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História De luz e de sombras - Prelúdio XI: À beira dos acontecimentos


Escrita por: Ninlil

Notas do Autor


Aquilo que foi e que será, e até mesmo aquilo que é, não somos capazes de saber, mas quanto àquilo que devemos fazer, não apenas somos capazes de saber, como também o sabemos sempre, e somente isso nos é necessário.
Leon Tolstoi

Capítulo 20 - Prelúdio XI: À beira dos acontecimentos


Fanfic / Fanfiction De luz e de sombras - Prelúdio XI: À beira dos acontecimentos

 

Leia tamborilava os dedos na mesa ao ar livre, um pouco afastada do caminho mais utilizado pelos moradores de Paideia. O dia começava a raiar e o mundo despertava: o modo de vida jedi eram madrugador e cheio de atividades. Todos se encontravam recém-despertos, após uma noite de descanso renovador. Mas não Leia.

 A princesa não conseguira dormir. Rolara na cama a maior parte da noite, entre os gemidos sonolentos de Han ao seu lado, os braços e pernas dele sempre a procurando, como a ter certeza que sua mulher não havia se afastado. E ele tinha razão em assim agir, pois por muitas noites, pelas preocupações, Leia perdia o sono e saía da cama, ficando a andar em círculos pensando, procurando a solução das questões que a deixavam desperta.

Ela se impacientou e pôs-se de pé.

 - Leia, de novo, não... Venha para cama. Não vai adiantar nada ficar acordada e amaldiçoar a garota.

  - Luke não me manda nenhuma imagem, pensamento... ele se fechou. – não ousou tentar contatar seu filho. Ele raramente fazia algum contato mental, sempre hermético para ela – Meu irmão é... bom demais. Não quer enxergar o que as pessoas podem realmente fazer. Confia demais. Sempre foi assim. E aquela mulher...

   - Ela realmente é uma encrenca. Mas talvez seja o que o garoto precisa: uma boa confusão em sua vida jedi correta. Ei, não me olhe assim! Ele é um homem, caramba!

      Leia desfez o semblante fechado e suspirou.

      -  Não falo de confusões amorosas ou corações partidos... Temo realmente por ele. Aquela mulher pode vir a destruí-lo... não sei como, mas eu sinto.

  Han se sentou na cama e puxou Leia para si, colocando-a em seu colo. Desejava distrai-la, pois conhecia muito bem qual caminho que sua mulher trilharia em suas preocupações. Beijava seu pescoço enquanto ela continuava a falar.

  - Ela é neta do Imperador e está aqui, em Paideia. Apenas esse fato já é um desastre. Existem vários setores no governo central que esperam um deslize de Luke para exigirem o fechamento de Paideia. Se ela e meu irmão mantiverem algum tipo de relacionamento, pode suscitar uma reação de ódio de várias facções oficiais e ocultas: pró-império, anti-império, seguidores de Vader, ... uma lista sem fim.

  - Você sobreviveu no Senado mesmo quando souberam quem é seu pai.

  - Não sei até quando. Você não imagina o jogo político que tenho que fazer para que me vejam a senadora e não a filha de Vader.

 - Ninguém saberá da garota, meu amor. – mordeu-lhe a orelha.

  - Até quando? Não há segredo que dure para sempre. – levantou-se no momento que Solo se insinuou mais com as mãos – Não. Não tenho cabeça para isso.

 Solo levantou as mãos em sinal de impaciência. Lá iam de novo, discutir.

  - Desisto...! Você, melhor do que ninguém, que esta academia sempre esteve em risco e será a garota ou qualquer outro motivo para que queiram fechá-la e dar um fim nos jedis. – balançou a cabeça – Luke tem ciência disso. A questão é outra. Você não gosta dela. Se não fosse isso, estaria a arranjar saídas para defender o que eles tem... ah, me esqueci que estamos conversando sobre um relacionamento deles... que não existe! Pelo menos não ainda.

 - E não gosto dela mesmo! E já disse o porquê. Eu...

 - Eu sei, eu sei. Você sente. – puxou-a de novo – Leia, respeito suas intuições. Não entendo da Força, mas convivo com você e Luke há anos.  Vocês não acertam toda vez... e acredito que você está misturando sua antipatia com a garota com o que você sente.

  - Você não consegue entender. Ela... ela tem alguma coisa... perigo. – fez uma careta e saiu do colo dele.

