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História De luz e de sombras - Prelúdio XX: Jedi


Escrita por: Ninlil

Notas do Autor


De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.

A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O este é meu norte.

Outros que contem
Passo por passo:
Eu morro ontem

Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
– Meu tempo é quando.

Poética - Vinicius de Moraes

* Este capítulo veio em substituição ao antigo que foi deletado há três dias. Achei necessário tal ação porque o anterior não expressava o que gostaria de ter escrito. Peço desculpas a quem leu o anterior e agradeço quando vier a ler esta nova versão, pois foram realizadas mudanças importantes. A quem não leu a escrita antiga, também agradeço a presente leitura.

Muitas partes do capítulo original foram mantidas e outras cenas foram incluídas. Nas que existiam anteriormente, foram inseridas e/ou modificadas partes importantes, as quais expressam a atitude e postura das personagens que alterei.

A cena do velório foi construída escutando a música Exit Music (for a film), de Radiohead. Sugiro, a quem se interessar, ler a citada sequência com essa música ao fundo.
Em 11/10/017, acrescentei alguns parágrafos na cena de velório - entre Luke e Lore, para expressar mais o luto de Luke.

Capítulo 29 - Prelúdio XX: Jedi


Fanfic / Fanfiction De luz e de sombras - Prelúdio XX: Jedi

 

Uma brisa desarrumou o cabelo dela, a mecha negra a lhe cair nos olhos.

Luke lhe afastou a madeixa do rosto suavemente, como sempre fizera naqueles meses nos quais viveram juntos. A longa trança repousava no ombro direito, deslizando em seu dorso sobre a eterna camisa escura. Ela trajava sua roupa negra, a de todos os dias, a vestimenta negra tão parecida com a dele.

Ele alisou seu rosto pálido; os lábios, antes róseos, agora sem nenhuma cor.  Mal sentiu a frieza nela, pois não havia mais calor nele. O sol cálido do meio da manhã não o aqueceu. Os raios luminosos lhe tocavam o rosto profundamente enrugado em torno de seus olhos azuis, sem lhe dar nenhum conforto.

A umidade do lago vinha com o vento brando. O penhasco à frente, a uma curta distância. À direita, mais ao longe, a colina. Naquele descampado, várias rochas inclinadas. Ali, quase em todas as noites, eles se encontraram, longe de todos, a ficarem a conversar ou apenas para ficarem lado a lado, deitados, apoiados nos pequenos rochedos.

Um deles seria sua lápide agora.

A cova estava pronta para receber o caixão com a tampa transparente. Era uma cápsula de hibernação existente na Falcon Millenium, flutuando a um metro e meio do chão com os suspensores antigravitacionais.

Esses detalhes passaram pela mente de Luke como se não existissem, pois ele só a via ali, sem vida. A dor de seus ferimentos no peito também mal era percebida. Pensamentos de seus ensinamentos jedi tentaram, em vão, confortá-lo para aquela realidade, que Lore agora se encontrava una com a Força, que ela estaria bem. Talvez até, em algum momento, seu espírito pudesse vir vê-lo. Talvez até já estivesse ali. Contudo, ele nada sentia... ele nada conseguia sentir. A Força não brilhava dentro dele. Ele estava só, como naquela época em sua juventude, em Tatooine, frio em frente a uma fogueira em cinzas.

O perfume dela não pairava mais no ar; apenas dentro dele, em suas lembranças. Só existira para ele... só ele sentira.  Ela passara em sua vida de um modo tão breve...  uma brisa vinda de longe por ele. Para ele. E que fora para longe novamente... por causa dele. As lembranças de um futuro não vivido com ela lhe causavam uma saudade dolorida.

Ele  segurou suas mãos, já tão geladas, tão brancas, tão rígidas. Tão macias quando  o tocavam no rosto. Tão firmes quando o seguravam pelo pulso, chamando sua atenção. Tão ágeis quando trançavam seu longo cabelo negro. Tão seguras quando manejavam seu bastão de luta. Tão habilidosas na arte da cura.

Aquelas mãos que o envolviam pelo pescoço para trazê-lo para si em beijos.

Um aperto dolorido no peito fez sua testa se franzir, todos os vincos em sua pele se aprofundando. Os lábios apertados, trêmulos. Um soluço contido. Ele meneou ligeiramente a cabeça para o lado, os olhos fechados com força, o coração batendo devagar, muito devagar, não suportando vê-la à distância de um abraço sem poder mais tê-la em seus braços. Não foi mais possível segurar o gemido que seu peito continha.

Cerrou os punhos, envolvendo as mãos dela nas suas.

Não. Não, tinha que continuar olhando para ela. Pois dentro em breve não mais a veria, a não ser nos seus sonhos.

Respirou fundo, a garganta travada e voltou-se novamente para ela.

Seus olhos azuis sem brilho se perderam no rosto imóvel dela. Franziu os lábios, uma revolta nascendo da raiva e morrendo na tristeza.  Não havia paz ali. A morte não trazia paz para quem se fora... e nem para quem ficara. Ainda eram visíveis os riscos mais pálidos em suas faces. Não houve como retirar as marcas de lágrimas já entranhados  no rosto dela.

Não havia como enxugar as lágrimas nas faces dele.

Luke se inclinou e pousou seus lábios embranquecidos nos dela, já sem cor. Pressionou sua boca na dela, um tremor naquele beijo, buscando, mesmo que com irreal esperança, um resquício de calor. Apesar de frios, ainda eram macios aqueles lábios que ele tanto beijara no pouco tempo que estiveram juntos.  Como... como eles se mantinham tão suaves mesmo na morte...?

Eu nunca vou te deixar, Luke.

Ele pressionou mais ainda os lábios de encontro aos dela, lágrimas escapando dos olhos fechados dele e caindo nas pálpebras cerradas dela, escorrendo em seu rosto pelo mesmo caminho que as dela correram em seus últimos momentos de vida. As lágrimas seguiram seu curso até as suas bocas unidas, umedecendo aquele último beijo.

Seu rosto se contorceu de dor enquanto o dela permanecia estático. Nunca mais... nunca mais.

Você me deixou, Lore. Você me deixou. Você disse que nunca me deixaria... 

Separou-se da boca dela, mas só alguns centímetros e encostou seu rosto no dela, agora molhado por suas lágrimas. Acarinhou suavemente sua face com a sua, a barba arranhar aquela pele tão branca. Ainda podia ouvir a voz dela, pedindo-lhe que mantivesse a barba quando, um dia, ele se encontrava pronto a tirá-la com a lâmina. Ainda escutava o suspiro de Lore. Ainda sentia seus dedos alisarem sua face, acarinhando-lhe a barba. 

Os choramingos de sua filha lhe chegaram como se viessem de muito, muito longe, junto com as palavras meigas e sussurradas de Leia, tentando acalmá-la. Sua irmã e Han se posicionaram um pouco atrás dele, com Ellin nos braços da princesa.

Ele se empertigou, afastando-se de Lore enquanto ficava reto na postura. No entanto, parecia ser ela a se distanciar dele naquele ato, à medida que Luke deixava de tocá-la e escutava Ellin a chorar.

Sua filha o chamava para a vida. Ela precisava do pai. E ele precisava dela. Ele estaria com ela durante toda a sua vida. Ele cuidaria dela. Todavia aquele instante, aquele instante congelado, era só dele... com Lore.

O aroma das flores silvestres enchia o ar. As pequeninas flores nasciam entre a relva alta em cores delicadas. Ele queria que fossem rosas, mas o tempo de rosas não existia mais. Não mais.

Han se aproximou, o rosto contrito, e tocou-lhe o ombro.

- Está na hora.

Luke assentiu com a cabeça. Lágrimas riscaram seu rosto silenciosamente.

A tampa do caixão se fechou.

**********************************

Atrás de uma das rochas, Ben se escondia.

Sentado, encolhido, os soluços infantis estrangulados na garganta, as lágrimas deslizando sem parar. Oculto na Força, vira seu pai passar perto dele pouco tempo antes, à sua procura, sem conseguir encontrá-lo.

