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História Dallas - Dallas - capítulo 15


Escrita por: biancamota

Notas do Autor


acho tão legal vocês interagindo e comentando sobre a história, fico tão tão tão felizzzzz :)

Capítulo 15 - Dallas - capítulo 15


Gabby - capítulo 15  19/04/2019 

Era quinta. Uma semana depois de ter surtado com o Tobias no restaurante da Marny, a poucos dias de surtar se Caleb viesse me perguntar de novo quando a gente iria sair e algumas horas antes de descobrir que Tiffany era a vaca mais vaca do mundo inteiro. 

Acordei, abri a janela do meu quarto e entrei no banheiro para me arrumar. Já tinha me acostumado com essa rotina, mesmo que contra minha total vontade. 

–Bom dia! –Winnie falou, toda sorridente. Sorridente demais. 

Pensei se dava tempo de fingir que tinha esquecido de fazer xixi, voltar para o banheiro e passar mais alguns minutos lá, até estar cem por cento acordada, mas então lembrei que havia tentado isso, na segunda, e ela entrou junto comigo. Não havia jeito de escapar daquilo. 

–Bom dia, Winnie. –arrastei meu pés até a cozinha, enquanto ela abria as janelas da sala. 

Era assim todas as manhãs, agora. Eu abria meu quarto, seu corpo se esgueirava para dentro, sua bunda se sentava na cadeira à minha frente na cozinha e sua boca comia qualquer coisa que fosse considerada meramente perto de um café da manhã. 

Todo dia. 

–Você tá com cara de quem ouviu uma música da Lana Del Rey. 

–Admirada? –me sentei na mesa, depois de pegar duas tigelas, um cereal e o resto do nosso leite. 

–Não; totalmente depressiva. –antes mesmo que pudesse piscar, ela estava mastigando. –O que aconteceu? 

Dei de ombros. Mas aí lembrei o quanto isso a irritava. 

–Só tô com sono. –o que não era mentira, mas também não era total verdade. 

A questão era: minha mãe estava chegando em casa todas as noites, às sete horas. Todas as noites. Aí assistia TV, ou ia para o seu quarto, ou ficava cantarolando pela casa. Distraída. Mais distraída que o normal. Geralmente quando tinha um novo Call, ela virava mais agitada, ansiosa, divertida. 

Ali, era totalmente o oposto. E eu estava, de verdade, aterrorizada. 

–É a sua mãe, né? Ela tá estranha. Mas não esquenta com isso. –Winnie fingiu não notar meu olhar perplexo. –Esse cereal é novo? Porque não tá muito crocante, não. 

–O que você sabe sobre a minha mãe para falar desse jeito? –o tom saiu grosso e ríspido, de um jeito que não queria parecer. 

–Ei, calma aí, garota. Vamos mudar de assunto, tá bom? –suas pernas se ajeitaram de uma forma totalmente inapropriada na cadeira. –Por que você vai sair com o ruivo sem graça? 

Quase joguei minha colher na sua testa. 

–Meu Deus, Winnie, a gente já discutiu sobre is... 

–Bom dia, meninas. –minha mãe saiu do corredor vestindo um top de ginástica e uma legging de cintura muito alta. Estava, tipo, linda pra caramba. Como se tivesse perdido uns seis anos em apenas uma noite. 

–Bom dia, Sra. Douglas. –até o tom de Winnie não parecia tão confiante perto daquela cena. 

–Você sabe que eu não gosto que me chame assim. –mamãe pegou uma banana na fruteira, depois de ter amarrado o cabelo. 

–Eu sei sim, Sra. Douglas. 

–Eu sou solteira, Winnie. Solteira. Sra. só se usa quando a pessoa é casada!   

Minha amiga se levantou e colocou o pote na pia. Ela nunca fazia isso; no fundo, deveria ser para impressionar minha mãe. 

Eu realmente não tinha controle nenhum naquela casa. 

–Você vai sair? Quer uma carona? Eu ia a pé para escola, mas, se quiser que te leve em algum lugar de carro... 

–Eu sei dirigir, Gabrielle. –minha mãe riu, de forma natural. Como se não fizesse... bom, eu nem lembrava a última vez que tinha saído para a escola com ela acordada. –E vou correr, então não acho que um carro seria muito útil. 

–Ah. Tá. –coloquei meu próprio pote na pia e olhei o relógio na parede. –Eu vou indo, então. 

