História Ela sempre volta pro Baekhyun - Capítulo Único

Ela sempre volta pro Baekhyun

Quem vê Kim Taeyeon caminhando calmamente pelo pátio da universidade não imagina a destruição que ela é capaz de provocar. Ás vezes parece que nem ela sabe.

É uma garota tão bonita, dona de um corpo pequeno que guarda coração frágil e mente forte.

Olhar Taeyeon de longe é um vício masoquista que eu não consigo abandonar. Como se um dos cigarros que eu fumo nos dias difíceis tivesse efeitos corrosivos no meu organismo, mesmo que a fumaça deixasse minhas vias respiratórias sangrando, ainda não poderia parar. O efeito corrosivo é a dor que sinto no peito e fumar é amar Kim Taeyeon.

Demorei muito pra aceitar que isso que sinto toda vez que ela está por perto é o que chamam de amor. É uma palavra muito abstrata e eu detesto isso, mas não existe mais nenhuma palavra que descreva melhor a bagunça que acontece em meu corpo quando Taeyeon está por perto.

Pensei que poderiam ser atração física e que depois de sanar todos os desejos carnais eu talvez poderia voltar a viver em paz. Porque olha, se tem uma coisa que eu não tenho mais depois que conheci essa garota, é paz. Estávamos na festa de aniversário de uma colega em comum e Taeyeon estava um pouco – talvez muito – bêbada. Bêbada e chata pra caralho. Eu saí pro jardim da casa da Joohyun pra fumar escondido porque ela odeia que eu fume, beba ou transe. Achei que teria um momento de paz com meus Pallmalls, mas por obra de algum ser superior ela sentou do meu lado no sofá de palha e desatou a tagarelar sobre safado do ex namorado, como ele não tinha o direito de jogar tudo o que viveram pelos ares e que seria a última vez que daria mais uma chance pra ele – e mais um monte de palavrões e frases que não faziam o menor sentido pra mim. Em certo momento eu parei de ouvir, ocupada demais em observar como os lábios dela ficavam lindos naquele batom matte rosa pêssego. Pra piorar um pouco pro meu autocontrole, ela tinha um cheiro docinho e fraco que não parecia nem perfume, talvez só alguma loção que explicaria o fato de a pele dela ter uma aparência tão macia.

 – Talvez você devesse tentar encontrar outra pessoa. – sugeri antes de voltar o cigarro até meus próprios lábios.

Ela me olhou meio perdida pelo raciocínio lento típico de alguém que tomou boas garrafas de cerveja.

– Quem é você?

Eu ri. Logo começando a tossir muito por ter interrompido a tragada no meio.

– Miyoung. Hwang Miyoung.

...

Depois daquela noite não nos tornamos exatamente amigas – até porque nós duas estamos no período final da faculdade e os trabalhos de conclusão sugam tempo –, mas às vezes ela aparecia no café que ficava do outro lado da rua onde eu passava o tempo das aulas livres. Então um dia ela sentou comigo e foi assim que a gente começou a se falar. Desde o início eu tive a impressão de existir uma tensão diferente entre nós duas, e desde o início também eu preferi deixá-la de lado, ignorada lá no canto das paranoias que minha mente está acostumada a criar e alimentar.
Entre seus expressos fortes e meus cappuccinos, Taeyeon se mostrou uma garota daquelas excepcionais, que você olha e pensa “Uau...”. Eu já disse antes que ela tem a mente forte, mas vale a pena repetir, porque aquela loirinha é uma peça rara.

Eu cresci nos Estados Unidos, então foi um choque chegar à Coreia do Sul e descobrir como uma nação tecnologicamente desenvolvida pode ser socialmente primitiva. Machismo, xenofobia, racismo, homofobia... Era tudo considerado “cultural” nesse lugar cheio de gente infeliz. Eu não queria viver entre eles, me sentia sufocando toda vez que ouvia algum comentário sobre homossexualidade – única coisa que eles sabiam a existência, porque deviam pensar que pan e bi são letras gregas. Foi por isso que comecei a fumar. Além do efeito calmante, ainda afastava as pessoas conservadoras de mim sem que eu precisasse me esforçar pra isso. Imagina só, uma garota que fuma e não é escondido! Que infame!

Kim Taeyeon era divinamente diferente deles.

Ela também odiava cada um deles.

Quando o assunto sexualidade chegou a uma de nossas conversas, ela se mostrou muito interessada no que eu tinha pra contar sobre como o ocidente lidava com o assunto. Para minha surpresa ela se revelou bem informada sobre isso, sem nenhum sinal de repulsa ou reprovação enquanto falávamos. Uma faísca de esperança se acendeu em mim, mas foi logo mandada pra fazer companhia à sensação de tensão no cantinho das paranoias.

Nessa mesma tarde eu me senti confortável em dizer pra ela que sou lésbica. Ela piscou confusa por alguns segundos, mas depois assentiu, claramente pensativa. Os minutos que se passaram em silêncio depois disso quase me fizeram puxar um cigarro do bolso. Eu teria feito se não estivéssemos em um ambiente fechado.

