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História (De)floramento - Primeiro amanhecer


Escrita por: NecMizu

Notas do Autor


Hoje eu tenho estado com certa inspiração para descer os capítulos dessa fic. Eu realmente devo uma satisfação aos leitores e pra isso eu vou tentar dedicar-me bastante as coisas que eu tenho escrito. Espero que estejam gostando, e sempre estou aberto as sugestões.

Capítulo 3 - Primeiro amanhecer


6:30 e aqui estou eu: de joelhos na frente do vaso, com o rosto completamente para dentro enquanto eu viro minhas entranhas. Já estou vazia demais para por algo para fora, porém meu corpo não me obedece. Desde que acordei daquele pesadelo eu tenho estado assim, com leves pausas para tomar ar e me arrastar até o quarto, só para voltar correndo novamente e começar a expelir algo do corpo. Ultimamente nessas ultimas vezes que vomite, ou tentava vomitar, saia mais saliva misturado com bile, eu não tinha mais nada para jogar fora e meus músculos simplesmente não queriam parar os movimentos. Não sei por quanto tempo mais eu fiquei ali, alternando entre fôlego e esforço corporal para expulsar o que eu não tinha, só sei que acabou quando minha porta foi sendo aberta e minha mãe adentrou. 

-Querido? - disse ela, colocando a cabeça para dentro do quarto – Amorzinho? 

Eu pude acompanhar o rosto dela, que correu pelos lados do quarto escuro e logo deparou-se com a porta aberta do banheiro, onde eu era bem visível caída no chão. A mesma caminhou rapidamente até mim e ia tocar-me, mas eu fui mais rápido e recuei rapidamente, com o olhar petrificado e em pânico que sempre tenho quando alguém quer encostar em mim. Minha mãe quer me ajudar, eu sei que ela quer, mas para me ajudar ela precisa encostar em mim, e o mero pensamento já me causa o enjoo que tem me acompanhado a anos.  Dessa vez não pude conter, vomitei novamente no chão, a mesma saliva misturada com bile pois não há nada para se por para fora. Tossindo, recostei minhas costas na parede e fiquei ofegante, com minha pobre mãe querendo avançar para me ajudar, mas resistindo pois ela deve ter apreendido depois de tantas falhas que tocar em seu bebê apenas deixa-o em situação pior. O que ela fez? Simples... Forçou um sorriso amoroso para mim e foi se erguendo. 

-Você está ficando doente? - ela perguntou, já se afastando - Está tudo bem Marry... - esse nome não... - Eu posso faltar hoje pra cuidar de você... Vou lhe preparar um chá de morango... - parando na porta, ela voltou a me olhar da luz que vinha de lá fora – Respire fundo e jogue um pouco de água no rosto... Eu já volto... - com isso ela fechou a porta, cortando a claridade e seus passos audíveis conforme ela afastava-se de meu quarto - 

Ah... Escuro novamente. Luz mínima... Sozinha... Inútil... Sim, esse sou eu, esse  idiota.... Eu continuei a ter meus ataques de regurgitação, mas infelizmente não fui capaz de desviar do vômito no chão, então acabei esfregando as pernas na mistura que estava a minha frente. Minha mãe eventualmente voltou, e deixou uma caneca cheia de chá, que pelo cheiro, era mesmo de morango. Ela se aproximou novamente do banheiro onde eu estava e apoiou-se no batente, falando calmamente. 

-Eu deixei um cházinho esta bem? - sorria novamente – Eu não vou pro hospital hoje, ta? Você esta ficando doente, não? Eu vou estar no meu quarto, ta? Se precisar, é só sair e me pedir qualquer coisa... Tome um banho meu anjinho... E tome o chá em golinhos certo? Mamãe te ama, e ela vai estar lá fora... - e com isso, saiu - 

