História Dear, Sophie. - Primeiro

Madri, Espanha- 2 de Junho de 2012

__ Eu sei o quanto soo insensível quando recuso seus convites, Sergi. A questão é que já conversamos sobre mudar-me para Madri. Já havíamos entrado em comum acordo, não sei por que você insiste tanto nisso. __ Falei, revirando meus olhos.

Sergio sabia bem o quanto esse assunto era delicado. Nas inúmeras vezes que tentávamos resolver esse assunto, em todas elas acabávamos discutindo. As brigas não eram frequentes, aconteciam em algumas de nossas despedidas; ou quando um de seus companheiros anunciava a maternidade de suas esposas e ele me ligava, dizendo o quanto seria feliz se eu estivesse ao seu lado em todos os dias.

Era difícil negar um pedido seu, especialmente quando me ligava de madrugada, depois de um tórrido partido de futebol. Ás vezes estava tão exausta de mais um dia na faculdade; ou estudando anatomia, que mal conseguia distinguir todas as suas lamúrias e pedidos. Concordava com todos, apenas no outro dia, ao observar suas mensagens, percebia que, acabava por prometer algo que, talvez, não estivesse ao meu alcance, cumprir.

Nunca fora fácil lidar com a situação da distância. Sevilla até então me parecia o porto seguro, a menos que não me sentisse mais completa estando lá. E era exatamente assim que se passava meus dias. Trocando mensagens, ligações a noite, nada me parecia suficiente para suprir a necessidade do contato. Não ignorava o fato de que gostaria de passar mais tempo ao seu lado, algumas semanas juntos; outras não, eram como um martírio para nós dois. Mas ele sabia o quanto a faculdade era importante para mim, assim como para ele estava o futebol.

Estudar Medicina sempre me pareceu um sonho distante, até receber aquele misterioso envelope em uma quarta-feira. Lá estava minha carta de aprovação para cursar medicina e, um dos alicerces para me manter em Sevilla. Se não fosse a plena realização de um sonho de criança, certamente estaria embarcando para Madri naquelas frias semanas de Fevereiro. 2010 já se iniciava gélido, talvez ainda mais que 2012.

__ Eu sei. Eu sei. __ Repetiu duas vezes, depositando um beijo calmo em minha nuca. __ Desculpa por insistir mais um vez nesse assunto, embora eu ainda não tenha desistido, irei te vencer pelo cansaço Julia.

__ Você vence todos pelo cansaço, Tarzan. Mas dessa vez eu não serei a Jane. __ Falei, me desvencilhando dos seus braços, vendo-o sorrir ao ouvir nossos apelidos.

__ Tem razão você nunca quis ser minha Jane. __ Falou, com a feição de chateado, porém eu sabia que sua fala estava carregada de ironia.

__ Você me abandonou e veio viver na civilização, acha mesmo que eu deixaria barato? __ Retruquei. Sergio esboçou um sorriso largo, logo acompanhado de uma gargalhada alta.

__ Acho melhor pararmos por aqui, se não a senhorita vai fazer como ontem: sair irritada, me deixando sozinho. __ Pegou o copo de suco, o qual havia preparado para mim, tomando-o rapidamente, como se estivesse sedento.

__ Lógico, você ficou me provocando, dizendo o quanto aquela jornalista e sei lá o que mais, era incrivelmente linda. __ Falei, deixando evidente o quanto aquele assunto me incomodou.

__ Você é a mulher mais linda e ciumenta que eu já vi. __ Aproximou-se novamente, colocando o copo de vidro, sobre a bancada da cozinha.

__ Não é ciúmes, mas nenhuma mulher gosta de ouvir seu namorado dizendo que acha outras mulheres bonitas. __ Sergio gargalhou novamente com o meu comentário, mal sabia o quanto sua indiferença me incomodava.

__ Não se preocupe com Pilar Rubio, ela só é uma apresentadora bonita, nada demais.

Madri, Espanha. 10 de Outubro de 2012

                Mal conseguia digerir o misto de sentimentos que rondavam minha cabeça. Só me dei conta da minha total insanidade em estar parada próxima a Avenida, quando um motorista resolveu parar seu carro e me questionar, preocupado, se eu precisava de ajuda. O bombardeio de mensagens e notificações em meu celular, já indicava que o assunto havia virado público. Não que eu não imaginasse que isso aconteceria logo quando vi no site de fofocas, digo, público, para aqueles que me conheciam e se preocupavam comigo.

