Sábado, 11:27 AM
Sentado na cama esperando Willian terminar de se vestir, Ethan tentava jogar para longe a exaustão da noite anterior. Depois de tudo o que tinha acontecido na outra noite e naquela manhã, ele não conseguia mais nem se movimentar sem sentir dor, seu corpo doía tanto do esforço que ele não era acostumado a fazer, que chegou a pensar que não conseguiria mais sair da cama. Ao invés de sexo, ele parecia ter passado a noite e a manhã sendo espancado por Willian, e ainda assim podia sentir seu corpo incrivelmente sensível. O que ele era, algum tipo de pervertido? Porém, parando para pensar, na verdade a culpa era de Willian por todas aquelas sensações estranhas em seu corpo, por isso o pervertido, tecnicamente, era ele.
Após terminar de tomar banho — com a ajuda do garoto — foram para a cozinha do dormitório, o que ele, pessoalmente, achou incrível, afinal o dormitório não era apenas um dormitório, era praticamente um alojamento. Tinha tudo dentro; de cozinha à sala com TV compartilhada. Ao chegarem lá, Willian, que se sentia bastante disposto — ao contrário dele, que parecia ter envelhecido uns dez anos em apenas uma noite —, preparou o café da manhã, porém comeram em silêncio; o constrangimento havia voltado novamente.
Por ser sábado e eles não terem aula, Ethan não tinha uma desculpa sequer para fugir dali, o pai de Willian iria fazer uma viajem com sua madrasta naquele dia, então o garoto não iria para casa, disse que não sentia vontade de ficar só na casa enorme naquele final de semana. A atmosfera entre eles estava bastante pesada e ele se sentia desconfortável, mas não podia simplesmente fugir dali, ia dar muito na telha e depois não conseguiria encará-lo mais. Não, fugir não era uma opção no momento.
Ethan terminou sua torrada, que estava uma delícia, mas não tinha gosto algum em sua língua, tudo o que vinha à sua cabeça era o fato de que, há apenas algumas horas ele estava se agarrando com Willian no banheiro; aquilo não lhe deixava em paz nem por um momento sequer e, aparentemente, também estava afligindo o garoto, pois ele nem mesmo tocara em seu café. Aquilo, de certa forma, lhe deixava com os nervos a flor da pele, afinal não suportaria ser desprezado e ignorado por ele após o incidente. Se sentiria um lixo ambulante, um idiota que tinha caído no poder de sedução daquele babaca.
Sem perceber, Ethan passou a alimentar raiva de Willian e adotou o modo defensivo sem nem mesmo averiguar como o garoto estava, como ele se sentia ou como agiria. Pegou o celular do bolso e encarou a tela, haviam algumas mensagem de diferentes garotas e isso lhe fez apenas rolar os olhos subindo as mensagens até parar em uma de sua mãe, então algo tornou a sua mente. Ele se lembrou que queria ver a mulher, pois antes de sair de casa da última vez percebera que algo estava errado com ela; tinha que perguntá-la o que estava acontecendo, pois até mesmo seu pai, que não dava à mínima, estava agindo de forma mais cuidadosa que o normal.
Ele precisava ir ao seu quarto pegar roupas limpas, então aproveitou a oportunidade e se despediu rapidamente de Willian, que insistiu para que ele ficasse mais um pouco. Ele, porém recusou educadamente e até um pouco formal demais, sem olhar nos olhos do garoto, pois a coragem resolvera lhe deixar logo em um momento inoportuno como aquele, lhe transformando em um covarde e lhe impedindo de sequer conseguir encará-lo nos olhos sem tremer.