–Sim. Eu te acompanharia mas... –ela coçou a cabeça. 

A gente não tinha aquele tipo de relação. De andar de mãos dadas para escola, contar segredos, trançar os cabelos. Seria completamente estranho se ela me acompanhasse.  

–Tá tudo bem. Eu gosto de ir sozinha, pra pensar. –peguei a mochila e coloquei no ombro direito, sem nem olhar para seu rosto. 

Meu Deus. Quando, na vida, aquela mulher havia saído de casa sem maquiagem antes? Seu rosto parecia tão... limpo. 

–Olha aqui, vocês duas, um dia a gente vai ter que fazer terapia em família. Se vou tomar café todo dia aqui, precisamos nos entender. Ter um clima que não faça meu cereal voltar para a boca. –Winnie se desencostou da bancada e nos encarou. 

Ninguém ia lembrá-la que nunca chegamos a convidar sua presença aqui. Achava que, no fundo, a família dela era um pouco ferrada também. Não sabia. Nunca tinha feito perguntas pessoais, porque ela parecia fazer o suficiente por nós duas. 

–A louça é sua hoje. –murmurei, já abrindo a porta. 

–Por que? Foi minha ontem! 

–Se limpar tudo, faço panquecas pra gente amanhã. 

Nem vi sua careta. 

–Você é tão... Argh. Tá, vou lavar. 

Claro que ia. E claro que as panquecas não iam acontecer. 

–Tchau, Gabrie...

Nem ouvi o final. Fechei a porta antes que realmente pudesse ouvir minha mãe, a rainha do “Acordo Depois do Meio Dia”, se despedir de mim as sete e meia da manhã antes de ir para escola. 

Winnie tinha razão. Aquela mulher estava estranha. 


 

Eu caminhei até a escola, naquele dia, determinada a realmente esquecer que minha vida era complicada.

Ainda estava indignada com a cara de pau de Tobias em falar tudo aquilo para mim, como se o mundo girasse ao seu redor. Claro que eu tinha aceitado sair com Caleb por causa dele. Claro que, quando o garoto me convidou, pareceu a oportunidade perfeita para mostrar o quanto eu estava indiferente. 

Mas, droga, ele não precisava jogar na minha cara o quão patético tinha sido essa minha jogada. 

Não era como se eu realmente fosse em um encontro com aquele desperdício de neurônios. Só queria que Tobias largasse do meu pé de uma vez, para que eu pudesse superá-lo.

Não tinha dado certo. Agora, eu só me sentia patética e infantil quando via ele, e ainda tinha vontade de correr para seu colo e beijá-lo até perder o ar. 

Droga de hormônios. 

 

As dez e quarenta da manhã, eu caminhava para o refeitório, no intervalo das aulas, quando notei que algumas garotas estavam me encarando muito fixamente. Resolvi ignorar. Eu simplesmente não tinha acordado com saco para lidar com qualquer uma de suas intrigas de como eu deveria estar usando o tamanho de sutiã errado ou tinha amarrado meu cabelo no estilo da moda passada. 

Entrei no refeitório de queixo erguido. Apesar de me sentir um lixo, não planejava me arrastar por aí e ser vítima de pena. 

O salão era grande e bem iluminado, com várias janelas de vidro que permitam a entrada do sol quente de Safford. As mesas, todas redondas e roxas, abrigavam dezenas de alunos, todos barulhentos e irritantes. 

Fazia semanas que eu lanchava sozinha. Tinha uma mesa, bem no canto perto da máquina automática de frutas ao lado do banheiro, que ninguém sentava. Tinha virado o meu espaço. Nem os menos populares arriscavam olhar na minha direção, porque eu era definitivamente “território proibido” para amizades, designado por Tiffany. 

Não que me importasse. Na maior parte dos dias, eu pegava um caderno e desenhava, ou escutava música até ver que todos já estavam caminhando para as aulas. 

Aquele dia não planejava ser diferente. Eu já estava com meus fones de ouvido, pegando uma maçã, quando senti alguém parado atrás de mim. 

Demorei o máximo que pude até me virar. Naquela sexta feira, particularmente, eu tinha acordado sem disposição para o mundo. 