Escutava o som dos resmungos de Ellin trazidos pelo vento. Levantou-se um pouco, a pedra grande a lhe ajudar no seu esconderijo. A uma distância considerável, viu seu pai e sua mãe com a bebê.  Afastado, sozinho, seu tio, todo de negro, de costas, os ombros curvados, a cabeça baixa ao lado do caixão.

Sentou-se novamente, encolheu as pernas e abraçou os joelhos. Não conseguia ver seu tio, não conseguia...

E nem ela.

Apoiou o rosto nas pernas encolhidas e tentou conter os soluços que o sacudiam.

Um grunhido baixo. A pata peluda e quente em seu braço. Içado no ar, logo se viu afundado em pelos, a quentura do corpo do wookiee o acolhendo.

Chewie sempre o encontrava.

 

*****************************************

Leia fechou a porta do quarto de Luke com cuidado. Retirara Ellin do colo dele e agora a tinha em seus braços a choramingar. Embalou a bebê para que se acalmasse e não fizesse barulho, pois finalmente seu irmão adormecera.

 Han entrou na sala da casa de Skywalker naquele instante. Despedira-se de Chewbacca, que partira para Kamino, a fim de deixar Tau We em seu planeta natal. Ben também lá estivera, abraçando silenciosamente o wookie e depois se recolhera na enfermaria, lugar onde se isolara desde antes do velório.

 A princesa olhou com ansiedade para seu marido e este balançou a cabeça negativamente.

 - Nada. Ele não fala nada. Nem com Chewie. Vim ver como você, Luke e Ellin estão e já voltarei para ficar com Ben. Ele não aceita nem que eu o toque. Pelo menos,  deixa que eu  fique perto dele.

  - Acha que ele pode...

 - Não sei, Leia. Por isso não quero deixá-lo sozinho por muito tempo.

Ela embalou Ellin , andando pela sala., pensando no filho. Balançou a cabeça, impaciente e fitou a sobrinha com preocupação.

 - O que ela tem?  Fizemos os exames básicos... e está se alimentando bem. Sempre irrequieta. Será que está doente?

- Deixe que eu troque a fralda dela.

 - Troquei há uma hora.

 - Esqueceu do quanto é capaz de sair desses pacotes de gente?

 Han pegou a neném e a colocou deitada de costas na mesa da sala, tirando a fralda, que era uma adaptação costurada de tecidos higienizados da enfermaria. Tudo destinado a Ellin era fruto de criatividade e habilidade manual do que se encontrava nos depósitos de Paideia.

 A princesa o observava em sua habilidade em cuidar da sobrinha, sem surpresa, embora admirada. Era quase inconcebível para qualquer um que não convivesse mais intimamente com Solo imaginá-lo em uma cena daquela natureza; todavia, Leia conhecia esse lado de seu marido... de quase trinta anos atrás. Han dividira com ela as atividades mais prosaicas em relação a Ben, quando este era pequenino. Seu filho fora um bebê inquieto, irritadiço e demandara tempo e paciência. Alimentava-o, limpava-o e brincava com ele com naturalidade e prazer, assumindo parte do trabalho de criar uma criança nessa tenra idade. Han deveria estar recordando daqueles tempos com Ben enquanto lidava com Ellin, pensou Leia saudosa e pesarosa.

- Nem com Luke fica tranquila! Ela pode estar com algum problema que não foi detectado pelos aparelhos da enfermaria.

 Ele terminou seu trabalho e deitou a bebê em seus braços, dando-lhe um beijo rápido na bochecha.

 - Ellin só se alimentou até agora de leite de bantha que Luke trouxe congelado de Tatooine. Esse leite azul... será apropriado mesmo para uma recém-nascida?

- Luke me disse que foi criado com ele desde que era um bebê e bebia dele até quando ficou rapaz. É muito procurado em Tatooine hoje em dia. Na última viagem que ele fez para lá... acho que há uns três anos, se não me engano, veio com um estoque enorme para os younglings. Ainda bem que sobrou quantidade mais que suficiente para Ellin.

- O garoto trouxe muito de Tatooine com ele. Parece que até a areia.

- Tatooine foi o lar dele... como Alderaan foi o meu. – disse, com um suspiro. Refez-se rapidamente das lembranças – O leite está bom, eu já provei, inclusive. Deve ser outra coisa. Precisamos de uma opinião médica.

 - Chewie está partindo agora para deixar a kaminoana em seu planeta e buscar R2D2 e C3PO no ponto de encontro. Ele demorará um pouco para voltar. Entreguei a ele a lista que você fez de apetrechos e alimentos próprios para um neném. Quando retornar, sairemos deste planeta e faremos outros exames nela.

 - Teremos que nos arranjar com o que temos aqui, por enquanto. Dei outra missão para Chewie. Levará mais tempo fora.

- Que missão? Leia, o que você está aprontando?

- Quando R2D2 se comunicou conosco dizendo que conseguiu se infiltrar em um cargueiro clandestinamente com C3PO para nos encontrar, mandei que travasse contato com alguns senadores e comerciantes que pensam como nós em relação ao que está acontecendo com a Nova República. Existem aliados... ! Eles marcaram, através de R2, um encontro com Chewie. Gravei uma mensagem para ser levada a eles.

 - Você...

- Quero montar uma resistência ao desmantelamento da República. Terá que ser algo organizado, clandestino e armado. Prevejo guerra no futuro. Snoke está pondo em andamento seu plano lentamente já há algum tempo, posso sentir...  

Solo fechou o semblante, furioso.

- Ele ainda se encontra anônimo, agindo nos bastidores. – prosseguiu ela, ignorando a desaprovação dele -  Acredito que o objetivo dele envolva toda a galáxia e, para isso, levará tempo para montar sua estratégia. Precisamos estar preparados. Temos tempo ainda para começarmos a nos organizar. Palpatine levou anos com seu plano para arruinar a República e construir o Império  debaixo de nossos narizes. Isso não pode se repetir.

- Você está organizando um grupo de resistência mesmo com tudo que aqui aconteceu?! Quando acabamos de enterrar Lore? Quando seu irmão está estranho, mal dá uma palavra e Ben se esgueira por todo lugar, se escondendo de Luke? Quando ele não quer explicar o que fez? Quando nosso filho precisa de nós?

- Agora somos considerados desertores, inimigos da República. É a hora perfeita para juntar quem acredita em nossas razões. Não posso deixar passar o momento.

- Como faz isso... alteza? – baixou o tom, pois vira que a bebê se assustara e que podia acordar Luke - Como pode pensar nessa maldita política enquanto estamos todos com uma bomba nas mãos? Uma, não... um arsenal! Temos que ajudar Luke, temos que cuidar de Ellin... temos que ter nosso filho conosco novamente!

 - Tenho que pensar na política porque ela é a organizadora da sociedade. É a política que permite delimitarmos o nosso modo de viver, colocando regras para serem seguidas... para se ter um norte até para alguns quebrá-las.

 -  Esses alguns que são marginais na sua querida ordem social a burlam porque são regras rígidas e tendenciosas, de acordo com cada governo que decide, em suas cadeiras confortáveis, qual a melhor maneira de se aproveitarem da lei.

 - Do que está reclamando? Agora somos todos desertores. Terá muito mais oportunidades de fazer seus contrabandos e ser aceito em nosso agora mundo clandestino. – o tom se tornou mais ácido - Terá um lugar aceito e legal na nossa ilegalidade.

 - Ah, sim...! Como nos velhos tempos da Rebelião. Sou aceito porque consigo o que precisam... sem perguntarem o como. Agora isso é considerado bom outra vez.  Vê como as coisas mudam?

 - Sempre um... salafrário!

 - Ah, está errada. Eu fui salafrário! Seria  um salafrário hoje se fizesse o que tenho vontade e ir embora.

 - Não seja por isso. Fico muito bem sozinha!

- Nós, os salafrários, podemos ser marginais no seu mundo perfeitinho, mas não abandonamos a família!