Minha mãe, tão boa e tão gentil. Como eu me sinto mal por ser um peso em sua vida. Como eu me sinto mal por atrapalhar sua carreira e sua felicidade familiar. Papai certamente vai querer faltar ao serviço outra vez, mas ele não ira, pois dessa vez quem me encontrou nesse estado deplorável foi mamãe. Isso é quase como se já fosse implicito em nossa casa agora: aquele que me encontrar no pior estado da vez, é o que ira parar tudo para cuidar de mim. Por mais que eu tente, por mais que eu deseje não ser um estorvo para os outros, minha maldita existência sempre causa algum tipo de entrave nos projetos dos demais. Mamãe deve se sentir terrível. Ela é uma boa médica, eu sei, me tratava sempre que pegava uma gripe ou algo do tipo e sempre foi capaz de me por alegre outra vez, brincando com meus bichinhos de pelúcia e animada para ir ver meus colegas na escola... Dessa vez ela não pode me ajudar. Ela não foi capaz de medicar-me com alguma das drogas que são usadas para meu quadro, pois além de elas não terem surtido o efeito que eram pra ter causado, minha mãe não pode mais confiar em mim com remédio após a segunda vez que tentei me matar. Isso sempre foi assustador, mas fui capaz de tentar cinco vezes... A primeira vez eu estava tendo outra crise de choro, passava horas no canto do quarto, abraçando minhas pernas e simplesmente soluçava sem parar. Naquela época eu estava tentando um... Acho que era um antidepressivo... Além de ele não servir eu fui confiada com o potinho, que naquele inicio de noite, eu peguei, tirei a tampa e virei todas as pílulas de uma vez na minha boca... Eu estava fora de mim... 

-Faça acabar! Faça acabar por favor! - foi tudo que eu dizia entre lágrimas, quando eu me pús de joelhos no chão, com o pote de remédios vazio em uma das mãos - Eu não aguento mais! Eu não aguento mais, faz parar por favor! - mas eu era um covarde, e acabei entrando em pânico pensando na morte que iria ter. Me ergui e sai do quarto, corri atrás de meus pais logo abaixo e eles certamente viram o pote de antidepressivos vazio cair no chão - Papai, mamãe, me ajudem! Eu não quero morrer! - e soluçava enquanto minha desesperada mãe corria atrás da chaves do carro e meu pai corria em minha direção - Me ajudem! Por favor! Eu não quero morrer! - meu pai me ergueu e jogou-me sobre seu ombro, eu era muito leve e mesmo em pânico de morrer, eu já comecei a passar mal com o fato dele me carregar daquele modo, então em meio ao desespero por viver, havia o meu debater descontrolado para me livrar de seu pulso firme - Não! Me larga! Não toca em mim! Não! Não toca em mim! - e fiquei berrando isso por todo o caminho até o carro, onde corremos tanto que acho que minha mãe perdeu a carteira naquele dia só de multas - 

E lá estava eu, no hospital. A maca era confortável até, e o pessoal do plantão não só conhecia minha mãe, mas já havia me visto várias vezes. Eles não eram capazes de esconder os olhares preocupados com a colega de trabalho e sua filha problemática. Naquela época eu já estava nessa longa estrada em caminho a autodestruição. Lavagem estomacal é terrível, é muito ruim. Uma sensação horrível, e pra piorar, tiveram de me segurar pois eu já estava quase vomitando quando senti aquela coisa descendo pelo meu esôfago... Que lembrança terrível... 

A segunda tentativa foi com outro tipo de antidepressivos... Acho... Por alguma razão, consegui parecer sã o suficiente para poder conter um pote de remédios em meu armário. Foi uma repetência da primeira vez. 

A terceira vez eu ainda estava sobre prescrição médica, mas não tinha o remédios em mãos. Minha mãe ainda conseguia me fazer manter uma rotina alimentícia, mesmo que cada vez eu comece menos. A terceira tentativa foi na minha fase onde eu simplesmente ficava deitado sem fazer nada, olhando meu antigo ventilador de teto... Foi quando eu tentei me enforcar, usando algumas meias que eu tinha no armário. Eu quase consegui, mas como de costume, na ultima hora comecei a me arrepender e debater desesperadamente. Eu ia morrer, mas por alguma razão, meu pai que me visitou no quarto dessa vez. Ainda bem, pois ele foi o que ergueu-me pelas pernas para eu poder respirar novamente. É claro que aquele toque também me fez perder a cabeça, mas eu fiquei vivo no final. 

A quarta vez foi quando eu parei de me alimentar a ponto de meus pais me arrastarem até o hospital, em protesto é claro, mas lá estava eu deitada e tomando soro para melhorar meu estado decrépito... 

A quinta... Essa foi quando eu cortei os pulsos com o barbeador que nunca usei. Ardeu feito o inferno, e minha mãe foi rápida o suficiente para estancar o sangue quase que imediatamente após o corte, pois ela adentrara o quarto logo em seguida a minha atitude suicida, e reparou como eu agia estranho devido a dor e ao medo que estava em mim. 

