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História De luz e de sombras - Laços de sangue


Escrita por: Ninlil

Notas do Autor


Tudo que é feito no presente afeta o futuro por consequência, e o passado por redenção.
Paulo Coelho

Nota: Este capítulo foi denso de escrever, pois é Kylo o centro. E dificilmente há como escrever sobre Kylo (nesta história) sem a mão pesada.

Editado o capítulo em 06/10/2017: editei a cena de Kylo com a multidão-refém e o oficial da Primeira Ordem com o intuito de expor o modo de pensar de Kylo. Antes, não compactuava com sua personalidade.
O capítulo não sofreu mudanças estruturais, mas de qualidade.

Capítulo 33 - Laços de sangue


Fanfic / Fanfiction De luz e de sombras - Laços de sangue

 Ele caçava. E caçava com prazer.

 Ele caçava sua própria mãe.

 Após a destruição do Sistema Hosnian e da frota de combate por Starkiller, a Resistência se desmantelara. Como animais feridos, os resistentes lambiam suas feridas em esconderijos ocultos, dispersados e perdidos. Não havia notícia, ainda, da formação de uma nova base, caso esta estivesse já sendo organizada, com o que sobrara de membros, naves e recursos.  A única novidade que fazia o sangue gelado de Kylo Ren correr mais rápido era a pista – na verdade, mais do que uma pista – do paradeiro da General Organa: Naboo. O próprio Líder Supremo o enviara para lá, com a afirmação que ele encontraria... sua mãe.

A segunda de sua família a ser morta em sua lista. Depois... seu antigo mestre. E, por último, a garota.

 Existia, porém, um outro traçado na Força que o incomodava além da chacina de sua família e que constantemente o requisitava em suas meditações: os sencientes à Força raptados durante todos aqueles anos, mesmo antes de ele se juntar a Snoke. As crianças destinadas a serem doutrinadas, não-sensíveis, arrancadas de seus lares durante décadas, formaram o exército da Primeira Ordem. A grande maioria aceitara e se submetera aos comandos e à filosofia do Líder Supremo, stormtroopers leais e fanáticos, tendo algumas exceções, tal como FN-2187. Traidor!! Porém, os outros... os outros, latentes na Força, envoltos por um mistério. O Líder o excluíra desse projeto..., o que significava, claro, uma vertente importante no grande plano de Snoke, ainda desconhecido para ele.

 Durante os anos que permanecera sob a mão de ferro de Snoke, obedecera-o sem titubear... mas com os olhos abertos, bem abertos. Não era subserviente. Jamais seria a ninguém! Desprezava o fanatismo dos stormtroopers e de todos que literalmente idolatravam o ser trevoso. Ria internamente dos mais inteligentes, que percebiam Snoke como um símbolo, como Hux. Hux e tantos outros amavam e fascinavam-se com a ideia de um sistema rígido e ordenado, onde a galáxia seria regida como uma orquestra, na linha da ordem e progresso, sem dúvidas, sem questionamentos, uma máquina perfeita e esmagadora da vontade individual.

 Não... ele era mais... muito mais....! Compunha-se com o estofo dos vencedores, dos líderes, dos poderosos. Ele era filho da Força, momentaneamente sob a tutela do ser das trevas. Aprendia com ele... sugava todo o conhecimento da Força que Snoke lhe apresentava... armava-se paulatinamente para um dia... um dia... destruir seu atual mestre e tomar-lhe o lugar. E, para chegar a esse ponto, pacientemente aguardava, o ódio da espera a lhe dar forças... para descobrir o grande plano do Líder Supremo, usurpar-lhe o poder e destruí-lo.

Isso o motivava dia após dia desde que se entregara completamente ao Lado Sombrio.

Snoke esperava tal atitude dele, claro. Um mestre da escuridão não procuraria um aprendiz débil. Viveria no fio da navalha, alimentando aquele que se tornaria forte e capaz para cumprir seus desígnios e, ao mesmo tempo, tornando-se uma ameaça crescente. Chegaria ao ponto insuportável dessa ligação no qual ou o aprendiz, feito poderoso, tomava o lugar de seu professor. Ou o mestre, tendo-se aproveitado ao máximo dos poderes de seu discípulo, eliminava-o, já com um próximo acólito em vista. Assim fora desde que Darh Bane instituíra a Regra de Dois. Darth Plagueis, no entanto, com intenção de dizimar tal conduta por não achá-la producente e desejoso de inaugurar uma nova era entre os sith, não matara seu aprendiz Palpatine. Terrível engano... pois seu discípulo, o assassinara durante o sono.

 Snoke e Kylo tinham plena consciência dos perigos de dois senhores da escuridão conviverem juntos... que eram aliados por simples conveniência temporária. Ambos prescindiam um do outro. E justamente por essa relação precariamente equilibrada, o Líder Supremo nunca lhe deu chance de ele se chegar mais perto fisicamente, bem como participar na totalidade de seus planos.

O quanto essa estranha conexão se manteria... o quanto ainda essa insustentável balança não desbancaria... Kylo conhecia seus próprios poderes muito bem. Os do Líder Supremo.... difícil delinear. Poderoso ele se mostrara durante a convivência. No entanto, a abrangência de Snoke na Força ainda era sombreada... algo ainda não revelado. E as fronteiras do poder do Líder Supremo encontravam-se interligados com o limite de suas capacidades. Ren intuía que o grande plano de Snoke descortinaria suas intenções, bem como suas deficiências.

