História Desenlace - I got a long way to go...Getting further away.

‘’Quem parte também fica partido’'

Mais que nunca, eu concordo com essa frase. Em primeira mão, posso dizer que é verdade. Quem parte também fica partido. Mas como o alguém que partiu, mas que também já ficou, acho que ir é o pior. Quando você é deixado, você apenas pode aceitar. Mas quando é você que parte, você tem que lidar com o fato que a escolha foi sua. Você tem que lidar com a saudade e não reclamar, afinal, foi você que escolheu assim. Você só continua. Você não olha para atrás. Você não pode olhar.

Ah Namjoon, eu leio todas elas. Todas as malditas cartas que você me manda as quintas feiras. Eu chego em casa sexta a noite, faço o café do jeito que você gosta - amargo, forte - já que eu que sempre tive a mania de adoçar e romantizar as coisas. Você dizia que achava fofo, toda vez que eu chorava no fim dos filmes ou procurava suas pernas a noite porque achava romântico dormir de pés dados. E agora você usa isso contra mim.

É por isso que você continua a me escrever, pontualmente, toda maldita quinta, mesmo tendo passado 2 anos? Para nunca deixar a ferida cicatrizar? Se esse for o motivo, saiba: Nunca cicatrizou. Por que toda sexta feira, na volta da biblioteca - sim, eu ainda trabalho lá e sim, o capuccino ainda tem mais canela que café mesmo depois da gente ter ligado tanto para reclamar - eu passo nos correios e pego as correspondências estacionadas. Depois de tanto tempo, o senhor com óculos engraçadinhos nem pergunta mais meu nome, ele só me entrega e sorri triste para mim. Você contou nossa história para ele? Contou como nós nos salvamos da maldade do mundo e depois nos quebramos de novo pelo descaso? Você sempre foi tão discreto sobre essas coisas, mas eu imagino você contando pra ele como quão cruel eu fui por ir sem ao menos um bilhete. Não por mal sabe? Você nunca foi maldoso por querer. Por querer não.

E por isso que hoje, nessa quarta-feira de inverno, eu resolvi te responder. Porque eu estou indo embora. Dessa vez definitivo. Se eu passar mais um dia sentindo aquele maldito cheiro de canela daquela maldita maquina, volto para nosso apartamento. E eu não posso, não posso, nós sabemos disso. Hoje, como você disse na penúltima carta, eu sou apenas alguém que você conhecia. Mas pelas suas cartas, eu vejo que você não mudou nada.

A saudade não pode me fazer esquecer os motivos deu ter ido embora, entende? Você continua a viver no mesmo mundo racional demais e só ter saído do nosso apartamento não me bastou para esquecer como eu amava você ser tão cru. Como eu amava o contraste que a gente tinha, o bibliotecário sonhador que na verdade queria ser redator e o arquiteto igualmente frustrado que amava desenhar plantas, mas odiava ter que fazer algo encomendado. Eu amava quando você falava de física e eu das estrelas e em como chegávamos num consenso na astronomia. Eu continuo no meio dos livros que você tanto ama e as crianças continuam me chamando de tio. Eu continuo vestindo aquele suéter cinza de vovô e continuo colocando açúcar demais no café. Menos nas sextas a noite.

É por isso. não sei lidar com as lembranças. Eu vou embora e deixando todos nossos consensos para trás. Começar a tomar chá (sua mãe ia adorar isso, ela sempre dizia que íamos ficar com gastrite antes dos 30, lembra?), vou fingir esquecer o casaco na casa de algum amigo e o endereço vou levar comigo. Eu preciso de me libertar de nós dois e é impossível fazer isso tendo a mesma rotina que tinha antes com você (tirando que não tenho mais teus beijos no final do dia), recebendo suas cartas cheias de farpas e verdades toda semana. Eu preciso me libertar, porque minha mente é apenas um looping de coisas que nós dois fizemos, deixamos de fazer e não deveríamos ter feito.

Quando fica difícil demais resistir te fazer uma ligação (eu apaguei teu número, mas sei de cor há tantos anos que não faz diferença nenhuma, inclusive, várias vezes quase dei o número do agora só teu fixo, por causa do hábito formado), eu faço uma lista com coisas que me ajudaram na decisão de ir embora. Ontem à noite, o resultado foi isso aqui:

1- Você não gostava de Elliott Smith.

2- Eu não suportava mais aquele seu perfume que você usava há 3 anos desde que eu te dei um frasco naquele natal.

3- Você parou de sugerir que a gente fizesse maratona de Star Wars nos feriados.

4- Eu não posso te dar os filhos que você passou a infância toda desejando.

5- Você nunca fazia planos. Nós estamos juntos há fucking 5 anos e você nunca pensava no futuro comigo, como se nós fôssemos terminar mês que vem. Acho que no fundo sabia, como eu também, que nós dois fomos feitos para nos apaixonar, não para ficarmos juntos.

6- Eu passei tanto tempo sendo teu que esqueci como ser eu. Qual era minha música preferida antes de conhecer nossa música preferida? Eu amei teus olhos castanhos por essa ser minha cor favorita ou essa é minha cor favorita por causa dos seus olhos? Você consegue perceber? Eu me perdi no meio de ser teu Jin e ser o Seokjin.

7- Eu, que amo ler e estou rodeado de livros 24/7 nunca li teu livro preferido. Eu tentei várias vezes, você sabe, mas… simplesmente não deu.

      Eu jurei para mim mesmo que não iria usar essa carta para me justificar ou responder as suas palavras duras. Eu mereço a maioria delas. No início suas cartas eram todas raivosas e cheias de rancor… Depois se tornaram tão tristes e cheias de súplica que eu podia imaginar você sentado na nossa (sua) escrivaninha, tomando café e escutando Iron and Wine. Você nem ao menos gostava… Hoje tenho no mínimo 30 cartas com trechos de músicas deles. Eu não vou levá-las. Eu não poderia. Você não sabe o efeito que ainda tem sobre mim.

Acho que é por isso que nunca ficou me esperando nos correios, nunca foi atrás de mim na biblioteca ou perguntou meu novo endereço para minha mãe. Você nunca soube lidar com rejeição. No fundo, sempre achei que era por isso que você odiava as encomendas. Colocava tanto amor naqueles projetos que quando os ‘’filhos da puta engomadinhos’’ pediam para você mudar um ângulo sequer, ficava chateado. Até tentava disfarçar com a raiva, mas dava pra ver do jeito que ficava que não entendia como alguém não conseguia entender suas ideias e achar tão incrível como você - a gente - achava.

     Apaguei todas as nossas músicas daquele pendrive do R2D2, a única que ficou foi Sweater Weather. A desculpa é que era minha antes de ser nossa. Mas nós dois temos tantas lembranças com ela que sei que é hipocrisia minha. Pensando bem, eu deveria acrescentar um item na lista de ontem:   

8- Passamos tanto tempo sendo “nós” que esquecemos como era ser “eu”. Precisamos nos libertar.

                                                                                                                    Tentando deixar de ser teu,

                                                                                                                                           Kim Seokjin.