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História Crumbs of Freedom - Capítulo 3 - Everything will be fine


Escrita por: carpelai

Notas do Autor


Hey, pipous! Tudo bem com vcs? Espero que sim, mas caso não esteja, tenham ctz d q, cedo ou tarde, vai ficar ✌

Então né, esse cap não saiu em fevereiro, e demorou mais do q o último, então eu decidi que...... vou deixar a meta em aberto (provavelmente desse jeito os caps vão sair mais rápido do q planejando) enfim, msm assim peço dsclp pela demora, eu tento msm escrever o mais rápido possível, mas eu tento dar o meu melhor e às vezes o meu melhor vem montado em um jabuti...

«««IMPORTANTE»»» [LEIAM ESSE IMPORTANTE, NUNCA PEDI NADA A VCS]

Bom, o "importante" na raridade das vezes raras (?) será algo diferente de um pedido para q vcs escutem alguma música específica durante o cap ajsgshgsjs mas, dessa vez não, então quando for um importante que não se trate de uma recomendação de música, eu vou deixar um aviso ao lado do "importante".

Enfim, o que eu tenho a dizer é sobre a Camila. Eu gostaria muito de desenvolver mais a relação dela a religião islâmica, mas não farei por pq a homossexualidade não é aceita no islã e é crime em muitos países islâmicos, chegando a ser punida com morte.

Vejam bem, eu disse PAÍSES ISLÂMICOS e não o ISLÃ. O islã condena a homossexualidade, assim como muitas outras religiões, principalmente as cristãs, mas as punições ficam a cargo da legislação dos países.

Agora deixa eu explicar direitinho pra q n distorçam o que eu disse. Quando eu decidi fazer a Camila sendo dessa religião, meu objetivo era fazer com que as pessoas que viessem ler e que tivessem preconceitos com o islã, baseados em estereótipos e mentiras disseminadas, no geral, pela mídia, abandonassem esses sentimentos, pensamentos e opiniões pouco nobres.

Então eu optei por desenvolver a personagem da Camila como alguém que cresceu conhecendo e vivenciando — em parte — os ensinamentos do islã, mas que não fosse totalmente adepta a ele, como acontece com muitas pessoas. Principalmente, creio eu, com os homossexuais, afinal, é complicado ser adepto a uma religião que diz que nosso amor é pecado.

Eu optei por escrevê-la assim, porque, ao meu ver, fazer com que ela fosse adepta ao islã, além de ser muito mais ccomplicado, por se tratar de uma religião que eu não conheço a fundo, poderia trazer a fanfic um final não muito satisfatório (pelo menos para mim, porque eu preciso estar no mínimo satisfeita com o que eu escrevo para poder compartilhar com outras pessoas, mas acredito que não seria satisfatório para vocês também, porque se fosse para escrever final triste eu nem escrevia :v) e porque eu acho que é a realidade de muitas pessoas do meio lgbtqi; ter q se esconder, não poder mostrar algo que faz parte de você por conta da religião que sua família segue.

Em resumo, o desenvolvimento da personagem da Camila não será afetado por ela não ser adepta do islã (só vai ser afetado se eu cagar a personagem msm, o que eu não pretendo fazer, mas é uma possibilidade... então se isso acontecer, peço desculpas desde já), mas eu tbm não deixarei de esclarecer alguns pontos sobre essa religião, já que era a minha intenção inicial. E, claro, farei isso dentro das minhas capacidades, pois eu não sou nenhuma expert no assunto.

Sem mais, a música desse cap vai estar lá nas notas finais e, se quiserem, já que não são obrigados a nada 💃 ouçam ela qnd o famoso "Play" aparecer.

Tenham uma boa leitura, mozões, falo mais com vocês nas notas finais.

Capítulo 4 - Capítulo 3 - Everything will be fine


Fanfic / Fanfiction Crumbs of Freedom - Capítulo 3 - Everything will be fine

1° de junho de 1999, Londres, Inglaterra.

A mulher chegou exausta ao apartamento. Apesar de considerar fácil o seu trabalho, toda a dedicação que aplicava na realização de suas obrigações, além das cobranças que fazia a si mesma, rendiam-lhe uma boa tensão ao fim do dia. Ela, então, guardou suas chaves e despiu-se aos poucos enquanto caminhava em direção ao banheiro, o celular, porém, sempre em sua mão, à espera de um telefonema que ela tinha certeza de que chegaria a qualquer instante. Uma vez no banheiro, ela pôs a banheira para encher, já sonhando acordada com seu banho relaxante.