Tiffany e Lea estavam de braços cruzados uma ao lado da outra, perto demais para que eu conseguisse fugir. Usavam seu uniforme roxo e laços de cabelo combinando, e deram um passo para o lado, para ficar na minha frente, quando tentei contornar seus corpos magros.   

–O que vocês querem? –perguntei, com meu melhor tom de indiferença.

Quer dizer, não podiam ter escolhido outro dia para me encher? Qualquer outro. Eu já estava visualizando um final de semana pacífico e solitário, e tinha me determinado a não adicionar nada à minha lista de motivos para ter dor de cabeça.   

–Olha, Gabrielle, a gente até tentou te avisar sobre as regras… –os olhos de Tiffany se cravaram em mim de uma forma que me assustou. 

Argh. Eu ia ficar tão feliz em socar aquele rosto perfeito dela.   

–E você segue fazendo merda atrás de merda. –Lea balançava a cabeça ao seu lado, concordando. 

Ai, sinceramente… Ela que escrevesse uma carta de reclamação e mandasse para minha casa. Só queria comer e voltar para minha vida patética até que me mudasse novamente -o que eu esperava que acontecesse em breve. 

Tirei os fones, sabendo que aquilo não ia terminar tão cedo. Só então que percebi que todo mundo estava em silêncio, esperando o show. A escola inteira -menos Tobias, percebi com uma rápida olhada em direção a mesa que costumava sentar -nos encarava em espanto e expectativa. Como se algo gigante fosse acontecer ali. 

Será que tinham sido avisados sobre alguma coisa, e eu não? Era a cara dela ter criado um evento no Facebook informando que ia me humilhar publicamente. 

Quer dizer, se tivesse que dar uns puxões no cabelo daquela vaca, faria sem remorso, mas hoje… Eu só queria voltar a dormir. 

-E ninguém mais te quer aqui. -Tiffany frisou, batendo as unhas de gel no próprio braço. -Sinceramente, você planeja fazer o que? Sei que sair com Tobias te deu um pouco de… esperança, eu acho. Mas, se toca, não tem espaço para você nessa cidade.  

Meu coração, de repente, estava martelando na cabeça.

Eu estava tão cansada dessa merda. Os dramas adolescentes dessas crianças pequenas que estudavam comigo era demais para lidar, às vezes, e… 

Argh. 

-Ai, vê se cresce, pelo amor de Deus! -falei, um pouco mais alto do que planejava. 

Tentei desviar de novo. Sair dali. Eu era melhor que aquilo, não precisava ficar aturando aquele discurso patético. 

-Como é que é? -Tiffany parou bem na minha frente, quase esbarrando o corpo no meu. Filha da… 

Foi como uma gota d’água para que explodisse. Quer dizer, sinceramente… Eu não queria merda nenhuma a ver com ela! Nem com ninguém. Não entendia todo aquele ódio que a garota sentia de mim, e tinha cansado dos seus comentários escrotos e maldosos. Não era possível alguém falar tanta merda sem escutar nada em troca. 

-Que inferno, garota! Qual o seu problema comigo? Tobias é todo seu, tá? Pode ficar. Pode ficar com a merda da escola inteira, com a cidade toda. Não quero nada disso.  

Minha pernas ficaram bambas com a adrenalina. Eu queria xingá-la de tudo que já tinha escutado a minha vida inteira, quebrar seus dentes. Mas estava tentando respirar fundo, pensar um pouco mais racionalmente. 

Um mês para formatura. Eu não podia quebrar a cara de ninguém nessa altura do campeonato… Mesmo que quisesse muito.  

Ela tinha atingido um tom de vermelho que beirava a histeria. Nunca tinha visto uma veia da testa saltar tanto, prestes a explodir. 

–Meu problema, é que você e a vagabunda da sua mãe não pertencem a nossa cidade!  –ela gritou. –Você vai contar para todo mundo por que vive se mudando? Quer que eu conte? Ou a gente devia ir perguntar direto para a Lane? 

Desgraçada! Como que ela… e… 

Argh!!! 

Eu estava a poucos passos de espumar. Sem brincadeira. Nunca tinha sentindo tanta raiva na minha vida, e tinha certeza que minhas unhas estavam prestes a furar a palma da minha mão enquanto fechava os punhos com força para evitar voar em cima daquela menina. 

-Você não sabe nada sobre a minha mãe. -falei, com os dentes tão fechados e apertados que duvidava que alguém além dela tinha escutado. 

