse de ajuda poderia procurá-la. Não era como se eu fosse fã dela, muitas coisas estranhas aconteciam quando ela estava por perto, mas às vezes ela parecia uma pessoa um pouco mais acessível.
No dia seguinte, na hora do almoço eu acordei na cama de um hospital com o Nedley de um lado e a Waverly do outro.
Ei, você está bem? - Vi que Waverly estava com o braço machucado.
Você acordou! - Segurou minha mão com a mão livre.
Eu liguei para sua mãe, ela está vindo para cá. - Avisou o Xerife enquanto eu tentava lembrar o que tinha acontecido.
Waverly parecia muito preocupada. Um pouco depois chegou minha mãe e Olívia.
Amor, o que aconteceu? - Entrou Olívia correndo no quarto. Waverly olhou para ela e para mim, depois pediu licença e saiu. Nedley contou que me acharam desacordada em um bosque com muita neve e que eu precisava descansar.
Tentei forçar a memória e comecei a me lembrar que um carro estava me seguindo, passaram na minha frente e pararam o carro atravessado. 3 dos garotos que foram expulsos da academia de polícia quebraram o vidro do meu carro e antes que eu pudesse pegar a arma eles espirraram algo em meus olhos, depois me tiraram de lá arrastada. Me bateram de um jeito que não deixava marcas, até eu ficar inconsciente. Foi tudo muito rápido. Não acho que fiquei acordada por mais de 5 minutos, mas tinha uma vaga lembrança de uma voz conhecida gritando e eles fugindo como covardes. Enquanto eu apanhava eles diziam coisas como “Obrigada por arruinar minha vida” “Não consegui entrar em nenhuma universidade” ou até “Você merece apanhar até ninguém mais te reconhecer”. Foram coisas muito cruéis.
Contei o que eu me lembrei.
Minha mãe ligou para o Lorenzo buscar os nomes dos rapazes para que ela pudesse informar ao Xerife. Um pouco antes de dormir, Waverly me enviou uma mensagem dizendo que Wynonna tinha reconhecido um deles andando calmamente pela cidade.
Respondi “Wynonna?”
Waverly “Ela te viu na neve apanhando e espantou os caras.”
Nicole “Preciso agradecê-la.”
Waverly “Faça isso quando sair daí inteira, dorme bem.”
Nicole “E o seu braço?”
Waverly “Tá tudo bem. Só fique bem, isso já é muito.”
Nicole “Descansa”
É a garota que estava aqui quando a gente chegou? - Perguntou pegando o celular da minha mão.
Sim, Waverly. - Sem perceber eu sorri e ela percebeu.
Quer falar sobre isso? - Mostrou a tela do celular, com todas as mensagens que eu tinha trocado com ela.
Deixa as coisas acontecerem, caso tenha algo ai eu te conto. - Peguei o celular de volta. - Só não vai ficar com ciúmes de novo.
Só se você não me abandonar de novo.
Tentei repassar os últimos acontecimentos na minha cabeça. Eu definitivamente estava gostando de alguém, mas até ai eu gosto de muitas pessoas. Não conseguia ter certeza até que ponto isso era relevante para esperar que Waverly me desse alguma resposta do que sentia. O jeito que dela tratar as pessoas era diferente e me encantava. Ela era educada, atenciosa e doce e ao mesmo tinha coragem o suficiente para defender quem ela se importava. Eu realmente me importava com ela, tanto que vi que ela estava machucada antes de ver meu estado. Eu gostava dela. Gostava muito.
Eu fui atacada em expediente por pessoas que mereceram o destino que tiveram, mas é claro que não iriam me agradecer por ter tirado eles de uma carreira. Eu não podia me sentir culpada ou ficar com medo por causa disso, mas eu estava com medo. Se o que fizeram não foi o suficiente? Se os outros vierem atrás de mim também? Eu não tinha como ter certeza, mas poderia ver o que fazer frente a tudo isso, caso eles não forem pegos e presos por agressão. Eu vi o quão despreparada para algumas coisas eu estava. Eu era a policial, eu deveria ter sido mais esperta e mais rápida. Eu fui a primeira da minha turma, quando eu fiquei tão distraída?
Alguns dias depois eu tive alta. Olivia e minha mãe ainda estavam lá. Quando eu cheguei em casa, notei que meu quarto estava um pouco diferente.
Vocês pintaram meu quarto? - Olhei as paredes de cor salmão claro.
Sua amiga veio aqui, disse que tinha combinado com você. - Respondeu minha mãe.
Amiga? - Perguntei e olhei para Olívia. Ela não soube responder, passou a maior parte do tempo no hospital comigo. Andei pelo quarto e vi um bilhete em cima da mesa de cabeceira, que não havia ali até semana passada. Abri o bilhete, ele dizia “Não há lugar como nosso lar. Seja bem-vinda de volta, Oficial Haught. W.”. Minha mãe e Liv ficaram olhando minha reação com o bilhete, esperando que eu falasse algo, mas eu não conseguia pensar em algo para dizer. Enviei uma mensagem para Waverly agradecendo e avisando que eu estava em casa de alta médica, mas que ainda precisava de repouso. Ela perguntou se eu precisava de algo, então eu respondi que minha mãe estava comigo.
Elas me deixaram descansando e foram embora no dia seguinte. Meus braços ainda estavam roxos das injeções e meu sono não estava em dia devido ao “entra e sai” de enfermeiros com medicação, mas eu não aguentava mais ficar deitada, quase podia sentir meus músculos sumindo.
Acordei de manhã cedo e fui tentar correr, mas as minhas costas e minha coluna ainda não estavam aguentando tanto impacto. Eu não podia perder minha resistência, então andei o máximo que eu pude pela cidade. Algumas pessoas me paravam para dizer que ficaram sabendo do ocorrido e que sentiam muito. Cidade pequena tinha dessas coisas, todo mundo sabia da sua vida.
Enquanto eu andava, pensava se o setor que a Wynonna trabalhava não conseguiria me ajudar com minha investigação sobre meu pai, mas eu ainda não sabia se podia confiar em alguém que passou tanto tempo em reformatórios e tinha matado o próprio pai. Quando eu voltei a trabalhar, o xerife me deixou por mais uma semana na delegacia cuidando de relatórios e investigações não terminadas. Parecia um castigo ficar mais tempo trancada. Decidi que ia contar para ele o motivo de eu ter virado policial, talvez ele pudesse me ajudar de alguma forma, mas de fato não foi minha melhor ideia. Ele agiu como se eu não soubesse o que falava e sugeriu que eu tirasse mais uns dias de licença. Nedley poderia ser um ótimo xerife, mas com certeza ele sabia mais do que demonstrava e não parecia querer me ajudar. Certo, eu estava investigando por minha conta, que continuasse assim, mas eu estava chateada com a situação, algo muito estranho estava acontecendo ali e eu merecia saber o que era para poder lidar com o que fosse. E se fosse algo parecido com minha cidade? Eu não estava disposta a abandonar tudo outra vez.
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