- Que ideia faz de mim depois desses anos todos? Pensa que não me importo? Fiquei com Luke o máximo que pude... mas eu vi nos olhos dele que desejava ficar sozinho com Ellin desde o enterro. Ele quer ficar só com a filha! Ben não fala comigo e não me quer ao seu lado, fugindo quando me aproximo. Faço o que posso! Mas não ficarei estática a sofrer com toda a situação e deixar de fazer o que devo fazer... onde eu posso fazer realmente alguma coisa.

Ambos se encaravam, furiosos e arfantes. Nesse silêncio, o choro da neném se fez ouvir e caíram em si, no absurdo que construíram naquele momento tão delicado.

Leia se controlou. Não era momento para discutirem esses assuntos... essa peleja que sempre existira por debaixo do amor que sentiam um pelo outro e pelo amor por Ben. Han não se adaptara aos tempos de paz, sob a luz da legalidade. Não tinha lugar naquele tipo de vida... no tipo de vida dela.

Han pendeu a cabeça com um grande suspiro. Amava aquela mulher. Desde Hoth, quando fugiram do Império após a batalha na neve, ele admitira a si mesmo que desejava ficar ao lado dela. Contudo, os anos de convívio mostravam as suas gritantes diferenças. Ele fizera um grande esforço e até os dois encontraram um equilíbrio bizarro naquela situação, firmada com o nascimento de Ben. No entanto, o tempo era implacável e não sabia se o amor que os dois sentiam seria capaz de suplantar as suas diferenças de pensar.

Encarou sua esposa. Ela estava sofrendo por debaixo de toda a sua empáfia e senso de dever. Leia necessitava de algo onde pudesse ter controle, onde suas atitudes pragmáticas devolvessem resultados concretos. Isso lhe dava a sensação de segurança. Ela tomaria essa atitude mais cedo ou mais tarde, organizar a resistência... e se ocupou rapidamente com esse plano também para fugir da conversa que ambos, ele e ela, evitavam desde que chegaram em Paideia naquele dia horrível.

 Os dois se entreolharam, com o mesmo pensamento.

 - Han...

  - Nosso filho... nosso filho.

 Ele acomodou Ellin, que ainda se mostrava irritadiça, em seu braço esquerdo, enquanto abraçava sua mulher com o direito.

 - Ele queria salvar meu irmão... e salvou... de uma forma terrível.

 - Ben poderia ter detido Lore sem... ter feito o que fez, Leia. Não podemos fechar os olhos para isso.

 -  E ainda há o que aconteceu com os Cavaleiros de Ren. Sei que há alguma coisa que Luke não nos contou na época. 

 - Eu sei.

- Estou a pensar, pensar no que podemos fazer e não consigo achar uma solução.

 - Ele é nosso filho e precisa de ajuda. Para não ferir aos outros... e a si mesmo.

 -  O que há dentro dele...

 - Ben não é Vader!

Leia se separou de seu marido, caminhando até a mesa, apoiando as mãos nela e ficando de costas para Han.

 - Não há mais ninguém que tenha domínio na Força que possa ajudá-lo. Luke está devastado. Meu irmão... não sei se ele poderá ficar ao lado de Ben novamente. Nem ele... nem ele teria a capacidade de perdoar Ben depois de tudo, quanto mais tentar ajudá-lo.

 - Ben ficará conosco, com tudo o que ele é. Somos os pais dele. Tem que deixar de vê-lo como Vader! Nosso filho salvou Ellin. Se ele fosse como Vader, teria salvado Ellin?

 Leia respirou fundo e ficou de frente para Han. Ele tinha razão, ela sabia. Contudo, era tão, tão difícil... Era preciso tentar. Seu filho. Seu filho.

 - Está bem. Precisamos de um novo começo para todos nós. E um novo lugar. Não há como permanecermos em Paideia. Cada canto traz a lembrança de Lore. Luke e Ben não devem ficar aqui com essas recordações doloridas. Faremos desta forma, então. Quando Chewie retornar, teremos notícias dos senadores e comerciantes que apoiam nossa causa para iniciarmos a resistência. Precisaremos de um local para a base... e para construirmos um novo lar.

 Ele concordou com um aceno de cabeça.

- Nas viagens, quando procurava Tau We, encontrei vários lugares que seriam interessantes para isso... Ah! Um planeta na Orla Exterior, D’Qaar. É isolado, esquecido...  praticamente envolto de floresta. Perfeito para a base do comando e uma nova chance para nossa família.

- Luke precisa de nós. Será que conseguiremos convencê-lo a ir conosco?  Não sei como ele reagirá ou o que decidirá fazer de sua vida sem Lore, sem a Força... e com o que Ben fez. Terá Ellin para criar.. E... como Luke e Ben ficarão juntos depois de tudo?

Nesse momento, Ben adentrou na sala pela porta entreaberta, a única porta que dava saída da casa. Seu rosto, já naturalmente pálido, achava-se assustadoramente branco. A olheiras se afundavam debaixo dos olhos verdes. A tristeza e culpa em seu semblante lhe pesavam. Ele carregava um mundo.

Os três se entreolharam. Leia se levantou e fez menção de ir ao seu filho, porém Ben recuou como reflexo. A princesa estacou por um instante e seguiu em frente, abraçando-o. Diferentemente de antes, quando Ben brilhava com o toque de sua mãe ou com sua atenção, ele não reagiu, permanecendo rígido ao enlace da mãe. Ela o soltou devagar, engolindo em seco diante da rejeição de seu filho.

O silêncio era cortado pelo choramingo da bebê.

Ben abaixou o rosto, semicerrando os olhos. Expirou profundamente e dirigiu-se ao seu pai, estendendo as mãos para que lhe entregasse a criança. Han franziu o cenho em uma expressão confusa de surpresa e dúvida. Fitou o filho, buscando uma resposta às suas perguntas silenciosas. Ben não desviou o olhar, não enfrentando, apenas pedindo... pedindo tantas coisas ao seu pai.

Lentamente, Han entregou Ellin a Ben. Desde que haviam desembarcado em Paideia e Leia pegara Ellin de seu próprio filho, o menino não mais tocara na neném. Luke, mesmo em convalescência, mantivera a filha consigo no leito, permitindo apenas que ela saísse de seu lado para ser alimentada e limpa. Nessas ocasiões, o garoto ficava de longe, observando seus pais a cuidar da pequenina.

Ben estreitou Ellin em seus braços e ela parou de chorar imediatamente. Deu-lhe um sorriso triste, acarinhando seu bracinho. A pequenina mão dela agarrou o dedo indicador dele com firmeza. Olhava para Ben, emitindo sons que pareciam ser de alegria e satisfação

Han e Leia mal respiravam diante daquela cena. Havia uma ternura e tristeza no filho deles que lhes tocou fundo. E a tranquilidade de Ellin nos braços dele os comoveu, a confiança da bebê para com ele. Se havia algo que a perturbava, ao lado do menino desaparecera.

Ben fitou a porta do quarto de seu tio. Fechada... para ele.  

Olhou para Ellin e a imagem de Lore lhe invadiu a mente. Sentia tanta, tanta falta dela... Sua garganta travou. Nunca mais... nunca mais... e por sua culpa, exclusivamente sua culpa.

Monstro.

Não me olhe dessa forma. Esqueça de mim, Ellin.

Entregou a bebê para Leia e saiu pela porta. Ellin voltou a se remexer, impaciente.

Han lançou um olhar significativo para Leia e, de pronto, seguiu o filho.

 

*******************************

Na cama ao lado, estava seu pai, lutando para não adormecer. Os diversos leitos na enfermaria emprestavam uma sensação estranha, como se fosse parte de um mundo de fantasmas. Sabia que aguardava que ele, Ben, adormecesse, para que pudesse depois relaxar. Aqueles olhos castanhos o regulavam discretamente.

Melhor dormir, então. Dormir... dormir...   Desejava não sonhar.

Mas sonhou.