Todo mundo estava nos olhando. Todos. Sentados em suas cadeiras, os estudantes de Safford High School pareciam apavorados e interessados ao mesmo tempo. 

Eu queria matá-la. De verdade. Acho que nunca tinha sentido um ódio tão puro antes, mas meu corpo tremia e a cabeça latejava pela ansiedade de fazê-la sofrer. 

Nojenta. Quem aquela garota pensava que era para falar alguma coisa da minha mãe? Ela não sabia as merdas que tínhamos passado, para eu ter que ficar parada escutando aquela… mimada xingar a gente.  

-Sei que ela já teve uns… olha, chutando assim, eu diria sessenta namorados. Acho que nem você sabe, não é? -Tiffany estava com sangue nos olhos. -Você pretendia contar para o Tobias? Que já tentaram tirar a guarda da sua mãe umas três vezes, porque ela não consegue manter as pernas fecha… 

Não deixei que terminasse. Dei um tapa tão forte no rosto dela, que o som ecoou no refeitório inteiro. Eu a odiava. Com todas as minhas forças. Queria arrancar seu cabelo direto da raiz e xingá-la até que estivesse implorando para que eu parasse. 

Tão rápido quanto minha palma a acertou, empurrei seu corpo com força até que caísse no chão. Aí, o mundo ao redor passou como um borrão. 

 

Vaca. Como achava que podia falar aquelas coisas sobre a minha mãe? Eu devia ter socado aquela cara patética dela! Argh. Sentia a raiva tremer meu corpo, prestes a pular em cima dela de novo. 

Muitas pessoas vieram correndo para amenizar a situação. Dois jogadores de futebol agarraram Lea, que me chamava de louca, enquanto outro levantava a Tiffany, parecendo uma criança pequena.

O sangue escorrendo no canto do seu lábio era muito pouco. Queria fazê-la engolir tudo que tinha dito e mais umas verdades sobre princípios e educação. Quer dizer, quem eram os pais daquela vaca? Eu precisava pessoalmente lhes dizer que tinham feito um péssimo trabalho. 

Mas não deu tempo. Tão rápido quanto meu movimento de estapear seu rosto, alguém segurou meus braços e começou a me arrastar dali. Observei os alunos, todos antes quietos, se levantarem em espanto, falando sobre tudo. 

Tiffany estava chorando. E berrando. Dois garotos do time de futebol seguravam seus braços, enquanto tentava correr na minha direção, sem sucesso. Bem feito, vadia.  

Ainda queria socá-la até que não sobrasse resquícios do seu nariz perfeito, mas não era burra de voluntariamente entrar em uma briga na escola faltando pouco mais de um mês para minha formatura. Estava satisfeita em sair dali com meu rosto intacto, também. Ela tinha tido o que merecia.

E como sabia aquelas coisas? Será que tinha alguma coisa a ver com o comportamento bizarro de mamãe? Ela agora tinha saído por aí contando para toda vizinhança sobre a nossa história?   

Ah, merda. Se Tiffany sabia, quer dizer que Nanny sabia, o que significava que a droga da cidade inteira já tinha noção de quão complicada era nossa vida. Perfeito. Porque eu já não tinha absolutamente nenhum motivo para odiar minha atual situação.  

Assim que portas do refeitório se fecharam atrás de mim, tomei consciência das mãos fortes que me agarravam. Tobias. 

No corredor vazio, ele me olhava com uma expressão tão preocupada que partiu meu coração. Estava vestindo uma blusa branca e uma calça jeans preta. Lindo até morrer. Lindo em níveis astronômicos. Lindo pra... 

Ah. Será que ele tinha escutado tudo? Será que agora sabia o quão patética era minha vida e quão ferrada minha mãe era? Eu… 

Não saberia lidar com o desprezo de Tobias. Era demais para mim.  

–Você tá bem? –suas mãos chegaram perto demais, então encolhi meu corpo para o lado contrário. –Eu… desculpa, só cheguei agora. Não… Você tá bem, Gabby? Queria estar lá. Eu teria, sei lá, mandado ela calar a boca antes. Sinto muito por… 

Eu não aguentava mais. A carga emocional para morar em Safford era grande demais, instável demais. Estava tão cansada de tudo. 

