História Desavenças - 07

Durante toda a noite e madrugada Júlia dormiu. A equipe do plantão noturno optou por mantê-la contida, segundo eles para a segurança da própria.

Aquela madrugada parecia eterna para Camila que mal conseguiu pregar os olhos. Estava preocupada demais para conseguir relaxar e tirar um cochilo. À medida que o dia amanhecia os corredores começavam a ficar mais agitados. Ouviam-se vozes das enfermeiras do plantão conversando entre si, barulho do elevador chegando ou saindo.

Camila levantou-se da poltrona sentindo todo o incomodo por ter ficado a noite toda na mesma posição. Caminhou ate Julia e observou-a dormir com a boca entre aberta, os lábios estavam secos, levantou-as mãos para toca-la e no momento ouviu o som de mensagem no seu celular. Foi ate a bolsa jogada ao lado da poltrona, e viu uma mensagem de Lauren.

                                                                                                                                      “Preciso trabalhar, precisando me ligue“

Um suspiro longo foi dado, e um “Ok”respondido.

                                                                                                                                                      “Ok? Aconteceu alguma coisa?

Camila digitou “Não Lauren, só queria você aqui do meu lado nesse momento poxa”.  Clicou em enviar e guardou o celular dentro da bolsa. Pegou a carteira e saiu à procura de um copo de café pelo hospital.

Não tardou encontrar a cantina do hospital, a funcionária serviu um café e logo Camila voltou ao quarto, não queria que Julia acordasse e não visse ninguém. Abriu a porta ainda com o café em mãos e encontrou uma enfermeira com Julia. A moca simpática ofereceu um sorriso para Camila.

-  Vou ajuda-la no banho . – disse a enfermeira soltando os braços e pernas de Julia antes contidos.  Camila fez menção em sair do quarto – Sente-se, pode esperar por ela aqui mesmo. – Camila assentiu sentando-se na poltrona e observando a filha que se quer olhou para ela.-  

Julia se sentou, sentiu-se tonta e voltou a deitar.

- Senta devagarzinho, se levantar rápido vai se sentir tonta por ter ficado tanto tempo deitada. Acha que consegue? – A menina assentiu e voltou a se sentar – Isso, muito bem – elogiou – agora você vai descer pela escadinha e esperar ate se sentir bem para irmos ate o banheiro tudo bem?

Camila observou Julia descer da cama, ela vestia uma camisola verde do hospital, e usava fraldas devido ter ficado contida a noite toda.

- Mãe, trouxe produtos de higiene e roupas pra ela?

Camila negou com a cabeça se recriminando por ter esquecido algo tão importante.

- Não – suspirou frustrada – sai na pressa, nem me lembrei de pegar.

- Vou usar os do hospital, mas se puder ligar e ate mesmo ir busca-los, tenho certeza que ela não vai gostar de ficar andando com essas camisolas mostrando o bumbum pelo hospital não é mesmo querida?

Julia nada falou durante todo o banho, nesse tempo Camila já havia ligado para a esposa pedindo que trouxesse as coisas de Julia.

- Por que eu tenho que usar isso?

Perguntou ao ter que colocar uma fralda.

- Porque não temos calcinha, e bem – pausou pensando na forma que falar – você precisa usar absorventes por um tempo.

Julia não falou absolutamente mais nada, nem ao menos agradeceu a enfermeira. Deitou-se com ajuda na cama novamente e estendeu os braços para amarra-los novamente.

- Creio que não vá ser possível conte-la novamente. Comporte-se, logo trarão o seu café da manha. – ergueu as proteções laterais da cama -

A menina não demonstrou nenhuma reação, virou-se para o lado contrario que a mãe estava e fechou os olhos rendendo-se ao sono novamente.

Mais tarde acordou com conversas no quarto, abriu os olhos, mas continuou na mesma posição.

