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História Deep as the Sea - Harry


Escrita por: phamancio94

Notas do Autor


Aqui vai mais um capítulo! Muito obrigado pelos comentários do capitulo anterior <3
Dessa vez, vamos ver o ponto de vista do Harry, nosso tritão! Espero que gostem do capitulo, tanto quanto eu gostei de escrevê-lo. Bjs :*

Capítulo 2 - Harry


Fanfic / Fanfiction Deep as the Sea - Harry

Ainda que muito longe da costa, ainda conseguia vê-la se afastar lentamente. Não podia acreditar que havia reencontrado aquela mesma menina que havia falado comigo no verão de 2003. Mesmo tão novo, com meus recém feitos dez anos de idade, minha verdadeira natureza havia começado a florescer. Eu não entendia porque as crianças me achavam tão esquisito e me evitavam na escola, ou porque algumas pessoas passavam reto quando eu e minha mãe íamos até a feira. Mas aquela garota permaneceu ao meu lado. Ela se ofereceu para me ajudar a procurar meu colar de conchas entre as pedras, acabando por sujar suas roupas e desmanchar o penteado tão bem feito.

Naquela época não troquei com ela nenhuma palavra, porque.... Eu.... Eu não sabia por que tive tanto medo de falar. Talvez por estar tão acostumado a ficar quieto e me comunicar apenas com minha mãe, ou mesmo falar sozinho. Quando achamos meu colar e ela o pôs em meu pescoço, lhe agradeci com um beijo e fugi ao ver alguns adultos se aproximando. Me escondi atrás de algumas pedras e voltei para o mar. Fui batendo minhas perninhas na água, como sempre fizera desde que minha mãe me ensinou a andar na beira da praia e mergulhei.

Minhas memórias foram interrompidas pelo caldo que uma onda me deu, e dei-me conta de onde estava e do que acabar de acontecer. Aquela mesma garota, agora tão crescida, diferente e mais linda do que nunca, havia acabado de me beijar. Me beijar!

No início, quando vi que ela permaneceu parada a me observar, pensei que ela acabaria sendo como as outras; Desde meus treze anos, minha aparência é um verdadeiro imã do sexo feminino. Um simples olhar, uma troca de olhares profunda e..... Pronto. Ela estava enfeitiçada. Eu podia ver que ela não queria ver mais nada no mundo além do meu rosto. E isso me cansava, me esgotava muito. Como eu poderia saber se alguém estava sendo sincero comigo? Como saber se estavam sendo gentis comigo por serem realmente daquela índole, ou porque estavam querendo agradar um cara “tão bonito como eu”? E quantos amigos deixei de manter por acabar desmanchando seus relacionamentos?

Nossa .... Qualquer um que estiver lendo esse relato vai achar que sou um verdadeiro babaca egocêntrico que se acha a sétima maravilha do universo. Mas não, isso não é uma “auto bajulação”. É que faz parte da minha natureza de tritão. Todos nós, os sereianos, somos criaturas com uma beleza descomunal, que se destaca de todos. Seja pelos olhos, pelo cabelo, a pele ou algum detalhe no corpo, nós somos criaturas que instigam os sentidos sexuais e atrativos do ser humano.

Mas aquela garota lutava contra isso. Mesmo que eu não tivesse a intenção, o feitiço de minha natureza caiu sobre ela, mas percebi que sua consciência e racionalidade tratava uma verdadeira guerra contra seus impulsos.  E meu corpo também estava estranho! Era como se eu também estivesse hipnotizado de alguma forma. Eu não conseguia ter nenhuma reação, apenas lembrava perfeitamente quem era ela. Eu a examinei de baixo para cima e vi o quanto ela crescera, vi também aquela mesma alma atrevida e decidida pulsar dentro dela. Aproximei-me mais, querendo dizer que lembrava dela, perguntar seu nome e também querendo saber se ela lembrava de mim.

Percebi então o quão estranha estava sendo aquela situação. Eu estava completamente nu, apenas com meu colar de conchas adornando meu pescoço e o vento acariciando todo meu corpo, enquanto ela tinha as roupas molhadas e um pouco de areia no rosto, mas nada que ofuscasse aqueles olhos negros e confusos e aquela boca rosada e carnuda. Ah, aquela boca...

Como queria ter a coragem de falar o quanto queria beija-la. Nem sequer a conhecia, mas meus instintos pareciam querer devorá-la com mil beijos. Acho que ainda havia um adolescente normal pulsando dentro de mim, afinal de contas.

Porém, quando ela tomou o primeiro passo e me beijou, senti algo clicar dentro de mim. Era como uma corrente elétrica que explodiu entre nós dois. Senti uma vontade de não largá-la nunca mais, pela primeira vez quis fazer o que sempre quiseram que eu fizesse: Eu quis arrastá-la para o mar e nunca mais soltá-la.

Porém, a visão dele surgiu em minha mente.

Não.

Eu não queria ser como ele. Não ia satisfazer à vontade dele.

“Pegue-a.”.

Ouvi sua voz sussurrada em meu ouvido.

Mas não o atendi. Eu era mais forte. Soltei a garota, sorri para ela me despedindo, e mergulhei no mar. Podia ouvir ela protestando atrás de mim, mas sabia que não podia ficar. Meu corpo começara a ficar quente e minhas mãos a suar, não podia ficar tão próximo a ela ou algo de muito ruim aconteceria, eu sabia bem.