Por essa e tantas outras razões, Kylo fora discreto e prudente em suas investigações sobre os sensíveis da Força capturados durante todos aqueles anos, descobrindo apenas sua localização: Ilum, o lendário planeta das Cavernas Cristalinas, a qual fora fonte dos cristais para os sabres de luz, tanto para os jedi quanto para os sith.

 Foi com esses pensamentos que chegara a Naboo, a premência de esclarecer o papel dos sensitivos da Força em Ilum e com o gosto da caçada daquela mulher a quase fazê-lo salivar.

Já se achava há algum tempo no planeta e vasculhava-o com pente fino. As fronteiras espaciais do planeta fecharam-se em um grande cerco e eram vigiadas por diversas esquadras da Primeira Ordem. Nenhuma nave aportara ou decolava de Naboo. O governo planetário não o recebera com alegria e muito menos com irrestrita cooperação. Submetiam-se a ele, Kylo Ren, por medo, muito embora o desprezo fosse encoberto por detrás da obediência aos seus comandos. Desprezo por ele, o filho traidor da Princesa Leia Organa... o neto renegado da Rainha Padmé Amidala. Seus pensamentos descuidados flutuavam até ele e Ren os captava, esmagando-os com ódio. Como podiam relacioná-lo ainda com seu antigo eu, Ben Amidala Organa Solo?

 Eles sofreriam por causa disso.

Sorriu com satisfação sinistra. O Líder Supremo, então, não detinha toda a sabedoria. Ele lhe falara que o povo entregaria sua mãe sem delongas. Mas, não. Existia uma lealdade entranhada naquele povo e sua mãe era descendente de sua antiga amada rainha que ele não conseguia e nem queria entender. Lutariam por ela. Morreriam por ela. E a ocultavam. Tal atitude do povo de Naboo o irritava a ponto de desejar a matá-los... matar a todos, um por um, em um banho de sangue por tal desrespeito e audácia! No entanto, agiu como Snoke desejava, sem violência maior, porém com a sombra do medo, enquanto escrutinava os recantos de Naboo. O que equilibrava sua ria baseava-se no prazer secreto em ver a falha de discernimento do Líder Suremo e prolongar a caçada. Podia-se dar a esse luxo, a antecipação de um momento que aguardava há muito, muito tempo... Leia. Sua mãe. A mãe que o desprezara quando criança... a primeira a odiar em sua vida.   

 Os dias escorriam rapidamente... muitos, muitos dias. E Kylo aguardava que a paciência de Snoke se exaurisse e o liberasse para fazer o que tinha que ser feito... do seu jeito.

Não era o ideal se prender a esse deleite... a expectativa de matar aquela mulher. Uma falha... uma pequena digressão, admitia. O Líder Supremo o direcionava para ser liberto de quaisquer sentimentos e elações. Esse era o Mal... a liberdade de tudo e de todos, segundo a visão de Snoke. O ódio, a raiva, a paixão se perfaziam em instrumentos, em combustível momentâneo para as ações e não como base e estrutura. Caso fossem utilizados como motivador, quebrariam a corrente de liberdade e inseririam, quem os usasse, no universo de vínculos.

 Enquanto refletia, Kylo Ren ajeitava lentamente suas braçadeiras de couro, as quais continham, em suas costuras, adagas, ficando à mostra apenas o cabo das mesmas. Encontrava-se impecável em seu traje negro e imponente, blindado com sua escura armadura de cortosis, metal resistente aos ataques de sabre de luz. Sua eficácia não atingia a perfeição, porém lhe concedia vantagens em sua resistência e imponência.

Vaidade. Outro deslize nas premissas da escuridão? Viver sem sentir, sem ter vínculos... para atingir a liberdade. Não questionava a eliminação do amor, seu primeiro e longo aprendizado... Deixar de amar sua família. Espantou-se, durante o longo tempo em toda a sua adolescência, o quão fora resistente a deixar de amá-los, embora almejasse esse objetivo do fundo de sua alma. Anos... anos...! Provas impostas por Snoke...  dolorosas... a virada de perspectiva do olhar sobre quem o criou... Todos... todos amando-o por interesse e/ou por uma conexão biológica. Seus pais se sentiam obrigados a amá-lo por vergonha de si mesmos. Como pais não poderiam amar um filho? Mas por ele mesmo... como indivíduo? Não... ! Ele não era o filho que desejavam. Não se enquadrava em seus anseios e compatibilidades. Seu tio? Interesse pelo seu poder... e a satisfação de uma carência oculta sob as pieguices jedi... a vontade de ser pai. Lore? Ela enxergava nele um reflexo dela mesma... uma variação de si no menino. Amá-lo era amar a si mesma... E quando ele extrapolou nesse reflexo, afastou-o. Ellin? Uma criança que amaria qualquer um que lhe satisfizesse seus desejos!

 A consciência de si e que não necessitava de ninguém era libertador.