Tendo metade de seu corpo submerso na água quente, o celular tocou e ela prontamente atendeu.

Você conseguiu? — Uma voz cortante e temerosa sibilou do outro lado da linha.

— Sim, está tudo sob controle. Eu cheguei ao necrotério antes dos peritos e concluí com exímio a etapa dois da primeira fase, meu caro — disse a mulher, divertida e ignorando o ultraje que o tom de dúvida na voz do homem representava para suas habilidades. — E você também fez um bom trabalho identificando os corpos desfigurados, pelo o que eu soube. Ao contrário do policial encarregado, o desgraçado escondeu informações de mim como se eu não estivesse anos-luz a frente dele. — Manteve o mesmo tom, apesar do leve aborrecimento.

Obrigada, mas você é inacreditável, como pode se divertir numa situação dessas?

— Não, inacreditável é você, quando teme por eu não conseguir realizar uma tarefa tão simples. O que você espera que eu faça? Eu conheço minhas limitações melhor do que ninguém e, portanto, sabia que concluiria a minha parte de olhos vendados. Me preocupar com coisas fáceis de resolver não faz o meu feitio.

Tudo bem, você está certa. Vou deixar para me preocupar quando a situação estiver fora dos eixos e não houver mais maneiras de remediar — ironizou.

— Isso não vai acontecer, deixe de ser pessimista — rebateu rindo. — Nós somos os melhores. Ou ao menos eu sou. — Fez silêncio, fingindo uma reflexão.

E ainda discorda quando digo que a inacreditável é você — respondeu o homem, desacreditado pela fala da mulher. — Tenho que desligar, nos falamos em breve. — A linha então ficou muda e a mulher agradeceu ao cosmos por finalmente poder relaxar.


♦♦♦


Lauren's POV

É simples e completamente trágico quando se chega à conclusão de que, para o destino, é prazeroso te ver chegar a um momento de sua vida em que você se encontra totalmente sem rumo. Eu cheguei a essa conclusão e, definitivamente, não desejaria isso nem mesmo à Michelle, por mais que eu duvide muito que algo no universo seja capaz de levá-la a mesma conclusão que eu tive.

Eu poderia facilmente ser considerada um tola por me referir a ele como uma pessoa, mas não era algo com o que eu me importasse, porque eu reconhecia que ele era muito mais do que um aglomerado de átomos e sentimentos desordenados e tudo mais que sirva para qualificar o ser humano como tal. Eu reconhecia que ele era tão mais, que eu nem ousava tentar reduzi-lo a qualquer explicação, porque eu sabia que nenhuma poderia compreender todo seu significado, assim como nenhuma explicação também seria capaz de compreender total e definitivamente o amor, mas isso não vem ao caso, o fato é que eu esperava que todo o respeito que eu tinha por ele fosse minimamente retribuído com um pouco de amparo, que apenas uma vez ele me desse respostas sem que eu precisasse implorar ou me esforçar ainda mais para consegui-las, pois eu estava esgotada.

Então, sim, eu estava me corroendo de raiva pela tamanha prepotência do destino.

Eu preferiria infinitamente estar em uma encruzilhada do que estar presa em quarto escuro, sem janelas ou portas e nem sequer uma diminuta fresta que me permitisse continuar respirando, e era a materialização exata de como eu estava me sentindo psicologicamente naquele memento.

Apesar de eu não ter a menor culpa pela morte de meu pai, aquele sentimento pesava em peito, me sufocando.

Deitada na cama em meu quarto na mansão, uma lágrima sorrateira trilhou um caminho em meu rosto até a colcha e logo tantas outras a imitaram. Elas pareciam infinitas, e mesmo assim nenhuma foi capaz de diminuir a queimação em meu peito.

Milhares e milhares de possibilidades rondavam minha mente; possibilidades de coisas que podia ter feito e não fiz, coisas que eu podia ter deixado de fazer, mas que meu orgulho não permitiu, coisas que eu poderia ter guardado para mim, mas que gritei a plenos pulmões, coisas que podiam ter evitado a morte de meu pai.