Ethan sentia-se ainda menos confiante perto do garoto, agora que tinham transado. Willian queria ir deixá-lo de carro, mas ele também recusou a proposta e saiu andando; ao chegar lá fora o céu ainda estava nublado e o ar estava úmido, soprava uma brisa gélida e as poucas folhas douradas restantes nas árvores se moviam fazendo barulho, não havia som de pássaros e a rua estava ainda mais deserta que o habitual naquele lugar que parecia inabitável, afinal não importava se era final de semana ou não, lá estava sempre deserto e as montanhas que rodeavam a escola deixavam o local ainda mais sinistro. As pessoas provavelmente ainda estavam todas dormindo ou já tinha saído para duas casas, ainda mais às 11:30 AM de um sábado em que não haviam atividades de clubes nem aulas complementares obrigatórias.
Quando Ethan chegou em casa ia dar 12:10 PM, sua mãe estava sentada na varanda em sua poltrona habitual, toda encolhida e enrolada com seu edredom, só havia dois carros na garagem, o seu e o dela, o que significava que seu pai já havia saído para o trabalho. Quando se aproximou, notou que ela parecia muito mais cansada e velha que o normal, seus traços pareciam, de certa forma, ainda mais frágeis do que já eram, sua aparência bela e élfica, sempre alegre e travessa, muitas vezes até sarcástica, agora estava mais apagada e triste e a luz de seus olhos parecia ter se extinguido, ao invés disso eles estavam vermelhos e inchados.
— Olá mãe, o que está fazendo sentada aqui tão cedo nesse frio? E por quê? Você não vem aqui apenas para o chá da tarde e para esperar seu marido?
— Olá meu bem... — ela lhe olhou parecendo surpresa — Estava preocupada com você! Fiquei pensado se ficaria bem naquele lugar sem mim, afinal já faz quase três meses.
— Eu ligo todos os dias, não é mesmo?!
— É mesmo?! — ela franziu o cenho parecendo confusa por um momento, mas logo voltou ao normal — Bom, sim, mas você não pode me culpar por me preocupar, não é? Você é meu filho, então mesmo que eu saiba disso, ainda me preocupo com você, afinal...
Ethan não descobriu o que sua mãe ia dizer, pois ela parou de falar abruptamente e arfou, logo em seguida ele via sangue jorrar de seu nariz, escorrendo pela a boca até o queixo, manchando-lhe o rosto, pingando e tingindo de vermelho vivo o branco imaculado de seu roupão. Ele ficou sem ação por alguns instantes, até que lhe caiu a fixa de que sua mãe ainda estava sangrando, tirou o celular do bolso e discou o número da ambulância, pediu ajuda e quando esta chegou, ele foi junto. Ao chegarem ao hospital ela mencionou o nome de seu pai, então ele se lembrou do outro e o contatou, avisou que estavam no hospital porque ela tinha passado mal em casa e alguns minutos depois — talvez uns quarenta, não sabia ao certo — o médico lhe falou que ela estava estabilizada e que ele podia vê-la. Ethan entrou no quarto ainda trêmulo, aquele hora o maior susto que já tomara na vida.
— Mãe... meu Deus, o que foi isso?
— Nada querido, eu só passei mal.
— Só passou mal? E o que era tudo aquilo?
— Era sangue! — ela falou com ar brincalhão e Ethan a olhou muito sério, com olhos intensos quase pretos e os lábios apertados em desaprovação, do jeito que ele sabia que a deixaria se sentindo culpada — Está tudo bem, Ethan, eu já me acostumei... vem acontecendo bastante esses dias.
— "Vem acontecendo muito esses dias"? Vem acontecendo muito... E você está acostumada com isso?! Desde quando você se acostuma a esse tipo de coisa, mãe? A gente não deve se acostumar com coisas ruins. E por que diabos você não me disse nada, já que vem acontecendo com tanta frequência?
— É apenas sangramento nasal, Ethan, não precisa se preocupar.
— Meu pai sabe disso?
— Ele sabe, mas...
— E ele não fez nada? — Ethan sentiu a raiva subir.
— Ethan, por favor, não faça isso. Não trate seu pai como o culpado de tudo o que acontece, certo? E não fale nada quando ele chegar, não quero outra briga...
