Betrayed
“Toda traição começa com confiança” — Shades Of Blue
Anne corria para a Search Creatures em busca do diretor. Tinha uma novidade para ele que acabaria com duas alunas da escola.
Entrou pelos portões de grade e foi em direção à sala do responsável, enquanto ficava abismada lembrando da cena. Parou em frente à porta de madeira, fechada. Bateu.
— Entre. — A pessoa do outro lado gritou.
Anne passou pela porta, encontrando um homem de quarenta anos, loiro, os olhos azuis. A pele era alva e macia, vestida por uma camisa social rosa acompanhada por uma calça jeans larga e sapatos sociais. As mãos estavam no bolso, ele encostado na mesa de vidro grande, que continha alguns papéis em pastas separadas.
Na sala haviam pinturas famosas como de Picasso e Van Gogh, dois em cada parede.
A menina loira recebeu o olhar inquisidor do diretor, que estava surpreso ao vê-la.
— Anne? O que faz aqui? É tempo de férias. — Falou, se endireitando na cadeira.
— Ola, senhor Wallis. — Sebastian Wallis era bisneto do fundador da escola. Assumiu o posto há dois anos. — É, eu sei que é estranho me ver aqui, mas eu precisava vir. Tenho uma coisa muito importante para falar com o senhor.
Preocupado, ele inclinou a cabeça.
— Por favor, sente-se.— Sebastian se acomodou na cadeira enquanto Anne fechava a porta e fazia o mesmo. Sentou desajeitada. Não queria entregar ninguém, mas deixar aquilo acontecer era uma opção fora de cogitação.
— Diga, o que lhe fez vir debaixo desse Sol em plenas férias?
Anne engoliu em seco. Mexia nos dedos enquanto o diretor olhava intrigado para ela.
— Quero que saiba que eu não tenho a intenção de prejudicar ninguém, só que isso põe em risco nossa segurança.
— Vá direto ao ponto, Anne.
Ela olhou nos olhos de Sebastian e contou.
▷▷▷
— Quanto tempo leva para chegarmos à sua casa?
Ariela perguntou cobrindo o Sol com a mão. Achou melhor falar “sua casa” do que “inferno” perto das pessoas. Kyu havia retirado o sobretudo e o segurava nos braços. Os cabelos prateados eram embaçados aos olhos da ruiva.
— Não sei. Mais ou menos dois dias? — Perguntou mais pra si mesmo.
— Kyu, não minta para mim. — Ela parou no meio da rua. — Se você leva alguns segundos para ir e voltar todos os dias, por que não podemos usar essa alternativa?
— Porque — Ele se aproximou — são as regras. A verdade é que nenhum humano deve entrar nas profundezas do Inferno e DongHae quebrou as regras quando levou Luana.
— Então vamos quebrá-las para trazer minha irmã de volta.
— Não posso. Sou o Rei, fiz as regras diante do Criador e não serei eu a descumpri-las. É errado e mesmo eu sendo um demônio, não posso quebrar todas as regras que existem. É do meu reino que estamos falando. Você, Ariela Spencer, só vai entrar lá para pegar sua irmã e voltar. Essa é a única coisa que terei que explicar para quem vier tirar satisfações comigo, entendeu? Não quero mais confusões pra cima de mim.
— Tudo bem. Não precisava desse discurso todo. — Falou, confusa.
O demônio olhou sério pra ela e indicou a frente.
— Passe na frente.
— Começou a mandar, não é? Escute, vou parar no primeiro restaurante que eu vir e vou comer um prato cheio. Estou morta de fome.
— Então, nesse caso, nós podemos utilizar meus poderes. Para chegar ao Inferno, não.
— Essa parte eu já entendi, senhor mandão. Agora, me leve para o restaurante logo, vou desmaiar de fome!
Ela abraçou o demônio que riu da estratégia de levá-la junto à ele. Passou seus braços pela cintura dela e desmaterializaram. Chegaram debaixo de uma árvore frutífera e avistaram um restaurante à beira da estrada.
— Graças à Deus… — Ela falou e Kyu a repreendeu.
— É a segunda vez que fala em Deus comigo. Pareço Deus para você?