– Eu... – ela começou hesitante – Eu não sei bem se me encaixaria em um desses grupos. – eu apenas a encarei, dando sinal de que estava ouvindo. – Eu tenho um namorado – sim, ela tinha voltado com Baekhyun. Ela sempre volta pro Baekhyun. –, mas às vezes olho pra certas garotas e penso que realmente queria beijar elas. – opa, faísca de esperança pode sair do castigo – Mas... Não acho que pare por aí. Acho que de todos os termos que já li sobre o que mais se encaixa na forma que me sinto é pan. Eu sinto que, se alguém for capaz de fazer eu me sentir apaixonada de verdade, a última coisa com a qual eu me importaria seria com o gênero desse alguém. Prazer sexual a gente encontra até sozinha – ela riu envergonhada e eu a acompanhei porque era fofo vê-la assim. Provavelmente era a primeira vez que ela falava de masturbação com alguém. –, mas amor é tão raro pra ser jogado fora quando finalmente acontece.

E lá estava eu, querendo pra mim aquela garota bonita por fora e inacreditavelmente linda por dentro.

...

Só tinha um grande problema em Taeyeon e ele se chamava Byun Baekhyun, o famigerado namorado que às vezes era ex.

Foi em uma das noites em que Baekhyun era ex que Taeyeon me chamou pra assistir um filme na casa dela. Estava sozinha porque os pais foram visitar uma tia no interior e o irmão mais velho aproveitou para passar a semana na casa da namorada, mas eu nem podia cogitar qualquer malicia no convite porque Taeyeon sempre me ligava bêbada para desabafar quando Baekhyun e ela “terminavam”. Eu ouvia enquanto tragava um cigarro atrás do outro, concordando às vezes pra ela saber que eu ainda estava ali. Eu achei que ela estivesse bebendo naquele dia também, mas não estava.

Nós assistimos Despicable me*, porque ela precisava rir e ninguém fica triste assistindo esse filme. Quando o filme acabou, ela estava com fome, então deixamos a TV ligada em um canal de videoclipes americanos e fomos pra cozinha improvisar. Taeyeon me olhava mais que os outros dias. Enquanto eu cantarolava Sucker for pain e tentava me concentrar em cortar os legumes sem amputar nenhum dedo, ela me abraçou pela cintura e afundou o rosto nas minhas costas.

– Miyoung-ah...

– Hm?

– Eu queria pedir uma coisa, mas acho que pode me odiar se eu pedir.

Oh my God...

Pousei a faca na bancada antes que um acidente (pior que o capotamento que meu coração sofreu) acontecesse naquela cozinha.

– Eu não acho que consiga te odiar. Pode falar.

– Eu nunca beijei uma garota... – como reação ao nervosismo e insegurança, seus braços apertaram mais minhas costelas – Seria muito egoísta pedir que você me beijasse?

– Egoísta?

– Eu... Eu percebo como você me olha às vezes. – meus músculos enrijeceram – E percebi que talvez eu também queira.

Cada pelo do meu corpo reagiu àquela frase sussurrada contra minha coluna. Eu só queria me virar e beijar aquela boca de uma vez, mas havia um grande problema com Taeyeon e eu precisava estar segura sobre a solução dele.

– E o Baekhyun?

Ela estalou a língua e eu ri.

– Não fale esse nome hoje.

Eu não estava nenhum pouco segura sobre essa resposta, porque já tinha aprendido que era quase como uma espécie de regra do universo: ela sempre volta pro Baekhyun. Mas o ser humano é muito passageiro para viver dentro das linhas da segurança.

Então eu me virei em seus braços, puxei o rosto bonito pra mim e beijei aquela boca de uma vez. Quando me separei para medir suas reações ao primeiro beijo com outra garota, ela estava de olhos fechados e passou a língua pelos lábios antes de abri-los e me olhar. O contato visual durou poucos segundos, porque logo seus olhos baixaram para os meus lábios e então se fecharam, quando ela inclinou-se pra frente e me beijou.

Por uma noite esquecemos a comida, o tempo, a música, o mundo. Se eu tivesse poder sobre o Sol, nos prenderia naquela noite pela eternidade, mesmo que isso significasse que nunca mais amanheceria outra vez.

...

Agora são quase oito horas da manhã e Taeyeon já está chegando para a apresentação final do curso de Jornalismo.

Fazem quase três meses desde aquela noite e eu ainda não parei de observar de longe. Dói, mas ao menos dói só pra mim. Se eu ficasse perto, doeria pra nós duas.

Eu apago meu cigarro enquanto ela olha o relógio de pulso, aflita, olhando pros lados em busca de alguém. Enquanto puxo o maço do bolso e prendo o cigarro novo nos lábios, esse alguém vem caminhando com pressa até ela. Quando acendo-o ele deixa uma carícia na lateral do rosto dela e aquele sorriso bonito aparece. Quando trago ele se aproxima. Antes que aconteça, eu me viro e saio dali. Não preciso ter a lembrança de Baekhyun dando um beijo de boa sorte que eu queria pra mim. Acho que finalmente está na hora de parar de fumar, afinal, é quase como um tipo de regra do universo.

Ela sempre volta pro Baekhyun.