Andava, a relva submissa aos seus passos, silenciosa. Noite clara. Os prédios no lugar. A horta. A dispensa. Era Paideia.... e não era. Tudo igual... e tão diferente. Abaixou-se e agarrou pequeninas flores que nasciam rasteiras na grama. Textura... esquisita. Tocou em si mesmo. Estranho. Seu mundo mental...? Não, não era. Jamais mais fora lá desde aquela vez.

Nunca estivera tão consciente em um sonho... a noção de si, muito embora sua mente fluísse languidamente. Sonho...? Seria um sonho mesmo?

O choro.

Aquele choro infantil suave e longínquo... Presente. Constante. Insistente.

A residência do seu tio. Como chegara ali?

À frente, o quarto de seu mestre, a porta escancarada, a luz artificial apagada. A luminosidade das luas lhe revelou que lá não havia ninguém. À esquerda, o outro cômodo com a porta aberta, sua mãe adormecida, a cama encostada na parede. Ellin deitada entre Leia e a parede, a mão da mulher repousando levemente no peito da neném.

Uma tontura o atingiu e fechou os olhos por um momento, uma sensação nauseante. A temperatura no quarto caiu subitamente e a umidade fria grudava em seu rosto.

Abriu os olhos.

Uma névoa negra rodeava a bebê, que chorava e se remexia inquieta. Suas pequeninas mãos, fechadas, se mexiam, como se dessem socos contra quem a agredia. A bruma possuía vida própria. Volitava em torno da criança, contorcendo-se em si mesma, tomando impulso e caindo com afinco em sua direção, tentando incorporar-se à Ellin, sem sucesso. A névoa perfez outro círculo, um corvo esfumaçado, e atacou novamente, sendo rechaçado mais uma vez ao tocar a pele da bebê. O que impedia...? Apertou os olhos, ainda atordoado, e distinguiu uma luz que emanava de sua prima: discreta em volume, mas irradiante em seu tom rosa dourado.

Sonho ou não, tinha que tirar Ellin dali.

Chegou perto da cama e aquela névoa escura se encolheu à sua proximidade, como se o temesse. E por que teria medo dele....? Baixou a cabeça para suas mãos e elas cintilavam. Ele todo brilhava, a luz que o envolvia resplandecente, quase ofuscante. Essa luminosidade lhe era íntima, contudo não pertencia a ele.

A malha protetora de seu mestre.

Ajoelhou-se no colchão, seus braços passaram por cima de sua mãe (como ela continuava a dormir...?) sem tocá-la e pegou a bebê em seus braços, que se tranquilizou ao se vir aconchegada no peito de Ben. Ele a apertou contra si dentro da luz protetora dele.

As brumas negras se afastaram da luminosidade e   adensaram-se em um ponto, como uma bola de fumaça e desapareceram.

Sua mente clareou e ele se fez senhor de si. Seu semblante se tornou grave com o raciocínio límpido. Um bebê obsediado pelas sombras. Cerrou os olhos. Assim devia ter sido com ele, em uma noite parecida com aquela. Ninguém a saber, ninguém a sentir.

Trincou os dentes. Desgraçado.

 - Pensa que ela vai amá-lo, sendo você o que é?

Ben se voltou para a sua direita, aquele ser horrível dois metros de altura, a cabeça sem cabelos, a cicatriz funda entre os cenhos, sua pele de um cinza doente, a sotaina longa e negra a encará-lo. Apesar do negrume de sua silhueta, fazia-se translúcida a sua presença, como um espectro. Intermitentemente, sua figura parecia desvanecer-se e retornava... com esforço nítido em permanecer ali.

 Snoke... novamente Snoke.

- Você.

- Chamei, então, sua atenção, mesmo com a proteção de Skywalker.

Isto não é minha mente e nem a dela. Onde estamos? É criação sua?

- Não. Uma entrerealidades. Existe muito mais do que imagina ou que seu mestre lhe mostra.

- Como conseguiu chegar a ela? Ellin não tem sombras!

- Ora, você me mostrou o caminho.

- O quê?

- Você... no Lado Sombrio. Eu vi. Trevas brilhantes... quando matou o Cavalheiro de Ren. Quando matou Lore. Magnífico sol negro. Não poderia se esconder de mim... e acabou por me revelar essa menina.

- Afaste-se de Ellin! – rugiu, entredentes.

- Tem compaixão por ela... – o sorriso se abriu com maldade – Culpa. Inveja... da luz dela. E ciúmes. Quantas fraquezas tão expostas, Ben Solo.

-  Não pode entrar na minha mente e nem na dela... eu vi!

- Na dela, não.

- E nem na minha.

- Por enquanto. Será você a me chamar. Será você a querer que eu venha.

Mirou aquele ser com ódio e desprezo. Essas emoções lhe trouxeram imagens de seu encontro anterior com aquele ser e se deu conta que Snoke não o atacara como antes. Por que não avançava para ele e para Ellin? A luz... a proteção de seu mestre a cintilar. Estreitou os olhos e deu dois passos em direção a Snoke. O ser escuro retrocedeu, não deixando a luz tocá-lo. A sua consistência se esvaía, ficando cada vez mais transparente.

Sorriu, confiante.

- Não tem como me controlar. Desista de mim!

-  Esconde-se atrás da luz de outro... Que mérito há nisso? Enfraquece-se quando nega a si mesmo e deposita sua confiança nos que o rodeia. Acredita que ficará com ela para sempre? Crê que Skywalker o perdoará pelo o que fez? Pensa realmente que é aceito por seu pai e por sua mãe, ainda mais agora que é um assassino? Essa menina... um dia saberá que você matou a mãe dela. Nem ela... que agora se sente confiante em seus braços ficará ao seu lado!

- Fiz coisas horríveis... Não espero mais nada de ninguém depois de tudo. E, mesmo assim, eles se preocupam comigo. Eles não desistiram de mim!

- Até quando irá se iludir? Permitiu-se enganar por abraços e palavras? Você jamais pertenceu à sua família. Tolerado... temido... rejeitado. Suportado... por comiseração, senso de dever e medo.  Diferente... poderoso... e miseravelmente domesticado e controlado por aqueles que dizem amá-lo. Eles amam o que desejam que seja e não o que é. Dentro em breve, sua família o humilhará e você não deterá a sua própria natureza.

- Eu não continuarei a ser um monstro! Não me unirei a você!

- Você é uma fera enjaulada que quebrará suas correntes para ser livre... junto a mim. Voluntariamente. Você se debate agora, Ben Solo, porque sabe que tenho razão e não tardará a admitir, aceitar... e desejar. Você se voltará para mim!

 A raiva se condensava em ira, transformando sua mente em brasas. Todas aquelas palavras remexeram em feridas, umas até então ocultas e desconhecidas. Alguma verdade se entranhava nas palavras de Snoke. O ser sombrio o conhecia muito bem... vivera como um parasita dentro dele durante anos. Possuía conhecimento dele suficiente para manipulá-lo.

A fúria, presa a ferros, o tentava. Odiava Snoke. Odiava-o mais do que tudo. Odiava que ele ameaçasse Ellin, que quisesse destruir seu mestre. Odiava aquela criatura que trouxera à tona o pior de si, que lhe mostrara o monstro que era. E odiava profundamente Snoke por ter revelado a ele a sua natureza sombria... da qual apenas ele mesmo, Ben, era responsável.

Ellin se remexeu em seu colo e acabou por arranhar a palma de sua mão quando tentou pegá-la.

Ben piscou, sentindo a presença da bebê, como se alguém estalasse os dedos na frente dos seus olhos. Ela estava ali...Ela sofreria se ele não se controlasse... como Lore sofreu. Ele poderia terminar por repetir o que fizera... cego pelo ódio, movido pela ira, não enxergando nada mais e machucando quem não deveria.