De gostar tanto de Tobias, me preocupar com o futuro, trabalhar para sustentar a minha própria mãe e ter que aturar aqueles adolescentes nojentos e seus dramas. Não conseguia mais lidar com Nanny e seus abraços grudentos e perguntas pessoais. 

Eu estava doendo, de verdade, por dentro. Tão esgotada de lutar contra meus sentimentos e ser empurrada para meus limites, em todas as direções. E a raiva… Como Tiffany tinha descoberto aquelas merdas? O que a minha mãe estava fazendo e falando por aí? 

Quem ela achava que era para chamá-la de vagabunda? Qual era o problema com aquela garota? Como se eu, pessoalmente, a tivesse feito tão nojenta e mal amada que não conseguia ter a atenção que queria. 

Argh. Eu só queria minha cama. 

–Eu tô bem. Você não… Não tem que se preocupar comigo. –comecei a me afastar cada vez mais do seu corpo. 

–Mas... 

–Não, não, Tobias. Você não tá entendendo. Não quero que se preocupe comigo. –caminhei alguns passos em direção a porta de saída daquele andar, mas ele vinha logo atrás. Desgraçado. –Pode… Só finge que eu não existo, tá? 

A raiva ardia no meu sangue. Não dele. Mas de estar aqui, sendo gentil. Será que não dava para perceber? Eu falava errado? 

Não aguentava mais ficar perto dele! Porque era tão... bonito e... e tudo! Nunca poderia competir com o que sentia por ele. E doía muito. Saber que nunca encontraria alguém como Tobias Trenty, e que teria que deixá-lo para trás mesmo assim.

Que uma parte de mim concordasse um pouco com Tiffany.  

–Para, Tobias! Eu quero ficar sozinha. –minha voz saiu alta e incrivelmente irritada. 

Estava prestes a chorar. E eu nunca chorava. 

–Ei, Dallas, é só a Tiffany sendo idiota. Ninguém realmente liga para as merdas que ela fala. Não define quem você é ou... o que eu acho de você. –ele coçou o pescoço, naquele tique nervoso de quando estava envergonhado. 

Parei um pouco antes de chegar na porta e me virei na sua direção. 

–Tobias! –berrei. Seus olhos se arregalaram, mas não o impediu de continuar a falar. 

–De verdade. A gente pode ir ali agora e você volta a quebrar a cara dela, se quiser. Tranquilo. Eu não vou julgar. Você ganha a briga tranquilamente. Só… quero saber se você vai ficar bem.  

Fechei a mão ao redor da maçaneta. A minha cabeça latejava, de uma maneira incontrolável. Minha pulsação estava tão acelerada que a veia do meu pescoço saltava e estava literalmente doendo, tamanho o esforço. Eu odiava estar tão vulnerável. Prestes a surtar novamente.  

–Sai daqui! –bati o pé no chão, para enfatizar. 

Estava cansada. Enjoada. De saco cheio. Qualquer expressão ridícula que sinalizasse o quanto queria simplesmente... me mudar! 

–Não! –Tobias bateu o pé no chão também. 

Inferno!!!!!!!! 

–A Tiffany tem razão, Tobias. Eu vou embora, logo. E aí vai passar tudo, você vai me esquecer, e a gente não vai ter significado merda nenhuma na vida um do outro. É bem melhor assim. A gente... não combina. –apertei o rosto, porque minha garganta estava doendo daquele jeito de quando se engole o choro. –Não gosto de você, então não tem porque... Não vai acontecer. Pode voltar para os seus amigos. 

Ele parecia tão triste. Quase decepcionado. Seus olhos azuis me encaravam com tamanho pesar, que não me surpreenderia se eu começasse a chorar a qualquer momento. Não aguentava mais. Gostava tanto, tanto, dele… 

Não dei tempo para ouvir sua resposta. Abri a porta com toda a força de vontade que ainda tinha e corri o caminho todo até em casa. Estava me agarrando ao pensamento de que tudo ia ficar bem.  

Infinitamente bem, no momento que eu me mudasse. 


 

Quando entrei em casa, duas lágrimas já estavam rolando pela minha bochecha esquerda. Foi uma sensação diferente. Horrível. 

Parei por um segundo e pedi para que, pelo amor de Deus, Winnie não entrasse ali. Para que ninguém entrasse. Porque... cacete, eu só queria ser muito menos complicada. Só queria não ter que ser... daquele jeito. 