Ele gostava de sentir... não negava a si mesmo. O calor da raiva, a ardência do desejo, a satisfação da vingança, o gosto do ódio, a sensação do prazer... todas as sensações inseridas, envoltas e ordenadas pelo frio do Lado Sombrio. Por vezes, indagava-se até quanto Snoke estaria certo no caminho da liberdade, eximindo-se de qualquer tipo de relação com os demais. Deixar de viver para ter vida eterna? Sim, era isso que o Líder Supremo buscava, no fim. Ele não lhe falara exatamente, porém, mas como haveria liberdade na morte? O maior algoz, o cerceador da liberdade, o controlador da vida... a morte. Essa era fronteira final, a eterna e imensa questão de todo ser com alguma consciência. Não... Snoke procurava a vida sem fim e todo seu plano, o qual ainda se matinha desconhecido para ele, Kylo, rondava esse objetivo. Sentia em seus ossos... em seu sangue.

Ele também desejava viver para sempre e acima de todos, mas tendo os outros formando o seu pódio, como naquela visão, naquela primeira prova que Snoke o submetera ainda com onze anos de idade.

 A caçada. Caçava Leia... sua mãe. Mãe. A cicatriz em seu rosto se esticou com seu sorriso sinistro. Ora, como não sentir prazer nisso? Ainda poderia se dar ao luxo da vingança, não?  E depois... seu tio, seu antigo mestre. A garota, Rey... Ellin... por último e, mesmo assim, depois de ser usada pelo Líder Supremo em seu plano.

 Ou não.

Queria-a para si... desejava-a com uma ardência imensa. Não conseguia entender a razão daquela atração, desde que a encontrara pela primeira vez adulta, em Takodana, quando a dominara na floresta, quando a teve em seus braços, quando lutou com ela. Talvez, se satisfizesse seu anseio, ele se dissolveria após tê-la. Contudo, Snoke o advertira que não a maculasse em nenhum nível até ela ser entregue em suas esqueléticas mãos. Depois... depois... ah! Poderia fazer o que quisesse...

 Até ficar com ela, ao seu lado.  

Esse pensamento o aborreceu e o atraiu, duas forças opostas que se aproximavam e se mesclavam. Seria uma fraqueza sua? Matá-la seria o mais apropriado. Eliminar o problema. Entretanto... por que não satisfazer seu desejo por ela antes? Ou até... fazê-la voltar-se para as trevas e mantê-la até que se cansasse de sua companhia. Até transformá-la em sua discípula. Roubar o manto de Snoke e ter como sua acólita a filha de Luke Skywalker... a neta de Darth Vader...

Sua prima. Sua aprendiz. Sua amante.

Perigoso... e interessante.

Cansara-se das escravas... as escravas de olhos verdes claros e cabelos castanhos aterrorizadas em suas mãos. Enfadonho. Sempre igual. O medo nelas o entediava. Precisava de mais... mais! Ter a catadora... e ela o desejando?  Corrompê-la... transformá-la em uma aliada... contra o jedi... e contra Snoke. Ah... sua boca ficou seca. Triunfo. Vitória... para si mesmo... e diante de Luke Skywalker. Ah... sim. Muita satisfação teria em ver o mestre, seu... tio... presenciar sua filha voltada para as sombras e ao lado dele, Kylo. E depois matá-lo.

Sim!

O frio em suas veias diante daquela imagem fez com que todo o seu corpo vibrasse, a decisão tomada.

Com a questão solucionada, sua mente focou em outra situação que o espinhava intermitentemente: a luz persistente, insistente e resistente dentro de si, um resquício de seu antigo ego... tão forte que se personificara quase em um sobrevivente, quase como algo à parte de si. Como isso fora possível? Uma parte de si negava-se à escuridão, como se houvesse alguém dentro de si. O bem personificado. Era um acinte uma parcela de si mesmo se rebelar e constituir-se em um ser com consciência! Essa... essa quebra de si mesmo. O que mais odiava, o que quase o desequilibrava. Essa era a falha mais vergonhosa, pois era ele lutando contra si mesmo... ainda. Mácula em sua pureza sombria. Enquanto não apagasse o resquício luminoso de si era um fraco! Fraco como seu avô e patente sua queda para a luz.

Jamais!

Essa parte... esse seu antigo eu... Ben Solo. Fora ele que o impedira de tantos atos, que interferira em sua vida! Que lhe roubara memórias. Que não permitia ser por inteiro. Ele era o seu pior inimigo, essa centelha luminosa escondida nas trevas. E seria massacrado... sim. Derrotado em sua cilada, agora se ocultava, escondia-se... mas não por muito tempo. Perseguia-o dentro de si, vasculhando os recônditos de sua mente, procurando-o implacavelmente.  A luz se refugiava, escapava-lhe... até agora.

Sua mãe o auxiliaria a localizar seu antigo eu. Ela participaria... da morte de Ben Solo.

 O prazer da antecipação de estar frente a frente com sua mãe era como um frio ardente dentro de si. Aquela mulher... por aquela mulher sofrera na sua infância, correndo atrás de um olhar seu, de uma aprovação sua. De certa maneira, até ficara satisfeito por sua mãe tê-lo rejeitado. Ela o auxiliara no que se tornara. Era-lhe, de certa forma,... grato.

 E a gratidão nas sombras... seria a morte para ela.

               

                ********************

 E, enfim, Snoke lhe deu permissão para agir como sempre desejou.

O prazer, porém, veio com um gosto amargo. O longo tempo que permaneceu no planeta à procura da General Organa não fora um desperdício ou uma visão débil do Líder Supremo. Kylo Ren percebeu que, apesar de Naboo não capitular, não entregar a tão venerada filha da Rainha Amidala que lutara na Rebelião e agora assumia a liderança da Resistência, a presença ameaçadora constante da Primeira Ordem na figura dele e das tropas acabou por minar o espírito bravo daquele povo. Eles se abatiam dia após dia, sua combatividade pronta para o ataque que não vinha os exauriu. A tensão provocou brigas internas, histeria, separação onde havia uma só voz. Enfraqueceu-lhes a alma.