  -  Não devia estar falando comigo e sim com Luke. Vá, diga isso a ele. Ah... – apontou o dedo indicador para a princesa – Posso ver que não tem coragem! E por quê? Porque não deve ter fundamento para o que diz e seu irmão te colocará em seu lugar apenas com um olhar. Aliás... se Lore é tão perigosa, deveria estar preocupada antes com nosso filho, que não passa de uma criança e que está andando com ela lá naquela colina. Pensou em Ben alguma vez? Não... só está preocupada se Luke vai ceder aos encantos da garota.

  - Você está passando dos limites, Han.

 - Sim, estou, alteza.  Sempre passo do limite para você quando o assunto é Ben. Nosso filho...  nunca quer falar dele realmente comigo! Eu só soube que havia algo de errado quando Ben me falou da voz... e o caso do sufocamento daquele outro menino com a Força. Mas você, Leia, sempre foge quando quero saber mais! Não conseguimos nem ficar perto dele direito. Algo se perdeu, mas estou lutando para recuperar. E você? Você, não.

  - E finalmente você passou dos limites.

 Havia saído pisando duro, mudando de roupa rapidamente para ficar à espera de Luke do lado de fora, noite alta ainda.

 As horas passaram lentas e trouxeram a verdade que ela bem já sabia. Han tinha razão. Ela estava com ciúme... porém também temia por Luke. Não sabia como Lore se encaixava, se ela faria algo ou estaria no meio desse algo, todavia o fim era o mesmo, com Luke sofrendo. Não era uma visão;  mais se assemelhava com uma história vaga que ela já tinha conhecimento e que ainda não fora escrita.

Ben. Han talvez não entendesse. Ela amava seu filho profundamente e sofria com o distanciamento entre eles. Entretanto, existia algo em Ben que...  era Vader. Vader. Máscara. Não era difícil imaginar Ben com uma máscara. As imagens de Vader e Ben se propondo. Sabre vermelho. Alderaan destruído. Planetas destruídos. Balançou a cabeça com força.

Luke, Lore e Ben andavam em sua direção, o sol nascendo e iluminando-os às suas costas, produzindo um efeito brilhante em torno deles, inclusive em seu filho. Seu filho... iluminado. Ela engoliu em seco, emocionada. Tinha ciência que era um efeito natural do nascer do sol, porém foi tocada por aquela imagem e por todas as suas esperanças quanto às possibilidades luminosas para Ben.

 Leia abraçou o irmão rapidamente, embora o segurasse com premência. Trocou um olhar significativo com o jedi.  Ele exalava tranquilidade diferente, como alguém que houvesse sobrevivido a uma grande luta. Luke esticou os lábios em um pequeno sorriso, sem revelar nada e a senadora, suspirou, voltando-se para o filho para  lhe dar um beijo no rosto.

Leia observava seu irmão e a moça. Ambos vestiam trajes negros, sendo o de Luke a vestimenta completa de um jedi. Lore, porém, ostentava apenas a camisa e calças escuras folgadas, já que pertenciam a seu irmão.   As botas tinham sido recheadas de meias para não dançarem nos pés da moça. Também não era mais visível o pingente da Casa de Ren e o cabelo negro se encontrava preso em uma longa trança de raiz.

 A linguagem corporal deles indicava que existia uma cumplicidade, embora não formassem um casal de fato, intuiu ela. Plainava, porém, um certo constrangimento, talvez decorrente da própria cumplicidade. Algo muito sério deve ter ocorrido naquela noite, pensava Leia intrigada. Haviam retornado diferentes: Lore, sem aquela premeditação e agressividade elegante, uma certa leveza, porém com uma preocupação disfarçada dirigida a ele; Luke, com um grande peso oculto no coração sob sua expressão mansa, todavia com um carinho contido para com ela.

 As primeiras horas do dia. Sentados em uma mesa de madeira ao ar livre, perto de uma árvore. Younglings, padawans e membros de serviço já iniciavam suas atividades.

  - Onde estão papai e Chewie? – perguntou Ben, acomodado à esquerda de Skywalker.

  - Devem ter acabado de acordar e fazendo mais uma manutenção na Millennium Falcon. O hiperpropulsor  quebrou... de novo. – disse a princesa, balançando a cabeça irônica.

  Luke sorriu, cúmplice. Por um momento, ele lembrou aquele rapaz de Tatooine, pensou Leia, devolvendo-lhe o sorriso. Deu-se conta, então, que se encontrava sozinha no banco corrido, enquanto os três se achavam do outro lado da mesa.

Como uma família.

