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História É Errado Te Amar? (em revisão) - O Doloroso Paradoxo do Amor


Escrita por: Akisa-sann

Capítulo 30 - O Doloroso Paradoxo do Amor


04:38 da manhã, Domingo

O silêncio absoluto que tomava o quarto não era em nada reconfortante, porém também não era de todo ruim, era apenas silencioso e vazio. A quentura que Willian passava, apesar de reconfortante, também era, de certa forma, fria, pois fazia o desolamento e a realidade se tornarem muito mais nítidos e plausíveis. O cheiro agora familiar de seu corpo inundava a cama, os lençóis e os travesseiros contaminando o ar como veneno mortal, e Ethan se encontrava sentado na cama ao seu lado o encarando com atenção enquanto era lentamente intoxicado por aquele cheiro pungente no ar, o observando em seu sono, percebendo o quão bonito ele era. Dolorosamente bonito.

O garoto parecia tão singelo e calmo, tão inalcançável. Sua respiração pesada fazia cócegas em suas coxas, pois seu rosto estava perigosamente perto de suas pernas. Aquele pensamento fez um arrepio subir por sua coluna. Os lábios de Willian eram realmente rubros e macios, lhe convidando a saboreá-los, seus longos cílios tremeram levemente quando ele suspirou em seu sono, talvez por estar sonhando com algo. Ethan podia ver seu peito subir e descer com a respiração pausada de seu sono, a pinta que o garoto tinha no pescoço, a qual ele achava tão charmosa, estava à mostra e suas clavículas eram visíveis, o que ele achava muito atrativo.

Ethan podia notar que apesar dos músculos o garoto era esbelto, com traços sofisticados e músculos cuidadosamente trabalhados; já havia percebido aquilo antes, mas nunca tivera realmente a oportunidade de observá-lo com detalhes e de tão perto enquanto ele estava com a guarda tão baixa. Notou que os cabelos dele estavam maiores do que quando o tinha visto pela primeira vez no colégio. Por esse motivo agora viviam desgrenhados, lhe dando um ar merecidamente rebelde que parecia fazer muito mais jus a ele do que os fios curtos e arrumadinhos. O garoto também parecia diferente, de alguma forma. Sua aura parecia mais distinta, talvez porque agora já o conhecia melhor. Ele já não parecia mais o garoto certinho que conhecera e também já não era assim tão misterioso como aparentava ser no início.

Com o passar das horas, os primeiros raios de sol começaram a entrar pelas brechas da cortina deixando o quarto com sombras, dando a Ethan o lembrete de que finalmente amanhecera. O garoto então se levantou com cuidado para não acordar Willian e saiu da cama lentamente pegando a primeira roupa que viu, que se encontrava jogada em um canto do quarto escuro, próxima as malas. Willian não se moveu um centímetro. Honestamente, Ethan não pensou muito no frio da manhã, apenas saiu do quarto em seus jeans simples, blusa de manga longa e chinelos, descendo as escadas cauteloso enquanto pensava em como chegar até a cozinha e roubar alguma coisa da geladeira sem ser flagrado. Sua barriga roncava loucamente, tanto que era difícil se concentrar em mais alguma coisa que não fosse comida.

Ethan se aproximou do cômodo iluminado pela luz matinal sem muita cerimônia, afinal não achou que teria alguém de pé tão cedo, e por esse motivo se assustou ao se deparar com um par de íris verdes muito intensas lhe encarando de não muito longe. A pessoa estava sentada em uma das cadeiras da mesa tranquilamente comendo algumas torradas. Ethan engoliu em seco encarando o Sr. Clifford, que comia confortavelmente enquanto, ao seu lado, um pequeno rádio tocava música clássica baixinho.

O garoto paralisou onde estava, sem saber o que fazer, e sua boca secou ainda mais quando o homem lhe lançou um olhar penetrante, como se o convidando a se aproximar, mas com a leve ameaça inclusa de que era melhor se aproximar, e Ethan não conseguiu o ignorar, saindo de seu transe e caminhando como se pisasse em vidros até estar ao lado do homem, tenso como uma estaca fincada ao chão. O homem porém parecia muito à vontade e até levemente divertido com sua reação de óbvio nervosismo.

— S-Senhor... n-não achei que já tivesse alguém acordado a essa hora.

— Não consegui dormir... — fez uma breve pausa onde limpou a garganta, sua voz soava rouca, cansada. — Às vezes é difícil ignorar a dor.

— Ah, sinto muito! — Ethan realmente não sabia como agir naquele tipo de situação, então não conseguiu pensar em nada melhor para dizer a não ser "sinto muito". 

— Não se desculpe, não é sua culpa. Mas agora, por que está de pé tão cedo, Sr. Fitzgerald? Vocês ainda não têm mais um dia e uma noite aqui? Você devia dormir um pouco mais.

— Sim, é… Tem razão, eu só… — Ethan ficou desconcertado, afinal não era nem mesmo sete da manhã ainda, e ele não podia simplesmente dizer que estava tentando roubar comida.

— Algo lhe incomoda?

— Não... não exatamente! — Os olhos do homem brilharam como se não pudesse esconder nada daquelas íris, então ele prosseguiu — Não sei se devo lhe incomodar com isso, senhor. Você já tem seus próprios problemas para se preocupar.

