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História Entre Sem Bater - Capítulo 06 - Mesmo em meio as manifestações?


Escrita por: andreiakennen

Notas do Autor


Postagem especial de aniversário para minha fofa Kohai, a Gi-chan!
Ela, mais do que qualquer outro, se apaixonou pelo Caio e pela história dele.
Então, pra você, Gi-chan! Capítulo duplo! 8)
06 e 07! Feliz aniversário! /o

Capítulo 6 - Capítulo 06 - Mesmo em meio as manifestações?


Entre Sem Bater

Por Andréia Kennen

Capítulo 06

Mesmo em meio as manifestações?

— O Thiago?

A expressão da Laura não foi bem a que eu esperava, a feição de curiosidade dela se desfez e eu percebi um leve tom de desdenho. Meu sorriso também se desfez.

— Sim, o Thiago — reafirmei, terminando de colocar a caixa de arquivo na prateleira de cima e descendo da escada móvel.

Trabalhar no arquivo da empresa fora o meio mais rápido que encontrei de contar à Laura sobre o Thiago e eu. Além disso, minha ansiedade causaria um buraco no meu estômago se eu esperasse até a hora do almoço.

Parei diante dela e tentei desvendar aquela nova expressão que a Laurinha fazia, parecia um misto entre preocupação e repugnância. Cruzei os braços no peito e a encarei com um olhar duro.

— O que foi?

— Nada — ela respondeu simplesmente, esquivando-se do meu olhar ao abaixar para apanhar outra caixa de arquivo.

— Nada, Laurinha? Eu conheço essa sua cara. É a mesma quando você encontra cebolas na marmita. O que tem de errado com o Thiago?

Ela largou a caixa.

— Desculpe-me, Caio. Acho que você está empolgado, mas...

— ‘Mas’...? — Bati as mãos ao longo do corpo, começando a ficar impaciente. — Desembucha, pelo amor de Deus!

— Ele é esquisito. Pronto. Falei.

— Como assim?

— Ele usa roupas cafonas, barba sempre por fazer, aquele cabelo comprido horroroso e oleoso... Ah! Pelo amor de Deus, Caio! Você não está desesperado. Eu nem imaginava que o Thiago fosse gay. Afinal, achei que era uma regra da sociedade homossexual todos gays serem bonitos, malhados, bem cuidados e charmosos. Eu sempre imaginei o Thiago morando em um bairro pobre, em uma casa inacabada e trabalhando no pesado o dia inteiro para sustentar a mulher e três filhos. Você é bonito, baby. Apesar de a família ter te rejeitado, eles têm status. O que você viu no Thiago pelo amor de Deus?

Eu não consegui responder de imediato as observações tão grotescas e preconceituosas da Laurinha. Nem sequer acreditei que aquilo estava mesmo saindo da boca dela que sempre foi uma garota tão moderada. Apenas fiquei estático por um momento, encarando o rosto bem maquiado a minha frente. Eu achei que muitas pessoas na vida me decepcionariam, mas não uma garota que sempre se mostrou mente aberta como a Laura.

— Você está mesmo jugando uma pessoa pela aparência, Laurinha? — eu consegui desengasgar.

A Laura levantou o dedo como se fosse contradizer, mas seja lá o que ela tinha em mente, ela engoliu de volta, abaixou o dedo, pensou por um instante e respondeu.

— Desculpe-me, eu não deveria ter falado o que penso dessa forma. Afinal, agora vocês são namorados.

— Não. Se é o que pensa de verdade, estou feliz que tenha exposto.

— É que foi um choque para mim, Caio. Depois que vi o deslumbrante Guilherme, achei que seu interesse fosse em caras como ele.

— O Guilherme é um babaca, hipócrita e ridículo, Laura — resmunguei entre dentes. — Eu não consigo acreditar que você se esqueceu do que ele fez? Logo você que chorou rios por causa do que aconteceu.  

— Ele se arrependeu do que fez.

— Como você sabe?

Ela franziu as sobrancelhas.

— Ué? Você não viu a declaração que ele fez para você pedindo desculpas? — ela falou e foi tirando o celular do bolso da calça e desbloqueando-o ao tocar na tela, outro toque e ela acessou o meu Face através da página dela, então me mostrou aquele enorme depoimento escrito pelo Guilherme começando com: “O quanto um cara pode ser babaca?”.

