Rotina
Era para ter sido apenas uma noite. Uma noite para se livrar do encanto hipnótico de Caroline... Era para ter sido apenas isso, mas, de algum modo, uma noite se tornou duas, e duas tornaram-se três.
Antes que Klaus pudesse compreender plenamente o que estava acontecendo, Caroline parecia firmemente aninhada em sua casa em Washington. Era o rosto que via todas as manhãs ao acordar. A pessoa que ele ansiava ver ao fim de um dia de trabalho. A razão pela qual recusava todos os convites que recebia regularmente em sua caixa de mensagens. Afinal, por que iria ficar de papo furado com pessoas superficiais se podia ficar em casa na cama com sua beldade de olhos azuis? Uma que insistia em continuar trabalhando como garçonete. E ele não conseguira fazê-la mudar de ideia.
Porque jamais conhecera uma mulher mais teimosa ou independente do que Caroline Forbes! Seria isso parte de seus atrativos, essa determinação em não permitir que ele ditasse as regras?
O reconhecimento de que aqui estava uma mulher que trabalhava tão duramente quanto ele.... Ainda que num campo muito mais modesto. E depois que a novidade de tudo isso houvesse terminado, então certamente essa fome por ela iria consumir a si própria, e poderia voltar a viver normalmente. Sozinha.
Era apenas que ele aparentemente esquecera como ser normal. Aqui estava ele, barbeando-se com a mente completamente ocupada... Enquanto através da porta aberta para seu quarto jazia a fonte de sua preocupação, cabelos desgrenhados e sorriso de satisfação preguiçosa curvando seus lábios para cima. Será que ela compreendia que estava exercendo sobre ele alguma espécie estranha de feitiço? E será que já não era hora de se livrar disso?
— Você parece a quilômetros de distância — comentou enquanto retornava para o quarto.
A voz carregada de sotaque de Klaus penetrou os pensamentos de Caroline, que olhou para cima, coração derretendo-se em desejo enquanto o observava. Estava usando nada mais além de uma toalha branca amarrada nos quadris, enquanto, com uma versão menor, enxugava seus cabelos dourados.
Gotas de água reluziam como metal precioso em seu tronco nu; e ela teve de engolir uma sensação de descrença. De que ela estava aqui, na cama de Klaus. E que ele a estivesse olhando de volta com aquela já tão familiar centelha de desejo nos gélidos olhos verdes. Ela suspirou. A cama era quase tão grande quanto todo o quarto de dormir da casa de Caroline. Sofria, sim, mas era uma espécie de sofrimento delicioso, que a fazia lembrar-se de todas as coisas que seu amante britânico fizera com ela na longa noite em que haviam passado juntos. E em todas as noites antes disso...
— Como posso estar a quilômetros de distância quando estou aqui? — Questionou ela com um sorriso tímido.
Com um suspiro entrecortado, Klaus deixou cair á toalha, escutando o pequeno arfado que ela deixou escapar ao ver seu corpo nu. Sentiu-se enrijecer e compreendeu que se caminhasse até a cama, poderia estar no interior do ávido corpo de Caroline numa questão de segundos. E que queria estar. Queria telefonar para sua secretária e mandá-la cancelar todos seus encontros para o resto do dia, apenas para poder ficar em casa com Caroline. Irritado, puxou uma camisa de seda de seu guarda-roupa. A esta altura a atração exercida por Caroline já não deveria ter diminuído um pouco? Fazia um mês desde que haviam retornado da França... E três semanas desde que haviam feito amor pela primeira vez, nos Estados Unidos.
Normalmente costumava racionar seu tempo, e as mulheres sentiam-se gratas pelo que conseguissem dele. Uma noite aqui e ali, dependendo de onde o humor o levasse. Certas noites ele preferia trabalhar até tarde e dormir sozinho. Ou gostava da liberdade de sair para jogar cartas até o amanhecer. Ou para voar até o outro lado do mundo, informando seu paradeiro apenas aos seus associados mais próximos. Com Caroline era como se houvesse jogado o livro de regras pela janela. Era como se não conseguisse jamais sentir-se saciado dela, e o pior era que não conseguia entender o motivo. Será que Caroline tinha alguma noção de que o atraíra para uma armadilha de amor, e estava conjurando fantasias sobre o futuro que os aguardava, neste exato momento, enquanto o brindava com um sorriso sonhador? Estaria pensando que a compatibilidade sexual talvez se estendesse para algo mais geral? Klaus franziu a testa. Algumas mulheres não precisavam de muito para começar a sonhar com véus e grinaldas... Principalmente quando um homem fora marcado com o rótulo "elegível". E se Caroline estava fazendo isso... Ele poderia realmente culpá-la?
— Você não vai trabalhar fora esta noite, vai? — Perguntou Klaus.
Caroline engoliu em seco quando Klaus começou a vestir um calção de seda. Às vezes, observá-lo vestir-se parecia ainda mais íntimo do que fazer sexo com ele. Era íntimo, compreendeu.
Quando encontrara com Vicki no almoço de lançamento literário do dia anterior, sua amiga comentou que ela e Klaus estavam praticamente vivendo juntos.
E quando Caroline protestara, de forma muito tênue, era verdade, Vicki dissera algo como ela por acaso não sabia com que espécie de homem estava lidando? Que um homem que era conhecido como avesso a compromissos não era a espécie de pessoa a quem se deveria entregar o coração.