O que acontecera comigo? Já tinha beijado meninas antes e nunca fora aquele jeito. Nunca senti minha pele eriçar e minhas escamas começarem a surgir involuntariamente daquele jeito. Era como se ela houvesse despertado algo dentro de mim. Seu beijo fora como um gatilho para um turbilhão de processos dentro do meu corpo. Uma onda de adrenalina percorrera minhas veias, precisava descarrega-la! Nadei velozmente e num impulso, dei um salto por cima da água, como um golfinho, mergulhando fundo na água salgada em seguida. Olhei para baixo e vi que finalmente minhas pernas haviam sumido e se transformaram em minha cauda de peixe, viscosa, grande e cor de esmeralda e eucalipto. Subi mais uma vez na superfície e respirei fundo, enchendo meu diafragma com ar. Mergulhei lentamente e nadei pelo coral que circulava aquele trecho da praia.

Era bem bonito, para um lugar próximo à cidade grande. Não se comparava ao Bahamas ou à Grande Barreiras de Corais na Austrália, mas vi várias espécies de peixes bem saudáveis e nada influenciadas por toxinas jogadas na água. Segui nadando por um bom tempo, não sabendo exatamente para onde, talvez para o outro lado da ilha.

Finalmente, cheguei na curva do rochedo coberto de musgo marinho e a anêmona vermelha. Se seguisse em frente, chegaria em alto mar, onde provavelmente acompanharia um grupo de golfinhos para a costa leste e voltaria para o porto onde conseguira roubar uma bela calça jeans na semana passada. Mas, se fosse pela direita, poderia rever alguns amigos meus. Talvez encontrasse Liam em alguma enseada ou visse Louis perto da praia, tentando a sorte com alguma humana.

Rodopiei para a direita, nadando veloz até a enseada. Como suspeitava, avistei de longe um tritão de cabelo curto e cauda azul cor do céu deslizando pelas algas com um bebê humano no braço. Tanto tempo passara, que nem me lembrava mais que Liam havia se tornado pai e agora morava numa cidade costeira e sempre aparecia em sua casa de praia junto da Cheryl. Devia ser estranho, mas ao mesmo temo incrível ter uma família para ver todo dia, ver um sorriso como primeira coisa ao acordar, e rir até o fim do dia. Claro, devia ser um saco ouvir choro de bebê e ter que limpar a sujeira deles, mas no fim tudo valeria a pena.

Aproximei-me mais dele e emiti meu “som”, avisando minha chegada.

Qualquer humano normal que ouvisse o som comunicativo de uma sereia, juraria não passar de uma baleia cantando. Mas nossas vozes debaixo d’água era bem mais agudas e melodiosas, como um cantarolar ao som da corrente marinha. Liam virou o rosto em minha direção e me viu, sorrindo em seguida. Ele emitiu seu som pacífico e curto, me cumprimentando. Remei mais forte com a cauda, enquanto vi ele apontar para mim e me mostrar para seu filho. Abracei meu velho amigo debaixo d’água e sorri para seu neném, vendo que ele olhava meu cabelo balançar na água. Incrível como já tão pequeno, aquele tritãozinho já conseguia segurar seu fôlego por tanto tempo. Liam apontou para cima e emergimos.

-Olha só quem o peixe gato trouxe! – Liam falou, risonho.

-Quanto tempo, mano! – Eu falei, pigarreando forte em seguida. Estava bastante desacostumado a falar.

-Já conhece o pequeno Sebastien? – Ele perguntou, exibindo seu filho, que riu ao me ver tossir.

-Tô vendo agora! E ai, campeão? – Eu falei, apertando o nariz dele, fazendo-o espirrar e rir. – Como vai a Cheryl?

-Provavelmente tá pegando um sol na praia. Quer almoçar com a gente? – Ele perguntou.

-Ih... Não vou ser incomodo?

-Ah, que é isso, claro que não! Cê é praticamente da família. Aliás, o Sebastien não vê ninguém faz um tempinho, não é mesmo? – Ele falou, olhando para seu filho, que batia sua mãozinha na água distraidamente.

Sem discutir, juntei-me a eles e nadamos até a praia não muito distante.

Cheryl estava debaixo de uma pequena barraca, tomando sol com seu maiô preto. Ao nos avistar, balançou seu braço bem alto, nos chamando. Fomos em sua direção, e por algumas horas pude relaxar com velhos amigos e esquecer o imenso oceano próximo a nós.

 

 

-Então você não sabe o nome dela?- Liam perguntou, após ouvir o meu relato.

-Não faço ideia. Só sei que havia finalmente a encontrado! Sabia que era ela.

-Mas espera aí – Cheryl pontuou, enquanto tentava segurar o pequeno Sebastien e dar-lhe sua mamadeira. – Como que você a reencontrou? Estava casualmente nadando por aquela praia e ela apareceu do nada?

-Cheryl, que é isso... – Liam falou, cerrando o cenho para ela – Por acaso não tá insinuando que o Harry tenha...

-Não, claro que não! – Cheryl se apressou em se explicar. – Eu sei que Harry não é do tipo de... Sabe... Brincar com a cabeça das garotas.

Ela falou aquilo, gesticulando com as mãos de um jeito engraçado.

-Não se preocupe Cheryl, não me ofendi. – Respondi à sua pergunta. - Acontece que... Não sei explicar ao certo. Estava passando por aquela praia, que eu sabia não ser a mais frequentada daquela região. A cidade fica a alguns quilômetros e precisariam de um carro 4x4 para chegar até aquele ponto, então claro, percebi a presença de um grupo de humanos naquela noite.