Eu li rápido correndo os olhos sobre o texto. O Guilherme pedia desculpas pela criancice que fez com a foto no outro dia, dizendo que estava confuso e que queria apenas chamar minha atenção, porque tudo que ele queria era ser meu amigo e um monte de baboseiras mais.

— Viu? Cheguei a pensar que ele estivesse interessado em você. Parece uma mensagem verdadeira. 

— Interessado em mim depois da babaquice que ele aprontou? — revirei os olhos. — Poupe-me.

— Tem gente que faz coisas babacas quando está apaixonada, oras — ela deu de ombro. — Só para chamar atenção da pessoa que gosta, como ele colocou no depoimento.

Eu revirei os olhos mais uma vez. 

— Laura, o Guilherme está apaixonado sim, mas não por mim, e sim pelo Thiago, ele é ex dele. E aquilo que ele fez ontem e esse falso-depoimento, não passam de uma forma que ele encontrou de me atingir porque ele sabe que o Thiago e eu começamos algo.

Ver a Laura boquiaberta não teve preço, tanto que não consegui evitar um sorrisinho matreiro que brincou nos meus lábios.

— Você tá me zoando, né, Caio? — ela perguntou, dando um risinho sem graça. — Aquele gato, divino, não pode ter sido namorado daquele... cara.

— Mas foi — assenti com firmeza. — Não só foi, como ainda corre atrás dele feito um cachorrinho. Ao ponto de ter feito o que fez comigo na tentativa de me afastar, de tentar me intimidar.

— O que o Thiago tem, pelo amor de Deus? Um pinto de ouro?

— Laurinha, meu bem, às vezes você consegue ter um linguajar pior do que pedreiro.

— Só estou tentando entender.

Resolvi por um fim naquela conversa.

— Tá, chega. Acredite se quiser. Vamos voltar para sala. Essas caixas fedendo a mofo e cobertas de poeira estão me dando coceira. Chega de arquivo, eu te contei o que queria e sinto por você não estar feliz por mim.

Passei por ela, esbarrando nas caixas e segui para saída.

— Não fique bravo assim, Caiooô! — ela me pediu exaltada ao me alcançar. — Você sabe que eu te amo, não sabe, baby?

— Acho que você anda mais apaixonada pela Dafne ultimamente — confessei ciumento.

— Larga de ciúmes bestas. Eu vou te apoiar se é isso que quer. Só que eu tenho direito de achar estranho, ué?! Ainda mais com relação ao que me contou sobre a questão do sexo. Eu acompanho seriados gays, assisto filmes gays e até leio revistas sobre vocês. E tudo que resume o relacionamento homossexual é sexo. Eu acho sexo primordial para um relacionamento hetero, homens heteros pensam em fazer sexo o tempo todo mesmo sabendo que a mulher não tem a mesma necessidade. Imagina então um casal composto por dois caras?

Eu cruzei novamente os braços no peito.

— Não sei aonde quer chegar, Laurinha.

— É simples, Caio. Para mim, só existem três motivos plausíveis para o Thiago não querer fazer sexo com você. Primeiro: algum trauma. Segundo: doença. AIDS. Terceiro: ele não é gay de verdade.

Descruzei os braços e os bati ao longo do corpo, mais uma vez.

— Como alguém não é gay de verdade? Para que alguém vai fingir que é gay? Logo com tanta coisa para se fingir, que é rico, que é inteligente, mas gay?

Ela ergueu os ombros.

— Sei lá! Alguém que ainda não esteja seguro?

— Obrigada por me desiludir.

— Eu só estou sendo sincera como sempre fui — minha amiga respondeu, repousando as mãos no meu ombro. — Pelo menos tire a dúvida sobre ele ter ou não a doença.

— E como você sugere que eu faça isso, Laura? “Oi, Thiago, eu pensei bem e antes da gente consumar nosso relacionamento, poderia me mostrar seu teste de H.I.V. atualizado”?

— Baby, eu não sei. Isso daí é com você. A única coisa que quero é que tenha cuidado para não se machucar mais tarde. Você é a pessoa mais amável que já conheci, Caio — ela confessou, tocando em meu rosto. — Faz quase três anos que nos conhecemos, e nesse tempo eu pude perceber que você é do tipo que se entrega muito rápido. Ontem você nem olhava para o Thiago hoje você está perdidamente apaixonado por ele, se você se entregar completamente, antes de ter certeza das intenções da outra pessoa, a dor será muito maior mais tarde. De verdade, eu me importo com você.

É, ela havia me convencido, eu iria pensar no assunto.  

...