E Caroline dera com os ombros e dissera que não havia a menor possibilidade de que lhe entregar seu coração. E Caroline acrescentara que decerto não era estúpida o bastante para imaginar que ela e Klaus poderiam desfrutar de qualquer espécie de futuro de longo prazo juntos. Exceto que isso não era exatamente verdade. Mesmo quando o bom senso lhe dizia uma coisa, isso não impedia seu coração de desejar o completo oposto... Há algumas noites, ela o observara dormindo, e começara a se perguntar como seria um filho ou filha dele? Uma filha de Klaus seria muito bonita, considerara Caroline, caso herdasse aqueles frios olhos verdes e cabelos dourados escuros.
— Não, não vou trabalhar esta noite. — Eu.... Bem, você sabe que eu requisitei turnos diurnos sempre que possível? — E a mãe de Vicki concordou, de modo que tenho a maior parte das noites livres.
— Bom. — Ele lhe dirigiu um sorriso calmo enquanto começava a abotoar a blusa. Claro que estava feliz por poder ter as noites com ela. Odiava vê-la partir todos os dias para servir a homens que certamente preferiam devorá-la com os olhos a comer o que elas lhes serviam nas bandejas. Talvez fosse hora para eles começarem a se aventurar para além do quarto. De parar de permitir que o sexo o cegasse para todas as diferenças entre eles e insuflar um pouco de realidade neste relacionamento. De ver que não havia um relacionamento.
— Pensei em jantarmos fora.
— Seria ótimo. — Ela fitou-o, nervosa. Descontando aquela última noite na França, era a primeira vez que ele iria levá-la para jantar fora, e ela não queria decepcioná-lo. — É algum lugar muito requintado?
— Na verdade, é um lugar muito pouco requintado — disse ele em voz baixa.
Talvez sua ideia de "pouco requintado" ainda seria algo bem opulento. O único trabalho de Caroline naquele dia foi um almoço de negócios num vasto apartamento no centro, o que lhe deu tempo de sobra para fazer compras depois. Comprou um vestido verde de seda em uma loja de ponta de estoque, e um colar de pérolas falsas, e voltou para a casa de Klaus para se aprontar.
Entrar na casa era sempre uma experiência um pouco intimidadora. Não tinha chave, e sabia que a governanta de Klaus não gostava dela, provavelmente por não ter esquecido que ela já havia trabalhado ali, servindo canapés.
Contudo, forçou um sorriso reluzente quando a mulher mais velha abriu a porta.
— Klaus ainda não chegou a casa? — perguntou Caroline.
— Ainda não, senhorita. — O Sr. Mikaelson deve voltar logo.
Murmurando um agradecimento, Caroline subiu as escadas, tomou um banho e se maquiou e se vestiu.
Ele parou por um momento no portal do quarto, olhos fixos nela. Verde caía muito bem em Caroline, pensou ele, principalmente quando aderia aos seus quadris daquela forma e expunha uma boa parte de suas coxas espetaculares.
— Você está magnífica, amor — disse baixinho enquanto tirava a gravata.
— Estou? — Ela estava prestes a lhe dizer que aquele era apenas um vestido vagabundo, mas se conteve. Uma mulher devia sempre guardar algum segredo. Além disso, não queria que Klaus pensasse que estava insinuando que ele deveria lhe comprar algo mais caro.
— Hum... Absolutamente deliciosa. — Na verdade, acho melhor não beijar você, para não correr o risco de mudar minha ideia quanto a sair. — Dê-me dez minutos para me trocar.
O carro de Klaus os levou a um restaurante muito arejado, mas o ar estava tão quente e pesado quando desceram que Caroline se perguntou se não haveria uma tempestade se avizinhando. Era um estabelecimento simples, uma sala ampla com piso de madeira polida e mesas e paredes nuas, de modo que toda a atenção estava focada na água verde acinzentada do canal que fluía do outro lado das janelas gigantescas. O cardápio também era simples, a maior parte da comida era cultivada em fazendas próximas, segundo a jovem e entusiasmada garçonete que os atendeu. Pediram risoto com abobrinhas e uma grande salada verde.
— Este não era o tipo de lugar que eu estava esperando — disse Caroline enquanto tomava um gole de vinho tinto cujo aroma era levemente puxado a framboesas.
— E que espécie de lugar você estava esperando?
— Não sei algo mais sofisticado.
— Você teria preferido?
Algo no tom de Klaus a fez pousar o garfo na mesa e fitá-lo intensamente.
— Voltamos ao assunto da caça de dotes, Klaus?
— Claro que não. — Estava simplesmente fazendo uma pergunta.
— Não, eu não teria preferido algo sofisticado. — Eu trabalho em lugares assim. — Gosto daqui. — É diferente... E aprecio a simplicidade. — Ela correu a ponta do dedo pela borda da taça de vinho. — Vocês têm restaurantes assim na Inglaterra?
— Claro que sim. — Há restaurantes assim no mundo todo. — Apenas em áreas afluentes você encontrará comida de camponeses a um preço extorsivo — comentou seco. — Essa é uma das muitas ironias da vida, Caroline. — Aqueles que passaram por momentos difíceis tentam reviver esses momentos depois que os superam.
— Você já teve momentos difíceis?
Estreitou os olhos.
— O que é isto, o começo de um interrogatório?
— Interrogatório? — Ela pousou a taça. — Não posso negar estar interessada na sua vida.
— Como poderia, quando estamos passando tanto tempo juntos? — Além disso, você quis saber a respeito do meu passado, não quis?
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