História Cuida Dela - Ela

David P.O.V

Fazia 3 meses que eu a amava à distância. Ver fotos dela, conversar por telefone e FaceTime me fazia sentir como uma criança pobre que via um brinquedo caro atrás da vitrine. Estávamos no mesmo barco do sentir, vivendo horas exaustivas de distância um do outro que tornavam mais difícil ainda nosso encontro.

Uma chance apareceu no mês anterior, quando fui convocado para jogar com a seleção brasileira em Pernambuco contra o Uruguai. Mas não foi preciso muito esforço para percebermos que um encontro não seria possível já que eu estaria com a seleção o tempo inteiro. Então permanecemos cada um no seu lugar, eu na concentração, e ela se preparando para um show do Jorge e Matheus que teria em São Paulo no mesmo dia do jogo. Saber que estávamos no mesmo país e não nos veríamos era pior ainda, mas não havia outra opção.

Seguimos então cada um com sua noite. Na minha o começo foi promissor, com gols de Douglas Costa e Renato Augusto dando um gostinho de uma possível vitória fácil em cima do Uruguai, mas depois Cavani e Suárez aproveitaram falhas minhas na defesa para conseguirem um empate que mais teve gosto de derrota. E mais uma vez me vi protagonista de um jogo vergonhoso para a seleção, e então o público brasileiro já sabia exatamente quem culpar.

Me familiarizei com o sentimento que veio logo depois do jogo, era o mesmo que eu havia sentido após o jogo contra a Alemanha. Eu não culpava a torcida brasileira pelo ódio contra mim, no momento até eu mesmo me odiava. Reconhecia que havia falhado nos dois gols uruguaios. No primeiro, deixei Cavani livre de marcação para superar Alisson. No segundo, errei na linha de impedimento e não consegui travar o chute de Suárez. Por fim, levei um cartão amarelo e estava suspenso para a partida contra o Paraguai. A noite não poderia ter sido pior.

Quando voltamos para o hotel me deparei com o que já esperava na internet. “Parecia que o Brasil ia ganhar, mas tinha um David Luiz no caminho” – dizia o título da notícia de um dos maiores sites esportivos do Brasil. Não me incomodei em clicar e ler o que eles haviam publicado, nada poderia ser pior do que eu já estava sentindo. No twitter eu era o assunto mais comentado do país e um dos internautas escreveu: “O David Luiz está com 100% de aproveitamento. Perdeu todos os lances até agora”. Outro internauta respondeu o tweet dizendo: “Pior que o David Luiz é quem escala o David Luiz”. Era o suficiente por aquela noite. Eu estava prestes a desligar o celular quando recebi uma chamada de Gabi no FaceTime.

Assim que atendi me assustei com o barulho que estava no local, ela ainda estava no show e filmou parte dele, depois foi para um lugar mais quieto.

- Que bom que você já está no hotel, estou te ligando porque minha vontade de ter você aqui comigo só aumenta. – ela disse. – Mas acabei de ver que vocês terminaram o jogo empatado, então fico feliz de você estar aí.

- E qual é o motivo da felicidade? – falei desanimado. – Não ganhamos o jogo.

- E nem o Uruguai ganhou, porque você estava aí para defender nossa seleção e impedir que eles fizessem mais gols.

O sentimento de culpa aumentou em meio peito e a raiva de mim mesmo veio logo em seguida.

- Você não sabe o que está dizendo... – falei.

- Amor, eu sei que não sou a mulher que mais entende de futebol, mas sei o suficiente para entender sua função como zagueiro.

- É mas essa função ultimamente não tem sido e eu nem sei se devo mais ser chamado de zagueiro. Eu deveria impedi-los de marcar mais gols mas na verdade facilitei o empate. – falei nervoso - Você saberia disso se não estivesse aí nesse show estúpido com esse cara!

Gabi não tinha ido sozinha para o show. Um tal de Matheus, que segundo ela era seu amigo de infância, mas que eu nunca havia visto, foi com ela e foi inclusive quem a convenceu de ir.