Seu sorriso se desfez. 

 Um ciúme e uma certa tristeza correram nas mãos cerradas que ela escondeu debaixo da mesa, enquanto percebia que se encontrava muito só sem Han. 

O menino pareceu captar as emoções da mãe e, rubro de vergonha, sentou-se ao lado dela. Leia passou a mão pelo braço de seu filho, distante.

  - Aqui estão os dois holopads com as informações. – Leia entregou ao jedi os aparelhos – Chewie reuniu o que pôde.

  Skywalker pegou os eletrônicos e inclinou-se um pouco mais para direita, a fim de que Lore, sentada ao seu lado, também analisasse os dados. Ela se curvou um pouco na direção dele a fim de ver melhor, concentrada no que enxergava nas pequena imagens tridimensionais. Próximos naturalmente, refletiu a senadora.

- Taxas de midi chlorians de cada prisioneiro. Sim, suficientes para usuários da Força mas poucos com o suficiente para treino como jedis. Dentre esses, nada de mais significativo, nada exorbitante. Os cativos dessas prisões poderiam passar uma vida inteira sem nenhuma manifestação da Força relevante, caso não fossem despertos.

  - Não estariam aptos para um exército treinados na Força? – indagou Leia.

 - Aptos... sim. Porém o treinamento jedi, fora algumas raras exceções, demanda muitos anos, dependendo da capacidade e vontade de cada ser. Além do mais, instrutores versados na Força deveriam já existir. Sua existência e atuação na Força causaria perturbação suficiente para ser percebida. – Luke franziu o cenho. Não se encontrava com seus poderes na plenitude... será que tal ação na Força lhe escapara?

   - Talvez também não fosse... prático. – falou Lore, ainda olhando para aqueles números

   - Não ser prático? Um exército sempre é uma arma de poder.

   - Para que um exército dessa natureza, princesa? Lutar contra quem? Olhe ao seu redor. Não há outra academia jedi a não ser esta e ainda no início com alguns aprendizes. Skywalker é o único jedi no momento. Muito mais fácil, menos oneroso e menos chamativo seria reunir um exército de não-sensitivos.

    - E isso podemos ter com os desaparecidos da época da Batalha de Endor. Muitas ... crianças, como eu. – Ben fraziu a testa – Como escravos desde lá.

  - Não escravos, Ben. Também um exército de escravos se faz complicado em treinar e controlar. Se agruparam um número substancial de crianças parece lógico que elas tenham sido aliciadas e convencidas de um ideal a ser defendido desde sua tenra idade até a fase adulta. A longo prazo, um exército leal a uma causa é poderoso e digno de se respeitar.

 Leia se viu obrigada a concordar.

 - Isso é possível... e há mais formas de realizar do que possamos imaginar. Sim. Um ponto para começar, embora em um espectro vasto, mas algo para começar. – voltou a tamborilar os dedos na mesa, o olhar ao céu, refletindo - Ainda temos, porém, esses sensitivos à Força agrupados nos cativeiros que encontramos, o que deve ser apenas uma amostra de prisões ocultas pela galáxia. Isso não pode ser ignorado. Se a função deles não é formar batalhões guerreiros, para que, então.

   - Com taxa alta ou baixa de midi chlorians, não deixa de ser muita midi chlorian junta. Talvez seja isso que queiram. – disse Ben, distraído.

 Os três adultos se entreolharam, com pensamentos similares. Voltaram seus olhares para o menino, espantados. Ben levantou os ombros, como se a ideia dele fosse óbvia.

  - Luke, isso é possível? – Leia estava confusa – Estarem interessados diretamente midi chlorian?

 - Possível... sim. Experiências genéticas... estudo das midi chlorian e seu potencial... talvez até a descoberta de mais uma utilização para elas. É um universo de possibilidades.

   Ao longe, surgiu a figura de Han acenando para Leia, chamando-a com insistência. Ela já se aprontara para ir sozinha quando lembrou da conversa entre ela e seu marido mais cedo. Trincou os dentes. Não tivera o impulso natural de chamar seu próprio filho para acompanhá-la e dar um bom dia ao pai. Desejava Ben ao seu lado, porém, ao mesmo tempo, evitava-o. Isso não era justo com uma criança... com seu filho. O problema gritava dentro dela. Nem Ben, nem Han tinham responsabilidade sobre isso. Odiava ficarem realmente magoados um com o outro – o que ocorria quando o assunto era Ben.