— Está tudo bem, afinal é sobre o Willian, não é?

— S-Sim... eu acho. — o fato do homem saber sobre o que se tratava lhe deixava ainda mais nervoso, pelo que Ethan via, não se conseguia esconder muito dele.

— Não posso fingir que não sei qual o motivo, não pude deixar de ouvir a... Briga de vocês antes, e o entendo. Willian e Matthew... Bom, eles têm um passado um tanto conturbado. Não posso dizer que é uma relação amigável a que aqueles dois compartilham.

— Sim eu entendi isso — então ele tinha ouvido? O quê exatamente ele os ouvira? Sentiu-se corar com aquele pensamento, esperava não ter sido muito barulhento na noite anterior —, mas não consigo evitar me sentir curioso sobre tudo isso e ele não me diz nada. Não sei porque ele não pode confiar em mim. Ele simplesmente disse que não é problema meu, mas quer que eu confie nele cegamente. — Ethan sentia a raiva voltando.

— Não é em você que ele não confia, Sr. Fitzgerald... — o homem olhou pela janela parecendo pensativo — Matthew já deu mais de uma razão para que o Willian desconfiasse dele, e ele sempre foi assim. Matthew tomou tudo o que conseguiu tomar dele. — Com isso o Sr. Clifford lhe lançou um olhar bastante significativo lhe fazendo corar — Willian é assim com quem se preocupa, principalmente se tratando do Matthew, e eu sei que você é alguém especial para ele, caso contrário ele não teria lhe trazido até aqui.

— Sim, mas ele acha que eu sou assim tão indigno de confiança ao ponto de…? Ele nem mesmo me deixou explicar, estava tão irritado e eu nem sei o porquê. Além do mais, quando o perguntei se ele podia me garantir que… Não se arrependeria de nada, ele não conseguiu me dar uma resposta. — o homem sacudiu a cabeça negativamente como se o repreendesse e aquilo o fez sentir ainda pior.

— Você o magoou quando foi até o Matthew, sr. Fitzgerald.

— Mas eu não fui atrás do Matthew, sequer o começo. Por que é tão difícil acreditar em mim?

— O Willian confia em você, Sr. Fitzgerald, em quem ele não confia, é no irmão. — o homem fez questão de enfatizar que quem confiava nele era apenas Willian, ninguém mais — Você não pode simplesmente ignorar isso, criança, tente se pôr no lugar dele. Você confiaria em alguém que traiu sua confiança bem mais de uma vez, da pior forma possível? — Ethan sentiu que realmente não sabia de pontos cruciais na história entre aqueles irmãos, pois mesmo que não parecesse, Matthew parecia mesmo ter feito escolhas bem ruins no passado, ao ponto de até mesmo seu avô tratá-lo com desprezo.

— Eu entendo isso, senhor, mas o fato de ele me igualar a essas pessoas, como se eu fosse traí-lo como os outros fizeram... Me irrita muito. — não conseguiu se parar e depois sentiu o rosto esquentar. Tinha praticamente admitido para o avô do garoto que realmente estavam em um relacionamento.

— Sim, eu já notei... — ele desligou o rádio e se virou para ficar de frente para Ethan.

— Além do mais, como eu já disse, não era minha intenção ir de encontro com o Matthew. Como eu poderia saber que ele mora ali? De qualquer forma, eu só fui parar ali porque… — sua voz falhou, não podia dizer mais nada para o homem.

— O Matthew não é bem-vindo aqui. Ele não tem mais nada a ver com essa família. — Ethan se impressionou com o tom duro no homem que ele julgara ser sempre gentil — Tenho que lhe falar algo, criança. — o homem ficou sério de repente — Eu sei que meu neto gosta de você e sei que você sabe disso; também sei que a forma que ele gosta de você é da forma romântica e acredito que você também saiba disso, e não posso dizer que gosto disso, mas também não posso impedi-lo, se é isto que o faz feliz. Claro que tem os pais dele também, pois eu sei que eles jamais aceitariam esse tipo de relação, afinal esse caminho é um tanto difícil de se percorrer, ainda mais quando se tem um nome a zelar, e tenho certeza que seu pai tem uma opinião sobre isso também, mas não estou aqui para dizer o que é certo ou errado, Sr. Fitzgerald, pois não cabe a mim decidir isso, quem sou eu para julgá-los, não é mesmo? Sei muito bem que não mandamos no nosso coração, mas às vezes apenas amor não é suficiente e precisamos tomar decisões dolorosas, porque é isto que a vida adulta é.

Ao dizer aquilo Ethan notou que o Sr. Monggomory ficou com o olhar um tanto mais frio e o garoto entendeu a mensagem. Ele estava claramente o mandando deixar seu neto em paz. As palavras do homem começavam a girar em sua cabeça e pesar em seus ombros como um casaco de chumbo, aquilo lhe fez sentir vontade de sair correndo dali, sentiu seus olhos arderem e engoliu a força o choro que se formava em sua garganta como se fosse pedacinhos de vidro triturado.