Mas não fiz nada. Apenas olhei-os dançar na praia, estavam mais bêbados que uma lagosta depois de entrar numa nuvem de tinta de polvo. Resolvi deixa-los pra lá e ia procurar um canto para dormir. Lembrei que havia uma caverna próxima à praia que poderia me abrigar até a maré baixa pela manhã. Tudo corria bem, nadei despreocupado, até que ouvi aquela voz.

O pior de tudo é que eu a conhecia muito bem.

Ele estava ali. Bem ali, naquela mesma parte do mar que eu, mas não consegui enxergar. A água estava muito escura, mesmo com a lua brilhando no alto, não o vi nem senti sua presença em canto algum. Apenas vi o barulho de algo estranho abrir caminho por entre as ondas. Olhei para a minha esquerda, e vi as pernas da garota caminhando com esforço pela areia pesada e empurrando as ondas leves daquela noite. A voz não parava, e eu não tive outra escolha senão ir até ela. Quando a alcancei, sua cabeça já estava completamente submersa. Ela teria morrido se eu não tivesse vindo ao seu socorro.

Quando a peguei em meus braços, levei sua cabeça para fora d’água, tomando cuidado para segurá-la por trás. Se por um acaso ela acordasse do transe, se debateria muito na água e poderia piorar a situação. Eu ia leva-la para a costa, mas a corrente pegara nós dois. Mesmo com minha cauda lutando contra as ondas, não foi fácil vencer. Era como se o mar quisesse a menina de qualquer jeito. Mas eu sabia muito bem quem estava fazendo isso.

“Me entregue a garota.”

Eu ouvi sua voz falar claramente em minha mente.

Deus, como eu odeio o poder que suas palavras têm sobre mim!

Engoli água salgada algumas vezes, mas consegui me manter firme. Depois de um tempo, desisti de leva-la para a praia e me entreguei ao mar com ela em meus braços, ainda segurando-a com força. Foi ai que avistei algumas palmeiras. Pensando rápido, fechei o nariz dela e mergulhei rápido, nadando o mais forte que consegui. Com sorte, consegui chegar a um banco de areia, onde a coloquei um pouco. Consegui debruça-la numa pedra e apertei seu peito. Ela cuspiu um pouco de água e pareceu respirar normalmente, só não abria os olhos. Olhei para trás e vi a grande onda que se aproximava. Agarrei  a garota com força e protegi-a do impacto da água. Ele era mais forte do que eu pensava, e mesmo invisível, queria pegá-la a todo custo, mesmo que me matasse. Mas eu não ia permitir.

A praia não estava longe, então segurei a garota com um braço, remei com o outro e balancei a cauda com força. Em pouco tempo cheguei na areia seca e a deixei lá. Deitei junto dela, exausto, e olhei o céu estrelado.

Eu vencera, mais uma vez, escapei dele.

“Isso não acabou.”

Senti sua presença se esvair, e finalmente estávamos sozinhos. A garota não acordava, mas percebi que respirava. Dei-me conta que ela agora dormia tranquilamente. Olhei para frente e vi o azul escuro da noite começar a se dissipara e dar lugar ao alaranjado do nascer do sol, que aparecia no horizonte. Vi também que minhas pernas estavam aparecendo, logo vi minhas escamas sumindo e dando lugar para esses cambitos branquelos.

Enfim, foi isso, amigos. O resto acabei de contar. – Eu disse.

Ao ouvir meu relato, percebi Cheryl meio inquieta.

-Uau... Vocês tem mesmo uma vida agitada, nossa senhora! – Ela falou, tentando cortar o clima pesado que se formara.

-Harry, acha mesmo que era Ele? – Liam perguntou, com uma grande preocupação em seu olhar.

-Quem mais poderia ser? Nenhum tritão atrairia uma mortal assim tão inesperadamente e de forma tão fria. – Falei, lembrando-me de sua voz, tão sedutora como tenebrosa.

-Mas você não tem certeza. Como pode ter, já faz anos que não...

O comentário positivo de Liam foi interrompido pela campainha. Todos estranhamos. Era bem tarde da noite, Cheryl já havia ido colocar Sebastien para dormir e não havia sinal de ninguém na praia. Quem poderia ser?

Será que... Ele teria mesmo a coragem de vir aqui? Não poderia ser tão inescrupuloso de fazer algum mal para a família de meu amigo. Eu não permitiria. Ouvimos os passos pesados de Cheryl no corredor.

-Eu atendo!

Ela dirigiu-se à entrada e perdi ela de vista. 

-Harry? Você me ouviu? –Liam perguntou.

Forcei minha mente a bloquear aqueles pensamentos obscuros e me concentrei em meu amigo que me olhava com seus olhos castanhos tão preocupados e gentis.

-Ih, foi mal. Que é que cê disse? – Perguntei.

-Acha que continuar fugindo vai amenizar sua dor?

A pergunta de Liam me pegou em cheio.

Essa era minha vida. Sempre fugindo, sempre me escondendo aonde eu pudesse. Havia muito tempo em que eu não possuía um lugar para chamar de “lar”. O mar era meu lar, cada canto dele me servia de abrigo, ainda que ao mesmo tempo, não fosse nem um pouco seguro. Não enquanto ele estivesse atrás de mim. Estava prestes a responder, mas a voz de Cheryl me interrompeu.

-Amor, tem um cara aqui que diz que é seu amigo.