- Com certeza será de extrema importância um acompanhamento terapêutico. Porem é crucial vocês terem em mente que ela jamais voltara a ser a mesma. Um processo de luto como esse traz muito sofrimento.

Julia ouvia a conversa com lagrimas nos olhos.

- Tem algo que nós mães podemos fazer nesse momento? Ou evitar fazer, não sei –Camila perguntou confusa –

- Carinho, paciência, compreensão... – olhou para o relógio -  vou deixa-la por mais um dia no hospital, Carol nossa psicóloga ira passar e conversar com ela. Amanha passo para vê-la.

O Medico saiu do quarto e a voz de Lauren se fez presente.

- O que vamos fazer com mais esse problema, Camila?

***

- O que esta acontecendo, por que ela só dorme?  Ela não comeu nada o dia todo.

Camila perguntou a uma enfermeira que monitorava a filha.

-  Pode ser efeito da medicação de ontem ainda.

- Mas ela pode ficar tanto tempo sem comer assim?

Questionou.

- Esta correndo um soro – mostrou o soro pendurado no suporte – isso meio que supre a alimentação.

- Poxa, eu não ouço a voz da minha filha desde ontem praticamente.

Com a voz chorosa ela falou. Camila estava se mantendo forte, mas o que mais queria era poder sentar e chorar no ombro de alguém.

- Sinto muito – murmurou a enfermeira finalizando o monitoramento dos sinais vitais.

Julia sentia-se fraca, não conseguia ficar acordada. Seus olhos pareciam pesados, e lutar contra eles parecia uma guerra perdida. Talvez a profunda tristeza que sentia contribuía com todo esse sono exagerado.

Parecendo fazer uma forca absurda ela abriu os olhos, mexeu os braços se certificando que não estavam presos. Com calma mudou a posição na cama, virando-se para o lado que Camila descansava, ela sentia seu corpo doendo. Sua boca estava seca, os lábios pareciam machucados, ela queria agua, mas não acordaria Camila.

Observava o soro caindo lentamente, baixou o olhar para o acesso em seu braço e uma careta se formou em seu rosto ao tocar no local onde a agulha estava. Acariciou a barriga se lamentando internamente pelo acontecido, seu bebe havia morrido sem antes poder tê-los em seus braços.  Sentiu seus olhos lacrimejando, puxou o ar buscando forcas para não chorar mais. Passou os olhos novamente pela poltrona e encontrou Camila agora acordada a observando em silencio. Os olhares se encontraram, Julia abaixou a cabeça para pouco depois encarar a mãe novamente.

- Pode me trazer agua?

- Claro.

Camila levantou-se calcando o sapato, saiu e logo depois voltou com um copo descartável com agua. Ficou na duvida se dava na boca da filha, ou daria o copo em sua mão para que ela tomasse sozinha.  Camila não era boba, conhecia a filha suficientemente bem para saber que quando a menina estava mal ela se afastava e se irritava muito fácil com quem quer que seja. Optou por esperar Julia se sentar na cama e entregar o copo.  A menina bebeu todo o conteúdo do copo de uma só vez.

- Quer mais água? – Camila perguntou assim que Julia estendeu o braço com o copo para ela. –

- Não.

Camila foi ate a lixeira deixando o copo e voltou para  perto da filha. Tentou pegar na mão de Julia que se esquivou do toque.

- Ju, não me queira longe de você nesse momento tão difícil que você esta passando. Eu sei que eu não passei por isso, e por esse motivo eu não possa imaginar a dor que só quem passa sabe, como você mesma disse pra mim. Mas o que eu sei, e posso afirmar quantas vezes for preciso é que me dói – olhou para Júlia – e me dói muito ver minha filha mal e não poder ajuda-la, mesmo que minha ajuda fosse só dando amor, colo e um abraço confortante de mãe. Jú, por favor, me deixa ficar com você.

Julia estendeu os braços pedindo colo da mãe, um bico se formou, os lábios tremeram enquanto um choro intenso começava..