 Kylo compreendeu o jogo de Snoke e admirou-lhe a sagacidade, mesmo contrariado por mais uma vez o ser trevoso provar sua sabedoria. Caso, logo que aportara em Naboo, exigisse com violência a General, o povo reagiria com toda a sua força, com todo o seu destemor, uma batalha acirrada e suicida. Nessa luta, muito provavelmente sua mãe escaparia do planeta. O povo, apesar de perder a guerra e boa parte dos habitantes, ainda cultivaria o espírito bravo e honrado. Contudo, da forma que Snoke planejara, Naboo se desorientara, fragilizara o prumo, como uma manada de banthas sem direção.

Ele seguiu o plano do Líder Supremo, sua essência cruel de destruir a chama daquela gente em vez de eliminar a todos de uma vez só.

Quando Kylo Ren anunciou que mataria indiscriminadamente adultos e crianças até que Leia fosse apresentada, seus adversários enlouqueceram e até tentaram reagir, porém sem mais organização e disciplina. O desespero da alma atingida os debilitara física, mental e emocionalmente... ainda mais, pois Ren pretendia aprofundar a dor daquele povo mantendo vivos os guerreiros e as guerreiras, dilacerados pela dor de seus amigos, filhos, pais caindo sob o sabre de luz vermelha e cortados sem piedade pelas adagas.

O sol em zênite anunciava o sacrifício diário. Cerca de uma centena de crianças e adultos capturados e encerrados na praça em frente do palácio, praça essa que comemorara, décadas atrás, vitória de Naboo em relação à Federação do Comércio. Tropas terrestres guardavam os arredores e naves plainavam, assegurando que nada impediria o massacre. A transmissão da chacina seria reproduzida em todo o planeta.

 Os adultos formaram um cerco, guardando as crianças no meio, uma tosca proteção para com os pequeninos. Choros cortavam o ar. Frases de consolo murmuradas soaram como uma sonata de morte. O cheiro do medo entranhou-se no chão colorido da praça. O temor e a dignidade alternavam-se nos semblantes dos adultos trêmulos. Raiva. Revolta. Impotência.

Kylo Ren meneou a cabeça, a máscara bem encaixada. Ela lhe fornecia liberdade em sua fisionomia. Queria aproveitar aquele momento sem ter que controlar sua expressão e impor mais mistério e horror à sua figura diante dos expectadores em todos os planetas.

Ele gostava de matar, mas não indiscriminadamente. Havia a necessidade de uma motivação e uma escolha. Não era um carniceiro. Existia uma elegância na morte, um refinamento e um requinte prescindia de um ritual, motivação e finalidade. Claro que a morte crua possuía um gosto, a vida deles em suas mãos, o medo crescente dos demais quanto a ele, o fim de uma vida exalava a Força, uma nuvem invisível e etérea saindo dos corpos inanimados, centelhas retornando à sua fonte, chispas flutuando e emanando o poder em partículas, poder que animou seres com sonhos e anseios, causando um frêmito na alma dele. Não tinha certeza, mas a sensação que o envolvia era que aquelas vidas se incorporavam à dele, como se o vivificassem ainda mais.

Não era, no entanto, suficiente, apesar do deleite da morte em si. Não para ele.

Mas naquele dia específico, por essas e mais outras razões, seu prazer não se afiava, pois preferia ter Leia Organa sob seu domínio a matar toda aquela multidão e isso aplacava. De qualquer forma, ele cumpriria a ameaça feita, haja vista que a general continuava com paradeiro desconhecido.

O sabre seria suficiente, porém não continha o fator teatral que as adagas proporcionavam. O sabre era demasiadamente elegante e asséptico para aquele fim. E Kylo faria o trabalho perfeito, pois a imagem sangrenta daqueles inocentes deveria entranhar-se nos olhos e corações do povo de Naboo, o horror que ele provocara. Ninguém esqueceria quem era Kylo Ren. E mais ainda...: far-se-ia claro que a responsabilidade de todo o massacre, mesmo tendo sido ele a levantar sua mão, seria de Leia Organa, por não ter se entregado para evitar o genocídio.

Chegada a hora.

O medo de suas vítimas acabou por estimulá-lo.

Ele avançou contra a multidão, as facas em suas mãos, o sabre em seu cinto. As pessoas se afastavam, aterrorizadas. Um pouco decepcionado, admitia. Esperava alguma reação, alguma coragem, alguma força apesar do medo deles. Ah... um deles. Sim... ele vinha, molhado de suor de medo. Porém a raiva se tornou maior e a audácia e desespero se aliaram e aquele homem, sem poder algum, enfrentava ele, Kylo Ren.

 Um sorriso de satisfação lhe cortou o rosto. Afinal, não seria tempo perdido.

                **********************************

O problema em matar com as facas era o sangue. Muita sujeira. Era difícil tirar o sangue de suas mãos, cabelos e roupas. Desnecessário, quando tinha o sabre, tão eficiente e asséptico. Contudo, ocasiões requisitavam a glamour do sangue para os devidos efeitos na população. A violência tingida de vermelho jamais era esquecida.

