Por mais que eu limpasse, folhas coloridas sempre tornavam a cair em meus ombros. A luz alaranjada do sol poente projetava longas sombras que não se contentavam com o chão e estendiam-se pelos muros das casas. O balanço em que eu estava sentado ia para frente e para trás; eu estou apenas olhando para algum ponto da rua, mas nenhum ponto exato. Droga, devolva-me meu sorriso. Já não vejo mais graça em nada, pois você transformou meu mundo numa aquarela de apenas uma cor: cinza. Eu te odeio, mas ao mesmo tempo não consigo deixar de te amar... Meu único desejo é tê-lo de volta em meus braços. Pensar em você ainda me dói muito, principalmente porque eu sou o culpado de tudo isso, se eu não tivesse sido tão idiota provavelmente você ainda estaria aqui, comigo. Ah, Yoongi, mesmo você não estando mais aqui ainda mexe muito comigo, como eu queria poder me livrar desse peso em minhas costas, porém creio que jamais será possível. Algumas crianças passam correndo e sorrindo por mim, por algum motivo o sorriso delas me lembrou do seu... Seu sorriso era capaz até mesmo de fazer uma tempestade dissipar-se, eu daria tudo para poder vê-lo novamente.
Suspiro e deixo que as folhas acumulem-se sobre meus ombros, elas também me lembram você. Éramos tão felizes juntos, costumávamos vir sempre aqui, embaixo dessa cerejeira, para observar as folhas e as flores que dela caíam na passagem das estações. Lembro-me que sua estação preferida era a primavera enquanto a minha era o outono, éramos opostos um do outro por isso nos dávamos tão bem, você era o que faltava em mim e eu o que faltava em você. Lembro-me de quando nos conhecemos, ainda estávamos no colegial; o sorriso que você dirigiu a mim naquele dia ainda está vivo em minha memória. Você era o garoto novo que sempre sentava lá atrás e não falava com ninguém, porém eu consegui me aproximar e antes que me desse conta já estava apaixonado pelo seu jeito, pela sua voz calma e pelo seu sorriso inocente. Você sempre fora o mais baixo, portanto eu o carregava em meus braços ou em minhas costas; ríamos muito ao brincar de tentar adivinhar a forma das nuvens deitados na grama, estávamos sempre rindo e nos divertindo... Nem parece que já faz tanto tempo. Começamos a namorar no final do último ano na escola, lembro-me que foi aqui mesmo, sob as folhas desta cerejeira e o atento olhar da lua, que trocamos nosso primeiro beijo. Sempre víamos as estações mudarem juntos e, algumas estações após nosso primeiro beijo, trocamos carícias mais profundas e intensas no tapete da sala de minha casa pela primeira de muitas vezes; jamais esquecerei da forma como você dizia meu nome, da forma como gemia meu nome. Lembro-me também que você sempre deitava-se ao meu lado com a respiração ofegante e deixava sua mão repousar sobre meu peito nu.
Sinto lágrimas a se formar em meus olhos, mas não as deixo cair; lembrar de ti me dói mais do que qualquer coisa. Com o passar do tempo e das estações fomos amadurecendo nosso relacionamento e começamos a morar juntos sem que ninguém soubesse; pensando bem, só bastou alguém descobrir nossa felicidade para que tudo desse errado. Após mais algumas estações lá estávamos nós no sofá da sala trocando carícias e beijinhos quando sua mãe invadiu nossa casa, ela ficou indignada por ver seu filho morando com outro homem, disse que não o criou para ser esse tipo de pessoa e automaticamente ligou para o seu pai para que o mesmo pudesse vir buscá-lo. Foi aí que tentaram tirá-lo de mim pela primeira vez; você voltou a morar com seus pais, porém às vezes conseguíamos nos ver às escondidas e então podíamos demonstrar todo o carinho que sentíamos um pelo outro. Contudo, porém, entretanto, todavia, nada é perfeito. Em um desses nossos encontros escondidos de seus pais pude notar várias manchas roxas e hematomas em seu corpo, quando perguntei o que havia sido aquilo você simplesmente dissera que não fora nada, mas após eu insistir um pouco, você revelou-me que seus pais queriam casá-lo a força com uma mulher que você nunca vira na vida.