A conversa que tive com a Laura foi um tapa na minha cara. Mesmo na faculdade, os três motivos que ela enumerou para o Thiago não querer transar ficaram pairando sobre minha cabeça como uma nuvem negra de tempestade.

O Thiago havia confessado que não era do tipo promíscuo, mas ele ter perguntado sobre a camisinha no primeiro dia que ele dormiu na minha casa era no mínimo motivo para eu pensar no que a Laura havia apontado.

Além disso, ele poderia nunca ter sido do tipo promíscuo, mas ele se relacionou durante muito tempo com alguém que certamente era.

Mas usar preservativo é uma regra tão básica que me faz pensar que estou sendo idiota ao me deixar levar pelas neuras da Laura.

Porém...

As pessoas não pensam na camisinha em primeiro lugar, principalmente na hora do “vamos nos pegar”, elas pensam primeiro no sexo, depois se lembram do preservativo.

O pior era que estávamos na semana de provas, mas quem disse que estava com cabeça para estudar?

Mandei uma mensagem para o Thiago informando-o que estava na biblioteca, era costume a Laura, eu, e agora a Dafne, chegarmos mais cedo na semana de provas para estudar na biblioteca. Ele respondeu a minha mensagem bem no momento em que o sinal para o primeiro tempo soou, avisando apenas que chegaria atrasado.

Ainda tinha aquele fato estranho: os benditos atrasos.

Eu estava começando a pensar que a Laura tinha razão sobre o Thiago ter algo a esconder.

Na sala de aula, mais tarde, o Thiago chegou atrasado, como de praxe. O professor tinha acabado de entregar as provas. Ele pediu licença e seguiu direto para a carteira dele, sem desviar minimamente o olhar, nem para saber se eu estava presente.

O acompanhei com o olhar, ele se sentou, tirou a caneta da mochila e pegou o caderno de provas que o professor estendia. Voltei a atenção para minha própria prova quando notei de relance que a Laura me encarava. Suspirei e tentei me concentrar o máximo possível na avaliação.

Eu fui o último a entregar a prova. O Thiago havia terminado a dele pouco depois do início do segundo tempo e não estava mais na sala. A Laura tinha saído para comprar lanche com a Dafne e o restante da turma ficou na classe, estudando para a próxima prova. Eu também deveria fazer o mesmo, mas decidi ir ver o Thiago, saber pelo menos se iríamos embora juntos.

Tentei falar com ele pelo celular, mas estava dando ocupado, franzi o cenho. Eu sabia onde ele fumava, então fui até o local.

Quando cheguei o vi encostado na parede com a perna direita dobrada e o solado do pé também encostado na parede, o cigarro na boca e o celular no ouvido. O Thiago não percebeu minha presença, o lugar era mal iluminado por ser na lateral do prédio. O vi buscar o cigarro da boca e o segurar entre os dedos, para ter a boca livre e resmungar a resposta para a pessoa do outro lado da ligação.

Senti meu coração palpitar ao vê-lo sozinho ali.

O Thiago podia não ser do estilo “príncipe nórdico” como o Guilherme, mas era certo que ele tinha uma beleza apenas dele, um jeito todo misterioso, recatado, beirando o frio, algo que me prendia.

Acabei me pegando sonhando acordado por um instante, me vi chegando nele naquele lugar escuro, parando na sua frente e beijando aquela boca enquanto ele se mantinha na mesma pose indiferente. Meu estômago chegou a contrair ao imaginar aquela bobeira.

 Porém, meu momento de contemplação e devaneio foi interrompido por aquela frase que surgiu e me tirou totalmente foco.

— Não, você não está dizendo nenhuma inverdade, Lu. Tu tem razão. Eu sei muito bem o que ainda sinto por seu irmão. Ele foi o primeiro cara que amei..., que amo, sabe lá. Afinal, o amor não é um sentimento que se desfaz assim, do nada. Mas o problema é que...

Thiago foi interrompido e enquanto a pessoa do outro lado provavelmente argumentava, ele suspirou cansado, deixou o cigarro cair na calçada e saiu da pose em que estava para pisar na bituca acesa. Com a mão agora desocupada, ele a elevou à cabeça.

— Não, não. Aí você está equivocada. Eu não estou iludindo ninguém. Eu estou apenas tentando seguir em frente e tirar de vez o Guilherme da minha cabeça. Você acha que vou ficar o resto da minha vida remoendo um sentimento que não pode ser vivido?