Em desagrado, viu-se manchado de sangue por todo o corpo e por toda a sua armadura. A máscara protegera seu rosto e cabelos dos salpicos vermelhos. Deu as costas para as dezenas de corpos caídos na praça, o chão manchado para sempre com o sangue daqueles seres. Os gritos, ele ainda podia ouvir... e não saíram da mente de toda Naboo por gerações.

Um oficial da Primeira Ordem caminhou até ele, as costas rígidas. A voz saiu em uníssono formal.

- Senhor, fomos informados que a General Organa se entregou às nossas tropas e encaminha-se para este local.

 Ah, claro... ela se entregara... mas não a tempo de poupar aquelas vidas. Excelente... além de tê-la sob sua custódia, a general receberia toda a responsabilidade daquelas mortes por não ter sido... pontual.

O oficial, já beirando os seus quarenta anos, suava frio. Kylo meneou a cabeça de lado. Aquele militar deveria estar orgulhoso em comunicar a captura da comandante da Resistência.

Retirou a máscara para que o capitão visse seus olhos gelados.

- Fale, capitão. A verdade.

O homem estremeceu. Mas empertigou-se em postura de sentido para um superior.

 - Senhor, não quis interrompê-lo em sua... ocupação.

 - E qual motivo teria para aviltar a possibilidade de se intrometer em minha tarefa?

 - A chegada da general Leia Organa. Ela se entregou... a tempo. Houve uma confusão na comunicação, uma falha em meu esquadrão. Quando a notícia chegou a mim, o senhor já havia... começado a sanção com o povo de Naboo e não achei de bom tom tirá-lo de seu dever.

 - Ah... você, capitão... permitiu que eu passasse de um vulgar assassino?

 - Senhor, eu... não entendo. O senhor... mata. Matou milhares... não pensei que importasse...

- Não, capitão. Você teve medo que eu o matasse se me interpelasse durante a punição de um acordo não cumprido... quando este foi cumprido! Preferiu sua vida a me expor como um salafrário sem honra. Aquela multidão morreu sem motivo.

 - Senhor! Mas não entendo... não entendo!

 - Eles morrem quando eu quero. E desejei que fossem mortos caso Leia Organa não fosse entregue dentro do prazo estipulado. Ela cumpriu o acordo. Por sua causa, capitão, eu não cumpri o acordo. Você, capitão, permitiu que eu os matasse desnecessariamente e passasse por desonrado

 - O senhor se importa com eles?

 - Não, idiota. Eu me importo comigo e com meus propósitos.

- Desculpas, senhor...! Eu não compreendia seu modo de pensar. – ele agora não escondia o tremor – Agirei da forma correta da próxima vez, eu...

Não chegou a completar a frase. As duas facas penetram seu pescoço, uma de cada lado.

Kylo olhou com desprezo para o capitão morto.

- Incompetente. Até para entender, incompetente. Suas desculpas não foram aceitas. 

                *********************

Dez stormtroopers escoltavam os prisioneiros. De longe, no início da praça, Kylo pôde visualizar sua mãe, pequena em estatura e Chewbacca, em sua altura extraordinária, ainda maior do a dele.

O tapete vermelho estava estendido para ela, pensou Ren, em um sorriso dentro da máscara.

 Assistiu à sua mãe cruzar a praça coberta pela centena de corpos de inocentes dispostos à sua direita e à sua esquerda, um corredor ao centro livre para ela andar até ele, tingido de sangue. Ela olhava para os lados e, mesmo de longe, Kylo pôde vislumbrar a dor no rosto dela, a compreensão daquele massacre e a indignação tonalizada pela raiva contida.Cada criança, cada homem e cada mulher prostrados em poças de sangue, num macabro cortejo. A grande mão imersa em pelos do wookie apertava a da mulher, os grunhidos dele em lamento, enquanto passeavam diante da vastidão da morte naqueles seres deitados ao longo do caminho.

 Kylo calculara bem o tamanho do percurso e o tempo que sua mãe levaria para atravessar aquela cena macabra. Queria que ela sofresse a cada passo. Ele terminara de se limpar com um pano branco, agora tingido de rubro e inspecionou-se discretamente com olhos, satisfeito. A armadura era impermeável a sangue. Ela reluzia novamente. O cortosis se mostrava adequado até nesse tocante.

O grupo ultrapassou o espaço da praça e chegara até ele, a poucos passos à sua frente. Não vira sua mãe desde que partira para o encontro de Snoke, há quase dez anos. Ela jamais deixaria de ser uma mulher bonita. Os traços régios desde sua juventude permaneciam. No entanto, ela não ficara incólume à passagem dos anos e do sofrimento. Rugas riscavam seus olhos e o contorno da boca. Os músculos do rosto perderam a firmeza e o cansaço pintava seu semblante.

O wookiee o fitava em um misto de raiva, confusão e mágoa. Ele rugiu e fez menção para avançar, impedido pelo toque leve da princesa, antes mesmo que os soldados tivessem tempo para detê-lo.

 - Chewie, não. Meu filho ainda existe nele.

 Chewbacca balançou negativamente a enorme cabeça, contendo-se em não atacar Kylo, mas fitando-o com olhar assassino.

 - Olha-me com compaixão agora? Age mais erroneamente do que antes. Nunca me conheceu realmente.

- Não falo com você, ser desprezível. – sua expressão de asco transmutou-se em ansiedade - Ben, não permita isso. Meu filho, escute-me...!