 A ira não se desfez. No entanto, aquele segundo de lucidez lhe proporcionou a oportunidade de perceber a avidez nos olhos de Snoke, provocando-o. Já vira aquele tipo de olhar... nos seus colegas padawans na academia, quando, por despeito e inveja, implicavam com ele e desejavam que  fracassasse nas tarefas.  Não era, em absoluto, malévolo como o do ser escuro, mas o princípio, no fundo, era o mesmo: que ele se descontrolasse.

Na época, ele não nutria aquela intensidade nas emoções. Apenas se afastava magoado, com raiva, mas em proporções infinitamente menores. Seu tio o aconselhava a mostrar compaixão por eles, explicando que os outros padawans o agrediam justamente porque não sabiam lidar consigo mesmos.

Não tinha como usar a compaixão que seu mestre sempre lhe ensinara. Simplesmente não conseguia senti-la com aquela criatura hedionda e maléfica.  Contudo, o receio de cometer outra vez uma atrocidade, juntamente com o ódio intenso por Snoke querer que ele fosse um monstro se mostraram capazes de paralisá-lo em sua ira. Usou o medo de ferir Ellin e a intensa raiva de ser manipulado por Snoke para se conter, cristalizando a fúria, encapsulando-a  em frio ódio, denso, condensado, concentrado. As brasas ardentes ainda fumegavam, porém em chamas estáticas dentro do gelado rancor.

Mantivera sua sanidade... de uma forma sombria, mas não deixava de ser sanidade. Conseguira se deter... como se adiasse a explosão de uma bomba-relógio. Não sabia até quando. Que fosse o suficiente para que o espectro de Snoke, já tão inconsistente, desaparecesse.

Snoke o observava em silêncio, avaliando-o com curiosidade. Sua imagem era tênue, quase não se firmando mais.

- Interessante... Preocupa-se tanto com essa menina que, por ela, tenta fugir do que é. Isso não será necessário. Ela também se juntará... a nós.

-  Isso não acontecerá. Ellin é diferente de mim. Não pode fazer mal a ela como fez comigo. A luz é dela... Meu mestre não permitirá que você se aproxime.

-  Ah, Skywalker a protegerá...como te protegeu?!  - ele riu com escárnio - Posso não entrar na mente dela... mas existem muitas outras formas de trazê-la para mim. Seu mestre falhará com ela, como falhou contigo. E devo lembrá-lo, Ben Solo, que foi você mesmo quem me revelou a menina. Essencialmente, a responsabilidade do que acontecer a ela é sua... exclusivamente sua.

Ben cerrou os olhos, prendendo a respiração. Ele se retesou todo, tornando-se tão rígido a ponto de fazer a bebê chorar, de tão apertada por ele..

A voz de Snoke ressoou em seus ouvidos muito de longe, enquanto o espectro desaparecia.

A responsabilidade do que acontecer a ela é sua... exclusivamente sua. 

****************************************

Ben.

Seus olhos permaneciam fechados, a testa franzida. As palavras a voarem dentro de si, procurando seu lugar.

- Ben.

A mão em seu ombro.

- Filho!

Olhos bem abertos. Casa do seu tio. Seu pai o segurando. Realidade.

- Acordei e você não estava na cama. Por que veio aqui? Por que Ellin está contigo?

Ben fitou Ellin em seus braços. Ela agarrava a camisa dele à altura de seu peito. Os olhos verdes claros eram um mar tranquilo. Ajeitou carinhosamente a manta que a envolvia para que não sentisse frio. Ela estava bem. Não detectara nenhuma vibração destoante.  Em seguida, vasculhou com os olhos todo o ambiente, certificando-se de nada a mais encontrar. Nenhuma sombra. Nenhum resquício de Snoke. Sua percepção ainda se alternava entre os dois mundos.

Aos poucos, sua mente se organizou, a voz de Snoke ainda a ecoar ao longe, suas palavras a caírem como gotas de chuva dentro dele, absorvendo-as.

 - Pensei ter ouvido Ellin chorar... e vim.

- Ouviu Ellin chorar aqui enquanto estava na enfermaria? Filho, você está bem? Olhe para mim. Parece que viu um fantasma.

Ben se forçou a fitar o pai com  sua expressão preocupada. Aqueles olhos castanhos se colocavam à disposição dele; queriam ajuda-lo. Desejava muito pedir ajuda ao pai, contar-lhe tudo... Fizera isso uma vez, há alguns anos, quando lhe falou sobre aquela voz.  Seu pai  gritara, dizendo para que se afastasse daquilo. Ele não sabia... não pôde compreender naquela época e não entenderia agora.

- Está tudo bem, pai.  Não precisa mais ter medo... por mim.

- Não preciso... mesmo?

- Não precisa.

O alívio tomou conta de Han, um peso enorme tirado de seus ombros.

- Estou aqui... sempre estou aqui. Não sou o pai que... que talvez você sonhasse... mas estou aqui com você.

- E eu não sou o filho que queria que eu fosse.

- Não sou o pai dos seus sonhos e você não é o filho que me acompanharia na Falcon.  Mas pode contar comigo... para qualquer coisa. Farei o que puder... com o que posso, filho.

O menino baixou a cabeça, assentindo com um balançar de cabeça em silêncio. Ele era seu pai... Era bom ter ouvido isso dele.

Sentiu a mão de sua mãe na sua. Ela acordara e se aproximara sem ser notada. Suportou seu toque, embora o desejasse. Havia um abismo entre ele e sua mãe que custaria a ser dizimado. A mesma distância que os separava era a medida do amor que nutria por ela.

- Ben, meu filho...

- Nós te acordamos, mãe. Volte a dormir. Está cansada. E você também, pai. Durmam os dois.

- Ficará conosco...? – ela falava com cuidado, observando-o.

- Sim. Ficarei aqui.

- Dê-me Ellin. Vou colocá-la para dormir.

- Deixe que ela fique comigo esta noite. Perdi o sono. Cuido dela. Assim vocês poderão descansar. Ela não chorará mais... eu garanto.

 Verificou que sua mãe se deteve em discordar. Sinal de paz dela, uma concessão. Fitava-o, mil perguntas a se perderem no silêncio. Ela suspirou, sem saber o que falar.

- Venha para o quarto. Vamos arrumar colchões para colocar no chão para ficarmos todos juntos.

 - Durmam você e papai na minha cama. Ficarei aqui na sala... esperando meu mestre. Sabem para onde ele foi?

- Luke disse que queria ficar um pouco sozinho. Não falou para aonde iria e nem quanto tempo se ausentaria. – ela hesitou por um momento – Ainda é muito cedo para vocês dois.

  - Nunca será a hora certa, mãe.

 Ela prendeu a respiração.

- Meu irmão precisa de tempo... não sei o que está pensando. Não sei como reagirá contigo. Antes, preciso conversar com você  sobre o que aconteceu. Preciso compreender... para poder interceder por você com Luke.

 Ben cingiu os lábios. Não perguntara como ele estava. Não chorara com ele. Não disse que estaria ao seu lado sem titubiar.

 - Não, mãe. Não existe nada mais a ser compreendido além do que você viu e sabe. Não tenho defesa. E quero conversar sozinho com meu tio.

 Ele se sentou na cadeira junto à mesa da sala e começou a embalar a bebê, dando o assunto por encerrado. Pela visão periférica, assistiu sua mãe cerrar os punhos não contra ele, mas em revolta contida à situação. Seu pai a abraçou e murmurou algumas palavras em seu ouvido, acalmando-a, ao mesmo tempo que a rebeldia nela se transformava em tristeza.

 Os dois se acomodaram na cama, a porta aberta, a observá-lo. A angústia deles lhe era captada; todavia ele se fechou para aquele e tantos outros sentimentos de seus pais.  Eles resistiram ao sono mais do que esperava. Uma vida se passou antes que seus pais finalmente cedessem à exaustão.

 Andou até o quarto de seu mestre, com Ellin em seus braços. Acomodou-se na cama e colocou-a no meio do colchão entre dois travesseiros, cada qual ao lado dela, como um cercado de segurança. Cobriu-a com a própria manta, deixando-a bem aquecida. Ela, já adormecida há tempo, sequer se mexeu quando ele a beijou na testa.