Houve uma nova pausa, a qual foi cortada de forma alterada.

— Eu quem não quero, Lu? Eu? E o que a sua família fez? E a opinião do próprio Guilherme? Lu, pelo amor de Deus, chega disso, por favor... — ele esfregou a mão no rosto. — Eu sei que você só quer ajudar, mas não dá. É sério.  

Eu tinha ouvido o suficiente, resolvi voltar para sala. Era dolorido continuar ouvindo aquela conversa, principalmente depois de ter escutado o: “Ele foi o primeiro cara que amei..., que amo...”.

Não que eu não imaginasse algo do tipo, mas depois de tudo que ele havia me contado, eu quis acreditar que o Thiago não amava mais o Guilherme.

Voltei para sala de aula e minha cara de desânimo foi percebida imediatamente pela Laura e pela Dafne.

— Onde você estava? — a Laurinha quis saber. — E que cara é essa? Alguém morreu?

— Meu relacionamento, antes mesmo de começar.

— Você está namorando?

A Dafne perguntou radiante, totalmente fora do espaço e tempo.  

— A pergunta não é mais essa, Dafne — a Laurinha respondeu, impaciente. — Você não ouviu o que ele disse? A pergunta agora é: vocês terminaram? — ela inquiriu, batendo a mão na minha carteira. — Não me diga que você foi averiguar sobre as minhas suposições e ele te deu um pé na bunda?

— Ele é da nossa sala? — continuou a Dafne animada, fazendo perguntas fora do tempo real.   

Eu cruzei os braços sobre a carteira e deitei minha cabeça sobre eles.

— Nada disso, nem nos falamos ainda — respondi com a voz abafada.

— Caio, me explica...

Mas não teve como, o sinal tocou e o professor entrou na sala, pedindo que desligássemos os celulares e deixássemos somente canetas sobre a mesa, achei melhor assim, não estava a fim de dar explicações para ninguém.

O Thiago entrou alguns minutos depois. Atrasado como sempre. Mas eu não estava me importando, desta vez fui quem não quis olhá-lo.

Não foi nenhuma surpresa ele ter sido o primeiro a entregar a prova, estávamos ainda na metade do primeiro tempo. Achei que certamente ele não me esperaria, mas mantive uma pequena esperança. Porém, quando terminei a prova e não encontrei nem ele e nem a moto dele no estacionamento, eu quis não me surpreender, mas foi difícil.

Fui esperar no carro da Laura e liguei o celular, nenhuma mensagem também.

Novamente senti aquela dor que achei que não sentiria tão cedo. Aquela dor que parece lacerar o peito devido a uma rejeição. O Thiago chegou e foi embora sem me cumprimentar, sem mandar nenhuma mensagem, sem me ligar. Estava me sentindo um trouxa. Aquilo não era namoro. Aquilo não era “estar tentando tirar o Guilherme da cabeça”.

Revoltado, agi da pior forma que se pode quando está de cabeça quente, mandei uma mensagem via celular. Ele havia saído a mais de uma hora, certamente deveria ter chegado em algum lugar e poderia ver a mensagem.

O texto foi simples: “Achei que estivéssemos namorando, mas não estamos agindo como namorados. É melhor esquecer. Isso não vai dar certo. Caio.”.

O celular tocou em resposta, meu coração deu um salto. Eu ponderei por um segundo se aceitava ou não a ligação, mas era preciso. Respirei fundo, e mesmo receoso, eu decidi atender.

— Alô?

— Por quê? — foi à pergunta disparada do outro lado da linha.

— Pensei melhor, acho que não vai dar — respondi sério. — Tá na cara que somos incompatíveis, Thiago — eu falava rápido, sem pensar, vendo meu hálito ofegante sair como fumaça da minha boca. A temperatura ainda estava baixa aquela semana. Sentia meu nariz gelado, a ponta dos meus dedos gelados, mas o meu coração não, esse não gelava nunca, continuava acelerado, batendo em um ritmo frenético contra o peito. Quase querendo pular para fora. Thiago não disse nada, nem contestou. Então eu prossegui com minhas justificativas. — Eu sou um puto de um egoísta. Não gosto de ser ignorado, não quero esperar para transar com você. Também acho que está me escondendo alguma coisa. Gays curtem transar, homens curtem transar. Colocamos o sexo em primeiro lugar. Você pode estar escondendo o verdadeiro motivo para não querer fazer sexo comigo, como um trauma, uma doença...    