— O Willian passou por muita coisa, ele merece todo o sucesso que ele pode ter. Ele é uma criança maravilhosa e compreensiva, mesmo quando algo injusto acontece ou quando alguém o machuca, ele nunca demonstra, ainda que realmente se magoe. Raramente demonstra qualquer fraqueza, ele prefere sofrer em silêncio e longe de onde as pessoas possam ver, talvez seja uma forma de se proteger, talvez seja por orgulho, não sei, mas sei que isso o tornou mais forte. Ele é bom demais para sofrer por algo que não dará frutos, não acha? Não os impedirei de aproveitarem a juventude, mas não os encorajarei a ir adiante com uma relação fadada ao fracasso.

— Eu não estou entendendo onde você quer chegar, senhor. — a visão de Ethan começava a embaçar, tudo o que queria era sair dali ou sentia que podia morrer sufocado. — Por favor, seja direto comigo e vá direto ao ponto.

— Eu não disse nada no início porque não achei que era a hora certa, mas meu neto não é livre para viver da forma como deseja, ele tem a responsabilidade enorme de carregar o nome da família nas costas. Você entende não é? O Willian não pode ter fraquezas ou defeitos se ele quiser sobreviver nesse mundo e você, Sr. Fitzgerald, é uma enorme rachadura na armadura dele.

— E-Eu entendo a sua preocupação, senhor… Mas ele não é o único que tem coisas a perder.

— É mesmo? — os olhos do homem cintilaram perigosamente fazendo a garganta do garoto secar ainda mais — Willian era uma criança alegre e perfeita, ele vivia exatamente do jeito que devia viver... E então, de repente, ele parou de me visitar e agora quando finalmente volta é isto que eu encontro. Um garoto cheio de dúvidas, irritado e ansioso, e certamente você sabe que a culpa desse comportamento dele é sua, não sabe? Ele sequer conhece o mundo real, não permitirei que algo o machuque antes mesmo dele sair do ovo. Você perguntou se ele está preparado para perder o que ele tem por você, mas e você Sr. Fitzgerald, o que está disposto a abrir mão por ele?

Ethan queria fugir dali, não queria ouvir mais nada, odiava o jeito como o homem falava dele como se fosse a pior coisa que já tinha acontecido na vida do neto, uma doença perigosa. Era verdade que Willian era incrível, mas isso o tornava indigno do amor dele? Ethan encarava o homem sentindo seus olhos arderem, as palavras o acertavam como um tapa na cara. Doía entender o que o homem estava lhe pedindo

— Meu neto é alguém muito precioso e merece alguém a altura, que o faça sorrir quando ele precisar, alguém que tenha a força de segui-lo onde ele for e acompanhá-lo em seu ritmo, e que aguente ficar ao seu lado nesse processo tão doloroso que é confiar de verdade em alguém e se arriscar a amar novamente sem ser traído. Alguém que o ensine a confiar novamente, que não o faça chorar, mas que se o fizer, também o console. Alguém que o aceite com tudo o que ele é, que o ajude a crescer, que possa o desculpar mesmo quando ele errar, mas que dê broca nele para que não erre novamente, que o ame incondicionalmente, pois é assim que ele vai amá-lo, afinal quando o Willian se apega a alguém, ele é a pessoa mais fiel do mundo, e talvez isso também seja uma fraqueza.

A esse ponto Ethan já sentia que sua mente havia escapado de sua cabeça e pendia frouxamente como um balão amarrado ao lado de seu corpo, meio seco, mas lutando para se manter flutuando e acompanhando seus pensamentos. A primeira lágrima caiu dos olhos do garoto, mas ele a enxugou violentamente, porém aquilo não pareceu incomodar o homem, que prosseguiu falando como se nada mais lhe impressionasse. Ethan já tinha percebido, mas ainda se surpreendeu por estar chorando tanto, aquilo doía horrivelmente, ele só não sabia onde. O Sr. Clifford sorriu docemente como se tivessem acabado de ter uma conversa simples e trivial e não uma cruel e avassaladora, então ligou o rádio novamente em uma sinfonia de Mozart e tornou a falar:

— Se você está atrás de um lanche, pode se servir.

Ethan o olhou aturdido por uns bons quinze segundos piscando para limpar a visão embaçada de lágrimas antes de se levantar e caminhar roboticamente até a geladeira enxugando o rosto com as costas das mãos. A abriu e pegou qualquer coisa que viu e começou a comer, mas não sentia realmente o gosto, pois sua boca estava muito seca para que ele pudesse degustar algo. Ao voltar à mesa o homem já havia sumido silenciosamente, como se jamais tivesse estado ali, porém suas palavras permaneciam no ar, lhe perfurando como facas.

Não sabia que as palavras "deixe-o ir" vindas de outra pessoa o machucaria tanto. As lágrimas não paravam, ele tentava enxugá-las, mas só conseguia molhar o rosto ainda mais, pois elas se negavam a parar. Ele queria desesperadamente sair dali e ficar sozinho para tentar pensar um pouco. Seu coração estava na garganta quando voltou para o quarto, Willian, porém, continuava dormindo tranquilamente sem se dar conta do que se passava em sua cabeça. Ao vê-lo ali parecia que as palavras do homem ficavam ainda mais altas em sua mente, ecoando e lhe dando náuseas. Sem saber o que mais poderia fazer ou como encarar o garoto quando ele acordasse, fez a única coisa que sabia fazer de melhor. Fugiu. Pegou sua mala e seu casaco olhando uma última vez para o garoto adormecido a apenas alguns metros de distância, e com a boca salgada das lágrimas sussurrou: “Me desculpe”. E então desceu rapidamente a escada, que agora parecia grande demais, íngreme demais e traiçoeira demais; saiu pela porta dos fundos olhando vez ou outra para os lados e para trás para não ter o perigo de ver o senhor sentado na sala.