 Encolheu as pernas e apoiou a cabeça nos joelhos. Sabia o que era. Sabia do poder que pulsava, rebelde, dentro de si. Sabia que o único caminho para usufruir dele em sua totalidade era o ódio... o ódio que o cegara, que trazia  aquele outro lado seu.

 O formigamento em sua pele, a luz de seu mestre que o envolvia protetoramente, constituía-se a única barreira que Snoke não conseguira transpor. E esse poder luminoso de seu tio, tão necessário ao jedi, achava-se ali. Sem ele, seu mestre nada podia fazer para deter o ser escuro.

 Quando se jogara do penhasco, fizera-o com conhecimento que não pertencia nem às sombras de Snoke e nem à luz de seu mestre. E assim continuava. Entretanto, nesse vácuo no qual se encontrava, acabara por fazer coisas horríveis... e terminaria sucumbindo às sombras não por escolha, mas por se ver perdido. Se não tivesse retornado... se tivesse se deixado ir...

Ellin se remexeu e suspirou em meio ao sono. Sua boquinha se esticou e parecia um sorriso.

Segurou a mãozinha dela, pensativo. Mesmo com seus poderes, seu mestre conseguiria protegê-la? O escárnio de Snoke ainda ria dele. Talvez o mestre pudesse... ou não. Não poderia arriscar. Se ele, Ben, se tornasse o que queriam que fosse.... seu mestre teria seus poderes novamente e seriam dois jedis.

Isso não era ele. Porém, talvez, não existisse um lugar para o que ele era... um lugar onde as trevas brilhassem e a luz se sombreasse. E, caso assim fosse,  via-se obrigado a escolher por algo que não era ele.

Apoiou-se no batente da janela, a olhar, pelo vidro meio embaçado, para o a trilha que levava fora do conjunto de casas iluminado pelo brilho intenso das estrelas.  Não esperava amor ou perdão de seu tio. Lutaria para que seu mestre o recebesse de volta, como seu padawan.

Naquele momento, era a única saída que se mostrava para que ele não fosse um monstro.

               

            ************************************************

           

 A mão metálica esquelética deslizou pela rocha, alisando-a com pesar.  Embora nada estivesse ali gravado, ele sentia o nome dela encrustado nas granulações rígidas da grande pedra.

A terra fofa e remexida em frente à lápide natural e sem nome em breve se cobriria de relva e com pequenas flores rasteiras. Não demoraria muito para que a natureza enchesse aquele nicho com exuberância e ocultasse todos os sonhos que, um dia, foram tão vivos. Dali a alguns anos, ninguém lembraria que ali estava enterrada a sua mulher.

 Apenas ele

...lembrarei daqui, de Paideia. Não tive nada a me apegar quando criança ou quando mais jovem. Este planeta é minha casa. Aqui encontrei paz.

Os dedos de metal se recolheram lentamente, arranhando a rocha. A mão se fechou em punho. Ela tinha se ido. Toda uma vida ainda a ser vivida... juntos. A dor pela ausência dela se agarrava a ele. E sabia muito bem que aquela dor não o abandonaria... nunca.

 E a culpa.

Era o responsável... no fim, era o responsável por tudo o que acontecera.

 A raiva, contida até aquele momento, se ergueu. A revolta... consigo mesmo.  Ele poderia ter evitado. Ele vira a possibilidade daquele futuro. Ele assistira todos os eventos surgindo e se interligando, como dominós em fileira, aguardando a última pedra a ser posta, vendo sem enxergar. Ele falhara.

 Existira a possibilidade de evitar aquela tragédia.  Deveria ter mandado Lore embora logo que tivera a visão... mesmo com um viés de futuro alternativo possível a brilhar, um futuro no qual ficariam juntos... todos juntos, Lore, ele e... Ben.

 Ben.

 Encostou-se em outro rochedo ali perto, quase de sua altura, deixando-o que ele sustentasse todo o seu corpo, cerrando pesarosamente os olhos. Houve um escuro instante no qual a ira tomou corpo contra o assassino da mulher que amava, porém se despedaçou em mil estilhaços ao se deparar com aquele menino arrasado, estarrecido e perdido. Um menino... só um menino... horrorizado consigo mesmo... um menino que estivera nas mãos de Snoke por anos... sozinho com aquele mal. Um menino que amava, seu filho.

Leia lhe falara tudo antes do enterro, toda a história dita por Tau We e de como Ben tomara conhecimento.  Sua irmã ressaltara que Lore não tivera chance, que era impossível ela resistir ao condicionamento e que seu filho entrara em pânico. Ben fez o que fez para te defender, mas conseguiu salvar Ellin. Meu filho errou... errou terrivelmente. Não espero que o perdoe, mas não o odeie. Ele ficou cego... ele queria te salvar, Luke.

Não revelara à Leia que Lore resistira, que se libertara no último momento; que sua morte fora ainda mais terrível por isso. Ele calara fundo aquela verdade dentro de si. Causaria ainda mais sofrimento ao seu cunhado e à sua irmã e aniquilaria com Ben. Se ele soubesse, talvez fosse o último empurrão para que seu sobrinho se perdesse.

Errara com Ben? Errara em não ouvir o que Lore lhe afirmara, que Ben deveria ser treinado de modo diferente justamente por ser... diferente, extraordinário... e desequilibrado por Snoke? Conduzir seu filho adotivo exclusivamente nos caminhos luminosos da Força fora um... engano?!A luz em si não era o suficiente?A luz não era suficiente?

Desejava sentir a Força naquele momento. Talvez Lore estivesse ao seu lado, envolta no brilho fantasmagórico a lhe tocar a mão.

Protegera seu sobrinho em demasia... desde o começo, admitia agora. Lore lhe alertara e ele não quis escutá-la. Permitira que o tio se sobrepusesse ao mestre. Afastara Ben de qualquer contato com a escuridão e terminara por isolá-lo, deixando-o sozinho com suas próprias dificuldades. Se, quando com seus plenos poderes, tivesse levado seu aprendiz a enfrentar as sombras junto a si, acompanhando-o de perto, experimentando-o paulatinamente sob sua supervisão, Ben conquistaria mais equilíbrio e a confiança em seu mestre não teria sido abalada. Não teria ocultado suas dúvidas e medos dele, Luke. Ele teria suporte para saber quem realmente era, seu poder. Ele teria aprendido a se controlar. Ele não teria feito...

Aquele momento...  perdido.

 Você se ofusca com a própria luz e não consegue enxergar nada.

Obi-Wan lhe dissera, em Dagobah, em como falhara com Anakin, seu pai. O custo de incontáveis vidas. O nascimento de Vader. E toda a galáxia sofrera pelo seu erro.

 Falhara com Ben. E lhe custara a vida dela. Estaria, com sua falha, criando um outro ser escuro, um outro Vader? A galáxia, mais uma vez, se submeteria a tal tragédia?

 E ainda havia Ellin.  Ellin... sua filha amada... sua filha com Lore. Um brilho dentro daquela tristeza. A menina nascera prematura, porém era forte... e cresceria, com toda a herança dele e da mãe. Ela ficaria ao seu lado. Ele a ensinaria. Ela seguiria no Lado Luminoso.

 Seria capaz...? Seria capaz de ser um mestre novamente para Ben e agora para sua filha? Ele tinha condições de orientá-los, ele, logo ele, sem a Força, com tantas deficiências, com um rastro de tantas falhas a persegui-lo?

Sua mão robótica se fechou mais uma vez. Amava dolorosamente aquele filho escolhido. Contudo, não estava pronto para olhar para ele novamente... ainda. Era cruciante fitar, no mesmo semblante, quem tanto amava e quem lhe tirara quem tanto amara.

Poderia ficar ao lado dele, dia a após dia...?

 Olhou para o céu, as estrelas muito brilhantes. Sentou-se no chão, encostando as costas na rocha. Todas aquelas reflexões iam e vinham interminavelmente numa ciranda de pensamentos e emoções sem fim. Elas o confundiam,  tripudiam dele e exauriam-no. Não devia se entregar assim... a dor não sumiria e ela não retornaria.