Ele ficou em silêncio por um tempo que pareceu uma eternidade. Achei mesmo que o Thiago fosse tentar se justificar, e gritar que não falou comigo porque chegou atrasado, que estava fazendo extras no serviço, ou inventar alguma outra desculpa, esfarrapada que fosse, mas ainda assim que demonstrasse que ele se importava e que não queria me perder. Também pensei que me chamaria de louco por levantar aquelas suspeitas idiotas sobre sexo e doenças, e riria na minha cara. Mas não, não foi como pensei, a resposta que obtive foi tão fria quanto o iceberg no qual o Titanic bateu.

— Se é o que pensa.

Ele não poderia ao menos ter tido a delicadeza de perguntar: “Você pensa isso mesmo?”.

Eu não consegui segurar. Doeu demais. As lágrimas vieram com força.

— Não, não é o que eu penso, Thiago — respondi, tentando não demonstrar que estava chorando. — Mas eu ouvi a droga da sua conversa no telefone com a Luciana. Se o que você quer é o Guilherme, então pare de mentir para você mesmo. Você não consegue tirar ele da cabeça, entenda essa merda de uma vez, engula esse orgulho idiota e volte para ele, porra! — concluí em um grito e desliguei o telefone daquela forma malcriada.

Doeu tanto, e eu chorei tanto, como chorei.

...

Para não pensar no Thiago e no namoro que terminou sem mal começar, eu enfiei a cara nos estudos. Também evitei as redes sociais e os bate-papos no Whatssap.

A Fran e a Jess me bombardearam com perguntas indignadas sobre a minha atitude. Porém, a Luciana até me adicionou no Facebook quando soube que dei o fora no Thiago, me mandando uma mensagem privada dizendo que eu tinha tido uma postura louvável. E para contrapô-la, o Guilherme me mandou outra MP me chamando de trouxa.

Cara, como ele conseguia ser tão insuportável?

Eu só respondi que eu era mesmo trouxa, e que na verdade ele deveria beijar os meus pés por ter saído de livre e espontânea vontade do caminho dele. Então o deixei falando sozinho, não sei por que eu ainda o tinha na lista de amigos, poderia tê-lo bloqueado desde o começo, mas, talvez, no fundo, eu achasse divertido bater boca com ele.

Apesar de conseguir evitar o Thiago no mundo virtual, não consegui fazer o mesmo na vida presencial. Eu o via entrando e saindo da sala de aula todos os dias. Sempre com seu jeito indiferente, chegando atrasado, pedindo licença e sentando-se isolado em seu lugar. Era pouco, mas era o que eu conseguia ter dele.

Pensava que uma hora ou outra chegaria a notícia de que ele e o Guilherme haviam reatado. Mas enquanto aquela notícia não vinha, eu ficava aliviado quando perguntava para as meninas (Fran, Jess e Luciana) e a resposta era sempre negativa.

A semana de provas finalmente acabou.

Laurinha me avisou que não iria na semana de entrega de notas porque precisava se preparar para a viagem, e que acompanharia o lançamento de notas pela internet. Eu decidi que também não iria naquela semana, porque estaria sem carona. Ela riu e me chamou de preguiçoso. Mas era apenas uma desculpa, se eu podia evitar a tortura de ver o Thiago por uma semana, antes das duas que teríamos de férias, eu evitaria. 

No sábado de manhã fui até a casa da Laura ajudá-la com os preparativos para viagem.

— Ainda não me sinto bem pelo que aconteceu, Caio — a Laura comentou, dobrando o sexto moletom para colocar na mala. — Eu não pensei que seria tão radical ao ponto de terminar seu namoro.

— Eu não te entendo, Laurinha. Você critica o meu namorado, bota mil e uns defeitos no cara e agora se sente mal por eu ter terminado?

Tirei o sexto moletom que ela havia colocado na mala e o devolvi para dentro da gaveta do guarda-roupa de onde ela havia retirado.

— Além disso, te contei o motivo real pelo qual terminei.

— Mas a minha intenção era que você namorasse o deus nórdico, não que mandasse o ex dele de volta para ele. — Ela apanhou o moletom que eu tinha devolvido, olhando-o com estranheza. — Ué, eu não tinha colocado isso na mala?

— Eu tirei. Você não vai passar as férias inteiras de moletom, né, Laurinha? Por favor.

— Você não sabe o quanto faz frio em Ponta Porã, Caio Henrique.

— Ai. “Caio Henrique” não, professor Rubens.