Liam e eu nos entreolhamos. Quem poderia ser?

-Ok, manda ele entrar! Sempre cabe mais um. –Liam falou, despreocupado, mas curioso.

Assim que a sombra se aproximou, meu corpo todo se eriçou, entrando em alerta com aquela energia. Mas relaxei ao me dar conta de quem era.

Ele não mudara mesmo. Aquele mesmo topete preto com tons brancos, aqueles mesmos olhos grandes e pidões, o sorriso sonso que me irritava tanto... E aquele mesmo cristal estranho e pontiagudo entre as duas sobrancelhas grossas.

-Zayn?

Ao pronunciar seu nome, ele me olhou fundo nos olhos, sem nenhuma expressão no rosto. Liam engoliu em seco, sentindo a grande tensão que se formara na sala.

-Ah, você também conhece o Harry? – Cheryl perguntou, inocentemente.

Zayn olhou para ela rapidamente, depois colou os olhos de novo em mim, deixando aparecer aqueles dentes pontiagudos e traiçoeiros num sorriso lento e preguiçoso.

-É muito bom estar entre amigos. – A voz dele era como uma lâmina fria, cortando o ar através daquele sorriso cínico.

Aquela seria uma longa noite.

 

 

O único som que se ouvia agora era das ondas do mar quebrando na praia do outro lado da janela. No quarto onde eu estava, a escuridão já tomara conta de tudo. Não tive como recusar a hospitalidade de Liam, ele e Cheryl insistiram bastante para que eu passasse a noite lá. As estrelas faziam milhares de desenhos sobre o mar, iluminando aquele breu tão natural quanto a própria Terra.

O cheiro do mar, tão familiar pra mim, me remetia àquela noite confusa e perigosa, quando a tirei da água. Como eu fora idiota de não ter ao menos perguntado seu nome... Como eu poderia reencontrá-la agora? Queria tanto poder dizer...

Espera! Eu queria reencontrá-la? Mas pra quê? Eu sequer a conhecia. Ela podia muito bem ser uma maluca que me sequestraria e me mataria se soubesse quem realmente sou. Talvez ela me espantasse se me visse de novo, talvez tivesse namorado. Ou fosse casada, com quatro filhos, dona de uma...

-Uau, que imaginação hein, Harry?

Cacete, o que ele queria ali na porta do meu quarto àquela hora? E ainda pra me dar um susto desses a essa hora da madrugada. Era aquele maldito cristal em sua testa, que lhe dava umas novas habilidades e agravava o poder das outras, fazendo-o ler mentes.

- Dá pra ficar fora da minha cabeça, por favor? – Pedi gentilmente, fuzilando ele com os olhos.

Zayn aproximou-se e sentou na cabeceira da cama.

-Faz tempo que chegou aqui? – Ele perguntou.

-Cheguei desde manhã cedo. – Respondi, seco.

Zayn ficou calado, observando o mar da janela do meu quarto também.

-Que bom que encontrei essa casa. Felizmente lembrei que Liam abandonou o mar e constituiu uma família humana, assim podemos todos ter abrigo de vez em quando, certo?

-Então você não tem casa? Achei que o fundo do mar não te incomodasse. – Falei.

- Bom, digamos que sou um “nadarilho”, como você. Mas prefiro mil vezes dormir numa cama confortável como essa do que num coral viscoso.

-Corta essa, Z... – Eu falei, cansado daquela conversa fiada. Olhei sério para ele. – O que está fazendo aqui?

-Ora, é desse jeito que recebe um velho amigo? – Zayn falou, fingindo ofensa na voz.

-Amigos não abandonam os outros quando precisam de um plano de fuga.

-Ah, pelo amor de Deus, Harry! Já fazem dois anos! – Ele falou, e percebi um certo tom de sinceridade na sua voz. – Ainda quer que eu peça desculpas por ter te deixado naquela baía de Santa Coste?

-Não só a mim, como Niall, Liam, Louis.... Você partiu na frente e nos deixou lá quando teve chance. – Eu disse. – Ainda fui idiota o bastante para achar que você voltaria pra nos resgatar, ainda disse ao Louis que você voltaria pela gente. Mas parece que eu estava enganado.

Zayn reviou os olhos e coçou as costas.

-É, eu fui o rei dos babacas, mas e daí? Águas passadas! – Ele disse. Sabia que ele estava fazendo sua carinha de foca pidona, por isso foquei meu olhar na praia do outro lado da janela. – E aquela vez no caís perto do México, não foi importante pra você? E quando a gente ficou cara a cara com...

-Não ouse falar o nome dele. – Eu o cortei.

Zayn riu.

-O que foi? Por acaso ele virou um tipo de “Lord Voldemort” agora? “Aquele que não deve ser nomeado”? – Zayn ironizou.

Não fiz questão de responder. Ele sabia muito bem o que aquele assunto significava pra mim. Toda a minha existência, toda a minha esperança de vida, tudo residia num...

-Mas sabe, eu acho que Nakk está bem per...

Antes que Zayn terminasse a frase, vi seus olhos de cafajeste quase saltarem de suas órbitas oculares quando eu agarrei o colarinho de sua camisa e apertei sua nuca com força sobre-humana. Ele pediu por aquilo. Meu humor não estava dos melhores, e ainda falar o nome do único ser responsável pela minha desgraça, era demais para eu aguentar. Senti minha pele humana e seca começar a ficar escamosa e áspera, os dentes cresciam lentamente e se afiavam dentro de minha boca, e meus olhos deviam estar com as pupilas dilatadas e bem maiores do que antes, pois Zayn me olhava como um filhote de camarão assustado.

