“Nobody touches us at all
Showdown, shootout, spread fear within, without
We're gonna take what's ours to have”
A fazenda não passava de um campo de plantação ressecada que abrigava uma casa de dois andares no centro. O milharal ao fundo da casa parecia não dar fruto algum, e era de conhecimento de poucos que ali atrás, escondido entre os pés de milho, a real plantação era a de maconha.
— Shawn? — Sid chamou se movendo nas sombras. Os oito homens mesclavam-se ao breu da noite, vigiando os inimigos como corvos da morte. — Quanto tempo mais nós vamos ter de esperar? Meus braços estão começando a doer.
Wilson havia escolhido empunhar um fuzil de assalto de modelo M16. Ele era bom com ataques à distância, tira uma mira ágil e perfeita para atingir cabeças desprevenidas.
— Já lhe disse, esperaremos para que se dispersem um pouco. Você não quer sair atirando em inocentes, quer?
— Eles estão dando uma festa para comemorar o roubo de armas ilegais, Shawn, ninguém ali é inocente. — e saiu de volta para seu lugar.
O grupo havia combinado esperar que alguns dos convidados extras deixassem a festa para que começassem o ataque. Shawn não queria fazer nada silenciosamente. Estavam todos sem máscara e chegariam fazendo barulho, olhando os desgraçados diretamente nos olhos. Não seria nem um pouco interessante atacá-los pelas costas.
As horas iam passando e a tensão só aumentava. Quando a maioria das mulheres e jovens já havia entrado em seus carros para voltarem à cidade, Shawn esperou que a rodovia voltasse a ficar silenciosa para fazer o movimento que todos esperavam. Corey apertou mais os dedos das mãos no punho de suas duas mini-uzis e sentiu o peito vibrar.
— Vamos lá, vocês sabem o que fazer. — Shawn comandou. — Não sejam burros e não morram, eles só são a porra dos Horsemen. Se algum irmão for baleado, nem sequer pensem em baixar guarda. Agora, vão!
Atravessaram a rodovia como um bando de corvos emergindo das sombras. Os únicos ruídos além dos que vinham da fazenda eram o farfalhar do vento nas árvores e os solados duros sob o asfalto que logo começaram a esmagar o chão de terra.
O grupo já havia feito aquele tipo de missão antes — invasão e assassinato a um grupo inimigo —, mas a última vez havia sido há um bom tempo atrás, então, apesar de destemido, Shawn tinha um pouco de preocupação no peito. Sabia que de alguma forma James estava certo: ele estava ficando velho e, consequentemente, mais flexível e compassível. Felizmente, quando a primeira bala do fuzil de Wilson disparou pelo supressor e atingiu a cabeça distraída de um homem que fumava um cigarro sozinho na varanda, todo e qualquer receio se esvaiu.
Pelos olhos de Corey os acontecimentos seguintes pareceram acontecer em câmera lenta. Até mesmo seus batimentos cardíacos pareciam tomar uma velocidade muito menor do que a esperada para aquele momento. Assim que a porta da frente foi aberta um homem careca apareceu na varanda avistando o esguicho de sangue na parede e o companheiro caído no chão. Ele levou à mão ao coldre na cintura, os olhos já se arregalavam procurando o assassino, mas ele não foi mais rápido do que a submetralhadora de Chris, que perfurou por três ou quatro vezes o peito vulnerável.
A poucos metros da entrada, já se ouvia alguns gritos do lado de dentro. Shawn fez sinal para que quatro seguissem pelos fundos da casa.
— Modo suicida? — Corey gritou com um sorriso de divertimento no rosto.
— Sempre! — respondeu o chefe.
As mini-uzis começaram metralhando assim que Corey passou pelo arco da porta. Atingiu móveis, vidros e três corpos. Shawn, vindo atrás, preveniu o amigo de receber um tiro de escopeta nas costas atirando no inimigo que vinha descendo as escadas. Mais uma dose de tiros vindos da parte de trás da casa e mais dois homens sendo atingidos por Shawn. Corey impedia três mulheres de fugirem da casa.