Todas as pessoas da cidade estavam falando sobre aquilo. Todas. E eu estava me sentindo tão suja, envergonhada e cansada que, em proporções reais, nem imaginava o quanto aquilo podia significar. 

Só queria me mudar. Bem rápido, de preferência.

Ainda com lágrimas salgadas ridículas no rosto, peguei meu aparelho de som, todos os CD’s que já havia escutado, e me deitei no tapete da sala enquanto soluçava. 


 

Minha mãe chegou depois do segundo CD, quando tudo o que restava da minha crise existencial eram olhos vermelhos e inchados. 

Me sentei no chão e observei seu caminho da porta até a cozinha e até mim. 

Ela tinha escutado sobre minha briga. Eu tinha certeza. Parecia olhar para todos os lados, sem encontrar meus olhos, envergonhada.  

–Olha, Gabrielle... –suas pernas se abaixaram até que estivéssemos quase da mesma altura. Ainda usava a mesma roupa que de manhã, como se acabasse de voltar da academia. 

–Não, mãe. Não precisa disso. Eu já tô bem. –balancei a mão pra enfatizar. 

–Mas.. 

–Mãe! Não precisa. 

–Gabrielle, deixa eu... 

Meu sangue já fervia de novo. Por que, depois de dezessete anos, justamente quando eu não queria, ela insistia em conversar? 

–Olha aqui. A gente vai se mudar, não vai? Provavelmente nesse mês ainda. Por que não na semana que vem? –apertei os dedos no tapete. –Então não tem porque falar nada. Vamos fingir que não aconteceu. 

Ela abriu e fechou a boca algumas vezes, com os olhos arregalados. 

–Você quer... simplesmente ignorar? –parecia muito surpresa. 

–Sim. É o que nós fazemos de melhor, não é? –balancei a cabeça, porque não queria entrar naquele assunto. Não ali. Não hoje. –Mãe, de verdade, vai ficar tudo bem. Vamos nos mudar e aí... já vai ser coisa do passado. 

–É isso que você faz, sempre? –sua mão foi na boca, aterrorizada. –Você... começa tudo de novo? Mas e seus amigos? 

–Que amigos? 

O que tinham feito com aquela mulher? 

–Os amigos que você faz. Vocês, tipo, não mantêm contato? Como trocar número de telefone ou essas coisas? 

Ela sentou, com uma expressão estranha pra cacete. 

–Tá tudo bem? –vi sua cabeça balançar. –Hm, tá. Eu não tenho telefone. E também não tenho amigos. 

Era uma frase muito estranha de se dizer. Muito. 

–Você não tem... Ah, meu Deus, Gabrielle. O que aconteceu com você? –preferi não responder essa. –Nem a Winnie? 

Bom, eu considerava a Winnie como... uma pulga, talvez. Ou um carrapato –ainda que ela fosse do tipo mais pulante do que grudenta. Era algo com que eu tinha que conviver, mas não precisava gostar. 

Só dei de ombros. 

–E aquele garoto? O bonito e alto. Ele não é seu ami... Bom, ele não é alguma coisa sua? –seus olhos não me encaravam, em momento algum.  

Tobias. Como ela sabia de Tobias? 

–Não, ele não é nada meu. Menos que nada. –comecei a me levantar. –Olha, mãe, não sei o que você esperava mas...

–Ele parece muito legal. O garoto. A Winnie também. Quer dizer, a Winnie é legal. Por que você não é amiga deles? –sua cabeça parecia pensar mais rápido do que eu era capaz de responder. –Você tem algum problema, Gabrielle? É isso? Tem... medo de conhecer as pessoas? Pode conversar comigo, vou ouvir. 

Puta merda! Eu não…

Aquele realmente não era meu dia. Estava com os limites tão extrapolados, que… 

Não dava para ignorar. Estava com tanto ódio… Dela, da nossa situação, de Tiffany, de gostar tanto de Tobias…  

–Se eu tenho algum problema? Você tá zoando comigo? 

–Não! Eu.. Tô falando de verdade. Os dois parecem tão interessados em tá com você que pensei... 

–Ah, pensou que o problema fosse eu? 

Estávamos as duas sentadas no chão, agora. Eu a encarando, ela olhando para nenhum ponto em específico. Eu alterada e falando alto, ela confusa e mal falando. 