                Eu queria responde-los dizendo: “Estou bem, já imaginava que isso um dia viria acontecer!”. Mas não estava. Não estava bem e nunca, se quer, cogitei a hipótese de que Sergio faria isso comigo. Ver fotos suas ao lado daquela mulher, estampado como manchete de fofoca, sem dúvidas, fora o pior momento que eu havia passado. Eu compreendi a situação vendo apenas uma delas, não precisou que eu lê-se a coluna completa para ter a certeza de que aquilo se tratava de algo verídico. Sergio me traiu da pior forma.

                A lembrança de sua fala “não se preocupe com Pilar, ela é apenas uma jornalista.” soava insistente em meu sub consciente. Queria gritar, chorar e cuspir em sua cara toda a angustia e mágoa que me tomava por completo, mas sabia que, talvez, ignora-lo seria a melhor forma de me recompor desse sofrimento. E era o que eu estava tentando fazer, não da melhor forma, visto que me arriscava em uma cidade estranha, ao meu ver, como Madrid. Talvez se estivesse em Camas, me sentiria melhor.

“Cariño, já estou em casa!”

Sergio havia me enviado uma mensagem. Ela era clara, certamente ele ainda não havia visto a notícia. Ou talvez, acreditava que ao se fazer de desentendido, conseguiria conversar comigo mais facilmente. Recuperei qualquer resquício de coragem que ainda residia em mim  e resolvi encarar de frente a situação. Faria o ver com seus próprios olhos, o quanto aquilo havia me destruído por inteira. Se Sergio se incomodava quando me via triste com algo, sentiria na pele as consequências de suas escolhas.

Adentrei bruscamente o quarto, sabendo que o encontraria lá, enrolado em uma toalha, como fazia todas as vezes que chegava dos treinos. Vi seus olhos me fitarem assustados, certamente se perguntando o porquê da minha face estar tão rubra e indecifrável; e as maças do rosto tão vermelhas, indicando que eu havia chorado. Aqueles olhos caramelo que tanto me fizeram perder o ar, ou que me tiraram tantos sorrisos; agora, eram o motivo da dor.

__ Aconteceu algo, Cariño? __ Sergio se pronunciou e com cautela, tentou se aproximar de mim.

Recuei rapidamente, quando dei conta de que se ele estivesse próximo demais, seria o suficiente para que eu perdesse qualquer dignidade e coragem que me restavam. Estendi meu celular á ele, o vendo pegar incrédulo com a minha atitude. Estava aberta a reportagem em que anunciava o novo affair do jogador merengue.

Seus olhos adquiriram uma expressão séria. O vi dar as costas e permanecer nessa posição por alguns minutos. Pensei que ficaríamos assim, sem saber reagir diante do acontecido por horas, até que eu não aguentasse guardar toda raiva e explodisse ali. Mas ele se virou, apenas me observando. Seus lábios abriam e fechavam rapidamente, como se tentasse encontrar algo a que falar, mas não conseguia. Eu seguia quieta, apenas não conseguia mais segurar as lágrimas que vinha acumulando desde que decidi vir até ele.

Sergio não sabia o que falar, pois tinha a certeza de que esse era o nosso fim e que havia destroçado qualquer sentimento que eu ainda sentia por ele.

Camas, Sevilla. Dezembro de 2017

__ É dezembro, Julia. A menina está de recesso escolar, deixe-a assistir esse desenho. __ Alice tentava argumentar, visto que Sophie insistia comigo que queria assistir ao filme do Tarzan.

__ Eu não sei porque Sophie insiste em querer assistir esse filme. Esse filme é horrível. __ Falei, dando-me por vencida e entregando o controle remoto as mãos de Alice.

__ Talvez porque você não goste dele, pois te lembra a Sergio e o que vocês dois tinham. __ Beto falou, me cutucando com a colher que mexia o cozido que o mesmo se dispôs a fazer para o jantar.

__ Você sabe que não é por isso. __ Falei, revirando os olhos, visto que Alice e Beto davam gargalhadas do meu incômodo com o assunto.

__ Eu não sei de nada, Julia. Só sei que te conheço desde que nasci e que tentar evitar as lembranças do passado, não vai te levar a lugar algum. Você se esquece que tem um pessoinha naquela sala que, te lembrará todos os dias de que vocês dois ainda precisam acertar os erros do passado.