Han e Ben nem mereciam tal postura dela. Mas era tão difícil... tão difícil.

 E, fosse o que fosse... ela amava o filho.

  - Venha comigo, Ben. Vamos ao seu pai. Você ainda não falou com ele hoje .

Fez um carinho no rosto da criança, o qual se tornou iluminado ao toque. E ambos seguiram para ter com Solo.

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 Lore descansou os holopads na mesa vagarosamente enquanto refletia. Ben a colocara a par de todo o assunto discutido enquanto desciam a colina. Piscou demoradamente. Parte de sua mente não tivera êxito em se concentrar totalmente no agora.

 A existência que ela conhecera até então terminara. Sem vozes, sem prisões, sem a constante raiva que a movia. Todos aqueles anos se foram em apenas... uma noite. Estava ali, como que jogada em uma rotina de pessoas normais, em outras vidas, fazendo parte em outras tramas e aceita... por Luke? Não haviam trocado nem um olhar mais demorado quanto mais palavras naquela noite face à urgência de cuidados que ele precisava e por Ben não sair de perto nem por um minuto do tio.  E logo que Skywalker um pouco se refez, afastara-se para meditar durante a noite.

Ela sentia o olhar dele. Mordeu a parte interna do lábio inferior.  A emoção dos fatos da noite passada já tomava outros tons que só o tempo era capaz de tingir.  Lore sabia que Luke tinha ciência de tudo agora, do que ela fora, do que fizera. Provavelmente já visualizara a ponte psíquica, entendera sua dinâmica e, talvez, começara a desfazer o vínculo. Tudo se conduziria à normalidade de sua vida como jedi. Ela seria encarada como uma experiência, um aprendizado, uma missão arriscada que fora concluída com sucesso. E assim deveria ser. Isso era bom. Ele seria livre dela. Lore compreendia... era lógico que dessa forma se desenrolasse. Quando o encarasse, no olhar de Skywalker se faria brilhar a chama do agradecimento polido, a cortesia distante, a serenidade sobre-humana de um jedi, a compaixão destinada a todos os seres, a compreensão e o perdão dos atos dela. Ele lhe ofereceria um lar em Paideia, pois ela nada possuía e não havia lugar para ir. E assim tudo terminaria de um modo pacífico, equilibrado e benevolente dos jedi, pensou ela, resignada.

Lore levantou o rosto e fitou Luke. A mansidão no mar dos olhos dele, um carinho tão grande que cintilava naquele azul. A compreensão se fazia presente, todavia humana, íntima, empática, de alguém que também já trilhara um caminho difícil e compartilhava do peso da bagagem trazida dessa estrada. Não havia superioridade ou distanciamento e sim mais proximidade do que poderia se imaginar. Muito próximo. Junto dela. Ao lado dela. Com ela.

O semblante de Lore se iluminou.

Um padawan adolescente pigarreou, chegando-se ao mestre jedi educadamente. Conversou com Skywalker sobre questões do dia-a-dia da Academia. O rapaz olhara rapidamente para a moça, achando-a atraente, todavia sem uma reação maior. Lore baixou os olhos, satisfeita. Guardara seu poder com êxito. Em sua nova vida não havia mais necessidade de usá-lo. Não mais. Nunca mais.

Quando o aprendiz se retirou, Luke voltou-se para Lore e lhe deu um pequeno sorriso antes de sua expressão ficar mais séria.

  - Precisamos descobrir quem são três homens que estão aqui detidos.  Sua resistência às ações da Força é surpreendente, como Leia comentou. Existem alienígenas e a animais resistentes à Força, mas nunca tomei conhecimento de um ser humano imune.

  - Humanos resistentes à Força existem há muitas gerações. Eu sei quem são. – disse Lore, juntando as mãos, agora focada – Todo homem da Casa de Andhera não pode influenciado pela Força, em nenhum viés.

  O jedi franziu o cenho.

  - Uma mutação nas midi chlorians em sua família...?

 - Não sei se é uma mutação... ou uma intervenção propositada de algum ser ou até mesmo uma outra forma da Força se expressar. Em minha linhagem, há muitas gerações, segundo o que as instrutoras que me... – interrompeu-se, meneando a cabeça – Os  homens Andhera são sensíveis à Força de uma forma singular, criando uma espécie de bolha, escudo em torno de si, tornando-se inatingível a alguma ação da Força através de outros seres. Não poderia adivinhar seus pensamentos, paralisá-lo ou qualquer outra ação que envolva a Força.  Lutaria com o sabre com eles como um homem comum, sem a interação com a Força, Luke.