— Graças à Kyu! — Esticou as mãos em direção ao chão, para simbolizar o Inferno, e caminhou em direção à sobrevivência. Entrando, encontrou um local bem aconchegante. Havia um balcão e as vasilhas de self-service no meio, com os pratos e talheres ao lado. Ariela olhou o preço e retirou as notas de dentro da jaqueta.
— Droga! — Sussurrou.
— Contando as moedinhas? — Kyu falou, colocando a comida em seu prato. — Não acredito que vai me deixar com fome, Faísca — Riu.
— É, pois acredite. Vamos embora. Me leve pra casa.
— Pode comer. Eu pago. — Ele piscou pra ela. — E não vá achando que sou seu chofer não, viu garota? Muito menos táxi.
— Bem, você não poderia ser meu chofer ou taxista em troca de… — Dedilhou os dedos pela camisa dele — Um beijo?
Kyu riu, colocando o prato em cima do balcão. Olhou pra ela.
— Você se vende por tão pouco?
— Aproveita que ainda tá de graça. — Riu.
— Bem, um beijo eu não aceito. Agora… Dois ou mais, posso pensar. — Mordeu os lábios.
Ariela concordou, colocando a comida no prato de porcelana. Logo sentaram em uma mesa quadrada ao canto do recinto.
Ela tremia de fome.
— Por que não disse que estava com fome antes?
— Eu… — Ela mexeu na comida com o garfo. — Me esqueci.
— Se esqueceu que estava com fome?
— Sim. — É isso que acontece quando pega seu namorado transando com outra mulher e logo depois descobre que sua irmã foi para o Inferno com um demônio.
— Por causa de Phillip?
Ariela olhou para Kyu, séria.
— Olha vamos esquecer esse assunto, tudo bem? Você conseguiu o que queria, terminei com ele do pior jeito possível e..
— Eu consegui? Pense comigo. — Deixou o garfo no prato. — Se você não tivesse ido comigo para terminar com ele, você seria... Corna. — Ele riu da palavra. — E nunca descobriria que ele transava com uma garota de dezoito anos. Da idade de sua irmã.
Olhando por esse lado, ele tinha razão.
— Você sabia disso?
— Claro. Senão não traria você.
— E por que não me contou antes? — Comeu um pouco da comida.
— Simples, porque você não confia em mim. Assim como não iria confiar se eu dissesse que aquela loira não foi a primeira.
— Sério? Há quanto tempo ele faz isso? — Disse decepcionada.
— Bem. — Pegou o garfo novamente. — Lembra da primeira vez que nos encontramos no Vale?
— Como esquecer, né?
— Pois então, enquanto você passava aquele susto todo, assim, olhando para essa belezura — Ele indicou o próprio corpo, fazendo Ariela rir. — Ele te traía. Enquanto você caçava pelo bem da humanidade, ele estava deitado com outra mulher. E essa mulher era sua amiga.
Ariela largou o garfo.
— O… O quê?
— Pois é. Por isso eu lhe pedi para terminar com ele, além de que você não o amava mais.
— Quem era ela?
— Anabela. Mas esqueça isso, já passou.
— Anabela é mais amiga de Luana do que minha. Agora tá explicado o porquê. — Comeu mais um pouco e bebeu o refrigerante que Kyu trouxera. — Bem, pelo menos agora não preciso me sentir culpada por ter te beijado antes.
— E nem as outras que virão.
Ela riu, sem graça. Aquele dia foi cheio de surpresa.
— Kyu. — Ela chamou depois de um longo silêncio. A comida do rapaz havia acabado até. — Posso perguntar uma coisa?
— Pode. — Ele bebeu o refrigerante.
— Você já amou de verdade uma garota?
O demônio encostou na cadeira. Ao longo dos anos ele nunca amou ninguém e não sabia o que era amar alguém de verdade. Mas admitia que o que sentia por Ariela era algo perto de amor. Ou além.
— Ao longo de todos esses anos? — Perguntou e ela concordou. — Não. — Ele a observava comer e sorria pelo fato de ela ser tão linda. — Mas acho que… — Ela o olhou, acabando a última garfada. — Que descobri o que é amor.
— É? Como?