-Já avisei uma vez, e não vou repetir: Não teste minha paciência, seu pedaço de merda!! – Eu rosnei, minha voz feroz e sombria por trás de minhas presas, que cresciam sem parar. Zayn não devia ter me irritado.

Ele esforçou-se para falar alguma coisa, mas não o fez, pois eu quase o sufocava. Percebi que o cristal pontiagudo em sua testa brilhava com força, tentando bloquear a minha investida contra ele, mas minha raiva era mais forte. Eu tentava controlar meu instinto animal a todo custo, mas meu lado sombrio e descontrolado crescia gradativamente, e eu não sabia se poderia parar.

-Não vou te matar agora. Mas se me irritar de novo, eu juro que trituro essa sua cara de um jeito que nem a Alycia pode resolver. – Rosnei em seu ouvido, ouvindo o sangue em suas veias pulsar de medo ao sentir minhas unhas se transformando em garras.

-Des... Desculpe... – Ele murmurou, sufocando.

Soltei seu colarinho e deitei minha cabeça na parede, respirando fundo e tentando me conter. Zayn provavelmente havia se esquecido desse meu pequeno problema. Eu não sou um tritão comum. Nunca fui. Desde que descobri minha verdadeira natureza, busco lutar também com minhas raízes e minha sina. Sempre que me estresso muito ou sofro algum tipo de pressão, acabo me transformando numa criatura sem controle e mortífera, em todos os sentidos. Quando atinjo o ápice da minha transformação, já não consigo mais me controlar. É como se... Ele tomasse conta de todo o meu corpo.

Durante anos travo uma luta dentro de mim mesmo, para não deixar que a força dele não domine todo o meu ser. Aonde quer que eu esteja, por mais que eu fuja, ele sempre está lá comigo. Sempre há um pedaço dele dentro de mim. Eu sempre serei um monstro igual a ele, por mais que me doa admitir.

Por isso sempre estive fugindo. Sempre mantive distância de tudo e todos, nunca parei num canto só. Nunca quis deixar que Nakk me encontrasse. Ele queria me dominar, me fazer igual a ele, um monstro. Um enganador. Um ser sem alma e cruel. Mas eu não quero ser assim. E só de ouvir o seu nome na boca de outra pessoa, ainda mais de um bosta como o Zayn, meus nervos vem a flor da pele, literalmente.

Porém, só de respirar fundo algumas vezes, e lembrar do rosto daquela garota, senti minhas escamas sumindo, minhas presas voltando a ser dentes macios e meu fôlego melhorar.

Zayn tossia e ajeitava sua camisa.

-Você... Cof! Cof!... Sempre foi dramático pra cacete...- Zayn falou, sem fazer questão de se desculpar novamente e admitir seu erro. Idiota.

-Cala a boca.

-Tá bom, não devia ter forçado. – Zayn admitiu. – Mas olha, falando na Alycia... – Ele começou a falar. O assunto começou a me interessar.

Alycia era uma antiga amiga minha, da espécie das sereias também. Ela era muito reservada, ficava sempre perto de um velho navio afundado perto da costa Oeste. Era uma sereia solitária, séria e um tanto sombria, mas muito amigável e prestativa. Também era uma verdadeira bruxa do mar, conhecia todas as especiarias, rituais e mistérios que o oceano podia oferecer. Já foi de grande ajuda para mim e Zayn, salvando a vida dele ao colocar o cristal negro da cura em sua testa. Se havia alguém em quem podíamos confiar, era nela.

-O que tem ela? – Perguntei.

-Talvez seria bem útil falar com ela, você não acha? – Zayn perguntou, levantando-se da cama. –para lidar com o seu... Dilema.

-Não tenho nenhum dilema. Estou seguindo meu caminho, amanhã cedo mesmo irei embora.

-E vai fugir para sempre, Harry? Sempre buscando um coral para se esconder, uma ilha pra se abrigar por uma semana para depois voltar ao alto mar? – Zayn falou, e por um segundo, senti um tom de verdadeira preocupação naquele que eu costumava chamar de amigo.

-Vá direto ao ponto, Zayn. – Falei, já sem paciência. – Aonde está querendo chegar a esse assunto?

-Você quer reencontrar aquela garota. – Ele disse.

Confesso que sua resposta fora bastante inesperada para mim. E por mais que me recusasse, tive que concordar plenamente com ele. Baixei os olhos e depois voltei a olhar para a praia.

-Isso não é da sua conta. – Respondi.

-Você que sabe. Só a Ally pode ajudá-lo a expelir a sua Aura de Poder. – Ele disse.

Eu ri de deboche.

- Faz tempo que não ouvia esse nome.

- Exato. Você precisa trabalhar mais esse lado seu, sabe que sua Aura pode fazer coisas incríveis, até mesmo encontrar aquela garota! – Zayn disse.

-E isso te interessa tanto por quê...?

- Porque.... Por mais difícil que possa ser de admitir, eu me importo com você, Harry. – Ele falou. Fiquei calado por um momento. Zayn e eu realmente tínhamos uma história. Por um momento achei que ele realmente fosse como um irmão para mim, que nunca seria capaz de me magoar. Compartilhei com ele meus mais profundos segredos, torci para que nossos sonhos se realizassem, mas ele fez o imenso favor de jogar tudo pelo ralo.