— Vocês brigaram?
— Foi apenas uma discussão hoje de manhã por algo que não concordamos, só isso.
— É por isso que seus olhos estão vermelhos? Ele te fez chorar? Ele fez alguma coisa com você...?
— Ethan! Não fale como se seu pai fosse abusivo! Você sabe que ele jamais faria algo assim! — sua mãe parecia realmente magoada — Já disse, foi só um sangramento nasal... É apenas a idade e não o fim do mundo.
— A idade? Mãe, você tem quarenta e dois anos, e sim, eu preciso me preocupar, afinal não foi você mesma que fez uma tempestade em copo d'Água quando eu desmaiei na escola?
Sua mãe abriu a boca para rebater, mas neste momento seu pai chegou e interrompeu a conversa fazendo Ethan agradecer pela primeira vez por sua presença. Ele estava tão elegante como sempre, sua presença era intimidante, como sempre e o deixou ainda mais inquieto... como sempre.
O garoto ainda não sabia qual era o problema, mas já tinha uma leve noção de que não eram nada boas as notícias que estavam por vir. Seu pai caminhou imponente para o lado do leito onde sua mãe estava descansando e pegou em sua mão, que era muito menor na frente da dele, parecendo muito preocupado e totalmente diferente a vista do que era. Era como se ele houvesse corrido até a sala, pois seus cabelos estavam levemente desalinhados e algumas gotículas de suor escorriam por sua testa, assim como suas bochechas coradas.
— Você está bem, querida? — Ethan franziu as sobrancelhas com a pergunta, afinal não havia ninguém ali na sala para que ele precisasse fingir ou atuar como "o bom marido".
— Vou ficar! — ela sorriu docemente, mas ele devolveu com uma carranca — Haha, essa carranca não combina com você, meu bem. — ela falou alisando a ruga que se formou entre as sobrancelhas do homem.
— Não é esse o problema e você sabe...!
— Okay, me desculpe.
— Fiquei realmente preocupado, você sabia? Por que não está tomando seus remédios direito, Dakota?
Ethan havia parado estagnado assistindo àquela cena mais que estranha como se assistisse a um vídeo, pois sentia-se muito de fora, totalmente distante, como se olhasse por uma tela. Nunca tinha ouvido seu pai falar ou agir tão preocupado daquele jeito com a esposa; seu tom de sempre era grosseiro e seco, mas ali, naquele momento, estava gentil e calmo, porém possuía um quê de nervosismo envolto em suas feições e palavras, assim como medo refletido em seus olhos.
O garoto se lembrava de já ter se questionado por muitas vezes o porquê de sua mãe ter casado com aquele homem, afinal seu pai raramente demonstrava sentimentos (bons) por eles. Talvez, em um passado distante, mas aquela não era mais sua realidade, há muito tempo aquele tipo de proximidade carinhosa não existia entre eles, porém ver aquela cena fazia cócegas em sua mente bagunçado-a e trazendo à tona a sombra de uma aconchegante e quente lembrança, era apenas uma sensação, menor que uma lembrança, mas tão boa quanto dolorosa.
Era como se Ethan estivesse em transe, se sentia extasiado de uma forma bem diferente, mas o sentimento que aquela cena lhe causou era tão bom que ultrapassava felicidade, afinal pela primeira vez em algum tempo pôde testificar com seus próprios olhos que, de fato, seu pai amava a esposa que tinha. O garoto só voltou a si quando sua mãe falou com ele.
— Bom, já que seu pai chegou, você não precisa mais ficar, Ethan, pode ir. Você precisa descansar.
— Não, eu quero ficar.
— Por favor, não fique com raiva meu bem, mas eu quero ficar um pouco a sós com seu pai.
— Ah, e-está bem, por que eu ficaria com raiva disso?
— Mais tarde eu voltarei para casa e então nós jantaremos juntos, certo? Como nos velhos tempos.