Calmo. Deveria ficar calmo. Ali, agora, sozinho, longe de todos. Calmo... e deixar toda a tempestade de imagens e acusações passar, sem retroalimentá-la com novos argumentos ou reflexões já tão repisadas, curvando-se a ela como um flexível caule de planta. Quando a tormenta se fosse, ele ainda permaneceria.

 Não tinha acesso à Força para realizar a meditação da forma adequada, porém se deixou levar, sem pensar. O corpo, como um ser autônomo, rearrumou-se, as costas eretas e as pernas cruzadas entre si, a posição e postura inerentes em sua memória dos muscular diante de tantos anos de prática. Descansou dentro de si mesmo, vazio, enquanto todas as suas angústias o assolavam como um furacão e ele ali, sem refutar, sem se defender. Elas tentavam derrubá-lo e levá-lo.  Pendia de um lado para o outro, animais raivosos a atacá-lo, incansáveis.

 Perdeu a noção de tempo. Não importava. Em algum momento, os pensamentos que se faziam obsessivos perderiam a energia.

 Calmo, muito calmo.

Lentamente, muito lentamente, a força da tormenta se enfraqueceu.

Silêncio.

 A dor não iria embora, mas se acomodaria nele, integrando-se a ele. Levaria muito tempo para esse processo, todavia já naquele momento lhe permitia espaço para enxergar as coisas. A tempestade devastara tudo... e também clareara o que clamava por ele.

A situação como um todo chegara a um ponto crítico e exigia dele uma posição e ação.

As estrelas perdiam seu brilho em meio à luz do dia que não tardaria a chegar. Levantou-se, aprumando-se.  Varreu as lágrimas de seu rosto, mas as marcas fundas na pele que a ausência dela provocara permaneceram.

Pousou novamente a mão metálica na lápide sem nome em um grande suspiro. Uma brisa  lhe alisou a face por um momento, trazendo um aroma suave tão familiar. Ele fechou os olhos e inclinou a cabeça para o lado, procurando sentir de onde vinha a fragrância.

 Mas, suavemente como veio, o perfume se foi.

 

            *******************************************************

 Durante toda a noite, Ben fixara o olhar pela janela.

Quando o manto do céu tonalizou seu azul escuro em várias gradações mais claras, ele viu um vulto de negro caminhar ao longe, em direção da casa. A luz do sol despontou ao largo da colina ao longe e iluminou os contornos daquele homem. O garoto esfregou os olhos e mirou aquela figura mais uma vez pelo vidro embaçado da janela. Parecia que a luz emanava de seu tio.

 O menino engoliu em seco e reuniu coragem. Pegou Ellin em seus braços e foi ao outro quarto, acordando o pai e lhe entregando a bebê.

 - Fique com ela. – sussurrou, a fim de não despertar a mãe.

 - Para aonde está indo? Está fugindo de Luke de novo?

  - Não, pai. Estou indo me encontrar com ele.

 Percebeu que seu pai concordava com aquela atitude quando este lhe deu um balançar de cabeça.

Adiantou-se, saindo da casa e andando em direção ao seu mestre. Seu coração batia forte e a boca seca. Seus pés lhe pesavam, não querendo que ele seguisse, mas, mesmo assim, caminhou com determinação.

 Luke andava no sentido da casa, imerso em seus pensamentos, a fim de encontrar seu sobrinho. Seu coração se apertava e ele respirava profundamente, mantendo as emoções em controle.

O sol saiu por detrás da colina e ascendeu as pequeninas flores silvestres ocultas na relva.

Os dois se encontraram no meio do caminho. Encararam-se. Ben tremia de emoção e fez um esforço enorme para se manter firme.

- Você deve me odiar muito.

Luke empertigou mais ainda as costas, tenso. Demorou algum tempo assim, em silêncio, rígido. Expirou profundamente e sua voz saiu embargada.

- Não, não te odeio.

Mágoa. Dor. Ressentimento. Desilusão. Tristeza. Sofrimento.  Ódio...? Não. Inacreditavelmente, não existia ódio.

- Consegue ainda... me amar?!

Luke assentiu levemente com a cabeça em silêncio.

Ben baixou os olhos, engolindo em seco. Como... como seu tio ainda podia amá-lo...?! Ele não mentira, podia ver em seu olhar. Havia amor ali... debaixo de uma dor muito grande, ferido por tantos outros sentimentos. Mesmo existindo amor, nada seria como antes... nunca mais.

- Não sou alguém que se deva amar, tio.

- Você é filho da Força. Ela te criou em equilíbrio. A interferência de Snoke é o que não era previsto... bem como minha inabilidade em lidar contigo.

- Do jeito que fala é como se eu não tivesse culpa. E eu tenho, sim. Eu... – virou o rosto, o queixo trêmulo num rápido instante -  Eu... eu... não consegui me controlar, mas poderia ... poderia ter seguido outro caminho. Poderia ter te ouvido... ter te procurado. Eu poderia... ela ainda estaria aqui.

O rosto de Skywalker se contorceu, as rugas fundas em torno dos olhos amargurados.  Em meio à dor da ausência de Lore, uma mágoa profunda e um cortante ressentimento latejavam em seus olhos enquanto mirava aquele rosto infantil. Ben era o reflexo de seus fracassos, como mestre e como tio... como  pai adotivo. E o seu fracasso havia levado Lore e exposto Ben às sombras.

E era com isso que enfrentaria... consigo mesmo.

Abafou as emoções que ameaçavam lhe turvar o discernimento. Limpou a garganta.

- O que você fez é sua responsabilidade. Esse fardo é seu e ninguém pode assumi-lo. Mas eu falhei contigo, Ben. Minhas escolhas permitiram que você se deparasse nessa situação.

-  Não sei... não sei se seria diferente. Você não sabe o que tem dentro de mim. Está crescendo dentro de mim... esse ódio. Preciso controlar isso... Se eu... -  a voz sumiu - Eu amava Lore. Se nem isso me fez controlar o que tenho em mim, o que espera que posso fazer? Sou capaz de muito mais do que fiz... Snoke sabe.

- Snoke distorce os fatos para dominá-lo. Ele se apóia em seus medos. Você não é o que ele diz.

- Ele me conhece, tio Luke. Sei que ele quer me manipular para me usar. Mas ele viveu dentro de mim. Ele viu. Algo como eu... não era para existir.

Luke se agachou e o segurou pelos ombros, a compaixão se sobrepondo à mágoa.

- Nunca mais diga isso. Nunca.

- Snoke vai atrás de Ellin.  Estava ontem tentando fazer com ela o que fez comigo!

Skywalker escutou os pormenores que seu sobrinho lhe contava sobre seu encontro recente com Snoke, levantando-se lentamente enquanto o relato lhe caía fundo. Sua filha. Não apenas seu sobrinho, seu filho, mas agora sua filha naquele jogo de Snoke.  A luz de Ellin, a sua resistência ao seu domínio fora um fator inesperado para aquele ser escuro. Todavia, era tácito que Snoke não desistiria deles. Ele queria as duas crianças. 

Defendê-las... por elas mesmas. E por tudo o que significavam.

Ben não era somente seu sobrinho sob seus cuidados; ele se constituía na possibilidade de se tornar uma grande força para a paz na galáxia ou se estabelecer como seu carrasco, seguindo os passos do avô. Ellin, sua filha, era uma Skywalker, com toda a herança que lhe cabia na Força, herdeira de Palpatine e Vader.  A depender de seus passos, a realidade se torceria para a luz ou para as sombras.