Ethan não conseguia entender como alguém podia falar tudo aquilo com um rosto tão sereno. Ele estava com o espírito tão conturbado e a mente tão disperça que não sabia mais sequer o que estava fazendo, apenas caminhou para o lugar que achou mais seguro, que por acaso era o mais longe possível daquela casa e em seu desespero acabou por esbarrar em um Matthew muito surpreso, que deixou cair uma caixa de papelão das mãos com um ruído de coisas quebrando e um palavrão bem rude, lhe lançando um olhar fulminante, porém ao perceber quem era, seu rosto suavizou.

Ethan queria dizer que estava bem, mas trombar com alguém tão maior e muito mais pesado, foi quase fatal. Ele se chocou com as largas costas do garoto, cambaleou para trás e se desequilibrou caindo sentado na grama que cobria o chão, tentou se apoiar com as mãos para suavizar a queda, mais acabou machucando o pulso com o impacto e arfou em surpresa com a dor latejante que se espalhou naquela região.

O garoto sentiu as lágrimas embaçarem sua visão e seu rosto esquentou com a vergonha de parecer tão patético na frente de Matthew. Talvez também por ter se lembrado que na noite anterior havia desmaiado nos braços do garoto, e o beijado, e deixado que ele lhe tocasse de forma tão íntima. Ethan engoliu em seco mandando aqueles pensamentos para longe, então baixou a cabeça para que o garoto não o visse chorando e segurou o pulso machucado com a outra mão se mantendo encolhido como se pudesse se fundir com o chão, mas claro que não funcionou.

Matthew lhe observou por um momento e então se ajoelhou a sua frente inclinando a cabeça tentando olhar para seu rosto, que estava parcialmente coberto por uma cortina de cabelos ruivos. O garoto lhe segurou pelo pulso, que felizmente não era o machucado, e afastou seus cabelos com um longo dedo pondo-os atrás da orelha, após um segundo suspirou e lhe puxou para cima pela cintura, lhe obrigando a se erguer. Sua mala/mochila havia caído no chão aos pés do garoto, o que deixava meio óbvio que ele estava tentado fugir, e ao ver o olhar acusador e a sobrancelha erguida a sua frente, sentiu-se corar.

— Bom dia, também! — falou sarcástico — A propósito, obrigado por, muito provavelmente, ter quebrado meus porta-retratos. Mas e então... — falou quando Ethan se afastou batendo o pó da roupa — Está indo a algum lugar tão cedo?

— Isso não é da sua conta, e o que você faz acordado "tão cedo"?

— Certo, eu vou fingir que não ouvi essa resposta super grosseira e perguntar o mesmo.

— E-Eu só... eu não...!

— Huum... não gosto quando as pessoas são indecisas. — falou apertando a mandíbula — O que foi dessa vez? Está em um mau dia novamente? Desde que eu te conheci não vejo você ter um único dia bom…

— Isso é porque você me conheceu há apenas dois dias... — Ethan ia acrescentar: E é por sua causa que eu estou tendo dias tão ruins. Mas não achou justo fazê-lo.

— Então quer dizer que você não é um garoto melancólico que fica desmaiando pelos cantos e chorando sentado no chão sempre?

— Eu não desmaiei! E não estou chorando. — falou indignado e fungou uma vez para impedir que o nariz escorresse, o que só lhe fazia ainda mais patético. Viu um sorriso se formar nos lábios de Matthew e por algum motivo, não se sentiu tão ruim por estar chorando na sua frente.

— Então, você precisa de um ombro amigo para chorar? — ele deu um passo a frente.

— Já disse que não estou chorando, e não vejo nem um amigo por aqui. — Ethan se afastou cauteloso.

— Poxa, assim você me magoa. Então, prefere uma carona?

— Não, obrigado! — falou imediatamente sem pensar muito na proposta.

— Então, pretende escapar… Quero dizer, ir embora, como? — sorriu triunfante fazendo Ethan se sentir nervoso por perceber que aquela era a sua única opção para sair dali — Relaxa, eu não mordo… com frequência.

— Ha ha ha, você é tão engraçado! — respondeu irritado — Escuta, eu não vou perder meu tempo com você novamente, você é sinônimo de problema.

— Pelo menos eu te fiz rir, hum? Isso é bem melhor do que um certo alguém, que até agora, pelo que eu vi, só te faz chorar. Acho que mereço uma recompensa por isso, hum? Que tal outro beijo?

— Você não sabe diferenciar uma risada sincera de sarcasmo? Tem muito o que aprender na vida, em garoto?