Michael sempre esteve muito longe de ser o pai perfeito, mas ninguém é perfeito, eu mesma era um exemplo perfeito de imperfeição, mas ainda assim, apesar de todas as suas falhas e ignorância, ele era meu pai, minha família e eu o amava. Nada no mundo jamais teria, para mim, importância maior do que as pessoas que eu amo.

Ao fundo, ouvi o telefone tocar, retirando-me de meus pensamentos infortúnios. Sem saber quem estava ligando, eu sequei minhas lágrimas com o dorso da mão, limpei a garganta e atendi por volta do sexto toque.

Lauren? — A voz conhecida soou extremamente preocupada, antes que eu pudesse dizer um simples “alô”.

— Sim, sou eu — respondi meu irmão. No mesmo instante, minhas lágrimas desatinaram outra vez.

Hey, presta atenção: Você. Não. Tem. Culpa. — Tentou me convencer.

— Tarde demais — informei, com a voz entrecortada.

Oh Deus... Certo, então apenas tente se acalmar, eu estarei aí em breve, Laur — disse rápido e pausou repentinamente. Eu sabia bem que ele ainda tinha algo a dizer e sabia também o que era, apenas nunca me acostumaria com o medo que ele tinha de tocar no assunto comigo. — Eu... Só preciso saber se você vai ficar bem, se a situação ainda está sob controle. Está?

— Está — tranquilizei-o. — Mas eu sei que não vai continuar assim por muito mais tempo... Eu... Eu não vou conseguir ir ao funeral, Kyle e você sabe bem o que vai acontecer... Michelle vai estar lá e você vai ter que cuidar dela por mim, não a deixe arruinar as coisas, irmão, eu lhe imploro.

Eu vou cuidar de tudo, não se preocupe, maninha — assegurou, reconfortante. Fiz um som nasal em concordância antes de desligar o telefone.

Nesse momento vi Blake, minha gata de pêlo cinza e olhos amarelos, entrar no quarto por uma fresta da janela. Ela pulou e engatinhou até a cama, subindo nela. Eu fiz um leve carícia em seu pêlo e então deitei-me novamente na cama, com ela aninhada a mim dessa vez, porém. Eu tentaria dormir um pouco com a intenção de aliviar a dor que tomara conta de minha cabeça e a estava fazendo latejar.


♦♦♦


2 de junho de 1999, Londres, Inglaterra.

Camila’s POV

Minha mãe havia conseguido passagens para ela e Sofia no mesmo voo que eu, afinal, e se eu pudesse tirar algum proveito de toda aquela situação sem me sentir mal, dado o fato de que a causa dela foi a morte de alguém, certamente eu teria agradecido por não estar sozinha no exato momento em que conheci Ali Raad pessoalmente.

Como eu precisava de um noivo, há alguns meses comecei a procurar por alguém agradável e não muito conservador na internet, pois se eu não gostasse minimamente da pessoa, eu poderia simplesmente deixar de falar com ela quando eu bem entendesse.

Eu conheci o Ali pelo ICQ*, depois de conversar com meia dúzia de homens grotescos. Ele se mostrou perseverante e bastante gentil, mesmo eu não tentando conquistar o afeto dele.

Depois de meses conversando e nos “conhecendo”, ele decidiu me pedir em casamento. Como ele morava em Bagdá e trabalhava lá também, visitou meus avós, expôs suas intenções e, uma vez que eu estava de acordo, meus avós, que haviam apreciado bastante o meu pretendente, começaram a acertar os pormenores do casamento.

Ali também deixou uma foto dele com meus avós, para que eles entregassem a mim quando fossem me visitar e assim o fizeram. Antes disso, nada sabíamos da aparência um do outro, exceto pelo que havíamos descrito. Ele até sugeriu enviar uma foto dele por e-mail*, mas eu não aceitei porque, além da palavra dele, não havia nenhuma garantia de que a pessoa na foto seria ele mesmo. Então eu preferi esperar por uma oportunidade mais confiável.

O outrora incômodo hijab marfim, que envolvia minha cabeça e pescoço, pareceu um esconderijo insatisfatório, quando me vi sob o olhar neutro e misterioso daquele que viria a ser meu esposo. O homem moreno, de cabelos e olhos castanhos, vestes sociais, um sobretudo e um cachecol em cores frias, e que, por fim, beirava a 1,80m de altura, observava atentamente as pessoas que saiam do portão de desembarque e segurava um pequeno cartaz com o sobrenome Cabello escrito em letras cursivas à mão. Certamente era o homem da foto.