— Certo... eu acho!
Ethan falou sorrindo, mas por algum motivo seu coração continuava a se apertar de acordo com que ele se distanciava dela. Uma estranha sensação em seu ser, quase como se, em seu íntimo, ele soubesse que eles jamais seriam novamente "como nos velhos tempos". O garoto saiu para o corredor e deu de cara com o Sr. Monggomory, o novo sócio de seu pai, e logo ao seu lado o Dr. Luka, um antigo amigo de sua família. Os homens estavam conversando, mas quando o viram se calaram imediatamente. Ele se lembrava do doutor porque suas famílias sempre almoçavam juntas e sua esposa era muito amiga de sua mãe, mas o outro, ele reconhecia apenas por fotos, apesar de ter a sensação que já lhe vira antes.
— Olá Ethan, como vai? Como você cresceu. — Dr. Luka lhe cumprimentou formalmente.
— Bom... estou bem e o senhor?
— Estou bem... pelo menos, estou o melhor que posso nessas circunstâncias, não é? — ele falou triste — Ah é, esse aqui é o Sr. Monggomory, você já deve ter ouvido falar.
— Sim, é um prazer... senhor!
— Igualmente, Ethan! Você mudou bastante desde a última vez que lhe vi. — falou o homem estendendo a mão para que ele a apertasse, Ethan o encarou estreitando os olhos; tinha certeza que aquele homem lhe era familiar e agora confirmara tal fato com suas palavras, só não lembrava onde e quando haviam se encontrado e tão pouco perguntaria, afinal aquilo pouco importava no momento — A propósito, eu sinto muito.
— Sobre o quê exatamente você sente muito... senhor?
— Sobre... a sua mãe.
— Ah, tudo bem. Obrigado pela preocupação, mas não precisa, ela vai ficar bem logo, foi apenas um sangramento nasal. — os homens se entreolharam e desta vez quem tomou a palavra foi o Dr. Luka.
— Sim, mais um esse mês. Com esse já são quantos? Quatro?
— Espera um minuto... Quatro? Ela não me falou nada disso. Você é o doutor que está cuidando dela agora?
— Não, quero dizer, não totalmente. Desde que ela começou o tratamento eu venho acompanhando ela, porque somos próximos e minha esposa continua a me cobrar notícias, então estou sempre por dentro do quadro dela, mas não sou seu médico oficial, me chamaram recentemente para tentar descobrir o porquê dos sangramentos nasais, os resultados dos exames chegaram hoje, eu ia ligar pra ela, mas não precisou.
— E quais os resultados? E que tratamento é esse?
— Bom, graças a Deus parece ser apenas estresse, pelo menos os exames não acusam nada. Ela está um pouco anêmica, mas se tiver um bom descanso vai ficar tudo bem por enquanto, então não vamos nos preocupar mais que o necessário, e quanto ao tratamento... bom, eu sinto muito mesmo, Ethan, por você e por seu pai, mas não posso fazer mais do que isso. Me sinto realmente mal por Edmund... apesar de não demonstrar com frequência, ele ama muito a Dakota.
— Espera... por que vocês estão falando como se minha mãe...?! Que tratamento é esse que ela está fazendo, doutor?
— Você sabe... a... doença...!
— O quê...? Que doença?
O doutor arrumou a postura e ficou ainda mais sério do que já estava; seu semblante pesou e ele pareceu por um momento que iria chorar; Ethan estava começando a perceber que estava perdendo detalhes importantes.
— Então ela não te contou nada, hum?! — ele sacudiu a cabeça negativamente e suspirou — Bom, vou lhe contar do início...
— Por favor.