Matthew sorriu jovialmente lhe lançando uma piscadela e Ethan se segurou para não entrar na onda dele e sorrir também. Ali, iluminado pelos primeiros raios de sol, ele podia ver o quanto o garoto era bonito com seus sedosos cabelos, negros como carvão esvoaçando com a brisa fria da manhã, enfatizando a palidez de sua pele e a pinta escura abaixo de sua boca, o que era bastante sensual, Ethan percebeu.

A iluminação forte da manhã passava por entre os fios de cabelo dando a impressão de que eles ondulavam como petróleo, seus olhos pareciam absorver a luz amarela se tornando ainda mais dourados, quase brilhando por conta própria. Ethan ali percebeu que nunca havia visto o garoto com clareza, pois sempre que se encontravam era rapidamente e sempre durante a noite, na penumbra dos lugares, então vê-lo ali nitidamente sob o glorioso céu azul cegante do amanhecer lhe fazia parecer quase encantador e muito diferente da imagem que o irmão pintou para ele. Matthew parecia ainda mais inalcançável que Willian sob os tentáculos de luz solar que lhes banhavam, com seus cabelos negros e olhos incrivelmente âmbar, sem nem um indício do verde que manchava o dourado das íris do irmão, ele parecia uma pintura a óleo dos anjos rebeldes que gravadam belamente as telas da pequena galeria privada de sua mãe. Com o negro e o dourado perfeitamente balanceado, ele era a tênue linha que separava o belo do trágico.

— Hunf... — bufou divertido puxando-o de volta ao presente — Então, quer ou não quer a carona? Porque não vai achar metrô ou paradas de ônibus por aqui, e muito menos táxi... E eu estou indo naquela direção, posso te deixar no colégio se você quiser, ou na sua casa, se preferir.

Ethan não achava sensato dizer seu endereço àquele garoto, então hesitou por um momento em sua resposta e o garoto sorriu divertido percebendo seu receio em aceitar a oferta. Naquele momento Matthew parecia bem mais jovem do que na outra noite, onde parecera melancólico e muito mais maduro que um garoto de vinte anos no auge de sua juventude. Também estava muito mais atraente aos olhos de Ethan naquele momento, já que ele não havia reparado ainda o quão belo o garoto era em suas roupas completamente pretas, com a blusa gola alta e manga longa colada ao corpo, mostrando um torço esbelto e com músculos firmes como o de seu irmão, apesar de um pouco maior.

Seu casaco pendia de um de seus braços, dobrado cuidadosamente junto a calça slim, que se adequava perfeitamente a suas pernas longas, lhe dando a impressão de ser ainda mais alto e longo. Ele ergueu uma sobrancelha e então virou o rosto em direção ao portão fazendo seus cabelos voarem por seu rosto; eles eram bem mais compridos que os de Willian e cobriam-lhe o pescoço emoldurando seu rosto em uma espécie muito sútil de Mullet, caindo por sua testa e olhos em ondas leves 

— Eu... — Ethan olhou para a estrada de terra por onde eles tinham vindo, não tinha nem um sinal de vida por perto — Tá bom, mas sem gracinhas.

— Eu prometo! — ele cruzou os dedos rindo.

Matthew piscou para ele e com duas passadas rápidas passou ao seu lado lhe assustando, então pegou sua mala do chão, a sacudiu e caminhou até um Jaguar vermelho que estava em um canto mais afastado perto do barracão, o que não combinava muito com aquele cenário, afinal era um carro um tanto... Atual demais para o cenário rural à sua volta. Ethan o seguiu ainda se sentindo relutante, mas pegou sua bolsa dos ombros de Matthew e entrou no carro, acomodando-se. Antes que pudesse pensar em qualquer coisa, porém, sentiu a quentura do corpo do garoto sobre o seu, sua respiração batendo em seu pescoço quando ele se inclinou e pegou o cinto de segurança, travando-o e lhe prendendo no banco, talvez para se certificar de que não mudasse de ideia e fugisse dali.

Ethan sentiu seu coração dar um salto mortal em seu peito e um arrepio subir por sua pele ao sentir o cheiro do garoto, nem sequer conseguira empurrá-lo ou dizer algo de tão surpreso que ficara. O cheiro de Matthew era um cheiro totalmente diferente do de Willian, mas ainda assim lhe agitou em seu lugar de uma forma que ele não se orgulhava. Mesmo sabendo que aquele não era o corpo de Willian, não era o cheiro de Willian, não era o seu Willian, não conseguiu evitar que seu olhar fosse de encontro ao pescoço do garoto até chegar a suas clavículas definidas e ao sinal em seu queixo, bem abaixo de seus lábios, que estavam úmidos.

Ethan sabia muito bem que, mesmo com as semelhanças, Matthew não era e jamais seria Willian, agora que já estava mais acostumado com ambos os garotos, já podia dizer sem dificuldades quem era quem, afinal não era como se fossem gêmeos, porém na outra noite mesmo quando percebeu que não era Willian que o beijava, não se sentiu tão mal como deveria e ali estava ele se sentindo terrivelmente nervoso por estar ao lado de Matthew em um lugar tão pequeno e impossível de fugir. Afinal qual era o seu problema com aquela família? Não era que gostasse daquela pessoa, sequer o conhecia, mas não podia mentir dizendo que ele não o atraía, porque ele atrairia qualquer um, homem ou mulher. Matthew era simplesmente muito bonito, seu charme era indescritível assim como seu carisma.