Ela riu e voltou a colocar o moletom na mala.  

— Além disso, eu te chamei para me ajudar a fazer as malas e não desfazê-las — ela me censurou.  

— Que horas vocês vão? — desconversei.  

— Cinco da manhã — informou e fechou a gaveta, passando a retirar os casacos dos cabides.  — Você quer ficar com o uno?

— E vocês vão de quê?

— No carro da mãe do Maurício, é bem mais espaçoso e mais confortável para viajar que meu uninho. E não é bom o carro ficar tanto tempo parado.

— Se não tiver problema para você.

Ela pegou a chave e os documentos do carro na bolsa e me entregou. 

— Confio em você, baby. E acho que você deva sair para curtir durante esses dias, não fique mofando em casa.

Eu a abracei.

— Ou... convide alguém para ficar com você, mesmo que não façam sexo. — ela opinou em meio ao abraço e rimos.

Não tinha como não gostar da Laura, ela era mais que um melhor amigo, era como a irmã mais velha, apesar dela ser ignorante, chata muitas vezes, boca-suja e sincera ao ponto de dizer verdades mesmo que essas machuquem.

...

Eu tinha destino certo àquela noite de sábado, e não era nenhuma balada.

As ruas em torno da Avenida Afonso Pena, a maior da cidade, haviam sido bloqueadas pela força policial. As passeatas que estavam ocorrendo desde a quinta-feira não eram mais pela tarifa do ônibus, que havia sido até congelada pelo novo prefeito, mas eram por várias outras situações como: o desvio de dinheiro público que deveria ser destinado ao Hospital do Câncer ali em Campo Grande; os gastos excessivos para realização da Copa quando o Brasil não tinha transporte, segurança, saúde e nem educação decentes. Por um país sem corrupção, com punição severa para o crime de corrupção. Por igualdade social. Eram várias as bandeiras que se levantariam aquela noite clamando por justiça e direitos.

Como os convites nas redes sociais falavam em manifestação pacífica, as ruas estavam lotadas de jovens, velhos, adultos, profissionais, estudantes e famílias, e até pais com crianças.

A bandeira que eu ergueria junto com a Jess e a Fran era contra o preconceito com os homossexuais, já que em maio o Conselho Nacional de Justiça, havia aprovado uma resolução que obriga todos os cartórios do país a celebrar casamentos entre pessoas do mesmo sexo[1](1). Ou seja, o nosso país de complexas desigualdades sociais havia dado um passo a frente no que se diz respeito à igualdade de direitos. Talvez o Brasil ainda tivesse salvação.

Mas o preconceito ainda existia. E eram por leis mais severas para quem comete crimes movidos pela homofobia que a minha bandeira seria levantada.

Deixei o carro da Laura na Rua 15 de Novembro e subi a pé as cinco quadras que me levaram a Avenida Afonso Pena. Cheguei ao ponto marcado pelo pessoal e admirei a quantidade de manifestantes.

Rapidamente encontrei a Fran e a Jess vestindo camisetas customizadas por elas, brancas e cheias de palmas de mãos coloridas. Elas também carregavam cartazes coloridos e fitas coloridas nos punhos, as cores que compunham o arco-íris e que representavam a bandeira LGBT (2)[2].

Notei que a Luciana também vestia a camiseta da causa gay, talvez por apoiar o irmão, afinal, a Luciana era heterossexual e namorava o Vinny, que estava perto dela e carregava uma placa contra a aprovação da PEC 37 (3)[3].

E, para minha surpresa, foi a Luciana a primeira a me cumprimentar com um abraço. Logo veio a Jess e a Fran que me apertaram entre elas.

— Que bom que você veio, gato — disse a Jess com seu jeito brincalhão.

O Heitor e o namorado também estavam lá, discretos, apenas me acenaram, mas eles também vestiam a camiseta do movimento gay. O Claudio e a Amanda estavam com roupas comuns e carregando cartazes contra corrupção.

Mas àquele que eu mais queria encontrar ali não localizei de imediato, e, como se percebesse minha ansiedade, a Jess envolveu meus ombros e de fininho foi me afastando do grupo.

— O que foi? — perguntei quando paramos.

— Acho que quem você está procurando está bem ali — ela apontou com um gesto de cabeça e eu senti um frio intenso se apossar do meu estômago.

Virei na direção em que a Jess apontava e lentamente meu olhar o encontrou.