Mas, pelo outro lado, ele estava certo. Somente a Alycia tinha a capacidade de me ajudar a encontrar a garota. Eu queria muito estar junto dela, ao menos poder dizer que eu me lembrava dela, que nunca havia esquecido daquela vez que nos vimos pela primeira vez.

-E... Sei que você não gosta de falar nisso, mas... – Zayn começou a falar mas se interrompeu, talvez com medo da minha reação. – Você sabe que ele está por aí. E bem próximo.

Ele estava absolutamente certo.

Na noite passada mesmo, quase fiquei cara a cara com ele. Nakk estava lá, comigo e a menina, invisível, mas sua presença e sua voz eram inevitavelmente perceptíveis. E isso era não só extremamente perigoso para mim, mas praticamente para toda a raça humana.

-Você sabe aonde ela está? – Perguntei. Zayn assentiu.

-Vou te levar pela manhã.

Então, consegui fechar os olhos naquela noite, sabendo que na manhã seguinte teria uma pista de como encontrar a garota dos meus sonhos.

 

Zayn e eu já estávamos prontos para ir, sentados na beira da praia, já transformados em tritões, esperando Liam se juntar a nós. Cheryl tagarelava um monte de coisas com ele, pedindo para ele tomar cuidado e não falar com nenhuma sereia, provavelmente. Ele beijou sua mulher e seu filho e tirou as roupas.

Em pouco tempo, nós três nadamos rápidos pela baía colorida, passando por alguns cardumes e pequenas florestas submarinas. Apesar da incrível cor que havia embaixo d’água, o céu não estava tão azul brilhante como sempre. Uma tempestade se aproximava, enegrecendo o céu todo.

Enquanto Zayn nadava na frente, nos guiando para onde ele havia visto Alycia pela última vez, pude olhar sua cauda negra e cheia de listras, semelhante à de um tubarão tigre. A cada remada de sua barbatana, era como uma lâmina cortando a água por onde passava.

Nadamos em silêncio por um bom tempo, até passarmos por uma região mais rasa, próxima a um recife.

“Cuidado”. Ouvi o som de alerta de Liam e seu pensamento ecoar no meu radar telepático.

Olhei para cima e vi sombras de vários cascos de barcos próximos de onde passávamos.

Chamei os dois com a mão e dei uma contornada pela direita, fugindo daquele monte de iscas e varas jogadas na água salgada.

Quando achei que estávamos livres, dei uma remada com a cauda e acabei prendendo minha barbatana numa rede recém jogada na água. Quanto mais eu me mexia, mais me enroscava. Liam se aproximou para tentar me soltar, mas acabou se enrolando também. Tentei me acalmar, mas ao vê-lo prender-se a mim, o pânico começou a crescer. Se aqueles homens nos pescassem, sabe-se lá o que fariam conosco.

Vi pelo canto do olho Zayn emergir à superfície. Ouvi, ainda que dentro d’água, o som dele rosnando, rugindo e partindo para o ataque.

“Zayn, não! Não!! “ Liam gritou, mentalmente. Mas foi inútil.

Ouvimos milhares de gritos humanos e vimos a cauda de Zayn mover-se, agitada, mantendo-o equilibrado fora da água enquanto ele dilacerava os pescoços dos pescadores que, inocentemente, nos emboscaram. Vimos a água azul tingir-se de vermelho e ouvimos sons de barcos de motores próximos alçarem movimento, fugindo desesperados.

Quando finalmente consegui desfazer a rede que prendia Liam e a mim, vimos Zayn mergulhar na água limpando a boca e lambendo o resto de sangue e carne que escapava. Ele nos olhou com a cara mais lavada e tranquila. Os corpos dos pescadores também afundaram, eram cinco no total. Cinco homens humanos que não faziam nada mais do que pescar tranquilamente, mas tiveram a infelicidade de cruzar o caminho daquele tritão frio e assassino com cara de bom moço.

“Acredito que eles não vão mais nos incomodar.” Ele falou. A calma em seu olhar era assustadora. Pra ele, havia tido a mais trivial das reações. Fiquei olhando incrédulo para ele.

“Qual é o seu problema?” Perguntei.

Zayn olhou decepcionado pra mim.

“Sério que você vai me passar uma lição de moral?”

Liam teve que me segurar, pois eu ia partir pra cima daquele palhaço.

“Gente, por favor, vamos parar com isso. “ Ele falou, nos olhando sério nos olhos. “Zayn, continue a nos guiar, vai. E vamos ficar longe dos humanos agora. ”

Eu e Zayn trocamos um último olhar e ele voltou para seu posto de guia.

Não demorou muito, chegamos à uma enseada coberta de algas. Seria muito fácil para uma serpente marinha ou qualquer animal selvagem se esconder ali e agarrar nossas caudas. Porém, tão logo chegamos, consegui reconhecer aqueles cabelos amarronzados logo na nossa frente, pertencentes a uma sereia de longa cauda cor verde escura (que aliás, me lembram um jacaré, espero que ela não se magoe se um dia eu lhe disser isso) que parecia bastante concentrada em colher as múltiplas algas ali presentes.

Emiti meu som alto e melódico, anunciando que eu chegara. Mas antes que eu sequer pensasse, ela se virou em nossa direção e deslizou pela água, com suas mesmas pálpebras caídas, olhos azuis tranquilos e o mesmo semblante sereno de sempre. Ela era mesmo uma linda sereia, mas sempre a encarei como a uma irmã.