Ele até tinha uma aparência agradável, quer dizer, para quem apreciava aquele tipo de anatomia.

O que mais atiçou minha curiosidade, no entanto, certamente foram as roupas que ele vestia e que em nada se assemelhavam às de um muçulmano que agradaria meus avós. Mas como nada naquele noivado fazia muito sentido, por hora eu não me preocuparia. Quer dizer, quem em sã consciência escolheria livremente casar-se com uma pessoa que nunca viu, uma pessoa que não ama? Ali escolheu. Agora, se foi em sã consciência, eu já não tinha tanta certeza. Mas o que eu poderia dizer também? Eu aceitei sua proposta, pois em meu coração eu tinha uma tinha uma dívida para com o meu pai. E, além disso, se nada desse certo, eu ainda poderia me divorciar.

Eu só esperava estar fazendo a coisa certa.

Chegando ao saguão, Sofia involuntariamente apontou para ele quando o avistou com o cartaz e olhou para mim como quem perguntava se seria ele mesmo, embora que parte dela soubesse a resposta. Eu me limitei a balançar a cabeça em afirmação e lhe dirigi um sorriso conformado, mesmo que eu considerasse seu questionamento como uma idiotice, não havia porquê ser rude com minha irmãzinha por um motivo tão banal. Ela tinha culpa de nada.

Vendo o gesto de Sofia, o homem, que não aparentava ter mais do que 25 anos, provavelmente presumiu que éramos nós quem ele esperava, pois no segundo seguinte caminhava elegantemente em nossa direção.

Mais do que nunca eu sentia-me desprotegida e despreparada, e transparecer o contrário não foi uma tarefa simples.

Al Salam Alaykum — saudou-nos, levando a mão ao peito, quando já estava perto o suficiente.

Wa Alaykum as Salam — respondi o cumprimento por nós três, imitando seu gesto.

— É uma enorme satisfação finalmente conhecê-la — disse, gentilmente. — Conhecer as três, perdoem-me — disse a Sinuhe e Sofi.

— Igualmente, Sr. Raad — respondi, me esforçando para apenas não soar irônica, e sendo acompanhada por minha mãe e irmã.


♦♦♦


Como um bom e não requisitado cavalheiro, ele carregou nossas malas até o carro. E, para minha felicidade, minha mãe foi ao lado dele, no banco da passageiro.

O tempo todo, do aeroporto à mansão Jauregui, em Hampstead, ele não parou de falar por um minuto sequer. Perguntou-nos sobre o voo, nos contou suas considerações sobre a cidade, mencionou rapidamente a tragédia da qual Michael foi vítima, mas não se estendeu muito nesse último assunto, conversou sobre desenhos animados com Sofia, dirigiu-se diretamente a mim algumas vezes, mas quando notou que eu não estava muito afim de conversar, não ousou mais fazer com que eu falasse — embora tenha se empenhado em lançar olhares inconvenientes para mim através do espelho retrovisor —. Enfim, ele estava se saindo muito melhor do que deveria, e, portanto, não estava contribuindo em absolutamente nada para o meu objetivo de odiá-lo.


♦♦♦


A mansão Jauregui era definitivamente incrível, e eu não duvidaria se me dissessem que existem cidades menores do que o terreno onde ela se encontrava, sua frente era em marrom barroco, com janelas e a enorme porta de entrada em carmim.

Descendo do carro, haviam dois empregados aguardando feito postes para carregarem nossas bagagens, o que eu considerei desnecessário.

Fomos recebidos pela governanta, que se chamava Elleanor. Era uma senhora de uns setenta anos, cabelo grisalho curto e muito simpática, mas que carregava um semblante abatido, que eu deduzi não ser inerente a ela, mas sim devido ao falecimento de seu patrão.

Elleanor nos conduziu aos nossos aposentos, informou o horário em que as refeições eram servidas, disse que poderíamos nos sentir bem à vontade e aconselhou que descansássemos. Eu havia gostado muito dela e não vi problema em seguir suas sugestões.


♦♦♦


Na hora do jantar, Allyson e Jerry também estavam presentes, o que, incrivelmente, não se aplicava aos filhos do Sr. Jauregui e só me deixou ainda mais ansiosa por conhecê-los.