 Ele gostou de ouvir Lore chamá-lo pelo primeiro nome.

  - Momentaneamente, enquanto estiver perto de um Andhera, lutando ou não com ele, eu perderia o contato com a Força.

  - Sim.

  - Em que distância produzem essa... bolha, esse vazio da Força?

 - Um metro de diâmetro em média, tendo o Andhera como centro. Você estaria sem defesas.

 O jedi alisou a barba cerrada em seu queixo, refletindo.

 - Esse efeito de vazio é similar ao que é provocado pelos Ysalamiri. – ante o olhar intrigado dela, explicou – São um tipo de lagartos arbóreos que criam esse espaço sem a Força. – suspirou – Deparei-me com eles logo depois da Batalha de Endor, em minhas viagens. Foi uma surpresa bem desagradável. Não conhecia sua existência até então. Mas como sabe que aqueles homens são Andhera.

 - Esses três eram da guarda no castelo em Hok onde fiquei por anos. – semicerrou os olhos com pesar – Não podiam ser influenciados por mim também.

 As imagens da mente de Lore chegaram voluntariamente ao jedi. Ele emergiu em cenas dela enquanto menina e adolescente, em tentativas frustradas de exercer seu poder de atração e controle naqueles homens no castelo, – vinte soldados, no total da guarda – em suas tentativas de fuga. Outras sequências de eventos se sobrepondo. Um planeta invadido e destruído por bandidos, um mar de mortos que uma Lore já moça atravessava acorrentada aos seus novos algozes, junto com outros sobreviventes também feitos sobreviventes. Homens vestidos de vermelho escuro eram colocados de lado, como cativos especiais e, entre eles, os três que vieram para Paideia. Em outra cena, enxergou o que ela vira, o trio colocado em celas perto dela, isolando-a da Força, impedindo-a de exercer sua influência em qualquer carcereiro.

  E o restante, os outros dezessete andherianos?

  - A função desses homens se restringia à guarda do castelo?

   Lore respirou fundo.

  -  Segundo minha instrutora, até o começo do Império, quando a Casa de Ren era influente através dos Andhera, os homens exerciam o papel de guarda-costas exclusivo das mulheres de minha linhagem, quando eram... negociadas como esposas ou amantes de um homem poderoso envolvido nesse... enlace. Fazia parte do contrato da Casa de Ren com os interessados, fosse em um casamento ou em um relacionamento, que esse guarda acompanhasse a mulher. Também tinham como função mantê-las sob controle, em sua missão. Foram designados como Cavaleiros de Ren.

Skywalker entrelaçou os dedos. Os holocrons não acusavam a existência dos Cavaleiros de Ren. Bom, não eram os únicos holocrons, pensou ele. Talvez esse dado tivesse sido armazenado em outro ainda não achado. Ou até essa situação ter escapado do Conselho Jedi. Fosse como fosse, a simples existência desses homens era preocupante. Poderiam ter influenciado vários acontecimentos de forma anônima, enfraquecendo jedis com sua presença. Poderiam ter contribuído em mortes de jedis apenas se aproximando deles.

  O Imperador os conhecia e tinha ciência de suas habilidades. E por isso destruíra a Casa de Ren quase em sua totalidade. Não se daria ao luxo de ficar à mercê de um exército de homens que tinham o poder de anular seu poder na Força. Afinal, os jedis haviam sido exterminados em sua grande maioria no Grande Expurgo. Os que poderiam porventura ter sobrevivido não justificavam manter um exército de Andheras.  No entanto, conservara uma pequena reserva para seus fins, para uma utilidade circunstancial, como usara com Lore.

 Onde estariam os Cavaleiros de Ren restantes? Teriam sido capturados e prisioneiros?

  - Os três guardas não a protegiam apenas, Lore. Tinham a ordem para me matar. Contraditório com a missão que outorgaram para você.

   A moça meneou a cabeça, tensa, ao imaginar Luke morto.

  - Não sei quais os comandos que obedeciam, a não ser me vigiarem. O que posso dizer é que a lealdade deles para a Casa de Ren é absoluta. E quem controlava a Casa até alguns anos era o Imperador. Tive conhecimento da morte de Palpatine mas nada mudou em meu treinamento. O palácio continuou a ser mantido após a queda do Império.

 - Alguém assumiu o lugar do Imperador nesse plano, em você prosseguir... Mas ainda não entendo seu último encarceramento.