Antes que pudesse pensar em uma resposta para sua própria pergunta, o garoto se afastou se acomodando em seu próprio banco e ligando o carro. Só então Ethan percebeu que estava prendendo o fôlego e que seu coração saltitava como um bode montanhês dentro de seu peito, só não sabia se aquilo era ruim ou não. Assim que eles partiram percebeu que o tempo estava começando a ficar fechado e cinza, a paisagem daquele lugar era realmente bonita, o verde contrastava muito com o cinza que começava a se espalhar tomando conta do céu e os raios do sol que atravessavam as nuvens densas. Ethan não queria que o garoto lhe levasse até o colégio e muito menos até sua casa, então pediu para lhe deixar na estação de metrô mais próxima, ele ainda insistiu um pouco, mas depois acabou simplesmente cedendo.

Matthew ainda se parecia muito com seu irmão em vários aspectos, o que era assombroso. Ethan se sentia meio desconfortável sozinho no carro com ele, principalmente depois da forma tosca como seu corpo reagiu a proximidade com o garoto e do quão consciente estava em sua atração por aquela pessoa, pois não podia mentir dizendo que ele não o atraía também. Porém, não podia simplesmente pedir que o garoto voltasse, não quando já haviam ido tão longe, voltar só ia ser mais constrangedor e também não podia simplesmente descer do carro no meio do nada.

Fora que seus pensamentos não lhe deixavam em paz nem por um segundo, continuando a repetir o que o Sr. Clifford lhe disse como um disco quebrado e também as palavras de seu pai, que agora pareciam muito assustadoras, já que nunca vira o homem com medo de algo antes. Vê-lo de uma forma tão fragilizada era quase tão assustador quando ter que abrir mão de Willian e agora que estava voltando, essa realidade era muito mais real. Tinha ainda os pensamentos sobre sua mãe, que lhe atormentavam como vermes em sua carne, lhe corroendo aos poucos, lentamente, lhe torturando.

O celular de Ethan não tinha rede, já que era um local meio afastado da cidade, e não tinha avisado a mãe que viajaria, então talvez ela estivesse preocupada, ou simplesmente achasse que ele estava no colégio, talvez nem se lembrasse mais dele. Aquele pensamento lhe fez sentir um gosto amargo na boca, então ele resolveu parar de pensar naquilo. O garoto sabia que seus pais haviam viajado, pois sempre o faziam naquela época do ano, iam para a casa no lago que seu pai tinha ganhado de presente do pai quando completara 18 anos, mas talvez nem tivessem ido, por causa da situação de sua mãe, porém tudo o que conseguia pensar era no quanto queria vê-la. Agora que tinha parado para pensar, sentia-se extremamente culpado após pensar em seu último encontro com o pai.

Ele suspirou olhando a janela embaçar com as gotas de chuva que tinham começado a cair, já estavam em uma avenida, pois o movimento de carros tinha aumentado significativamente e a estrada já não era mais de terra. Sem querer seus pensamentos divagaram de volta para Willian, seu avô, a conversa que haviam tido e em como aquilo estava lhe incomodando muito mais do que devia. Sabia que o Sr. Clifford tinha razão, Willian era realmente um bom garoto, ele merecia mesmo alguém melhor e tinha entendido o que queria dizer ao mandá-lo deixar seu neto em paz.

Ethan se sentia ridículo, de alguma forma, como podia ser tão infantil assim? Como aquele velho tinha lhe feito perder a cabeça com tanta facilidade? Por que quando se tratava de Willian, ele não podia pensar claramente? Quanto mais teria que se ferir até se sentir satisfeito? Não entendia por que não conseguia odiá-lo, afinal já tinha cortado relações antes por muito menos. Ele tinha lhe tratado como um objeto, se metido na sua vida, lhe machucado… Ou era isso que queria acreditar, mas sabia que não conseguiria, porque não era verdade. Ele tinha permitido que o garoto entrasse em sua vida e se apaixonado por ele, e isso o assustou. Ficava ainda mais claro sentado ali, ao lado de Matthew. Afinal, o garoto também o atraía fisicamente, mas não chegava nem perto do fogo que Willian despertava em seu coração, o que sentia ia muito além da atração, era inexplicável, poderoso e muito vivo. Desejo nenhum seria capaz de substituir aquele sentimento ou apagá-lo. Era magnetismo puro. Destino.

— Você não precisa se preocupar muito, ele vai te procurar assim que perceber sua ausência, se já não estiver procurando. — A voz de Matthew cortou o silêncio como uma navalha, lhe fazendo pular no assento. Virou-se para encarar o garoto e ele continuava encarando a estrada parecendo despreocupado. Desde que entrou no carro, Ethan vinha tentando ignorá-lo e ele tinha sido muito compreensivo, então aquela era a primeira vez que ouvia sua voz depois que partiram.

— Quê? — os lábios do garoto se curvaram em um sorriso torto.