— Quando te vi. — Declarou. Não esperava fazer aquilo naquele momento, mas não conseguia guardar para si o que sentia por aquela ruiva raivosa. A mesma ruiva que riu quando ele disse aquelas palavras.
— Ah, por favor Kyu, pra cima de mim não.
— Não estou mentindo. Assim como eu não estava mentindo quando disse que gostava de você naquela noite no Vale.
Ariela ficou sem palavras. Terminou de beber o recipiente do copo de vidro.
— Kyu, eu…
— Vamos. — Ele levantou, deixando o dinheiro em cima da mesa. — Vamos, vou te levar pra casa e amanhã a gente começa a trilhar o caminho para o Inferno.
Ele sabia que ela falaria “não posso fazer isso, e blá-blá-blá”, portanto, economizou suas palavras.
Ela ia falar algo, mas ele pegou as mãos dela e a levou para casa. Em alguns segundos ela estava de frente para a porta, os vidros quebrados e o cheiro de mato. A noite já caía e Kyu estava próximo dela.
— Pronto, está entregue. — Ele indicou a casa e se virou, mas Ariela o conteve, segurando seu braço e quando ele se virou, ela o beijou intensamente, segurando em seu pescoço. As línguas se tocaram, causando um arrepio enorme pelo corpo dos dois, enquanto o demônio segurava sua cintura. Ariela gemeu quando o maior mordeu seus lábios, sorrindo e quando cessaram, o surpreendeu com as seguintes palavras:
— Eu também gosto de você. Era isso que eu ia dizer quando você me cortou.
— Pensei que você iria fazer o discurso de boa moça que não deve gostar de um demônio.
— Kyu, eu sou muitas coisas, mas boa moça não é uma delas.
O rapaz gargalhou.
— Hum, então você é uma… Bad Girl?
— É, pode dizer que sim. — Eles riram. — Amanhã a gente se vê, então.
— Claro. E leve umas barrinhas de cereal, certo? Assim não morre de fome.
— Tudo bem — Ela riu, lhe arrancando outro beijo. — Boa noite — Sussurrou.
— Boa noite, Faísca — Fez o mesmo, beijando sua testa.
Ariela entrou, acenando para Kyu. Jesse estava sentado no sofá quando ela fechou a porta. A garota viu o irmão olhando-a de longe, enquanto bebia um pouco de uísque.
— Sente-se — Ele bateu no sofá. — Acho que precisamos conversar.
— Olha, temos muito o que conversar, mas pode ser depois do banho? Estou exausta.
— Tudo bem. — Ele sorriu compreensivo. Continuou a bebericar o líquido enquanto a televisão transmitia um filme qualquer. Jesse não estava prestando atenção em nada depois que Luana fugiu. Não demonstrava perto de Ariela para não desesperá-la mais e também confiava na mais nova, sabia que ela não faria algo extrapolado.
Pelo menos ele contava com isso.
Soltou um suspiro longo enquanto desligava a TV e subia para o quarto. O lugar dos vidros quebrados foi coberto por madeiras duras com pregos. Se trocou no quarto e esperou Ariela sair do banho.
▷▷▷
Ariela chegou ao quarto e desabou. Caiu no canto aos prantos, lembrando da cena com Phillip, de Kyu contando que não foi a primeira vez que ele a traiu. Ela deveria ter desconfiado, o jeito que ele falava, cheio de culpa e remorso, as coisas que lhe dizia. Phillip dizia que a amava.
Chorou por causa de Luana, por tê-la trocado por um demônio ao invés de ouvir o que a ruiva tinha a dizer.
Chorou por sua vida.
Por ter que mentir, por estar gostando de um demônio, rei do inferno.
Após se martirizar por alguns minutos, ela se reergueu pegando uma roupa e toalha. Debaixo do chuveiro, a água quente se misturou com as lágrimas salgadas, agora por desabafo do coração.
Lavava os cabelos para retirar a poeira da estrada, lembrando dos carinhos que KyuHyun fizera por todo o percurso. Até conseguiu sorrir por um instante. Iria trazer Luana de volta.
Voltariam a ser a família unida que sempre foram.
Ela desligou o chuveiro. Lentamente secou com a toalha macia, lembrando da língua de Kyu tocar a dela e os dedos tocarem sua nuca.