“Minha alma saúda a sua. ” O som de seu pensamento era como um dedilhar de harpa em nossos ouvidos. Ela cumprimentou Liam com o olhar e demorou o seu em Zayn, perdendo o sorriso ao deparar-se com ele. Depois, voltou os olhos para mim e voltou a desenhar um sorrir levemente.

Toquei suas mãos e senti a vibração de seu imenso poder. Meus braços e meu peito começaram a formigar de leve em contato com sua pele. Nada mais era do que minhas tatuagens, que ela fizeram, respondendo ao seu toque. A maioria delas eram para proteção e também de bom presságio, graças a elas que eu conseguia manter meus demônios controlados. Tenho muito a agradecer a Alycia.

“Quanto tempo, Ally... Tem passado bem?” Eu pensei, sorrindo.

“Deixe de rodeios, eu sei o que quer aqui. Claro. É só para favores que eu sirvo, não é mesmo?” Ela falou, dando-me as costas e nadando de volta para entre as algas.

“Err... Não, eu não quis dizer...”

Ela emitiu um som parecido com uma baleia cantando, mas estava apenas rindo.

“Estou brincando. Venham.” Ela disse, nos indicando o caminho.

 

Em pouco tempo, chegamos à um raso recife que circulava uma ilha paradisíaca.

-Que lugar lindo! – Liam comentou.

-Sim. E é ótimo para meditação. – Alycia falou.

-Hmmm... Perdido no meio do nada, sem nenhum contato... É, bem a sua cara. – Zayn falou, querendo dar uma de engraçado.

- Bem a sua cara também matar inocentes sem o menor pudor, expondo sua imagem para meros mortais. – Alycia falou, olhando duramente para Zayn, do jeito que só ela sabia fazer. – Que vergonha, Zayn.

- Eles estavam querendo pescar o Harry e Liam!

- Não tente reverter a culpa, você que quis se exibir. – Alycia falou, indo em minha direção e finalizando a conversa com ele. Zayn tentou protestar, mas ela o silenciou. – Faz muito tempo que você sentiu a presença de Nakk?

Ouvir aquele nome trazia um frio à minha espinha, ainda mais na voz de Alycia.

-Faz duas noites. Numa praia não tão distante daqui... – Respondi.

-E sabe se a garota está salva? – Ela perguntou. Olhei intrigado prestes a perguntar como ela sabia daquilo tudo, mas ela sorriu serenamente, lembrando-me de seus imensos dons.

-Não. Não tenho ideia. Por isso eu preciso... Revê-la. – Respondi.

-Finalmente vai deixar seu coração comandar, hein? – Liam falou, batendo em meus ombros levemente.

-Não é somente uma questão de amor. – Alycia interviu, séria. – Essa moça tem um grande papel na vida de Harry.

- Ela tem? – Perguntei. – Qual?

- Não percebeu? Graças a ela você conseguiu bloquear o contato com Ele. Só o simples contato dela permitiu você ter uma oscilação de forma, a sua alma reage à dela de alguma forma. Talvez ela seja importante para a seu desprendimento para com Nakk.

Ouvir aquilo de Alycia me encheu de esperança. Ela sabia o quanto eu queria ser livre dele para todo o sempre e não ter que me preocupar em me tornar um monstro através da influência dele.

- Mas como posso encontrá-la? –Perguntei.

- Deite-se. – Ela falou, pondo a mão em minha nuca.

Deitei meu corpo na água, começando a boiar na superfície.

- Respire fundo. –Alycia disse. Obedeci, respirando o mais fundo e demorado que consegui, tentando acalmar a minha mente. Senti o som da água batendo e borbulhando nos meus ouvidos, e concentrei-me somente em minha respiração, relaxando ainda mais. Lembrava-me perfeitamente de meditar junto a Alycia para conter-me. – Muito bem.

- Quem diria que tem sessão de terapia aquática. – Zayn comentou com Liam, que fez “shhh!” para ele.

- Agora, tente soltar sua Aura de Poder. – Alycia falou.

- N... Não acho que vou... – Comecei a falar.

- Consegue sim. Lembra-se como ela já lhe ajudou bastante? Vai. Não preciso te ensinar mais nada. – Alycia disse, soltando minha nuca e movendo as mãos de leve pela água. – Você sabe o que fazer.

 

Então, concentrei-me. Havia muito tempo que não fazia isso, mas senti que estava conseguindo.

Além de transformar-me em um monstro, eu tinha uma outra habilidade, que era mais comum entre os sereianos. Não entre todos, mas era aceitável, e até fascinante.

Eu consigo externar a minha alma. Fazer ela voar para fora do meu corpo, e muitas vezes, utilizei-a como minha defesa. Alycia me explicou que aquela não é exatamente nossa alma, e sim uma aura descendente dela, que se materializa como algum animal marinho e pode servir para nossa proteção, nossa comunicação e até mesmo ataque.

Muitas vezes vi Alycia meditar em sua forma humana, e externar sua alma majestosamente. Era mesmo algo incrível e de tirar o fôlego. Primeiro, um grande arrepio percorreu o corpo dela, seguido de um estranho brilho azulado, como se sua pele havia se transformado em um monte de pedras preciosas. Depois, de dentro do corpo dela materializava-se uma forma feita de luz e consistência etérea, uma grande raia de nadadeiras abertas, que voava pelo espaço onde estávamos e depois voltava ao corpo dela, desaparecendo tão rápido como surgira.