— Você é um livro aberto, sabia? O que você sente fica escrito na sua cara para quem quiser ver. — Ethan fechou a cara sentindo-se exposto — Escuta, o Willian pode ser um idiota as vezes, mas não é burro. E ele é justo e sincero sobre o que sente, então não se preocupe demais. O que tiver de ser, será. Willian é a pessoa mais teimosa que eu conheço, quando ele cisma com uma coisa, raramente muda de ideia. — Matthew falou aquilo parecendo nostálgico e triste, como se Willian já houvesse insistido nele um dia.

— O que quer dizer? — Ethan olhou para Matthew um tanto surpreso de perceber que o garoto notara sua inquietação — Do que você está falando?

— Você sabe que também mente muito mal, não sabe? — ele ainda sorria.

— Eu não estou mentindo. Realmente não sei do que você está falando.

— Então, por que essa cara de enterro? O que o Willian pode ter falado que te abalou tanto? Ele terminou com você? — finalmente Matthew desgrudou os olhos da estrada e lhe encarou, então ergueu uma sobrancelha e tornou a olhar para frente. — Ou não foi o Willian? — Ethan engoliu em seco.

— Isso não te interessa!

— Quantas vezes você já disse isso pra mim desde que me conheceu? Isso machuca, sabia? Eu sou um tanto sensível. — ele falava enquanto sorria, o que não era nada convincente.

— Você… sensível? — Ethan não conseguiu se segurar e acabou rindo.

— O quê? Não acredita? Só porque te passam uma visão distorcida de mim, não quer dizer que eu sou o que dizem que eu sou.

— Desculpe, não foi isso o que eu quis dizer. — na verdade, entendia muito bem aquele sentimento, afinal sua imagem também fora distorcida uma vez e ele pagava o preço até hoje, por isso ficava meio dividido em acreditar em Willian, afinal sabia como era ter sua imagem distorcida e mal interpretada. Era muito fácil convencer as pessoas de algo ruim, o difícil era convencê-las do contrário. Não sabia em quem acreditar, pois se identificava com Matthew mais do que gostaria de admitir e já tinha sido mal interpretado pelo próprio Willian, então…

— Bom, acho que te fiz esquecer pelo menos um pouco o que estava te fazendo se preocupar... Só não vá chorar novamente na minha frente, eu tenho um fraco por garotos bonitos chorando, sabe? Posso acabar querendo te consolar.

Ethan revirou os olhos, mas sentiu a boca secar, o garoto lançou-lhe um sorriso amarelo que o fez sorrir junto e não pôde evitar pensar que sua companhia era muito confortável se tirasse o fato dele flertar constantemente, mas imediatamente sentiu-se culpado por pensar assim. Suspirou encarando novamente o garoto, que ainda preservava uma sombra de sorriso nos lábios. É claro que entendia os motivos de Willian — pelo menos estava tentando entender —, mas era muito difícil odiar Matthew só pelas pobres informações que Will e o Sr. Clifford lhe fornecera. Ninguém, de fato, lhe citou um real problema para todos aquele ódio e isso lhe incomodava muito. Odiava julgar os outros por rumores e especulações de terceiros.

Não sabia ao certo o que pensar sobre Matthew, mas o jeito que ele o fazia sentir era bem diferente do jeito que Willian o fazia. Definitivamente conseguia vê-lo se tornar um bom amigo. Ele parecia ser calmo, brincalhão, gentil à sua forma, um bom ouvinte, sem julgamentos… E apesar de parecer meio indiferente às vezes, parecer sempre muito despreocupado e ter olhos frios que o lembrava muito os de seu pai, ele não parecia um cara ruim.

— Nós já estamos quase chegando, certo? Você tem certeza que não quer que eu te deixe em casa?

— Eu já disse que o metrô está bom o suficiente. Por que você é tão insistente?

— Só estou preocupado que você se perca ou desate a chorar sozinho novamente, só isso.

— Será que dá pra esquecer esse negócio de choro? Sei que nossos encontros não foram nos meus melhores momentos, mas não quer dizer que eu sempre ande por aí chorando.

— Certo, certo! Mas você sabe andar de metrô sozinho? — Ethan revirou os olhos novamente.

— Sim, eu sei andar de metrô melhor do que você saberia, disso eu tenho certeza.

— Uau, impressionante. Então você é bom em algo mais que chorar. — Matthew falou sarcástico e sorriu, Ethan abriu a boca para rebater, mas então resolveu que não valia a pena.

— Mas e você, o que vai fazer por essas bandas? Disse que tinha coisas a resolver por aqui.

— Bem, sim. — o garoto pareceu levemente desconfortável — Eu finalmente consegui a desculpa perfeita para deixar para trás aquela casa e viver por mim mesmo por um tempo, sem precisar dar satisfações a cada respiração que dou, sem precisar viver me escondendo para não ser visto… — ele parou e limpou a garganta, uma sombra passou por seus olhos escurecendo-os, mas então ele sorriu — Haha, estou brincando, acho que me empolguei. Estou mudando de faculdade, só isso.