–Não, Gabrielle. Não desse jeito. É só porque fiquei sabendo que você teve um encontro e aí... Achei que tava dando certo, sabe? Com você. Mas... 

Meu corpo tremia de raiva. Muito raiva. Raiva acumulada de anos, de séculos, da merda de outras vidas. 

–Dando certo? Como você espera que dê certo, se a gente só se muda? Quer saber se tenho um problema? Bom, eu tenho um. Eu o chamo de “mãe”. Acho que você conhece esse. 

Quis me levantar e sair dali, mas... Ela era tão egoísta! No único dia, talvez o primeiro em alguns anos, onde eu estava realmente mal e só queria ser deixada em paz... Esse dia era o que escolhia pra vir perguntar pela primeira vez dos meus relacionamentos? 

–Ah, claro! Ponha todos os seus defeitos sob minha cul... 

–Ah, foda-se! –me levantei. 

–Gabrielle! –meu punho estava doendo, de tanto ser fechado. Mamãe parecia prestes a ter um infarto. 

–Olha, eu tô cansada, tá? –meus ombros pesavam. –Vou para cama. Acho que... acho que vou parar de ir para escola, também. Semana que vem podemos nos mudar, não podemos? Eu não ligo de me formar em outro lugar. 

Não valia a pena. Quer dizer, não só discutir com ela –o que definitivamente era a última coisa que precisava nesse momento –mas também enfrentar aquela porcaria de superação, de mostrar para Tiffany que não tinha me abalado e conversar com Tobias para convencê-lo de que eu não era tão idiota. 

Tinha me abalado. Eu era idiota. Então por que tentar fingir? 

–Não, Gabrielle, volta já aqui! –sua voz tinha passado de chocada e fraca para irritada e muito alta. 

Nesse tempo, eu já estava no corredor. 

–Eu tô falando sério, não vira as costas para... 

–Mãe! Por favor, me dá um tempo!

Bati a porta com toda a força que meu enorme braço de quem nunca tinha levantado peso podia conseguir. 

–Nós não vamos nos mudar, Gabrielle! –nesse patamar, a vizinhança toda já podia estar ouvindo. 

–Ah, pelo amor de Deus! –eu estava berrando de volta. Como uma descontrolada. Porque só queria pegar a cabeça dela e jogar na... 

–Abre essa droga de porta! Você não... 

–Por que você não me deixa em paz? Por que tem que... 

–Abre a porta! 

–Não, porque você é egoís...  

–Eu arrumei um emprego! Arrumei um emprego, Gabrielle! –com essas quatros palavras, meu pulmão pareceu vazio demais para continuar berrando. 

Puta. Merda. Ela não... 

–Arrumei um emprego, faz uma semana. –quase podia ver a cena: seus braços apoiados no batente da porta, seus olhos fechados, os ombros indo para baixo. –Eu ia te contar, mas... 

Queria parar de ouvir. Queria virar, pegar todas as minhas roupas, e entrar no carro para mais uma cidade. Para longe daqui. Para longe da realidade onde minha mãe tinha um... 

Ai, meu Deus. Como ela podia ter um emprego? Aquilo era... 

Bom, aquilo não era. Não podia ser. 

–Abre a porta? –meus braços se tencionaram, como se decidem antes da cabeça sobre o que deveria acontecer. –Por favor? 

A maçaneta girou mesmo antes de eu piscar. 

Minha mãe estava exatamente na posição que a tinha colocado na minha mente. 

–Você pode, por favor, me ouvir por dois minutos sem... sem me odiar? –meu coração doeu. Fisicamente falando, doeu de verdade. 

–Eu não odeio você, mãe. 

Aí seus olhos azuis faiscaram e, de repente, estavam cheios de lágrimas. Lágrimas de verdade, por causa de mim, sua filha, pela primeira vez na vida. 

–Você odeia sim. Ou pelo menos deveria. Eu... eu me odeio, Gabrielle. Eu... –sua voz oscilou. Pelo amor de Deus, aquilo ali não era minha mãe. 

Peguei seus braços e a conduzi para o conforto da minha cama, como se fosse uma boneca frágil e delicada. 

–Você... hm. –foi o máximo que consegui formular. 

Eu não sabia ficar nessa situação. Nunca tinha aprendido a consolar minha mãe, mesmo depois de todos aqueles anos vendo-a sofrer. Eu só ignorava, e esperava que juntasse seus cacos. 