Ele sabia o que devia fazer.  Há muito tempo guardava essa alternativa como última instância. Chegou até a descartá-la, após ter direcionado o fluxo da Força de si para Ben, resguardando-o de Snoke. Porém Ben não necessitava somente da proteção contra o mal externo e sim aprender a dominar suas próprias sombras internas. E, para tanto, ele, Luke deveria retornar como seu mestre completamente. Teria Ben a rédeas curtas, supervisionando-o severamente a cada passo naquele caminho tão perigoso com a Força a guiá-lo, com todos os seus poderes a serem instrumentos de condução e ensino. Para que seu sobrinho estivesse a salvo de si mesmo. Para que seu sobrinho não se voltasse para a escuridão e Snoke o utilizasse para espalhar o mal por todas as incontáveis vidas pela galáxia.  Para que Ellin, sua filha, uma Skywalker, pudesse trilhar o caminho do Lado Luminoso e não fosse morta ou até se transformasse em uma cúmplice naquele rumo escuro.

Retornando a usar a Força, ele também estaria apto a lutar com Snoke. Ele, até o momento, era o último jedi.

Era arriscado... muito arriscado. Já fora feito antes. Houve sucessos em muitos casos, bem como fracassos desastrosos em outros. E seria Ben o primeiro a colher os frutos, fossem doces ou fossem amargos e, pelo perigo que rondava essa alternativa, poupara seu sobrinho desde o início.

Lore sempre fora partidária que se confiasse em Ben, mesmo que isso o colocasse em situação perigosa para sucumbir às sombras. Se Ben continuar acreditando em você, Luke, mesmo na escuridão ele encontrará um caminho para retornar; ele irá enxergar o mestre dele, o tio dele e você terá condições de ajudá-lo.

- Ben – disse, colocando-se novamente à altura do menino e olhando-o fundo nos olhos – Existe uma forma de você ser ajudado e de deter com Snoke em seus planos para contigo e para com Ellin. É muito arriscado e perigoso... principalmente para você. Preciso saber se  estará disposto realmente a seguir o Lado Luminoso, a aprender verdadeiramente o que posso lhe ensinar. É essencial que esteja pronto para isso, pois o que estou propondo depende da sua vontade e de se manter na luz da Força.

- Estou disposto, sim.

- Sinceramente...? Antes já prometeu e rebelou-se depois. E se não estiver pronto para seguir o Lado Luminoso, o que faremos poderá se reverter em um desastre não só para você, mas para com todos. Poderá cair nas sombras e levar muitos junto com você, inclusive Ellin.

O menino empalideceu.

- Com isso...  terá seus poderes novamente?

- Sim. Apenas com eles posso ensiná-lo devidamente... e acompanhá-lo no que proponho. Estarei ao seu lado em todos os momentos nessa empreitada. Porém, é imprescindível que confie em mim e que me obedeça.

- Confie em mim, mestre. Eu... eu não falharei.

- Quando estudou os arquivos do holocron, acessou os dados de uma prática antiga chamada Briseadh an anam, a quebra da alma?

Ben ficou estarrecido. Sim... ele, ele sabia muito bem o que aquilo era. Um arrepio passou por sua espinha. Quando encontrara esse arquivo no holocron, uma sensação de mal-estar o acompanhou, de... fatalidade.

De repente, vislumbres fugazes piscaram em sua mente, incompreensíveis, de uma linha de futuro que despontava: um mundo de areia acastanhada... pôr do sol duplo. Cicatriz no rosto. Neve. Sabre rubro. Uma moça de olhos verdes. Snoke. Piscou os olhos, retornando à realidade, seu mestre à sua frente com o olhar avaliador e preocupado.

- Sim... eu sei o que é a quebra da alma. – apertou os punhos, tenso, a respiração presa.

- Realmente entende o que é essa prática? Não é apenas criar um constructo mental, um duplo, um golem... É literalmente um outro eu seu... no mundo mental. Ele teria a sua energia vital. Teria sua personalidade. Seria uma parte sua. Possuiria suas lembranças. Será necessário que seja uma parte sua para que Snoke não descubra o engodo.

- Compreendo, sim... acho. O holocron afirma que os jedi usaram essa técnica há mais de dois mil anos para escapar da magia sith de supressão da mente, durante as guerras contra os Sith. Entendo... se Sith foram enganados, pensando que dominavam os jedi, Snoke também pode ser. Ele pensará que meu duplo sou eu. Ele conversará com o duplo, não comigo. Os registros dizem que é possível até filtrar as lembranças antigas...  selecionar diariamente as recordações que alimentarei sua memória... deixar apenas o que eu desejar para  tornar esse duplo até mais convincente... para que Snoke imagine que eu estou aceitando o que ele quer.

 - Muitos jedi usaram esse artíficio para bular a ação da Qâloi Kyamtuska e escaparam da escravidão mental dos Sith, deixando seus alter egos recebendo toda a influência escura até não serem mais necessários e devidamente destruídos por seus criadores. Houve muitos outros jedi, no entanto, que terminaram por se perder dentro de si mesmos... Que tiveram seus duplos tão engrandecidos pelo poder dos lordes negros que eles adquiriram vida própria e tomaram o corpo e a existência desses jedi. – segurou o menino pelos ombros, a voz baixa – Está entendendo o que acontecerá, Ben, caso aceite isso?

O menino engoliu em seco.

- Terá outro de mim na minha mente... que ficará no meu lugar no mundo mental para falar com Snoke. E se eu não tomar cuidado... ele ficará mais forte do que eu e... me dominará.

- Sim. Mas estarei contigo. Não perderemos o controle sobre o duplo.

- A proteção...

- Só será tirada depois desse duplo estar pronto. Ele será confeccionado com cuidado e tempo. Apenas nesse momento, a Força voltará para mim.

- Snoke... ele terá que ser convencido.que você tirou a proteção de mim.

- Construiremos uma história que justifique  Será planejado.

Ben deu um sorriso triste.

- Não será difícil. Ele acredita que você.... não me perdoará por causa...  dela.

A mandíbula de Luke travou. O menino o fitava interrogativamente, em expectativa, mas logo virou o rosto para o lado, franzindo a testa,  o queixo trêmulo. Luke fechou os olhos por um momento e puxou o sobrinho para si, abraçando-o, mas sem dizer uma palavra. Havia mágoa... ressentimento.... que demorariam para serem esquecidos.

Ben sentia o amor do seu tio naquele abraço, bem como toda a dor dele. Ele já lhe dera muito... não podia esperar o perdão dele.

O menino estremeceu entre os braços do jedi.

-  Isso tudo... dará certo, não dará?

- Existem muitos riscos. Porém também há grandes chances de sucesso, caso façamos com toda a atenção  e cuidado. E se algo sair errado... o duplo será desfeito imediatamente.e erguerei a redoma novamente. Voltaremos à situação presente. - olhou para o menino - É algo... grande para pedir para qualquer um. Se não quiser ou não se sentir preparado....não aceite. 

- Não. Deve ser feito.. Não se pode ficar como está, tio Luke. Eu não sei o que pode acontecer se... - respirou fundo.

- Está com medo, Ben? –  colocar o menino em perigo... para que ele não fosse um perigo para si e para os outros. Isso o trucidava,. 

- Estou. Mas quero fazer. Devo fazer. – por ela., pensou, pelo o que havia feito para ela... e não queria fazer para mais ninguém. – Estará comigo, mestre... não devo ter medo.

Luke o abraçou ainda mais, olhando para o céu. A responsabilidade daquele ato era enorme... Jedi de tempos antigos haviam conseguido. Aquele menino... ele era uma representação da Força... mas ainda um menino

. Ben voltara a confiar nele... completamente. Entregara-se à tarefa, a fé depositada nele, Luke. Tinha também que confiar nele.

- Eu não falharei, mestre.

Luke respirou fundo. Não poderia falhar com Ben... de novo.  

*************************************

 


Notas Finais


Exit Music (for a film) - Radiohead
https://www.youtube.com/watch?v=8051Hipbmmw

Para lembrar: Ellin/Rey é uma Andhera e o perfume dela é o de flores silvestres, flores do campo, que Ben sente em sua vida adulta.
As flores silvestres/do campo são citadas neste capítulo fazendo analogia da chegada e presença de Ellin/Rey na vida dos Skywalkers


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