Ponto de Vista Alasca Mackenzie.
Minha cabeça doía muito. A claridade do lugar me deixava tonta, para não dizer entorpecida. Ao meu redor não havia ninguém. Me forcei a abrir os olhos mais uma vez, tentando não fecha-los de novo, mas era impossível. Eu tinha quase certeza que estava em um hospital, mas por que? Eu não me lembrava do que tinha acontecido.
— Mamãe! — ouvi a voz doce da minha pequena e abri os olhos novamente. Ela estava mais linda do que nunca.
Damian estava junto com ela. O que ele fazia aqui? Ou melhor, o que eu estava fazendo nesse hospital tão caro? Confusão era a palavra que me definia no momento.
— Oi, meu amor. — abracei Alice. — O que estamos fazendo aqui?
— O papai me chamou beeeem di noitinha e disse que voxe tava passandu mal e que a gente picisava te levar pro hospital. — me bateu um choque de realidade e eu lembrei de tudo o que tinha acontecido na noite passada.
— E onde o papai está agora? — perguntei, cautelosa. Alice sorriu.
— Ele falo pa mim que ia lá em casa busca umas coisas e ja ja volta. — dei um meio sorriso.
Olhei para Damian, que me lançou um olhar piedoso. Ele sabia de alguma coisa mas não queria falar na frente da Alice.
— Ei, Ali. Que tal eu te pagar um lanchinho? — ela bateu palminhas, animada. — Mas você vai com a tia Malena, tá bom? — minha filha assentiu e ele a pegou no colo.
Saíram do quarto e eu fiquei ali sozinha, pensando. Eu não tinha certeza absoluta do que havia acontecido, mas não é como se eu não tivesse uma desconfiança. Fields não demorou muito a voltar. Quando entrou, fechou a porta atrás de si e me encarou. Ele se aproximou e sentou na cadeira dos visitantes. Trazia consigo uma bolsa que eu reconhecia muito bem, era de Mike.
— Eu não queria ser a pessoa a te dar essa notícia mas não vejo quem mais poderia te contar o que aconteceu. — desviei o olhar, tentando manter a calma.
— Eu aguento, Damian. Já passei por muita coisa nessa vida. — ele encarou o chão por alguns segundos e depois voltou a me olhar.
— Mike te trouxe aqui ontem. Ele parecia estar muito alterado, porém arrependido. Você sabe que nos conhecemos a anos e eu tenho total liberdade para conversar com ele, não é? — não respondi, ele prosseguiu: — Ele me contou o que aconteceu. Michael chorava a cada palavra que proferia, Alasca. Eu não sabia o que fazer, a não ser ouvir.
— E o que ele te falou exatamente? — perguntei.
— Que havia bebido muito e te bateu quando você "insinuou" que a culpa do câncer de Alice era dele, embora depois de um tempo ele refletir e perceber que realmente era. — senti uma pontada no coração. — Ele disse que depois que te viu desacordada, caiu a ficha do que tinha feito, mas já era tarde demais para desculpas. As palavras dele para mim foram: "Eu causei isso! Minha filha tem um câncer e quase matei minha esposa. Toda a desgraça dessa família fui eu que trouxe. Eu não mereço essas mulheres incríveis. Fala para a Alasca que eu não espero que ela me perdoe um dia, mas que eu nunca vou deixar de ama-la."
Eu já não podia mais conter as lágrimas. Michael pode ter feito o que fez comigo, mas eu entendo que ele estava doente. A bebida o cegava, o deixava agressivo... Não era o mesmo homem com quem me casei. Meu coração não queria acreditar que ele havia me deixado, mas no fundo, a razão ria da minha cara. O que seria daqui pra frente? Como eu contaria para Alice? Como eu pagaria seu tratamento? Como eu sustentaria minha filha? Perguntas sem respostas.