- Pensando que eu continuasse com missão sob as mesmas ordens, apesar da troca do mandante., não vejo tão estranho destruir Hok e prenderem-me em outro cativeiro - Lore deu um triste sorriso irônico – Sua vida foi estudada, Luke, para eu me adequar ao que você... apreciaria.

   - Ainda não compreendo.

  - Uma moça aprisionada e salva. Um toque dramático para compor minha  história. Para atingir a sua compaixão. – uma mecha se desprendeu do penteado e caiu-lhe no rosto. Ela a afastou prontamente para fitá-lo francamente –  Quem está comandando esse show de horrores deve ser tão ou mais cruel do que o Imperador. Todas aquelas vidas perdidas em Hok... todos os prisioneiros nada significam para esse ser.

 Luke se retesou. Aquelas mortes... tantas mortes para fornecerem um toque trágico em Lore para poder comovê-lo? A sordidez desse ato sombreou seu olhar. Indiretamente aquelas pessoas haviam perdido sua vida por causa dele.  Afastou os pensamentos que lhe vinham, focando na linha que surgia em sua mente. Um toque típico do Imperador. Ele seria capaz de assassinar quantos fossem preciso apenas para seu prazer em dar um toque refinado no enredo de Lore.  Contudo, esse novo ator, esse novo alguém que Leia sentira coordenar os eventos como um maestro precisaria de frieza e objetividade, de um resultado mais pragmático do que uma possibilidade de enfraquecer ele, Luke.

 O que resultara concretamente daquele massacre? O término da Casa de Ren, o sumiço de vários Cavaleiros de Ren, Lore presa, contida por três andheras, que seria resgatada mais cedo ou mais tarde... por Han, que já buscava cativeiros nessa época. Trazida para Paideia para cumprir o ordenado. Alguém imerso na Força, articulando a sequência de eventos teria capacidade de montar essa linha do futuro face aos fatos conhecidos.

Três anos de sumiço dos Cavaleiros de Ren. Presos ou preparados para um novo ideal, uma nova premissa, um novo senhor?

- Os Cavaleiros de Ren. – murmurou o jedi, deixando o som das palavras ressoar por um tempo, como procurando absorver-lhe a essência – Vinte homens cuidando de um castelo com uma prisioneira. Havia algum perigo eminente?

- Não. Hok dependia financeiramente do castelo... como também o temia. – Lore se perdeu em lembranças – Um lugar perdido, esquecido. Nunca houve alguma tentativa de invasão.

As imagens lhe vinham à mente de Lore naturalmente, o treino deles, sua postura, o fanatismo para com a representante da Casa, Weny Ren. Sua instrutora os desprezava, como a todos os homens. Encarava-os como lacaios e secretamente os temia, por serem imunes às artes da sedução, o que retroalimentava seu asco para encobrir seu temor. Tau We, por outro lado, os analisava com  objetividade e os apreciava por suas habilidades resistentes à Força. Tau We... mal tinha contato com aquela alienígena. Não sabia o que e quem ela era.  Só a via deslizar pelos cômodos, observando a tudo e a todos, como um fantasma a flutuar em seus gestos suaves.

- Uma kaminoana?

Lore piscou, retornando das recordações frente à pergunta de Luke. Percebeu que seus pensamentos voaram livres e o jedi captara as cenas do passado.

- Não sei o que é uma kaminoana.

- Geneticistas comportamentais à época antes do Império, especialistas em clonagem e experimentos.

Os dois trocaram olhares de entendimento. Midi chlorians atraíram Kamino e a presença de uma nativa daquele planeta em Hok indicava o enlace com o Imperador. Porém Skywalker sabia que Kamino fora totalmente destruído após a Batalha de Endor. Se Tau We não havia morrido na invasão do castelo, ela poderia estar em algum dos cativeiros espalhados pela galáxia.

Luke apoiou os cotovelos na mesa, juntando as mãos. O primeiro impulso seria ele mesmo sair em busca da kaminoana e dos Cavaleiros de Ren. As peças se mostravam pouco a pouco e havia a necessidade de juntar esse mosaico. Porém não seria viável no momento e direcionaria esse encargo para Leia e Han. Sentia que não deveria sair de Paideia, que sua presença era imprescindível ali para proteção de todos, apesar da localização de Paideia ser um segredo do qual apenas Leia e Han tinham acesso. Além do mais, desde que trouxera Ben para junto de si há cerca de dois anos, não mais realizara mais nenhuma incursão fora do planeta, pois acompanhava o sobrinho de perto e não arriscava a sair com ele de Paideia para não expô-lo aos fanáticos seguidores de Vader e outros grupos que odiavam o menino pelo o que ele era.