Thiago estava com sua habitual camisa preta, por baixo desta uma de malha fria cinza, boné, calça jeans, tênis e parte do rosto pintado de verde e amarelo. Ele estava com um megafone, gritando frases de ordem enquanto o punho erguido exibia uma pulseira colorida, representando que ele também fazia parte do movimento homossexual.

Eu senti algo bom me invadir, uma nostalgia, por recordar do dia em que eu notei o Thiago pela primeira vez, quando ele bateu na carteira da faculdade e encarou o professor Roberto ao defender aquilo em que ele acreditava. Havia sido aquele Thiago por quem tinha me apaixonado.

Com o olhar fixo naquela direção, dei passos que me levariam ao encontro com o Thiago. Queria cumprimentá-lo, mostrar que havia superado nosso término e que gostaria de continuar amigo dele. Porém, um segurar firme no meu braço me impediu.  

— Acho melhor não — disse a Jess, com um olhar sério.  

Antes que a namorada da Fran me explicasse o motivo eu o notei por mim mesmo: “o outro”, ou “o primeiro”, estava lá, há poucos metros de distância do Thiago, vestido com a mesma camisa do movimento gay, com a mão direita em punho erguida para cima, gritando palavras de ordem, e com uma linda menininha sentada em seus ombros.

A criança também vestia a camiseta colorida do movimento e imitava os gestos do irmão e do homem que a levava nos ombros. Ela parecia estar se divertindo, pois tinha um lindo e largo sorriso o qual mal cabia em seu rosto.

Quando pensei que aquela fosse a pior visão que eu teria aquela noite, outra ocorreu em seguida, provando que estava enganado.

Eu vi o Guilherme se aproximar do Thiago quando as câmeras da televisão focaram neles, eufórico, o loiro disse algo no ouvido dele, que fez o Thiago baixar o megafone, e na sequência os dois se beijaram, sendo apoiados por silvos, palmas e gritos das pessoas ao redor.

Tudo que me lembro a seguir foi de ter virado as costas e ter saído correndo, trombando na multidão de pessoas que carregavam faixas, cartazes e gritavam por um país justo.

Ouvi alguém gritar meu nome, depois de algum tempo fui parado por um novo agarre no meu braço. 

— Aonde você pensa que vai, Caio? — veio a pergunta esbaforida. — Eu trouxe uma camiseta para você — a Fran me estendeu a camiseta, respirando rápido devido a corrida.

— É melhor dar essa daí para o Thiago, Fran. Assim eles vão ficar iguais. Uma linda família feliz — eu gritei, não conseguia ouvir nem o som da minha própria voz tanto era o barulho a nossa volta.

Eu comecei a chorar. A Fran me abraçou.

— Você o ama, Caio. Diga isso a ele.

— Nunca!

— Caio? — ela amparou meu rosto com ambas as mãos, me obrigando a encará-la. — O Thiago pode ser tudo. Pode ser batalhador, trabalhador, revolucionário, idealizador, mas algo que ele nunca conseguiu ter controle foi sobre seus próprios sentimentos. Ele pode lutar por qualquer coisa que ele ache justa nesse mundo, Caio. Mas ele levanta a bandeira branca rapidamente quando se trata dos seus próprios sentimentos. Ao contrário de você. Você não desistiu dele mesmo quando ele tentou te afastar. Você é um garoto que busca lutar por quem ama, não desista dessa batalha dessa forma.  

— Mas ele disse que ainda ama o Guilherme. Os dois estão juntos.

— Claro que ama, Caio. Como ele ama a mim, a mãe dele, a irmãzinha, a todos que o rodeiam. Ele nunca vai deixar de amar o Guilherme. Mas não pense que esse sentimento se compara com o que ele sente por você. Além disso, você acha que o Guilherme o ama? Caio, o Gui só vai brincar com o Thiago. Ele não ama ninguém, nem ele mesmo. Se ele amasse o Thiago de verdade, se ele se amasse de verdade, a primeira coisa que ele faria era se assumir e assumi-lo perante a família dele. Mas o Gui nunca vai fazer isso, Caio. Nunca.

— Mas é aquele beijo diante das câmeras de televisão não é se assumir?

