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História Cruentamque - Depois do incêndio


Escrita por: Zyesio

Capítulo 5 - Depois do incêndio


    A única coisa que eu senti durante dois minutos foi uma dor intensa entre as pernas. Não conseguia me levantar e meus gritos eram abafados pelo som da sirene de incêndio. A porta se fechou e o elevador começou a subir comigo dentro. Ainda incapaz de levantar, eu só queria que aquela dor parasse logo. Então a porta abriu e eu vi um par de sapatos perfeitamente lustrados e uma calça social impecavelmente passada. O homem se abaixou e perguntou:

    — Stolz? O que você está fazendo aqui? — a voz era de Seth — Eu te ajudo a levantar — disse, enquanto me erguia pelos braços.

    — A menina… Ela fugiu — falei, quase sussurrando.

    A expressão de Seth, ficou mais séria. Não era mais paternal. Parecia que ele estava tentando lembrar de algo.

    — Onde está o Dussel? Preciso falar com ele — ele perguntou.

    — Ele deve estar em casa. Só eu fiquei aqui hoje — respondi.

    — Só você? Pelo menos três pessoas deviam ter tomado conta dela. Pelo menos no primeiro dia. Esses velhos não querem mais saber de trabalhar — a porta abriu e nós saímos. O corpo de bombeiros estava entrando no prédio, indo até as escadas de emergência — fique por aqui, eu preciso fazer umas ligações. Não se preocupe. Eu sei que a culpa não foi sua.

    Ele foi a caminho de sua sala e eu sentei em um dos bancos da recepção. Seria difícil dormir naquele dia. Eu peguei um ansiolítico que carregava no bolso e tomei duas pílulas. Depois que as dores na virilha passaram eu não conseguia parar de pensar no que aconteceria com o Roger e o resto dos cientistas e no paradeiro da Thais. Ela havia saído correndo com aquelas roupas de paciente. Seria muito difícil alguém não a encontrar. Depois de meia hora sentado, esperando, Roger apareceu. Ao me ver ele sorriu.

— Quando soube da notícia fiquei preocupado com você — falou — Foi tudo minha culpa. Eu devia ter ficado. Aqueles velhos não conseguem ficar nem dez minutos depois do expediente, eles não ligam mais para a cura, só para a aposentadoria. Eu achei que ela ia se comportar com você, mas parece que eu me enganei — disse, e me deu um abraço —  Me desculpa

— Não precisa se desculpar. Ela é louca. Não ia colaborar com nada que fizéssemos para tentar encontrar a cura. Esse laboratório ia entrar em combustão mais cedo ou mais tarde. Sorte que só eu estava lá — falei, tentando acalmá-lo um pouco.

— Eu preciso conversar com o diretor. Isso foi um erro enorme — ele disse

— Eu vou com você — eu falei — não quero que você assuma toda a culpa. Vamos discutir isso juntos.

— Eu agradeço — ele respondeu, sorrindo.

Nesse momento o homem que tinha convocado a reunião mais cedo apareceu. Ele lembrava o meu falecido avô. Óculos redondos e bigode grisalho. Mas as olheiras profundas e o jaleco amassado indicavam a falta de descanso.

— Você está bem, jovem? — perguntou.

— Estou — respondi.

— Vamos conversar com o diretor. Precisamos esclarecer algumas coisas.

Fomos todos andando até a sala de Seth. As portas de madeira estavam abertas e a sala estava mais clara do que da última vez. O papel de parede marrom com detalhes cinza dava uma sensação de conforto. Haviam duas cadeiras como a que eu sentei na última vez e um sofá ao canto. Eu fiquei no sofá. Roger sentou na cadeira à esquerda, mais próxima de mim.

— Quem quer falar primeiro? — perguntou Seth.

— Senhor, eu assumo a culpa — disse Roger — Era minha função cuidar dele...

— Será que podemos ser mais racionais por favor? — o cientista interrompeu —  Sim, foi um erro de todos nós permitir que isso acontecesse. Mas a menina não ia nos ajudar. Continuar não ia nos levar a nada. Não é tudo sobre lucros, Seth. Você entende o que estou falando. Conte a eles —  disse.

O diretor respirou fundo. Olhou por um instante para o velho e então se virou para mim.

— Eu vou falar — Seu olho esquerdo estava negro —  Mas isso não quer dizer que eu concorde com você —  Respirou mais uma vez —  Stolz. A garota não foi a primeira a passar por esse laboratório. Na verdade, ela foi a quinta. Você é jovem, possui capacidades muito acima da média, isso é inegável. Eu pensei que se eu te mandasse para o laboratório superior com alguém que pudesse te orientar — ele olhou para Roger —  Você seria capaz de enxergar algo que os mais velhos não conseguiram.

— Nenhum sobrevivente do Cruentamque apresentou algo de especial. Genes, fluidos corporais, células, nada explicou a aparente imunidade que essas pessoas tem —  disse o cientista.

— Doutor Markus Kroiss, acho que você deve compreender como isso parece absurdamente impossível —  disse o diretor.

— E eu concordo, mas eu não escondi nenhum fato. Inclusive eu acho que deveríamos parar de tentar insistir nessa cura. Se ela existe, é algo fora de nossa compreensão. Fui contra a sua ideia de incluir esse jovem no programa desde quando você propôs essa ideia absurda há um mês atrás, mas você não me ouviu e olha o que aconteceu. Não avançamos nem um pouco desde o primeiro sobrevivente que apareceu naquele laboratório —  disse o velho

— As decisões foram tomadas e os erros cometidos. Agora temos que encontrar a moça e decidir o que fazer a partir de agora — disse Seth.

— Por que ninguém me falou dessas coisas antes? — perguntou Roger.

— Os cientistas já estavam desesperançosos. A sua função era animar o Stolz e queríamos que vocês pensassem que podiam encontrar a cura — respondeu o diretor.

— Então, a cura era uma mentira? — perguntou Roger.

— Houveram sobreviventes do ataque, mas todas pareciam ser pessoas normais —  disse Markus —  Eu já sofri muitas desilusões e perdi muitas noites, então não vou mentir. É mais provável que essas pessoas apenas tiveram sorte e não entraram em contato com o vírus.

    — Acredito que podemos parar por aqui —  disse Seth — Stolz, me desculpe por te desapontar, vá para casa e durma,  sua cara está péssima. Tire o dia para descansar. Você vai voltar para o seu laboratório antigo depois de amanhã, entendido?

    — Entendido, senhor — respondi.

    Minha cabeça estava cheia de dúvidas e o meu corpo mole de cansaço. Todos nos levantamos  e saímos da sala. Roger veio até mim, sorrindo.

— Parece que tudo está resolvido, estou aliviado. Quer sair para comer um lanche ou algo assim? — perguntou.

— Não, muito obrigado. Acho que eu vou para casa dormir um pouco.

— Beleza! Qualquer coisa é só me ligar.

Eu não entendia como ele podia estar tão feliz e satisfeito com o que ouviu, mas as vezes eu queria ser assim também. Fui até a garagem e entrei no meu carro. No caminho até meu apartamento eu fiquei tentando encaixar as peças. Talvez faltasse algo. Ao entrar em casa a primeira coisa que fiz foi deitar em minha cama e dormir.



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