 - Seu filho está morto. Eu o matei há muito tempo. Nem Han Solo, em sua morte, entendeu isso. Será assim com você também, mãe?

Ao ver a expressão de dor dela, Kylo teve um lapso de prazer. Tão fácil machucá-la com as lembranças... e também se desapontou. Esperava algum desafio. Teria superestimado toda a sua família? O pai fraco, querendo comovê-lo na ponte, em Starkiller. Sua mãe, tocada por uma frase... Admirável ele ser o que era, com pais como aqueles! O sangue Skywalker só se valia pela concentração de midhi-chlorians.

 Mas havia ainda a possibilidade de enfrentar a mãe a sós... ali talvez ela valesse toda a expectativa que nutrira em encontrá-la, pois até agora fora uma decepção. Daria uma chance a ela, para que se mostrasse como oponente à altura. Além do seu prazer pessoal,  informações da líder da Resistência se faziam essenciais. Quanto antes exterminasse com esse incômodo, esses resistentes, mais cedo Snoke se dedicaria ao seu plano primordial.

 Mais cedo ele se libertaria de tudo... até de Snoke, para viver de acordo unicamente com sua vontade... com Rey ao seu lado.

 - Leve-os para a cela. – disse ele para o stormtrooper com a ombreira vermelha – Quero interrogá-los antes de partirmos.

                **************************************

O salão não era de seu acordo. Tudo muito, muito claro. Toda Naboo era luminosa... até agora. Já deixava de sê-lo com sua presença, mas mantinha ainda o ar de paz, apesar dos corpos estirados na praça. Eles continuariam lá por ordem sua, até que apodrecessem. A única transmissão autorizada era aquela cena. E fosse para identificar algum membro da família ou amigo, fosse por morbidez, fosse por ódio, o povo daquele planeta, símbolo de paz, só olharia para aquela cena.

 Ele depositou sua máscara em uma mesa e ajeitou os cabelos, aguardando a prisioneira ser trazida a ele. A cela onde ela e Chewie foram alocados era demasiadamente pequena e medíocre para aquele encontro.

A porta deslizou e sua mãe entrou sozinha, os guardas cerrando a porta e deixando os dois a sós. A postura dela mudara, pois ela lhe escrutinava o rosto, surpresa e curiosa. Estaria ela a analisar o que aquela década de ausência o mudara? Ele era um adulto totalmente agora. Buscava ela o filho que tanto rejeitara antes? Via o assassino de seu marido? Enxergava o senhor sombrio que ele se tornara?

Uma profunda ruga entre os cenhos. Ela o analisava, sim... agora mais fria. Ótimo... ótimo. A maternidade nunca lhe caíra bem e seria uma ofensa ela se mostrar maternal agora. Não que ele se magoasse hoje em dia. Não a amava mais. Não amava mais a ninguém. Só sobrara o ódio e o ressentimento de alguém que lhe fizera mal. E alguém que devia eliminar fisicamente para ele crescer na escuridão.

 Não era tolo... Snoke ainda o testava. Sempre. E agora era com sua mãe.

 Ela se manteve em pé, imóvel, fitando-o diretamente sem medo. Isso, mãe... isso.

 - Você tirou a máscara. – disse ela secamente.

 - Você também... finalmente.

 - Não imaginei que existisse tanto ódio e ressentimento em você para que criasse esse monstro.

O tom dela mudara, não terno, mas pensativo. Kylo estreitou os olhos. Ela parecia estar falando com outra pessoa, apesar de não desviar os olhos castanhos dos dele.

 - Para você ver o quanto nunca olhou para mim.

 - Agora vejo o meu filho e não você.

- Nunca se deu o trabalho de verificar as consequências de seus atos para comigo, embora isso não importe mais para mim. De fato, você facilitou meu caminho para meu verdadeiro eu.

 Ela deu alguns passos, rondando-o. O que ela procurava? Alguma forma de tocar seu coração. Não tenho mais coração, mãe.

- Sempre olhei para você, Ben. Eu sempre te amei, filho. O erro foi meu. Você nunca foi um problema para mim. O problema era...eu.

- E justamente por isso se afastou de mim. Talvez você, entre todos, sempre soube o que eu era.

 - Não... eu só via essa face sua de agora... latente. Se eu tivesse realmente enxergado você, teria te visto de outra forma... o que você realmente é. Meu grande erro. Han temia as sombras em você, mas nunca perdeu a sua essência de vista. Luke tentou me ajudar desde o começo e eu não o escutei. Até Lore conversou comigo e eu a rechacei.

 Ele também começou a caminhar, agora os dois se circundando, como dois lutadores antes de se atacarem.

 - Você foi a única que não se deixou iludir por mim. Contemple o que criou, mãe. Assista o que faço... o que está na praça é apenas uma amostra, um presente para você... de agradecimento. Cada gota de sangue que derramei antes e aqui tem a sua marca.

- Tenho responsabilidade em ter magoado tanto meu filho, sim. Eu tentei mudar, mas me deixei levar pelos meus próprios medos. Disso... não me perdoarei nunca. Mas o que você é... fugiu a qualquer controle. Ben nunca faria isso. Ele se mataria antes. Eu sei. Eu sinto.