- Eu entendo se você tiver tido uma atuação ruim no jogo, mas não vem descontar em mim e muito menos nele. Você disse que estava tudo bem se eu fosse já que não tinha nada melhor para fazer.

- Pois é, Gabi. Está tudo ótimo. – disse impaciente. – Aproveite sua noite com ele, tenho certeza que será melhor que a minha. Você não dormindo com ele depois do show está tudo ótimo.

Não sei exatamente porque disse aquilo, mas quando percebi já tinha dito.

- Quer saber, não sei o motivo de te acharem o pior zagueiro no momento, mas você está me mostrando ser o pior namorado. Se você falhou como zagueiro essa noite, saiba que como namorado sua atuação está pior ainda. – ela disse nervosa - Você quer se sentir miserável por seja lá o que é que tenha acontecido nesse jogo? Então se sinta, mas eu não vou tolerar que você desconte em mim. Eu vou sim aproveitar a noite com ele, não sei o que vou fazer com ele depois do show mas tenho certeza que ele merecerá mais do que você. Boa noite, zagueiro. – ela pronunciou a última palavra com desdém e desligou.

A raiva que senti me fez jogar o celular longe e por sorte ele não acertou na parede e quebrou. Ótimo, era só isso que eu precisava para fechar a noite. Agora não só um país inteiro me odiava, mas minha namorada também.

No dia seguinte tentei falar com ela, mas ela não respondia ou atendia o celular por nada. Quis me dar um gelo por uma semana inteira e enquanto isso postava o máximo de fotos possíveis com o tal Matheus, que parecia mesmo ser íntimo dela já que na maioria das fotos e vídeos eles estavam na casa dela ou dele, juntamente com o restante da família. Ela sabia mesmo como me provocar, em todos os sentidos.

Tudo bem, eu sentia ciúmes do cara como sentiria de qualquer outra pessoa que tinha a sorte de estar com ela quando eu não estava, mas nada justifica o que falei para ela naquela noite. E ela sabia que o gelo que estava me dando me faria sentir arrependimento.

Depois de uma semana ela resolveu responder meu pedido de desculpas e voltamos a conversar. Ela estava feliz pois a família descobriu que o bebê que Ludmila esperava era um menino, e que Ludmila e Oscar decidiram nomeá-lo Caio, o mesmo nome que Gabi chamava o irmão desde que era pequena demais para conseguir pronunciar seu verdadeiro nome. Vê-la feliz daquele jeito foi o suficiente para me deixar feliz também, e eu percebi que o sorriso dela era meu favorito.

A vida continuou em Paris e no início do mês de abril minha mãe veio passar uns dias comigo para comemorar meu aniversário no dia 22. Apesar de eu estar feliz em tê-la comigo, depois de 3 meses sem ver Gabi minha mãe não era a melhor opção que eu tinha em mente para passar o aniversário comigo. Mas ela também serve.

Aproveitei a oportunidade para falar de Gabi. Para a minha surpresa ela se recordou da única vez que a tinha visto, há dois ou três natais quando eu e Oscar reunimos nossas famílias em Londres. Depois disso as duas ainda se encontraram mais uma vez, em um dos jogos da Copa quando nossas famílias combinaram de assistir juntas no estádio.

- Eu não lembro muito bem do rosto dela, mas lembro que ela era linda. – disse minha mãe enquanto almoçávamos. – Quando a conheci a primeira coisa que pensei foi: o David podia conhece-la melhor.

- Sério? – falei.

- Sim, eu lembro como ela era delicada e alegre.

- Mas na época eu estava com a Sara...

- Exatamente por isso. Você não devia estar com ela.

- Você ainda duvida do que eu sei o que é melhor para você?

Eu sorri.

- Como é mesmo o nome dela?

- Gabi. – respondi.

- Então é esse o nome que trouxe de volta esse seu sorriso?

- Como assim?