Ali, parecia real demais para que eu deixasse passar. Seus ombros subiam e desciam em um choro compulsivo, arrasador. As lágrimas pingavam em rios, molhando sua legging, e ela parecia tão vulnerável que me obriguei a passar os braços ao seu redor, com medo que quebrasse a qualquer momento.  

Ficamos assim, por um tempo. Ela parecia tentar se controlar para recobrar o controle. 

–Não vamos nos mudar. –foram as primeiras palavras, que soaram mais firmes do que achei que ia ser capaz. –Vamos ficar aqui. Não quero dizer para sempre, mas... Eu renovei o contrato de aluguel, com a Fran. Estendi para um ano. Você vai se formar nessa cidade. Vamos.... bom, ficar. 

A soltei muito rapidamente e dei graças a Deus por estar sentada na cama. Não achava que meus joelhos iam aguentar o que ainda vinha em frente. 

–Por que? Por que... aqui? 

Merda. O que aquilo significava? Quer dizer, o que tinha acontecido com ela? Será que achava que agora tinha encontrado o cara certo? Eu não era capaz de criar esperanças como aquelas. Ia quebrar meu coração. 

–Tô trabalhando. Você sabe que tenho um diploma em Educação Física, que nunca chegou a valer merda nenhuma... Mas tava caminhando pela cidade esses dias e tinha essa academia, então resolvi entrar e eles estavam realmente precisando de gente. Não sei... só aconteceu. 

Ela me encarou. De verdade, pra valer. Até o fundo da minha alma. 

–Então não vamos nos mudar. E eu realmente sinto muito que você queira sair correndo dessa vez, porque não vai acontecer. Cansei de fugir, Gabrielle. –se minha mãe falasse que estava prestes a me matar, talvez eu teria ficado menos apavorada. –Não vou.. Nada de namoros também. Quero ser uma pessoa melhor. Uma mãe melhor. 

Ai, meu Deus! Que merda era aquela? 

–Mas você... Não pode fazer isso comigo. Quer dizer, eu aturei tudo até agora. Tudo! Todas as vezes que... Tudo que... E agora que preciso sair, tenho uma desculpa para me mudar, você quer ficar? –minha voz estava fraca e aterrorizada. 

Eu tinha sido horrível com Tobias. Arruinado todas as minhas chances de ter amigos, dado na cara de uma das garotas mais populares da escola… Quer dizer, tinha assinado minha carta de desistência social completa naquela cidade!

–Sim. E quero que você arranje amigos. Que se divirta, que saia com adolescentes normais... Não precisa trabalhar mais, também. Meu salário vai cobrir nossas despesas. –ela botou as mãos nas próprias pernas, decidida. –Estou fazendo o mercado. E... acho que amanhã nós podemos almo... 

–Mãe! –minha cabeça estava latejando. –Eu... você não pode desorganizar toda a minha vida do dia para noite, sem me avisar. Isso é tão... Você é tão... 

–Cansei de ser uma mãe de merda. –seus olhos se arregalaram. –Ah, cacete, esqueci que preciso controlar minha boca. 

Controlar a... Ela não podia estar falando sério. Eu me recusava a acreditar. 

–É assim que vai ser agora. Eu sou a mãe, você a filha. Nada de namorados para mim, todos do mundo para você. Sem nos mudar. Sem fugir dos problemas. Só... 

–Se você falar foco, fé e força, me taco da janela. 

–Você não morreria. 

–Segurando uma faca perto do pescoço, sim. 

Estava tão irritada, magoada e simplesmente... inacreditada, que fiquei quieta. Por vários segundos, foi simplesmente ela sentada na minha cama com determinação no rosto, e minhas mãos formigando para estapea-la. 

Às vezes, por mais cruel que aquilo pudesse ser, eu realmente a odiava. 

–Vou pedir comida. –seu corpo levantando fez minha cama gemer. Provavelmente de alívio, porque minha cama me entendia. –E aí vamos conversar sobre aquela vadia que estava te xingando hoje de manhã.

As lágrimas de antes tinham se transformado em um olhar superior e autoritário de mãe. 

Nem todos os CD’s do mundo iam me fazer dormir naquela noite. 

 


Notas Finais


não posso exigir que vocês comentem, favoritem ou deem notas, mas tipo, (me ajudem!!)


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