Jerry informou que Kyle chegaria no dia seguinte e, desculpando-se por não se tratar de um assunto para a hora do jantar, disse também que o velório ocorreria na sexta-feira.

A melhor parte, no entanto, foi que eu pude matar um pouco da saudade que estava sentindo de Ally e agradeci por ao menos a companhia dela eu ter desfrutado muito bem.

Até com Ali eu conversei e sem me sentir tão desconfortável, quanto mais cedo. Nosso noivado inclusive virou pauta em algum momento do jantar, mas ele ainda não passava de um estranho para mim e era cedo demais para determinar se eu havia feito a escolha certa. E principalmente para saber se tudo ficaria bem.


♦♦♦


Narrador’s POV

O celular soou estridente sobre o criado-mudo, em um dos quartos da mansão Jauregui, e foi culpado por acordar a morena que se revirava na cama por conta de mais um pesadelo, como vinha tendo frequentemente.

A mulher sentou-se na cama meio desorientada e logo esticou-se para pegar o celular.

A tempestade está vindo, baby — cantarolou do outro lado da linha uma voz masculina. A jovem fechou os olhos com força, sentindo de repente uma forte fisgada na cabeça.

— Estou aqui, Frank, já acordei. O que você quer? — Questionou impaciente.

Já? Você diz já? A tempestade já chegou e você está perdendo tempo. Tem um trabalho a fazer, então faça-o. — A voz dele parecia estupidamente familiar e mais estúpida ainda era a impressão que ela tinha de que jamais conseguiria associar aquela voz a um rosto conhecido.

— Alguma vez eu deixei de cumprir meu trabalho?

Não me faça enumerar, lindinha. — Riu secamente. — Bom, a novidade é que o Michael morreu.

— O quê? Como assim ele morreu? Droga, isso não pode ser verdade, ele não podia ter morrido agora. — A mulher desesperou-se.

Eu sei muito bem disso, Michelle, mas não há como reverter essa situação, sua estúpida. Com esse imprevisto os planos mudaram, o que você tem que fazer agora é descobrir quem foi o responsável por isso e chegar à presidência dessa maldita empresa o mais rápido possível. — Raivoso, o homem a instruiu e desligou o telefone, sem esperar uma resposta.


♦♦♦

[Play]

4 de junho de 1999, Londres, Inglaterra.

Partículas de poeira podiam ser avistadas em meio aos raios de sol que transpassavam as janelas que ficavam na base da cúpula da Catedral de São Paulo e tocavam a tampa do caixão fechado.

O badalar dos sinos foi ouvido; anunciava o início do velório de um homem que, assim como o santo que aquela catedral carregava em seu nome, um dia havia sido cego.

Eu um dos grandes assentos acolchoados da nave central*, uma mulher de cabelos negros e ondulados, endurecidos por fixador, se esforçava em demonstrar uma dor que não habitava seu coração. Alguns diriam que sua tristeza era real e até mesmo umas das mais profundas, mas Kyle não acreditaria em uma lágrima sequer que Michelle conseguisse derramar, mesmo sabendo que tal feito não seria difícil para ela.

Cavalheiros ofereciam lenços às suas damas, que embebiam os pequenos e macios tecidos com lágrimas doces. À exceção do grau de parentesco com o defunto e da intensidade dos sentimentos pertinentes a esse fator, eles não eram muito diferentes de Michelle.

O Reverendo Thompson fez um breve pronunciamento, antes de chamar Robert Turner ao púlpito. Com muita elegância ele levantou-se e, respirando profundamente e com pesar, ajeitou o paletó sob medida, e caminhou em direção ao altar. Embora não fossem parentes, ele era mais próximo de Michael e o conhecia melhor que o próprio Jerry, irmão de seu sócio e amigo. Por esta razão, fora ele o escolhido para dizer uma bela porção de mentiras e mínimas verdades sobre o patriarca Jauregui, somente para agradar os ouvidos da alta sociedade londrina e plantar em seus corações um sentimento que a maioria daquelas pessoas não compreendia e ainda desconhecia seu significado e essência; a empatia. Mas o pior é que alguns tinham consciência da frieza que lhes congelava a própria alma e pouco se importavam com isso.

Mas ainda havia esperança. Sempre haveria esperança, porque, apesar da perpetuada divergência em relação aos efeitos que causa sobre a psique humana, ela era necessária e sua semente residia no interior dos que eram tão subestimados e rejeitados como ela.