Onde eu estava? Ah sim... Os vômitos... Eles eventualmente pararam, e fui capaz de colocar-me debaixo do chuveiro para tomar um banho gelado... Isso me ajuda as vezes, e está relativamente quente agora, então é melhor para mim e para meus pais, uma vez que banhos quentes são caros e eu não quero ser mais custos do que eu já sou. Terminar esse banho eu deixei as roupas no chão mesmo, e molhada, eu simplesmente cambaleei até o quarto, jogando-me nas almofadas ao chão e pegando o chá com as mãos encharcadas, comecei a tomar pequenos golinhos, tomando cuidado de meu estomago vazio não incomodar mais do que já estava incomodando. Beber coisas nessa velocidade é relativamente incomodo se me permitem dizer, especialmente quando você tem um medo atrás de si... Meu chá acabou, e estou morta de fome... Será que meu apetite está voltando? Eu tinha que me vestir, mas eu não quero... Eu me ergo e vou até a porta, abro-a e saio do quarto. Algumas vezes eu ando nu e molhado desse jeito pela casa, eu só me sinto mal se tiver alguém pra me olhar, caso contrário, eu não sinto nada. Eu não sei que horas são, mas deve ser tarde o suficiente para meu pai precisar sair e ir trabalhar na universidade, e como minha mãe esta trabalhando no quarto, não vai haver ninguem para me ver andando sem roupa pela casa. Claro que as poças de água irão me entregar, mas meus pais não se importam mais com isso, eles só ficam felizes de eu sair do quarto. Eu corri pela casa até a cozinha, e pude reparar como meus pais haviam coberto o espelho do dia anterior... Eles sempre foram gentis assim, pensando em mim até mesmo quando eu mesma não penso em mim com toda essa consideração. Eu pude arrumar os restos da janta de ontem e esquenta-las, comendo solitariamente na cozinha. Ao terminar, eu me ergui e corri de volta para o quarto, trancando-me outra vez... Já devia ser o começo da tarde... Eu não sei muito bem o que fazer agora... Me vestir talvez. Sim, certamente. Eventualmente eu criei a vontade de faze-lo, e coloquei uma longa camisola de gatinhos... Só... Mais nada. A camisola ia até meus tornozelos e as mangas eram longas o suficiente para esconderem minhas mãos pequenas e continuarem um pouco mais... Acho que se não fosse uma situação tão depressiva, eu seria o modelo de personagem para algum mangaka que quisesse fazer algum lixo moeblob. Bem... Devo dizer que eu não me sinto tão mal com isso... Mas de todo modo, como posso aproveitar ser o modelo ideal de trap se isso não me traz mais o prazer que me trazia? Quer dizer... Eu não sei... Será que isso me trouxe prazer mesmo algum dia? Eu creio lembrar que sim... Eu creio que me lembrava gostar de deixar essa ambiguidade, mas agora... Agora eu não sei mais... Vestido, eu apenas comecei a andar pelo quarto, caminhando com cuidado até a pequena televisão que eu tinha. Ligando-a, eu usei o controle para colocar em um canal que normalmente tinha as coisas que eu gostava de ver... Nesse caso o canal de seriados... Eu não tenho o costume de acompanha-los, mas eu reconheço alguns, então eu apenas sentei-me de pernas cruzadas e pus-me a assistir sei lá o que estava passando, apenas para dez minutos depois trocar de canal, e por fim, eventualmente desligar a televisão novamente. Não tinha nada que eu quisesse assistir... Não tinha nada que eu desejasse fazer agora... Mas aqui estou eu... No meu quarto outra vez... Aqui é seguro, aqui é confortável, e aqui eu realmente preciso descobrir como manter-me... Depois desse pesadelo eu estou com medo de cochilar ou dormir como normalmente fazia para passar o dia... Acho que eu vou jogar meu MMORPG... Vou fazer um novo personagem, novamente... Eu não posso me cansar de repetir essas rotinas, pois são elas que irão me manter longe dos toques e olhares, e é aqui que eu vou poder manter-me seguro... Eu não quero sair daqui... Eu não posso sair daqui... Eu não vou sair daqui... Eu não posso, eu não posso e eu não quero... Por favor... Eu quero ficar aqui... 



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