As rachaduras na barreira de proteção em torno do menino se faziam visíveis. O mal rondava Ben.  Ainda eram contornáveis, porém não havia como precisar até por quanto tempo. Seria obrigado a reforçá-la, direcionando mais fluxo da Força para resguardar Ben e, consequentemente, ele mesmo, Luke, ter seus poderes mais enfraquecidos.  Uma espada de dois gumes que no dia anterior já refletira. Existia aquela última e questionável opção: briseadh an anam, a quebra da alma. Opção...? Não. Uma derradeira alternativa, quando não houvesse mais saída.        

  Apertou as mãos. Não faria aquilo com Ben. O quadro da situação como um todo começava a clarear e esse ser que coordenava toda uma ação na galáxia provavelmente – pressentia fortemente – era o obsessor do menino. Identificado esse agente maléfico, as ações seriam tomadas. Era preciso aguentar mais um pouco. Se fosse preciso enfraquecer-se mais para fortalecer Ben... assim seria.

Tão mais fácil seria se optasse pelo Lado Sombrio... não existiram dúvidas ao que faria e nem restrições que o prenderiam. Só certezas... e paz.  Encontraria esse ser escuro rapidamente, como o fizera para ver os monstros de Lore. O mal sempre reconhecia o mal, onde quer que estivesse.

Cingiu ainda mais as mãos. Isso não era uma alternativa, nem que tudo estivesse a se perder. Não. Por ter conhecido tão intimamente a escuridão, sabia que não deveria ser uma opção. E justamente também por ter imergido nela, continuava a ser convidativo, o caminho das certezas inquestionáveis.

Estaria a ser tentado dessa forma para sempre? Talvez. E toda vez, a ponderação, a lembrança do que acontecera... e do que poderia ter acontecido.

Lore pousou sua mão no pulso humano de Luke e ele relaxou os músculos do corpo diante daquele toque suave, uma tranquilidade irradiando-se através daquele calor. Tudo se tornava tão claro quando em paz, como dizia Yoda. Todas as situações se assentavam, ordenavam-se como acontecia quando meditava. Os fatos isolados se revelam interligados, os detalhes ocultos pulsando para serem descobertos, uma grande teia se construindo com os fios cintilando, o mosaico confuso florescendo em lógica, espaços vazios a serem preenchidos. A Força corria nele de forma mais premente e ele se permitiu envolver mais intensamente.

- Sua prisão... Não recebeu nenhuma visita? Houve contato com alguém de fora do cativeiro?

- Não. Ficava praticamente o tempo isolada. Alguns contrabandistas e comerciantes de escravos passavam por lá, pelo corredor, negociando. Eu os via pela janela de minha cela. – piscou os olhos – Todos sombrios... gananciosos. Houve um, porém...

Luke a acompanhou nas recordações, entrando no ambiente sujo e escuro daquele cárcere, enquanto ela prosseguia.

- Ele era alto, muito alto. Não era humano, embora lembrasse um. Sem cabelos, muito branco... acinzentado.  Eu o vi de perfil e depois de costas. Não havia muita luz para enxergar sua fisionomia. – Lore se enrijeceu - Era sombrio também, mas... como se estivesse contido. –  franziu a testa e quedou a cabeça para o lado, esforçando-se para a imagem se tornar mais nítida na mente.

O jedi caminhou naqueles corredores, visualizando o ser muito alto, vestido com uma sotaina negra. As sombras emanavam dele, não avassaladoras e sim como um rastro, como se escapassem dele, encarceradas nele para que os outros não a pressentissem.

Aquele ser estancou subitamente, como se algo o interessasse. Girou o corpo e mirou na direção de Lore. Ele permaneceu estático durante um momento,  as faces encovadas, os olhos apertados, a boca franzida em um mar de rugas. Um sorriso cruel lhe rasgou a pele entre as sombras, de onde ela não o visse.

Todavia, Luke o enxergou bem de perto, analisando-o, captando-lhe a escuridão, reconhecendo aquele tom sombrio, a densidade do mal que o envolvia como uma marca inerente, orgânica, própria... sua identidade.

O nome dele pairava ao redor e o jedi pôde finalmente conhecer quem obsediava Ben, quem se achava por detrás da coordenação de eventos para a construção de um novo império, o inimigo saído das trevas.