Destoante da verdadeira aura dos que presenciavam o velório, em completa sincronia, o coral iniciou uma canção melancólica, repleta de notas longas e suaves, uma canção melancólica, que em nada alegrava a Kyle ou estimulava Michelle a prosseguir com seus planos. Por motivos diferentes, eles sentiam-se perdidos e prestes a passar a eternidade no inferno, se não descobrissem o mais rápido possível o próximo passo a ser dado. A morte do pai os havia pegado mais desprevenidos emocional e mentalmente do que um dia imaginaram que aconteceria. Seus alicerces já corroídos, cederam de uma vez por todas. Seus olhos se abriram para a realidade; Kyle já não tinha mais um pai para ter desavenças e a possibilidade distante de reconciliação e Michelle, bom... Michelle ainda tinha uma missão a cumprir e que acabara de se tornar mais árdua.

Eles estavam tão absortos em seus pensamentos nebulosos, que não notaram quando o discurso de Robert Turner chegou ao fim, sendo despertos apenas depois de tocados no ombro por Jerry. O cortejo fúnebre iria começar.

Em uma procissão de automóveis, os convidados seguiram pelas ruas movimentadas da capital, por longos vinte e sete minutos, para o Cemitério Hampstead, onde mais belas palavras foram ditas, rosas foram jogadas sobre o caixão e o corpo foi sepultado, bem ao lado da lápide que continha os dizeres: Clara Jauregui Morgado; filha, esposa e mãe amada. ✩ 8/12/1952 ✞ 4/06/1991.

Faziam exatamente oito anos e não poderia haver uma coincidência mais infeliz.

Mas nada poderia mudar aquilo.

Aos poucos, então, as pessoas se dirigiram para fora do cemitério, pois ainda restava a recepção.


♦♦♦


Na mansão Jauregui, Camila terminava de se arrumar para a recepção; vestia uma abaya* preta, trabalhada em rendas da cintura para cima, na bainha e nas mangas e, por fim, pôs um hijab da mesma cor.

E então estava pronta.

Aquele era um dos momentos que mais lhe causava desconforto. E ela sabia que não seria o último, pelo contrário, sabia que muitos outros estavam por vir.

A morte de Michael e os dias vazios até o enterro a deram motivo e tempo para refletir sobre o que estava fazendo com a própria vida. A mensagem de Dinah a todo instante voltava a sua mente. Uma nova decisão foi tomada. Uma decisão que requeria paciência e sacrifício, mas que daria frutos que realmente a fariam feliz. Então não importava quantos argumentos ela ainda criasse em sua mente para recuar, para convencer a si mesma a desistir, pois se sua decisão anterior fosse realmente a certa, não haveriam tantas dúvidas, não haveria dor e, certamente, não haveria uma nova. Sendo assim, a única coisa que aqueles argumentos fariam, era preencher seu tempo de espera.

Camila havia entendido que a vida é curta demais para perder tempo com aquilo que não se ama e que o amor pode, sim, ser criado e, inclusive, onde ninguém jamais esperou que pudesse, só eram precisos a semente certa e o devido cuidado, mas não quando isso lhe custa a realização dos seus sonhos.

Ela não queria desonrar seu pai ou a memória dele, mas, se ele havia feito tanto por ela, é porque se importava com seu futuro e felicidade e, portanto, não fazia sentido condená-la a um casamento fadado a ser infeliz. No fim, ela preferiu acreditar que aquele casamento não passaria de um faixada para seus avós, minunciosamente arquitetado pelo seu pai. A única peça, cuja presença naquele jogo ela não compreendia, era Ali. E por isso ela precisava de tempo. Precisava descobrir a missão dele e provar a sua teoria, pois era a única maneira de se tornar livre e estar em paz com sua consciência.

Ela estava no topo da escada, observando todos de um ângulo único e se perguntando quantos segredos haviam naquele lugar. Se perguntando quantas pessoas ali escolhiam esconder um lado de si. E ela desejou ser a única que precisasse se esconder.

Infelizmente, ela não poderia estar mais enganada.