— Eu sinto muito. Tentei fazê-lo mudar de ideia, mas você sabe como ele é quando tem algo na cabeça. Não muda de ideia de jeito nenhum. — assenti. Eu entendia a situação, mas Alice não iria entender. Minha filha é muito pequena para passar por isso.
Sim, Mike me maltratava muitas vezes, nossas brigas eram diárias, mas ele nunca deixou de dar carinho e amor para nossa filha. Eu sabia que o perderia para o mundo do álcool uma hora ou outra, mas não imaginei que fosse quando eu mais precisava dele. Eu o perdoaria sim, talvez não por mim, mas pela nossa filha. Eu acreditava na mudança, eu coloquei minha fé nele e de nada adiantou.
— Eu quero ficar sozinha, Damian. — eu já não sabia mais o que pensar, e ter meu médico me encarando com dó não ajudava em nada.
— Você está de alta. A pancada foi forte, mas não causou sequelas, você só precisará tomar remédios para as dores que possa passar a sentir. — assenti, concordando. — Michael trouxe essa bolsa, deve ter alguma roupa. Pode se trocar, seu carro está no estacionamento. Alice vai ficar comigo até que esteja pronta para ir para casa.
— Obrigada. — ele me deu uma última olhada e saiu.
E lá estava eu sozinha novamente, sabendo que daqui pra frente seria assim. Senti um nó na garganta. Antes eu dava apoio à Alice porque tinha Michael para me apoiar, como vai ser agora? Abri a bolsa e logo de primeira, vi uma carta. Eu não queria lê-la agora, ou não pararia de chorar nunca mais. Abri um outro envelope que tinha dinheiro. Logo embaixo estava a chave do carro, da casa e algumas roupas para que eu vestisse.
Fui até o banheiro e tomei um banho rápido. Eu precisava sair dali logo, ir para casa e encontrar meu marido sentado no sofá assistindo ao jogo com seu copo de cerveja na mão. Eu ainda tinha esperança de que tudo não passou de um mal entendido e ele estaria lá, pronto para fazer as pazes.
Coloquei a calça, a camiseta e a sapatilha que ele trouxe e amarrei meu cabelo em um rabo de cavalo. Peguei a bolsa e saí do quarto. Alice estava com Damian e eu fui direto na recepção, assinar minha alta. Todo mundo me olhava com cara de dó, aposto que viram o estado que cheguei aqui ontem. Fui até Alice e a peguei no colo.
— Obrigada mais uma vez, Sr Fields. — não falei mais nada, dei as costas e fui até o estacionamento.
Depois de alguns minutos procurando, achei meu carro. Coloquei minha filha em sua cadeirinha e dei partida. Acho que nunca fiz um trajeto tão rápido do hospital até em casa. Estava tudo silencioso. Peguei as chaves de casa e chamei Alice, que estava dormindo. Ela acordou e eu peguei em sua mãozinha. Abri a porta e vi os estragos do que aconteceu ontem.
— Puque tem um monte de coisa quebada? — não respondi a pergunta. Fui direto ao nosso quarto e abri os armários. As roupas dele não estava mais ali.
Sentei em minha cama e me pus a chorar novamente. Ali se aproximou, pedindo colo. Peguei ela e a aconcheguei em meus braços.
— Não, mamãe. Voxe que vai deita no colinho da Ali. — sorri em meio às lágrimas. Ela apoiou as costinhas na cabeceira e esticou as perninhas. — Vem! — me chamou, coloquei a cabeça em cima de suas pernas e ela começou a acariciar meus cabelos.
Minha filha era meu único tesouro. Ela merece tudo de melhor que o mundo possa nos oferecer. Eu afasto todas as pessoas de mim, e infelizmente as consequências giram em torno dela também.
Eu tenho uma ferida de cada lugar, em que deixei guardada a solidão. E é por isso que eu digo que eu não sei lidar, é muito mais do que o meu peito pode suportar.
Senti o cheiro amadeirado do perfume de Michael e olhei novamente para o quarto vazio. Naquele momento caiu a ficha: nós estávamos sozinhas no mundo.
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