A mesma coisa acontecia comigo agora. Ainda que com olhos fechados, consegui sentir meu corpo arrepiar-se e um calor percorrê-lo inteiramente. Em seguida, mesmo sem ver, senti a imensa baleia materializar-se atrás de mim na água, sair flutuando dela e pairar sobre nós graciosamente. Ouvi Liam sorrir e soltar exclamações de êxtase. Com certeza Zayn observava aquilo calado, mas intimidado com o grande poder que minha Aura emanava. Era uma linda e majestosa baleia cachalote, que emitia seu cantar alegremente. Ainda concentrado, comandei-a com meu corpo inteiro, e ela começou a nadar rapidamente pelo ar, como uma folha ao vento, nadando pelo ar até a praia onde encontrei a garota.

A baleia passou por ela, como uma imensa nuvem azul, e foi em direção à cidade. Eu consegui ver através de seus olhos e observei os grandes prédios de concreto, as ruas movimentadas, e as pessoas olhando curiosas para a imensa baleia azul que nadava tranquilamente pelo céu. Com certeza achavam que fosse algum efeito de luz, ou mesmo um daqueles balões de propaganda, nunca iriam imaginar que era uma aura de um tritão procurando por uma garota que nem conhecia.

- Ele não pode ficar muito tempo. – Zayn falou. Sua voz só fez-me ficar aflito, senti o suor frio começar a brotar em minha testa e meus nervos aflorando.

- Concentre-se, Harry. Sente uma atração? Siga-a! – Alycia falou.

Com muito esforço, levei minha Aura para mais adiante, fugindo dos prédios e chegando a um grande condomínio no subúrbio, onde as casas eram praticamente iguais e uniformes, senão fosse pelos quintais e garagens cheias ou não. Lá, entre algumas daquelas casas, estava a garota.

Meu corpo tremia e me sufocava. Minha Aura não podia ficar muito tempo longe do meu corpo, isso poderia me matar. Ou até mesmo desencadear algo muito pior de dentro de mim. Se minha Aura ficasse muito tempo longe de mim... Ele me encontraria.

- Está indo bem, Harry. Continue! – Liam me incentivou. Ele provavelmente quis tocar-me, mas Alycia o impediu.

A Aura de baleia mergulho no ar e foi pairando pelas ruas vazias do pequeno subúrbio. Eu via todas aquelas janelas, todas aquelas caixas de correspondência e alguns poucos rostos confusos que apareciam ao deparar-se com aquela visão.

Eu não podia mais aguentar! Onde ela estava?

Foi ai que a vi. Finalmente.

Um carro vermelho vinho e pequeno se aproximou. Ele cantou pneu e finalmente parou ao deparar-se com a grande baleia flutuando ali. A motorista saiu do carro e observou, sem a menor credulidade nos olhos, aquela criatura azul, quase transparente como um fantasma, observando-a.

Era ela! Seus cabelos longos e negros, seus olhos calorosos e escuros, sua pele branca e macia e postura firme e protetiva. Finalmente a encontrei!

- Ele não vai suportar! – Zayn falou.

- Cala a boca, Zayn! – Liam reclamou.

- Não, se ele não voltar agora vai ser pior! Harry!! – Zayn agarrou minha barriga, me sacudindo. Aquilo causou um efeito completamente inusitado.

A Aura da baleia balançou rapidamente, como se tivesse tropeçado, e sua cauda gigantesca bateu num grande poste, fazendo-o cair e criar um curto circuito. Um carro estacionado próximo do local voou de encontro com a barbatana e capotou. Sorte que estava vazio. O olhar de espanto e temor da garota agora se intensificou, transformando-se em susto e pavor.

- Seu idiota! – Alycia exclamou, irritada. – Você quase o desconcentrou!

Zayn ficou quieto.

- Harry, volte! Rápido! – Alycia pediu, aflita.

A Baleia deu meia volta, sua cauda batendo na calçada fazendo um caminhão de lixo virar e esparramar todo o seu conteúdo no asfalto. Ela saiu voando rapidamente, o mais rápido que eu conseguia comandar.

As veias do meu pescoço quase estouravam, mas tive forças para fazê-la sair da cidade.

O tempo estava passando. Meu corpo começava a reagir.

Eu sabia que não ia conseguir.

Minhas mãos tremiam, minha cauda debatia-se descontroladamente, eu sentia que perdia o controle. Minha Aura voava rápida pela cidade, mas a grande distância dela com meu corpo estava me causando aquelas reações.

Liam parecia assustado ao me ver naquela situação, e Zayn, antes tão preocupado, me observava calado.

-Harry, vamos! Resista! – Alycia pedia, pondo as mãos na água e emanando um poder de apaziguamento nela. Mas era quase inútil.

Eu sentia o monstro chegando.

Ele ia tomar conta do meu corpo, fazer eu me tornar um demônio assassino de novo.

Mas, para a minha sorte, minha Aura retornou, e foi como recuperar o ar depois de quase me afogar. Uma onda de alivio e consciência me percorreu, senti que cumprira meu dever.

Tossi algumas vezes e me apoiei em Liam, que me segurava calmamente. Alycia me olhava intensamente e ainda emanava seu poder de calma na local onde eu estava, dessa vez me ajudando a relaxar. Zayn apenas me observava, quieto.

-Muito bem. Seu autocontrole está excelente. – Alycia me parabenizou.

-Então, como foi? – Liam perguntou.

Após respirar fundo algumas vezes, eu sorri.

-Consegui. Eu sei onde ela está.

 

 

 



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