Perdida em pensamentos, foi avistada por Ally no andar de baixo, que acenou em sua direção, esperando ser notada. Ela correu o olhar pelo ambiente, procurando rostos familiares. Encontrou Jerry, acompanhado de Sinuhe e Sofia, cumprimentando alguns convidados e, finalmente, alguns bons metros para a direita, na sala de estar, seu olhar caiu sobre sua irmã postiça. Camila andou a passos contidos e envergonhados pelo lugar, indo em direção a Ally. Ao mesmo que sua roupa a protegia de olhares certos olhares, também atraía outros. Era um triste paradoxo.

Depois do que lhe pareceu uma eternidade caminhando entre pessoas desconhecidas e de auras mórbidas, ela havia chegado à sala de estar e não tardou em sentar à esquerda de Allyson no sofá e engatar numa conversa amena.

A menor lhe contava sobre seu trabalho e um projeto em andamento que envolvia um acelerador de partículas. Camila pouco entendia do assunto, para não dizer nada, mas prestava atenção em tudo que ouvia. Bom, pelo menos até perceber que uma mulher, em um círculo de homens que incluía seu noivo, lhe encarava ininterruptamente, sem ao menos disfarçar. Era uma mulher muito bonita, de cabelos negros e olhos claros e que, se não fossem as circunstâncias, ela provavelmente estaria satisfeita por estar sendo o foco de seu olhar. Mas, dado suas vestes, não era o caso.

Ela permaneceu em silêncio por mais tempo que imaginara conseguir, não queria e não podia perder a paciência na presença de Ali, mas considerou que aquela mulher já estava passando dos limites. Afinal, ela não era nenhuma atração para ser observada de forma tão inconveniente e desrespeitosa.

— Está tudo bem, Mila? — Ally questionou, percebendo a súbita inquietude da irmã.

— Desculpe, Ally. É que aquela mulher não para de me encarar e isso não está me deixando nada contente — disse, voltando-se para a menor. Quando virou novamente para apontar a mulher que de quem se referia, assustou-se com ela bem diante de si. Mas logo se recompôs. — Posso ajudar?

Ally e a mulher misteriosa soltaram uma breve risada.

— Mila, essa é minha prima-

— Jauregui. Michelle Jauregui. — A mulher foi mais rápida em se apresentar, tirando o sorriso do rosto de Allyson.

— Oh, você é filha do Michael? Meus sentimentos, eu sei como é perder alguém que amamos, ainda mais um pai, eu também perdi o meu, tenho menos lembranças dele do que gostaria, porque ele se foi quando eu ainda era muito nova, mas eu sinto muita saudade dele. — Camila desatou a falar, sentia-se envergonhada por ter soado rude com a mulher.

— Sim, sou. Realmente, é muito doloroso sofrer uma perda dessas, afinal não é nada que possamos substituir, mas será que podemos não falar sobre isso? Eu ficaria muito grata se pudesse apenas desfrutar da companhia de vocês e espairecer um pouco.

— Eu não acho uma bo-

— Fique a vontade, a casa é literalmente sua — disse Camila, interrompendo a irmã.

— A menos que você tenha que cumprimentar outros convidados, prima, nós entenderíamos perfeitamente bem se tivesse que fazer isso ao invés de ficar aqui com a gente — disse Ally, sugestiva. Finalmente havia conseguido terminar uma frase sem nenhuma interrupção.

— Eu estou bem, Allyson, além de que essas pessoas não poderiam ter menos importância para mim agora — disse Michelle, enquanto sentava.

De longe, Kyle observava a interação e logo o primogênito Jauregui e o noivo de Camila estavam se dirigindo, ao mesmo tempo, para perto das três. Os dois chegaram quase juntos e Kyle, notando que o objetivo de Ali era o mesmo que o seu, lançou um olhar interrogativo a ele, que deu permissão com um aceno de cabeça.

— Podemos nos juntar às senhoritas? — Kyle pronunciou-se pelos dois.

— Humpf... E só fica melhor — resmungou Ally, baixinho o suficiente para que apenas Camila ouvisse, o que lhe rendeu uma cotovelada na costela, desferida pela irmã. — Ai! Podem, é claro! — respondeu a contragosto.

— Engraçado, o Jerry já está casado com minha mãe há oito anos e nesse tempo eu sempre pensei que o Michael tivesse apenas dois filhos — falou Camila, quando Kyle e Ali já estavam sentados no sofá ao lado.