— Eu estava fazendo meu plantão como normalmente faço, então me chamaram para atender uma paciente especial, eu fui dar uma olhada em quem era... e era sua mãe, Ethan. Ela estava com sangramento nasal, exatamente como hoje, também com tontura e levemente desorientada, — o doutor franziu o cenho como se tentando se lembrar — ela por um momento não reconheceu seu pai, então eu pedi pra ela fazer alguns exames específicos e depois de alguns dias ela voltou com os resultados... Como você deve imaginar, eles não eram bons!
— Como assim?
— Ela não vai precisar dos meus cuidados, pois não é minha área, graças a Deus... pelo menos, não que saibamos, mas me chamaram para tentar descobrir o porquê dos sangramentos nasais, porém não precisa se preocupar, o Dr. Montway é um dos melhores nessa área e já combinou a forma de tratamento com ela e seu pai, mas, bom... irá apenas retardar a doença, não é mesmo? Então... eu sinto muito!
— Desculpe doutor, mas não sei do que exatamente você está falando. Quem é Dr. Montway e por que graças a Deus por não ser sua área? Qual é a sua especialização, afinal?
— O Dr. Montway é especializado em neurologia e eu, bom... você sabe, oncologia!
— Mas isso é...
— Sim, é câncer... eu sei!
— Mas você disse que não é a sua área e sim a desse tal Dr. Montway... então, o que isso quer dizer?
— Quer dizer que sua mãe... foi diagnosticada com uma doença no cérebro. — Ethan o encarou.
— Espera, espera um minuto... — a cabeça de Ethan não conseguia mais processar nada, apenas estava tudo muito bagunçado e surreal para entender qualquer coisa — Isso tudo está muito confuso...! E-E o que isso quer dizer?
— Isso quer dizer que sua mãe tem um problema grave no cérebro, Ethan. Para ser mais exato... ela foi diagnosticada com Alzheimer a mais ou menos um mês.
— Alzheimer? — sussurrou — M-Mas isso é...! M-Mas ela só tem quarenta e dois anos, é perfeita... ela não... isso não tem... não tem cura!
— Eu sei! Ao que tudo indica, a doença ainda está em seus estágios iniciais, mas... Eu sinto muito, Ethan!
— Sente muito? — riu debochado — Ao invés de estar aí sentindo muito, não devia estar procurando um método de ajudá-la?
— Temo que eu também não possa fazer muito, afinal não é minha especialidade, e como você disse, é uma doença que não tem cura. Os tratamentos retardam os sintomas e lhe dão um pouco mais de tempo de lucidez, mas no fim não tem cura. Eu sinto muito mesmo, mas tenho que ser realista com você, não acho certo lhe enganar. Sinto muito você ficar sabendo por mim, acredito que Dakota não lhe contou para não lhe preocupar, ela te ama muito; espero que você saiba disso. — Ethan odiava aquele sentimento de perda; os dois homens lhe olhavam com pena, como se ele fosse um pobre coitado, o que, de alguma forma, sentia que sempre fora e aquilo lhe irritava muito; ele odiava aquele olhar, não queria a pena de ninguém — Bom, até logo, Ethan.
— Quanto... — ele tentou falar, mas sua voz lhe traiu e falhou no meio da frase.
— Como?
— Quanto tempo faz? — sua voz saiu como um sussurro.
— Bom, acredito que tenha sido no final do ano passado que os sintomas começaram a aparecer, mas o resultado dos exames só saíram tem um mês. — Ethan engoliu em seco contraindo os músculos e fechando as mãos em punhos ao ouvir a resposta.
Tanto tempo assim? Sua mãe vinha escondendo aquilo dele há tanto tempo assim? Algo tão importante? Ele sentia uma massa quente de raiva e melancolia tomar conta de si queimando seu peito, a cada passo dado por aquele corredor, a sentia crescer fervendo e o fazendo ranger os dentes, andou até parar em frente ao quarto dela pronto para fazer um escândalo, porém a cena que encontrou lhe fez repensar e retroceder com seu plano.