 Kylo parou de andar. O que ela estava dizendo...? Falava ora com ele, ora com outra pessoa? A culpa a tinha enlouquecido? Ou sua mãe captara aquele resquício de luz personificada dentro dele? Ela não tinha habilidade na Força. Tanto potencial desperdiçado quando ela decidiu não aceitar o treinamento do irmão. O poder que ela emanava era intuitivo, indisciplinado, ignorante de sua capacidade. Ela reagia, não agia na Força. Não teria como ela o enxergar a esse nível de profundidade. Até Snoke não tinha conhecimento do nível que aquela maldita luz dentro dele ainda sobrevivia, apenas sabendo que ele, Kylo, não era ainda completo na escuridão.

- Esse papel de mãe arrependida não combina com você. Tem culpa apenas pelo o que me tornei. E quero que tenha total consciência do que você ajudou a provocar.

 Lançou na mente dela todos os seus execráveis atos, os mais hediondos, sem poupá-la. Iniciou com a sensação de rejeição e abandono de sua infância e mesclou-a com todas as torturas, todas as mortes, todos os pensamentos sombrios, todas as suas intenções em fazer o mal. Encontrou resistência, um reflexo da Força nela, um escudo levantado, uma barreira forte, mas sem habilidade. Forçou lentamente as imagens, os sentimentos, as ações. Sua mãe levou as mãos à cabeça, suportando o quanto podia, o rosto em uma careta de dor, enquanto resistia. Seu corpo fraquejou, como se o mundo lhe pesasse e suas pernas não se aguentassem. Ela caiu ao chão, sentada, soltando gritos silenciosos de dor pela violação em sua mente e pelo horror de toda uma vida nas sombras.

Kylo a observava abatida no solo com grande prazer, realçando na mente dela todos os detalhes pavorosos de seus atos. No entanto, sua mãe era forte. Qualquer outra pessoa já teria desfalecido diante de tanto horror e ela ali, suportando sem emitir um urro sequer. Em meio àquela violência que lhe impunha, captava a dor dela, a noção da responsabilidade dela dentro daquele mundo tenebroso de vivências.

Isso, mãe. Sangre. Sangre por dentro. Veja que você também me fez o monstro que tanto odeia. Veja que o seu filho que antes existia foi morto com sua ajuda. Veja que você não é tão boa quanto pensava, que seus valores em nada impediram que falhasse. E veja... como sou grato por isso!

 - Ben! Ben!

Agora, o momento de ela suplicar. Tão rápido? Esperava mais de uma Skywalker.

- Ben, pare com tudo! O custo é alto demais para você e para todos! Meu filho, você não tem mais controle! Seu sacrifício se tornou uma tragédia!

O sorriso de Kylo Ren morreu e ele se viu estatelado com aquelas palavras. Estacou imediatamente com as imagens, chocado.  De sua altura assombrosa, olhou para a mulher caída aos seus pés, que agora arfava, tomando fôlego.

 - Sacrifício? Que sacríficio?

Ainda ofegante, sua mãe o mirou profundamente, agora ela com um sorriso de satisfação nos lábios, enquanto se levantava. Mesmo em sua baixa estatura, a verdade em suas palavras lhe dava imponência.

 - Você não sabe, não é? Meu filho... meu filho possuía todo esse ódio dentro dele. Ele poderia ter se transformado em um monstro, mas não permitiu. Luke me contou... contou como Ben lutou contra a própria natureza desde pequeno. Como ele... como ele te criou para não se tornar você!

O rosto de Kylo empalideceu mortalmente. Sua mente girava, alucinada, em contraste com seu corpo imóvel. Como ele... como ele te criou para não se tornar você! As palavras retumbavam como uma sentença, uma revelação. Suspeitas... murmúrios... sensações... não. Não. Nunca deu asas a essa ideia.... inconcebível. Impossível!

 - Você vai morrer por causa dessa mentira!

 - Mate-me, então, Kylo Ren. – seu desprezo era tão grande que foi como um tapa ao pronunciar seu nome - Kylo Ren. Você nunca foi meu filho. Meu filho nunca seria você!  Ele poderia ter sido mas teve a coragem de não ser! Mesmo eu tendo falhado como mãe, ele não sucumbiu. Você não é ... nada. Você não existe! Você não passa de um....

Os olhos de Ren arderam de fúria contida, enquanto esmagava o pescoço dela com a Força. Aproximou-se dela lentamente, gelado por fora, a ira por dentro, enquanto pousou a mão na testa de sua mãe para lhe arrancar a lembrança.

Não encontrou nenhum obstáculo. Ela abriu as comportas das recordações, puxando essa reminiscência específica, oferecendo-lhe com gosto, mesmo já quase desmaiando pela falta de ar. E Kylo então viu... viu Luke Skywalker encontrar-se com Leia antes de partir para o exílio. Ouviu a voz grave do jedi ao relatar a criação do duplo, do engano para com Snoke. Escutou  que Ben Solo, já jovem adulto, decidira, à revelia de Luke, esconder Ellin do constructo; que ele se afundou dentro de si, permitindo que o duplo assumisse seu corpo e sua vida a fim de se poder se aproximar de Snoke e matá-lo. Que Ben Solo se sacrificara por todos aqueles anos, oculto na mente de Kylo Ren, à espera do momento propício.

Que Kylo Ren não existia. Que Kylo Ren era uma construção, resultante da quebra da alma.

Que Kylo Ren não era nada.