— Talvez porque-

— Talvez porque a Lauren não gostasse de ser vista como filha dele. Além de ter coisas melhores para fazer do vir ao enterro do próprio pai — disse Michelle, interrompendo o irmão. Além de ser a terceira vez que ela interrompia alguém em tão pouco tempo, sua fala instaurou um clima pesado entre os cinco, fazendo Camila se arrepender de ter ficado contra Ally.

— Michelle, por favor! — Kyle a repreendeu. — O que você acha que está fazendo? Eles não precisam saber dos nossos problemas familiares e, novidade, irmãzinha, você não vai morrer se ficar um segundo sem mencionar a Lauren para Deus e o mundo, nós sabemos o quanto você a ama.

— Pessoal, isso não é necessário. Fui eu que perguntei a ela, Kyle, peço desculpas por me intrometer em um assunto particular de vocês — disse Camila, tentando recuperar o bom clima de antes.

— Não precisa se desculpar, Camila. Eu que peço desculpas, a todos vocês — disse Kyle, dirigindo-se aos outros três. — A minha irmã fez muito mais do que apenas responder a pergunta que você nem fez, na verdade. Ela às vezes passa dos limites. — Fuzilou a irmã com o olhar.

— Camila tem razão. Vocês ainda estão desestabilizados pelo morte de seu pai e isso pode gerar certos conflitos, mas porque apenas não mudamos de assunto, o que acham? — Ali falou, olhando carinhosamente para Camila, que moveu silenciosamente os lábios em agradecimento.

— Esplêndido! — Ally ergueu as mãos no ar e as balançou em sinal de alívio e ironia.

— Claro, porque não falamos do casamento de vocês então? — Michelle sugeriu com um sorriso enigmático e presunçoso no rosto, olhando para os noivos.

Camila engoliu em seco; preferia o assunto anterior. Ela sorriu amigavelmente para Michelle, apesar de, no fundo, querer beliscar os mamilos da morena de olhos azuis.

Os cinco passaram a conversar sobre o casamento que aconteceria em breve. Ali falava com empolgação, Ally e Kyle ouviam atentos e interessados. Michelle fingia muito bem o interesse. E Camila havia se distraído com a moeda que a morena movia entre os dedos e achou estranho tratar-se de uma americana, um dólar, mais especificamente.

No entanto, o que realmente a havia deixado inquieta e tomava conta de seus pensamentos, era de ser de Michelle que ela nunca tinha ouvido falar, e não de Lauren.

Ainda na mansão Jauregui, o celular de Robert Turner, que observava de longe os cinco jovens conversando, tocou no bolso interno de seu paletó, fazendo-o abandonar seu posto e dirigir-se ao jardim da mansão, onde teria mais privacidade para atender o chamado.

E então? — A voz do outro lado da linha questionou ansiosa.

— A etapa dois da fase Cheshire foi concluída com sucesso, podemos dar continuidade à Operação Ruína das Patas Sujas. A fase De volta para o Kansas começa amanhã.


Notas Finais


Link da música: https://www.youtube.com/watch?v=QhIfoTLzwe4

Então, quando vcs virem um ou mais asteriscos após uma palavra durante o capítulo, será pq eu não conhecia tal palavra ou expressão e pq algumas pessoas a qm eu perguntei tb n conheciam e, como eu sou mt legal, vou deixar o significado delas nas notas finais para quem tb n sabia.

*E-mail já existia em 1999, porém, eu não tenho certeza se já era possível enviar imagens por ele ou não nessa época, eu pesquisei, mas não achei nenhuma informação específica sobre isso. Se alguém souber, me avisa aí, por favor.

*ICQ é um programa de comunicação que tinha naquela época, tipo o MSN, só que foi o primeiro desse tipo de programas.

*Nave central é um termo arquitetônico que designa a parte central de uma igreja, catedral e afns, é onde as pessoas costumam se sentar para assistir à missa, culto, etc.

*Abayas são vestidos pretos de manga comprida e longos, longos mesmo que vão até o chão, usados pelas mulheres no Oriente Médio, em alguns países seu uso em público é obrigatório.

E ah, esses que aparecem na mídia do capítulo são o Ali, o Robert e o Kyle, respectivamente. E se n conseguirem ver a imagem inteira, pode ver por aqui: http://imgur.com/a/jxntY

E é isso ai, pipous, espero que tenham gostado. Até mais, mozões ✌💙


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