Snoke.

Luke saiu das lembranças de Lore e exalou profundamente. Snoke. Agora o mal possuía um nome e um rosto; era palpável, visível... algo que podia ser combatido. Isso era muito bom. O pior adversário a enfrentar era o indefinível, o desconhecido. Porém assim seria para Ben nesse momento? Há dois anos ele se achava longe desse assédio e adquirira estabilidade e um pouco de felicidade. Tinha conhecimento que ele jamais se misturaria com todos. Ele nascera diferente, era um ser extraordinário e dificilmente os outros o aceitariam como um deles. Os outros aprendizes o temiam e admiravam-no ao mesmo tempo, causando um amálgama de emoções contraditório e excludente. Ben deveria aprender a compreender esse ódio e medo e resistir à admiração. Porém, mesmo com todas essas dificuldades, ele conseguia conviver e aprender a lidar com a diferença com a qual era tratado. Não se isolara. Enfrentava as dificuldades, era corajoso apesar dos medos que sentia.

Apesar de toda a maturidade que ele demonstrava, não passava de um menino de quase nove anos que fora perturbado por Snoke desde tenra idade. Que benefício se agregaria ele conhecer seu algoz agora? Era um rosto e mais nada no momento, sem nenhuma informação. Passível seria até de se tornar prejudicial o conhecimento antes do tempo. Aquele semblante povoaria os sonhos de Ben. O menino se veria com a sombra de Snoke em sua imaginação, tirando-lhe o pouco de paz que conquistara e desvirtuando seu foco do aprendizado, podendo causar uma desestabilidade.

Ouviu os barulhos de passos. Os três Solos encaminhavam-se em sua direção e seus olhos se fixaram automaticamente em Ben. Como sempre, aquele menino evocava em Luke um amor profundo, uma compaixão tão grande que o coração se apertava dolorosamente.

Sentiu que a mão de Lore, que continuava em seu pulso, pressionava-o, chamando-lhe a atenção. Luke a fitou e se deu conta que alguns pensamentos seus, enquanto ele se encontrava nas memórias dela, haviam escapado o suficiente para ela tomar ciência do contorno dos fatos acerca de Ben. Seus olhos verdes azulados exigiam urgência.

- Ele tem que saber, Luke.

- Ainda não.

- Não pode protegê-lo para sempre.

- Eu sei, Lore. Mas ainda está ao meu alcance mantê-lo em segurança.

- Você o enfraquece tirando-lhe a oportunidade de conhecer seu inimigo.

- Eu o protejo para que ele se fortaleça para enfrentá-lo quando a ocasião vier.

A expressão dela se contrariou, resistente à postura de Skywalker, e viu-se obrigada a se calar pois Leia, Han e Ben já se encontravam perto. Soltou o pulso de Luke e forçou-se a engolir seus protestos... por enquanto.

Solo se encontrava sério com a notícia que trazia. Entretanto não se eximiu de avaliar Lore, sua beleza agora discreta, e a postura mais íntima entre a moça e seu cunhado. Sorriu para si mesmo, feliz por Skywalker. Isso, garoto... Não é um mar de rosas, mas vale a pena... sim, vale muito a pena. Não a deixe escapar.

Os três recém-chegados sentaram-se em frente ao jedi e à moça. Leia se encontrava com a expressão pesada e foi direto ao ponto, colocando sobre a mesa um aparelho portátil de holograma na mesa.

- Deixei R2D2 e C3PO no Senado de prontidão para qualquer eventualidade, a fim que me mantivessem informada, já que não confio em quase ninguém em Coruscant. E, infelizmente, não poderia estar mais certa.

Han ligou o eletrônico e a imagem tridimensional rasgou o ar azuladamente, mostrando um grupo de seis homens vestidos de negro e com os rostos ocultos por máscaras e capuzes. Eles andavam por uma rua em uma pequena vila. Um deles retirou a máscara por um instante para calibrá-la e suas feições ficaram à mostra.

Lore arregalou os olhos.

- É um dos guardas do palácio de Hok, Luke.

- Cavaleiro de Ren. – murmurou o jedi.

O guarda repôs a máscara.

  - Estou com um mau pressentimento. – disse Han em tom soturno.

 O mascarado à frente do grupo empunhou um objeto cilíndrico e a luz vermelha iluminou o ambiente azulado.

A sombra rubra da lâmina do sabre de luz se refletiu na face estarrecida de Ben.

                                                          



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