 Ele liberou Leia do enforcamento, estarrecido. Ao longe, muito longe, escutou os gemidos dela e sua tosse. Em meio ao seu momentâneo estupor, a frieza calculista dele lhe alertou que os dizeres do jedi não continham falsidade... nenhum traço de mentira.

 Ele não era nada.

A fúria cresceu dentro dele juntamente com a constatação da verdade. A frieza declinou à abrasante ira, seu ódio e revolta a tomar corpo como um vulcão. Ele... ele... uma sombra de Ben Solo? Um duplo? Um ente criado? Um ser que não possuía uma vida inteiramente sua? Um golem constituído para enganar Snoke?

O ar se adensou e os enfeites do quarto explodiram, as vidraças se estilhaçaram, os móveis se partiram, os tapetes se inflamaram, as paredes racharam. O urro que saiu de sua garganta foi medonho, com toda fúria que um ser poderia possuir. Os guardas postados do lado de fora do ambiente abriram a porta e um deles foi arremessado contra a parede do corredor, caindo morto. O outro conseguiu se salvar, fechando a porta, que deslizou trêmula e quase não se encaixou na fenda.

Todo o corpo de Kylo ardia e ele quase se sufocou com o próprio ódio. Voltou-se para Leia e a trouxe para si com a Força. Agarrou-lhe o braço fisicamente, quase o estraçalhando. Queria matá-la mil vezes! Queria que ela explodisse em suas mãos! Queria ver o sangue dela escorrer.

 E ela o olhava desafiando-o, deliciando-se com o momento dele de descontrole. Naquele instante, percebeu que não poderia atingi-la. Ela estava pronta para morrer e não se importava. Ele poderia torturá-la indefinidamente que aquela satisfação não sairia de seu semblante. Ela perderia a vida, orgulhosa de Ben Solo! Ela... ela encarava aquele ato como uma retribuição ao filho... até uma compensação por tê-lo mantido afastado dela por toda uma vida. Ela colocava o filho acima da Resistência, pois a Resistência existia, tinha comando por suas mãos! Ela, logo ela, que sempre priorizara o coletivo à sua vida pessoal e aos seus entes queridos.  Ela, com aquela revelação e com a disposição de pagar por ter contado a grande verdade, sentia-se, de certo modo, redimida para com Ben Solo!

A frieza voltou a circular em seu sangue, em sua alma. Não daria essa satisfação àquela mulher. Não daria a vitória de seu desmando a ninguém!! Ele não nascera daquela mulher, mas ele existia! Ele arrasara mundos, matara incontáveis seres, mudara o destino da galáxia! Ele existia muito mais do que qualquer outro ser, até de Snoke! Pois ele veio do nada e se tornou... tudo.

 Uma calma sinistra se fez nele. Liberto. Sim... liberto de tudo. Aquela não era sua mãe. Ele não tinha família. Ele não tinha história. Ele era ele! Nenhuma vergonha, nenhum conflito! Desde seu nascimento bizarro, ele fora ele! Ele nascera assim. Ele era literalmente filho da Força! Ele não devia nada a ninguém em tempo algum.

À medida que a serenidade sombria transparecia em seus olhos, Leia se agoniava, pois pressentia o mal. Com prazer, viu o medo nascer nela diante das sombras dele. Não por ela... mas pelo seu filho. Viu o arrependimento dela vir por ter revelado a verdade. Enxergou a consciência dela que sua avaliação fora errônea. E que a verdade, em vez de destruir a ele, Kylo, só o fortaleceu.

O poder dele era como uma onda gelada, invadindo todos os recônditos de sua mente, à caça de Ben Solo, de uma forma que ele nunca imaginara ser possível. Não o encontrara, mas tinha certeza absoluta que ele o escutaria naquele momento.

 - Ben Solo! – gritou com sua voz externa e interna, enquanto ainda segurava Leia pelo braço – Eu sei que você existe! Eu sei quem você é! Estou com sua mãe. Vou fazer ela sofrer. Vou matá-la agora se não aparecer para me enfrentar!

- Filho, não! – disse ela, sem saber se seria ouvida pelo filho – Não apareça! Não importa o que acontecer comigo!

-Se seu filho é tão honrado como disse, ele virá. – sua voz era baixa e perversa - Ele virá, mesmo você não merecendo. Eu vou matar seu filho, Leia Organa. E você é a responsável. Vai sofrer com essa culpa antes de eu dar cabo de você.

 Arremessou-a num empurrão com a Força e ela bateu na parede do outro lado da sala, desabando no chão, sem sentidos.

Silêncio. Torturante silêncio. Então, em sua mente, Kylo sentiu um calor emergindo, uma ira similar à sua, mas com o calor da paixão, ressoando dentro de si como um trovão

 - Deixe minha mãe fora disso, covarde! Venha, desgraçado. Venha lutar comigo!!

 Kylo Ren sorriu abertamente, os olhos a brilharem.

 - Você está morto, Ben Solo.

 


Notas Finais


Olá!
O capítulo 33 me deu trabalho...! Já havia escrito outro capítulo (o qual virá para a história) mas senti que o momento da descoberta de Kylo sobre sua origem era agora. Então, cá estamos!

Os próximos capítulos também serão tensos e não tenho como evitar esse andamento, pois a história se encaminha para seu ápice lentamente. Então, segurem o coração!
Espero que tenham gostado.

Capa: https://www.cnet.com/news/star-wars-the-last-jedi-posters-red-carrie-fisher-john-boyega-daisy-ridley/
(foto editada)


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