História Deep Inside - Presença

Ela tinha cabelos pretos, beirando ao azulado, extremamente lisos e compridos, que formavam um coque alto volumoso e impecável. E haviam aquelas várias manchas claras que se espalhavam por sua pele negra, praticamente dividindo seu rosto em duas cores. Seus traços pesados, o maxilar quadrado e os lábios cheios, o nariz largo, tudo de alguma forma se encaixava tão bem que deixava seu rosto com um ar doce, levemente delicado. Embora seus ombros fossem largos, sua cintura era fina, e aparentava ser ainda menor graças ao quadril grande. Cada detalhe dela já estava gravado na mente da menina de cabelos vermelhos, que gastava boa parte de seu tempo no auditório vendo-a ensaiar seus minuciosos passos de dança. 

A delicadeza que dominava seus movimentos e como seu corpo seguia a melodia com tanta sincronia, embora não realmente a ouvisse. Cada gesto seu emanava paixão, e a música que dançava, literalmente vibrava em si.

Bill apenas olhava, da porta do auditório a amiga assistir mais uma vez a desconhecida dançar. Suspirava em tristeza pela dor alheia, embora um pequeno sorriso habitasse seus lábios pelo quão poético era aquilo.

Camile sabia que a outra não podia vê-la, sabia ao encarar os olhos apagados, numa cor esbranquiçada. E sentia-se infinitamente mal por não poder declarar a paixão que sentia ao ver a moça dançar. Era como uma poesia muda. Surda. Cega. Tão intensa que arrancava lágrimas da ruiva, que chorava em silêncio focando nos movimentos leves e bonitos.

Ela não podia vê-la, não podia ouvi-la. Então Camile se resignava a assisti-la dançar. Com seus movimentos graciosos em um tutu cor-de-rosa. Em seus poemas feitos de gestos. E embora não houvesse como a menina saber de sua presença, algo lhe dizia o contrário à cada vez que ela dava uma de suas piruetas e sorria discretamente em sua direção.
Ambas se contentavam com o platônico. Camile ficava feliz encantando-se com as danças da garota, e ela sentia-se bem sendo contemplada de tal forma. 

Não havia necessidade de toques, não havia possibilidade de palavras, e os olhares vinham de uma única direção. Mas a presença uma do outra, era o bastante.