Ethan uniu as sobrancelhas confuso, não sabia no que acreditar, se na primeira ou segunda história. Matthew sabia mentir muito bem, ao ponto de fazer as pessoas acreditarem que suas mentiras eram verdades sem pestanejar. Ele olhou para o semblante do garoto, mas continuava tão inexpressivo como sempre, não dava para dizer o que ele estava pensando, mas aquele ar de melancolia ainda rondava o fundo de suas pupilas negras, como minhocas sob a terra. Por algum motivo, depois de passar um tempo com aquele garoto, Ethan começava a suspeitar que nunca realmente o via quando estava com ele. Sabia que era muito cedo para tirar qualquer conclusão, afinal só fazia 3 dias que se conheciam, mas sentia algo estranho quando estava com ele. Era como olhar por uma lente embaçada, não conseguia realmente ver o que estava do outro lado do vidro, era quase como assistir a uma peça. Matthew parecia um ator em seu personagem, apesar de muito bem ensaiado, às vezes acabava deixando transparecer seu verdadeiro eu. Era como se ele se esforçasse muito para ser aquela pessoa comunicativa e extrovertida, mas não conseguia se livrar nunca daquela aura melancólica e nebulosa que lhe fazia parecer tão enigmática e seus olhos tão frios, nada acolhedor. 

Ethan não percebeu que o encarava intensamente até o garoto se mexer desconfortável em seu banco, o fazendo piscar. Limpou a garganta constrangido e percebeu que seus dedos apertavam o volante com força, tornando as juntas vermelhas. Parecia desconcertado ao ser observado, quase nervoso. Ethan encarou seus dedos, que eram muito bonitos, longos e ágeis, muito pálidos em contraste com o couro negro do volante. O sinal abaixo de sua boca estremeceu levemente um momento antes de seus lábios se curvarem em um sorriso torto, ergueu uma sobrancelha parecendo divertido e o fazendo virar o rosto rapidamente sentindo o sangue se concentrar em suas bochechas.

O garoto resolveu ignorar Matthew pelo resto do caminho, afinal já estava ficando muito consciente de sua presença. Queria sentir o conforto de casa, o calor dos braços de sua mãe. Como sentia saudade dos tempos em que sua vida era simples, de quando ele não precisava se preocupar com sua reputação, com "irmãos malvados" ou a opinião da sociedade sobre com quem ele transava ou não, ou sobre qualquer outra coisa. Parecia que antes vivia livremente, mas agora só se preocupava com cada detalhe. Só queria sentir que era ele mesmo novamente. Era como se aqueles dias, que pareciam tão longe agora, estivessem sendo vistos de uma janela embaçada, apenas memórias difusas de alguém confiante de quem era.

Não se sentia mais o mesmo de antes, na verdade achava que Willian aos poucos estava lhe mudando e aquilo lhe assustava muito. Não se reconhecia mais, não era mais o Ethan que as garotas achavam legal e que os garotos queriam como amigo — talvez nem todos, mas esse não era o caso. Não era mais aquele cara despreocupado e que andava por aí fazendo estardalhaço e chamando atenção. O garoto problemático que dava trabalho só para irritar o pai e ter o que contar para os amigos. Na verdade, até se sentia envergonhado agora ao lembrar-se disso. Quando tinha começado a ter vergonha de si mesmo? Quando tinha começado a ligar para o que os outros pensavam?

Sim, tudo isso começara a partir de quando Willian entrara em sua vida. Quando lhe olhava de uma forma desconcertante ao vê-lo fazer algo de errado, quando aqueles olhos dourados lhe queimavam com intensidade ao vê-lo fumando ou na companhia de seus amigos de cabelos coloridos e piercings. Quando apertava a boca e tencionava a mandíbula em desaprovação ao vê-lo matando aula ou quando não aparecia no café da manhã. Quando lhe olhava com aquele olhar de clara censura, apertando os lábios em uma linha fina e estreitando os olhos, lhe fazendo se sentir como uma criança errônea. Foi a partir daí que começou a se sentir consciente do que fazia de errado e se envergonhar. Entender que ele era a razão que o fazia querer ser alguém melhor era um fardo pesado demais para aguentar. Precisava de um pouco de ar, porque estava começando a sufocar.

Ethan olhou pela janela do carro, passou a mão desembaçando o vidro e olhou para o céu, à hora parecia não estar passando, lá fora continuava cinza, ele suspirou sentindo saudade do céu claro e azul do verão, mordeu o lábio e olhou a tela do celular, já passava das nove e meia, fazia bastante tempo que eles estavam na estrada. Colocou os fones percebendo que Matthew o olhava mais uma vez. Sentiu o arrepio na coluna ao perceber aquelas íris gélidas e ridiculamente douradas lhe encarando e se pegou desejando em seu íntimo nunca ter conhecido nenhum deles.

Sentindo-se a pessoa mais infeliz do mundo, o garoto se escolheu em seu banco abraçando os joelhos e se virou enroscado como um tatu-bola. Não precisava se esforçar muito para fingir estar sozinho no carro, pois Matthew era uma presença silenciosa e gélida no ambiente. Estava exausto e com fome, e com a cabeça cheia demais e aquilo extinguiu as últimas forças que lhe restava, fazendo seus olhos pesarem. Ia tentar dormir por alguns minutos antes de ser obrigado a voltar a realidade. Quem sabe quando acordasse descobrisse que tudo aquilo não tinha passado de um terrível pesadelo.

~ C O N T I N U A ~



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