- Eu te vi recuperando aos poucos depois da Copa, mas sabia que você não estava se recuperando sozinho. Imaginei que teria alguém aqui por trás disso, mas não necessariamente que era uma mulher. Achei que fosse o novo time, o fato de estar jogando com o Thiago que é seu melhor amigo ou de estar fazendo novas amizades como o Cavani...

- Eu nunca sorriria assim por causa daqueles dois, que nojo! – fiz careta e ela deu risada. – Mas entendo o que a senhora quis dizer. Acho que foi um conjunto de coisas. Parece que Deus respondeu minhas orações durante aquele tempo difícil logo depois da Copa, e quis compensar. Agora estou em um ponto da minha vida que estou muito feliz, e a Gabi só é mais uma forma que Deus quis me presentear.

Minha mãe sorriu e passou a mão em meu rosto.

- Que bom te ver assim, filho. Eu só a vi uma vez e nem lembro do seu rosto, mas se ela está te fazendo bem assim já tenho motivos para gostar dela.

- Deixa eu te mostrar ela. – peguei o celular e abri no instagram de Gabi.

Os minutos seguintes seguiram com a minha mãe admirada com o tanto que ela era bonita e dizendo que fiz uma boa escolha. Depois mostrei algumas fotos e vídeos que tínhamos juntos e vi dona Regina assistir tudo com um sorriso no rosto. Ótimo sinal.

- Eu não acredito que você mostrou meu instagram para ela, que vergonha! – Gabi disse quando contei.

- Bom, eu queria ter mostrado você em carne e osso. Mas já que minha namorada não se esforça para vir me ver no mês do meu aniversário...

- Para de drama, amor! Você sabe que eu queria, mas não vai dar.

- Parece que você tá fugindo dela.

- Eu não estou. Você acha que eu não quero conhecer a mulher que colocou o amor da minha vida no mundo?

- Acho. – respondi e ela deu risada. – Você só pode gostar de me torturar, porque três meses sem te ver é mais do que eu achava que daria conta.

- Você consegue, eu acredito em você. – ela brincou. – Mas eu vou compensar todo esse tempo quando for aí.

- Gostaria de saber como, por favor.

- É impróprio falar. – ela deu um sorriso malicioso.

- Tá vendo? Isso é tortura! E você faz com a maior tranquilidade do mundo. – falei e ela gargalhou.

Ficamos um momento em silêncio enquanto eu tentava tirar todos aqueles pensamentos da cabeça.

- No que você está pensando? – ela quebrou o silêncio.

- Em você. Sempre. Ás vezes pelada, ás vezes não. Depende.

Ela riu sem jeito.

- Então quem está se torturando é você mesmo. – respondeu.

- Deixa eu postar uma foto nossa? – perguntei.

- Pra quê?

- Só para exibir o tanto que minha namorada é linda.

- Pode postar.

- Bloqueia sua conta no Instagram primeiro. – pedi.

- Porque?

- Primeiro porque vai aparecer gente te xingando nas suas fotos, segundo que muito marmanjo vai querer te seguir.

- Sim, senhor.

- É sério.

- Tá bom, eu vou bloquear daqui a pouco. Mas vê se posta uma foto bonita.

- Vou postar uma que você está sozinha então.

- Foi isso que eu quis dizer... – ela brincou.

Eu sorri, não pela brincadeira dela, mas por refletir no tanto que eu era sortudo em ter uma mulher assim. Talvez Oscar tinha razão quando dizia que eu não merecia uma mulher tão linda quanto a irmã dele porque segundo ele eu era o cara mais feio que ele conhecia, e ela a mulher mais linda que ele conhecia ficando atrás somente de Ludmila.

Foi exatamente por isso que assim que eu comecei a me sentir diferente em relação à ela, sabia que seria difícil conquista-la. Eu tentava fazê-la sorrir numa tentativa de conquista-la, mas quando ela sorria era eu que me apaixonava mais ainda. Então notei que eu nunca prestei atenção em nenhum sorriso antes até ver o dela. Que nunca quis tanto ter alguém comigo como eu a queria naquele momento.