— Shawn? O que fazer com elas?
As mulheres estavam encolhidas no sofá, a mira automática das metralhadoras sob elas.
— Shawn?
Corey desviou a atenção por um segundo, mas o velho, que já começava a abrir a boca para assentir em deixá-las ir, viu pelo canto do olho uma delas levar a mão às costas para buscar pela pistola, mas recebeu uma bala no crânio antes que pudesse tirar a arma da cintura. As outras duas não tiveram tempo de gritar, receberam o mesmo fim.
— Você perde muito tempo fazendo perguntas misericordiosas, Taylor.
O velho deu as costas, mais tiros soaram atrás deles e depois que os outros quatro voltaram para a sala, o silêncio dominou.
— Estão todos bem?
— Tudo certo. — foi Jay quem confirmou. — Alessandro desviou de uma graças ao inglês.
Alessandro mostrou o sangramento no braço feito por um tiro de raspão e Shawn sacudiu a cabeça para Paget como forma de agradecimento.
— E Larry?
— Nada. — Chris respondeu. — Deve estar no andar de cima.
— Certo. — Shawn trocou o pente da sua pistola mesmo com balas ainda restantes no anterior. — Chequem os quartos e cuidado ao abrirem as portas.
Não foi preciso procurar por Larry. Da porta de seu escritório homens armados estavam à espera dos atacantes, e assim que as cabeças começaram a aparecer na escada uma chuva de tiros foi jorrada. Shawn fez sinal para Corey para que agissem rápido. Assim que as armas inimigas pararam, receosas, eles pularam os degraus restantes e atingiram os seguranças. Corey chegou a ouvir uma bala zunir no seu ouvido e respirou fundo quando os corpos caíram no chão.
— Laaarry — Shawn tentou repetir a cena daquela manhã, vingando-se da desonra que passara. — Vamos, Larry, apareça. Renda-se!
— Eu vou matá-lo, Clown! — Larry ressoou do outro lado, a voz abafada pela larga porta de madeira. — Você e seu bando de filhos da puta!
Shawn gesticulou para que Corey, Chris e Mick tomassem postos ao lado dele. Corey esperou a ordem e chutou a porta com força, fazendo as duas bandas se escancararem e exporem o interior da sala. Larry estava armado, mas apenas tremeu com o baque e, vendo as miras voltadas para seu peito, apenas manteve a arma levantada, mas sabia que seria suicídio puxar o gatilho.
— Ah, você realmente achou que ia me fazer de idiota, Larry? — Shawn deu três passos a frente e baixou a pistola para sua cintura olhando o inimigo nos olhos sem temor algum. — Você começou essa merda de tráfico de maconha há menos de uma década e acha que iria roubar a mim e sair ileso? Achou que ia foder comigo de graça? — o líder riu sozinho. — Olhe só para você agora, Larry. Que situação ridícula a sua... Teria sido melhor se você tivesse continuado a manter nosso relacionamento de vendedor e cliente, mas, como uma criança gananciosa que é, decidiu colocar a mão no nosso doce. — ele estalou a língua com desgosto e suspirou. — Ah, Larry.
Shawn levou a mão fechada em punho para o lado esquerdo do rosto do inimigo, o que o fez cambalear para trás e se bater contra a escrivaninha. Outro soco atingiu o queixo, fazendo-o cair no chão. Shawn subiu sobre Larry e esmurrou-o repetidamente, fazendo o rosto sangrar a cada golpe recebido.
— Seu vermezinho miserável e prepotente. — socou-o no nariz e na bochecha outra vez. — Você nem mesmo merece toda essa atenção que nós gastamos com o seu bandinho, mas você buscou guerra contra lobos. E sinto lhe dizer, mas lobos não têm pena de gatinhos.