Talvez ela estivesse apaixonada demais. Talvez estivesse amando.
Ariela se trocou, um pijama vermelho de viscose e foi procurar por Jesse. Mas não precisou, encontrou o garoto no corredor seguindo para o quarto dela.
— Ia te procurar.
— Eu sei. Vamos, entre. — Ele indicou a cama dela, sentando ao seu lado.
— Então, qual a novidade?
— Estou solteira.
— Imaginei. Como foi?
— Phillip me traiu. — Ela olhou para Jesse, os olhos lacrimejados. — E parece que não foi a primeira vez.
— Como assim?
— Eu cheguei e ele estava com outra pessoa. Kyu me contou que não foi a primeira vez.
— Ariela...
— Mas isso não é importante. Eu... Descobri onde Luana está.
— Mesmo? — O coração de Jesse acelerou. — Onde?
— Temo que você não vá gostar. — Ela olhou bem no fundo dos olhos negros de Jesse. — Ela fugiu com DongHae para o Inferno.
— Ela o quê?! Como? Por quê?
— Não sei. Mas vou trazê-la de volta.
Os olhos de Jesse eram pura tristeza. Nunca pensou que Luana chegaria a tal ponto. Ao ponto de trocá-los por um demônio. Então ele chorou e a irmã o consolou, mas a verdade era que apenas se consolariam quando Luana voltasse.
— Vai ficar tudo bem, Jesse — Ela sussurrou, beijando o rosto dele. — Vai ficar tudo bem.
— Eu não sei porque ela fez isso, mas…
— Eu sei. Mas vai ficar tudo bem.
— Agora… Você sabe no que está se metendo, não sabe? — Seu olhar dizia que ele se referia à KyuHyun.
— Eu sei.
— Sabe que ele é um demônio. A natureza dele é fazer mal às pessoas.
— Eu ainda estou confusa. Tenho que pensar.
— Certo. Quando encontrarmos nossa irmã, terei uma conversa séria com ela.
— Encontrarmos?
— Sim, eu vou com vocês procurar Luana.
— Por quê?
— Porque ela é minha irmã também. E porque não posso deixar você ir sozinha com o rei do inferno para o território dele.
— Não, Jesse, e se Luana quiser voltar para casa? Quem vai recebê-la?
— Não acredito que ela vá voltar antes que a achemos.
— Jesse…
— Não se preocupe, Ariela. E sim, eu vou atrapalhar o romance de vocês dois, esse é um dos motivos para eu ir. Eu disse para você não esquecer que ele é um demônio.
— Eu sei o que ele é. — Ela estava nervosa, queria gritar com o irmão, mas o respeito por ele falou mais alto. — Amanhã resolveremos isso.
— Certo, mas não esqueça: Estou aqui pro que der e vier, tudo bem?
— Sim. — Ela riu, beijando o rosto dele.
Jesse saiu do quarto, lhe desejando boa noite enquanto apagava as luzes e fechava a porta.
▷▷▷
Estava frio.
Luana estava com fome, mas a vontade de se levantar daquele sofá era a mínima possível. Seu pensamento ainda estava em Ariela, não acreditava em como ela poderia ter sido tão falsa.
— Vai ficar desnutrida, criança. — Aquela voz melódica adentrou seus ouvidos repentinamente.
— Não quero comer. — Mentiu, olhando para o teto.
— Claro que quer. Escute aqui. — Ele sentou de frente para ela, a expressão estressada. — Se você morrer em minha responsabilidade, vão me culpar, e sabe Luana, eu não gosto de culpa!
Luana estremeceu, vendo o garoto pegar um prato de porcelana em cima da mesa. Quando aquilo tinha ido parar ali?
— Coma. — Ele entregou-a o objeto. — Quer algo para beber?
Por medo a garota apenas balançou a cabeça em negativa.
— Certo. — DongHae levantou. — Vou sair e quando voltar, quero este prato vazio. — Apontou para o objeto. — Entendeu? Va-zi-o!
— Tudo bem. — A voz dela saiu num sussurro. Ao mesmo tempo que ela não entendia o motivo daquele chilique todo, achou muito fofo da parte dele se preocupar com ela.
Luana queria saber: Por que sempre que estava perto de DongHae, seu coração acelerava?
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