Sua mãe tinha lágrimas nos olhos e tinha uma das mãos no rosto de seu pai e este também estava em lágrimas; havia tanta dor naqueles olhos sempre tão frios, que pela primeira vez, Ethan sentiu a sua dor, ele entendeu que o grande Sr. Fitzgerald, imponente e perfeito, também era um ser humano. Ele era um homem e assim como todos os outros antes dele, tinha caído nos encantos de uma mulher, como acontecia desde a antiguidade, onde até os mais cruéis reis amoleciam perante a sua amada, e seu pai acabara de provar que amava a mulher ali a sua frente e que a perspectiva de perdê-la o fazia perder sua pose de pessoa perfeita que ele cultivava com tanto afinco.
O medo de perdê-la era maior que a importância de sua imagem pública e tal medo refletia em seus olhos, o fazendo humano. A perspectiva de perder a sua companheira o fazia sentir a dor que todos os seres humanos normalmente sentem e talvez, só talvez, aquilo tivesse derretido um pouco daquele gelo todo. Assim como ele mesmo e sua mãe, Ethan viu pela primeira vez seu pai parecer frágil e entendeu o quanto ele a amava. Naquele momento sabia que podia contar com ele. Não, na verdade só podia contar com seu pai e mesmo que este não o ouvisse, talvez pudesse senti-lo, então sussurrou com a boca tão seca que quase chegava a doer:
"Pai... eu não quero perdê-la!"
Ele não conseguiu mais falar nem pensar, sua garganta ardia tanto que parecia ter sido tampada, saiu do hospital tão rápido que nem sabia como tinha chegado à rua cheia de carros, repleta de pessoas que estavam alheias à sua situação. Não havia nem um pedestre a não ser ele, a chuva que caía era forte o suficiente para lhe encharcar depois de apenas alguns minutos de pé lá fora; não sabia o que fazer então foi até a parada de ônibus mais próxima e subiu em um transporte qualquer, que estava parado lá, algumas paradas depois desceu, era um bairro nobre, e até então, desconhecido para ele.
Começou a caminhar sem saber onde exatamente estava indo, se sentindo ridiculamente miserável e digno da pena que tinha recebido mais cedo. Seu celular — que muito provavelmente havia parado de funcionar por conta da chuva que tinha lhe molhado — havia tocado alguns minutos antes com uma mensagem de Willian, lhe convidando a ir até sua casa e lhe dizendo seu endereço. Acabou que o garoto tinha voltado para a casa mesmo assim. Pelo menos os dele voltariam após a viagem, mas e sua mãe, voltaria? Se sim, por quanto tempo?
Enquanto andava, Ethan tentava desesperadamente segurar as lágrimas, mas no fim elas acabaram caindo de qualquer jeito. Ele se lembrou de sua mãe, de como ele nunca a tinha visto daquela forma tão debilitada antes, buscou então uma imagem dela normal, como sempre havia sido, feliz e sempre sorrindo; pensou tanto naquilo que sua cabeça começou a doer. Era como se seu cérebro quisesse gravar aquela imagem para sempre, até que sua visão embaçou e ele sentiu suas pernas fraquejarem. Naquele momento, ele não sabia o porquê, mas sentiu uma vontade quase insana de estar novamente nos braços de Willian.
Quando percebeu, Ethan andava sem rumo por ruas desertas e molhadas que ele não conhecia bem, suas lágrimas se misturando a água da chuva, que molhava sua roupa. Continuou vagando por algum tempo, vez por outra olhando para as plaquinhas com o nome das ruas para se guiar e por fim sentou-se em um banco de praça com o olhar perdido e chorou, chorou tranquila e silenciosamente, que mesmo se passasse alguém, não notaria que ele estava chorando, em parte por causa da chuva. Ethan nunca tinha ficado tão agradecido pela chuva como estava naquele momento.