Shawn sorriu ameaçadoramente e se levantou deixando o homem sangrando no chão de madeira. Manteve os pés cada um ao lado do corpo do outro e voltou a sacar a pistola. Larry cuspiu o sangue da boca e gemeu com o movimento.
— Clown? — chamou, a voz saindo com dificuldade do fundo da garganta. Larry mostrou os dentes sujos de sangue e seus olhos quase se fecharam com o sorriso. — Te vejo no inferno.
O tiro atingiu a testa, fazendo a cabeça calva imediatamente bater no chão e o corpo perder a vida. A madeira escura foi sendo banhada pelo líquido quente, fresco e vermelho, trazendo alívio e sensação de missão cumprida.
— Miserável. — Shawn cuspiu com a voz baixa, dando fim à cena.
O grupo ia finalmente se preparando para sair da casa e algumas armas dos que assistiam já iam baixando as miras, inclusive as mini-uzis de Corey, mas um movimento no canto da sala foi percebido e as pequenas metralhadoras voltaram ao seu campo de visão. Ele se perguntou mentalmente como aquela presença tinha passado por despercebida por todos. Focaram-se tanto em Larry que jamais imaginariam que ele teria consigo, em seu escritório, a companhia daquela pessoa.
— O que você está fazendo aqui?
Sua voz que soou muito alta, o que fez com que todos os homens se voltassem imediatamente para a nova mira. Ceticismo tomou seu rosto e um vinco de rugas se formou em sua testa.
— Scarlett? — foi Shawn quem chamou incrédulo.
— Corey, abaixe as armas... — ela pediu com terror nos olhos. — Por favor.
Ele se aproximou mais dela, as metralhadoras de pé.
— Explique-se. — ordenou. — Explique-se, Scarlett!
— Corey, não é...
— Porra Scarlett, você estava metida com o Horsemen?
— Não, Corey, não é isso. — ela tinha aquela voz cheia de pesar como se tentasse manipular o loiro. — Me escute...
— Então diga! — gritou. — Scarlett conte a verdade antes que eu meta uma bala na sua cara aqui mesmo. Conte a verdade pela primeira vez na sua vida, sua vadia.
Ela fungou e gemeu.
— Corey...
— ANDA!
— Tá bem! — gritou de volta. — Merda... Eles me ofereceram dinheiro! Larry me deu um puta de um dinheiro para ficar por dentro das transações que vocês faziam. Eles já estavam de olho em vocês faz tempo e quando me viram com vocês... Bem, ele foi esperto e eu me aproveitei também. Eu soube que vocês iriam receber mercadoria nova, então contei para ele, é claro, mas não sabia que vocês... Eu não imaginei que vocês pudessem vir matá-los só por causa de umas armas roubadas!
— É por isso que você andava fedendo a maconha, não é?
— Corey... — ela fez uma careta de choro e súplica. — Me perdoe! Eu só quis que vocês passassem por um susto.
— Não Scarlett, você queria foder com a minha vida outra vez, isso é o que você queria. O que mais prometeu a eles? O que mais deu a eles?
— Documentos.
— Documentos?
Ela bufou.
— Documentos, fotos, a merda toda que vocês tem guardado. As memórias do grupo e tudo o mais. Tudo o que poderia incriminar vocês, todas suas provas pessoais.
Shawn deu um passo à frente.
— Espere. — fez uma pausa. — Essas coisas estão guardadas na minha casa.
— Foi bem fácil arrombar, Shawn. Chantel passa muito tempo fora de casa cuidando de vocês, mas você deveria cuidar mais da sua própria casa.
— Você é uma vadia nojenta, Scarlett. — o líder sibilou.
— Onde estão as coisas agora? Os documentos e a nossa mercadoria, onde estão?