Eu fiquei muito mal, ele recusara-se a casar com ela e apanhara de seus pais por mim; Yoongi realmente amava-me e eu também o amava, por isso tomei uma decisão. Em nosso encontro seguinte disse que não poderíamos mais nos ver, que seria o melhor para nós dois; nossa última memória juntos deveria ter sido ao menos feliz, mas foi completamente o oposto, entre lágrimas eu dei-lhe um último beijo, sussurrei em seu ouvido que o amava e parti, deixando-lhe totalmente sem norte. Você deve ser pensado que eu não o amava, mas muito pelo contrário, eu te amava a tal ponto de privar-me de minha própria felicidade para te ver bem, sabia que enquanto você estivesse comigo iria continuar sofrendo. Eu fui um idiota. Poderíamos ter fugido juntos, mas a ideia só passou-se pela minha cabeça após ver a merda que eu havia feito. Você continuou a ligar-me e a mandar-me mensagens, mas eu ignorava todas enquanto chorava na cama que um dia fora nossa. Seu cheiro ainda se faz presente em nossos lençóis, não importa o quanto eu os lave, ele continua lá como se você ainda dormisse ao meu lado todas as noites. Após algum tempo as ligações e as mensagens foram diminuindo até simplesmente pararem de vez, assim como as folhas da cerejeira que iam amarelando-se gradativamente até caírem por completo. Todos os dias que se seguiram eu acordava na esperança de que você fosse mandar-me uma mensagem para dizer-me que estava bem, mas isso nunca acontecia. Tentei entrar em contato, mas você não me respondia e eu já não sabia mais o que pensar. Talvez você tivesse seguido meu conselho e conseguido me esquecer, eu rezava para que realmente fosse isso mesmo sabendo que jamais poderia esquecê-lo. Alguns dias depois, exatamente no dia em que o inverno transformou-se em primavera, recebi a notícia de sua morte. Assim que tomei conhecimento disso não quis acreditar, meu Yoongi jamais se suicidaria, mas essa era a realidade, ele havia tomado uma certa combinação de remédios e morrera devido as reações deles em seu organismo. Ao lado de seu corpo foram achadas algumas pétalas ressecadas de cerejeira e as palavras "eu te amo" escritas com sangue no chão próximo às pétalas. Quando eu finalmente me dei conta do que havia feito, simplesmente desabei, se não fosse por minha idiotice de achar que estava fazendo o melhor para você, talvez ainda estivéssemos juntos.
O vento sopra forte e uma brisa morna me atinge, fazendo as folhas caírem de meus ombros e o balanço em que eu estou sentado balançar para frente e para trás. Mesmo após tantas estações terem passado eu ainda não consegui superar sua morte, ainda acho que algum dia acordarei com você ao meu lado, que algum dia acordarei com ao menos uma mensagem sua em meu celular... Yoongi, você me faz tanta falta... Sinto saudades de quando você sorria ao dizer meu nome... Tudo o que eu mais queria era que você voltasse pra mim.
Um vento forte sacode a cerejeira, levando todas as poucas folhas alaranjadas que ainda restavam, sinto uma brisa quente envolver-me e automaticamente viro-me na esperança de que tudo aquilo tivesse sido um pesadelo e de que você estivesse ali, atrás de mim, mas tudo isso fora apenas paranoia da minha parte; a cerejeira era minha única companhia. Suspiro e deixo que o vento mova meu balanço, fecho os olhos para poder lembrar-me melhor de seu rosto e sorrio levemente; apesar de já ser noite, uma brisa quente passa próxima aos meus ouvidos e eu tenho a certeza de ouvir a coisa que você mais me dizia. "Eu te amo, Hoseok" foi o que o vento dissera a mim, isso pode ter sido apenas ilusão minha, mas sei que me animou pelo menos um pouco. Levanto-me do balanço e olho para a pálida lua minguante sobre mim, você amava meu sorriso assim como eu amava o seu, sem que eu perceba um sorriso bobo se apodera de meus lábios. Começo a caminhar pela calçada a caminho de volta pra casa, paro e espero o sinal fechar para que eu possa atravessar uma rua; após alguns segundos olho para os lados e atravesso, porém ouço o som de pneus derrapando e viro-me a tempo só de ver uma forte luz aproximar-se de mim, toda a minha vida, toda a minha história com Yoongi, tudo passou-se como um filme em minha mente. A última coisa que senti foi apenas o impacto de meu corpo contra o chão após ter sido arremessado com força como se eu fosse uma das folhas da cerejeira que o vento soprou.
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