Já estava escurecendo quando voltou a se levantar e resolveu ir para casa, se sentia tão vazio por dentro que nem sabia mais se estava chorando ou não, se estava realmente triste ou não, se sentia alguma coisa ou não e para piorar sua situação, seus pensamentos não paravam de voltar para Willian, aquele maldito garoto que tinha lhe feito se submeter a coisas tão baixas e desprezíveis, que fez seu corpo ir ao limite, que fez seu desejo pelo abraço de um homem renascer ainda mais forte e desenfreado que antes. Nem era gay, então por que sentia que precisava tanto daquele bastardo? Por que sentia que as mulheres não eram sequer consideráveis? Por que não conseguia mais transar casualmente com uma garota qualquer, desde que o vira?
Seguiu pensando em Willian durante todo o percurso que fez e antes que se desse conta estava apertando a campainha de uma grande casa em tons pastéis e de aparência senhorial e antiga, com portas de madeira escura, talhada com perfeição e uma placa de aço com os dizeres: "Residência dos Monggomory" gravado nela; o garoto franziu as sobrancelhas lembrando de repente do sócio do pai. O homem tinha o mesmo sobrenome que Willian, o que era engraçado.
Ele ouviu passos do lado de dentro da casa após tocar a campainha por algumas vezes e logo em seguida uma voz perguntando quem era. Sem obter resposta o garoto alto, de cabelos negros, olhos verdes e dourados, que mudavam como um caleidoscópio, e abdômen esculpidamente malhado à mostra apareceu em uma fresta da porta entreaberta.
Ethan não conseguiu vê-lo completamente, mas notou que ele vestia apenas uma calça de moletom cinza e tinha uma toalha em volta do pescoço, tinha o cabelo ainda úmido e estava descalço; aquilo lhe fez engolir em seco, já sentindo suas bases de segurança aumentarem. Assim que lhe olhou, a expressão de Willian se transformou de tranquila e relaxada para preocupada e tensa, o que lhe fez desejar correr dali o mais rápido que conseguia, porém seus pés pareciam colados ao chão.
Ao olhar para a expressão do garoto, Ethan se sentiu extremamente arrependido de ter ido até ali, odiava fazer com que as pessoas com quem ele se importava se sentissem daquele jeito, fazia doer ainda mais o seu coração já em frangalhos, mas precisava daquele calor, precisava estar dentro daqueles braços fortes e imponentes, que lhe protegiam com tanto cuidado, como se, de fato, ele fosse algo precioso. Só precisava sentir que não estava sozinho, que era necessário para alguém, que era importante, exatamente como na noite anterior.
Ainda de cabeça baixa, tentou falar, mas não saiu nada a não ser soluços, ele se sentia tão cansado que achava que iria desmaiar a qualquer momento, se sentia ridículo, devia estar parecendo digno de pena. Seu orgulho já não tinha sido ferido o bastante? Já não tinha sido pisado o suficiente por Willian? Ele já não tinha passado por coisas demais naquele dia? Precisava mesmo ser tão fraco na frente do garoto?
Respirando fundo, ele criou coragem e o olhou parado a sua frente, o garoto estava lhe encarando como se fosse a primeira vez que o via e isso lhe fez esquecer, pelo menos momentaneamente, seus problemas. Willian abriu a porta por completo, com seus olhos ainda fixos nele, tirou a toalha de si e colocou ao redor de seus ombros segurando-lhe pelo pulso e o puxando delicadamente para dentro, o envolvendo em seus longos e fortes braços, sem questionamentos, sem julgamentos e sem hesitação, abraçando-o.
— Não se preocupe, Ethan, Vai ficar tudo bem.
Ao ouvir aquela voz grave, porém que se mantinha tão suave ao falar com ele, por um momento Ethan esqueceu o peso que estava carregando em suas costas e desistiu de tentar, sentindo todo o seu frágil autocontrole, que ele tentava tão desesperadamente manter de pé até aquele momento, finalmente desmoronar e os soluços abrirem caminho rasgando sua garganta com força total.
~ C O N T I N U A ~
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