Corey estava até em mais tranquilo no momento. Estava ganhando a confiança da mulher e planejando o fim de tudo aquilo. Faria certo desta vez, repararia seus erros com o grupo naquela noite. Tinha o plano pronto e estava a poucos minutos de executá-lo.
— Scarlett, me diga onde estão.
— Você vai me matar Corey, eu não vou lhe dizer nada!
— Por favor Scarlett, eu jamais mataria você.
Soou tão sincero que até mesmo seus companheiros se sobressaltaram. Corey fez um gesto simples com o dedo para que se aquietassem.
— Olhe para mim, você acha que eu faria isso? — ele largou as armas na mesa de escrivaninha e deu mais alguns passos até a mulher. — Olhe, você fez uma merda gigantesca agora, eu não sei se vou te perdoar por causa disso. Não, tenho certeza: não vou te perdoar, não posso fazer isso. Mas eu não seria tão frio a ponto de assassinar a mulher que um dia eu amei. Apesar de tudo...
Scarlett ficou imóvel por um segundo absorvendo as palavras ouvidas, até que as lágrimas silenciosas começaram a descer pelo rosto e o sorriso aliviado tomou os lábios.
— Corey...
— Me diga, por favor.
O silêncio atrás de Corey chegava a ser palpável. Os amigos prendiam a respiração assistindo à cena, a dúvida martelando na cabeça. Ainda não tinham compreendido o que o rapaz queria com tudo aquilo. Shawn estava tão quente que tinha certeza que mataria Corey caso ele deixasse que a loira saísse ilesa outra vez.
— As armas estão guardadas no galpão de trás onde eles guardam a maconha. Mas os documentos devem estar aqui nessa sala.
Quando ela se virou para trás para olhar curiosamente uma das estantes de madeira, Corey voltou-se rapidamente para Shawn e puxou da cintura do líder a pistola automática. Três tiros foram disparados atingindo as costas da loira antes mesmo que ela tivesse tempo de ver o que aconteceria. O corpo chegou a tombar para frente e deslizou pelas prateleiras até o chão.
O silêncio ainda prevaleceu por um longo tempo. Ele engoliu em seco e suspirou soltando o ar ruidosamente. Voltando-se para trás, viu pares de olhos encarando-o. Pela falta de reação ele chegou a se questionou se havia feito algo de errado novamente.
— Taylor? — Shawn chamou. — Você está bem?
Ele travou a pistola e entregou-a ao dono.
— Não é com isso que temos que nos preocupar agora, Shawn. — respondeu. — Vamos pegar de volta o que nos pertence e colocar esse lugar em chamas o mais rápido possível.
* * *
A mercadoria intacta que acharam no galpão foi levada de volta aos carros e a casa foi sendo embebida em gasolina e álcool, assim como a plantação de maconha.
Àquela hora da noite o silêncio predominava o lugar, o vento silvava e a rodovia estava assustadoramente quieta. O grupo se juntou à frente da fazenda, os corvos de preto em meio à escuridão e a calada da noite. Corey acendeu o isqueiro que tinha no bolso e deixo-o cair no rastro de gasolina. O fogo subiu vivo e se alastrou rapidamente para a casa, tomando a varanda e o primeiro andar. As labaredas foram lambendo as paredes até chegarem ao topo. As cores quentes e as flamas dançantes deram cor à noite e iluminaram os oito rostos suados.
Estava feito, finalmente. A sensação no peito poderia não ser boa, mas era reconfortante. Fez Corey se sentir em casa novamente, e fez Shawn se orgulhar do que via. Depois de anos, o líder sentia que a família não estava morta. Apesar de tudo o que passaram, eles ainda eram os mesmos de sempre. Eram os homens sem esperança, os pais, filhos e irmãos de guerra. Eram os anônimos, eram as crianças inocentes que foram transformadas em lobos pela vida dura que tiveram. E ali estavam eles: de pé, renascidos. Agora se sentiam tão vivos e destrutivos quanto fogo que queimava sem cessar.
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