— Com certeza aquilo será censurado pela mídia. E mesmo que seja reproduzido, os pais deles nunca se darão ao trabalho de assistir algo que eles nomeiam como “baderna”. Fora que no passado o Guilherme saiu com uma centena de caras e garotas no tempo que eles ficaram separados. E o Thiago muitas vezes o viu, o Guilherme fazia questão de esfregar na cara dele todos os caras com quem ele ficava. Mas me pergunta quantas vezes o Thiago saiu com alguém? Nenhuma. A primeira vez que ele encontrou alguém especial, que ele encontrou você, o Guilherme fez um inferno da vida dele. Ele manipulou a irmã para ficar do lado dele, e estava até mesmo manipulando aquela sua amiga com conversinhas diabéticas pelo Facebook e pelo Whatssapp.

De repente a minha ficha caiu ao me lembrar de como a Laura reagiu quando contei a ela sobre meu namoro com o Thiago.  

— Foi por isso que a Laura agiu daquele jeito estranho quando contei para ela sobre o Thiago?

— Provavelmente. Mas não a culpe. O Gui é uma víbora. Um puto manipulador. Ele tem charme, é um cafajeste, é exatamente o tipo que passa a lábia facilmente nas mulheres.

Eu senti meu coração acelerado.

— Mas, Fran...

— Você o ama, não ama?

— Nunca pensei que amaria alguém tão facilmente na minha vida, Fran. — Eu desabafei e a Fran me amparou novamente em seus braços, arrancando olhares curiosos dos que passavam por nós.

Poderíamos ser um casal bonitinho, se ambos fossemos heteros, é claro.

Ficamos assim por um tempo, até que ela me afastou e entregou para mim a camiseta.

— Então, tome. Pare de ficar na porta, Caio. Se o Thiago não abre o coração para você entrar, é hora de invadir essa porra. Entre sem bater! Você vai se surpreender ao perceber que está morando lá dentro há muito tempo. Olha essa multidão de gente — ela apontou ao redor. — Não podemos ficar parados esperando as coisas acontecerem, precisamos levantar e ir atrás do que queremos. Se o Gui fosse um cara digno do amor do Thiago, eu juro que não estaria me manifestando agora.   

Eu sorri, limpei o rosto e assenti com um balançar firme de cabeça.

— Eu vou falar com ele.

A Fran apanhou a minha mão e ambos corremos desviando dos manifestantes, tirei minha camisa, amarrei no cós da calça e vesti a que a Fran havia me dado. Ela tirou o celular do bolso e me informou a localização que o grupo estava.

— Eles pararam em frente a prefeitura. Vamos, rápido!

Enquanto corríamos, meu peito se enchia de coragem. Mas a minha euforia foi se diluindo conforme fomos nos aproximamos. Percebemos um princípio de tumulto, tinha gente correndo na direção oposta à que íamos. Ouvimos duas explosões, uma seguida da outra, parecia barulho de bomba de efeito moral. Senti um calafrio. A Fran pegou no meu braço, mas alguém atravessou entre a gente e fomos arrastados para lados opostos.

— Caiooooo! ­— eu ainda ouvi o grito dela se afastando.

Mas algo me dizia que eu precisava chegar à prefeitura. Lembrei do que o Thiago havia dito aquele dia no Copo Sujo “que ele seria o primeiro a queimar bandeiras de partidos se caso elas surgissem”.

Parei uma pessoa que vinha correndo para tirar aquela dúvida.

— O que está acontecendo?!

— Chegou uns malucos erguendo bandeiras de partidos políticos e um pessoal começou agredir eles. O Choque interveio, tá a maior bagunça lá, melhor não ir.

Eu nem tive tempo de agradecer, o cara estava longe. Então corri, corri como se minha vida dependesse disso. Ouvi gritos, novos estrondos e explosões.

— Isso é mesmo Campo Grande mesmo? Tá parecendo o que aconteceu em São Paulo, só falta aparecer carro pegando...

— Fogooo!

Quando dei por mim estava no chão, o cara que gritou “fogo” trompou em mim e eu caí, fui pisoteado e não consegui mais levantar. Haviam pisado no meu tornozelo e só percebi onde estava quando um espaço foi aberto. Logo pude ver o motivo: um grupo de vândalos depredava a agência bancária onde algum idiota havia estourado a porta de vidro, provavelmente com coquetel molotov (4)[4].

Tentei me arrastar no asfalto ao ouvir o barulho das sirenes se aproximando, os marginais que explodiram e depredavam a agência saíram correndo. Se eu ficasse ali seria confundido com os vândalos, me desesperei.

— Droga, droga, drogaaa!

Foi quando senti alguém me apanhando pelas costas e logo surgiu outra pessoa na frente e me pegou pelas pernas.

— Vinny?! Roberto?!

— O que está fazendo no meio dessa bagunça, garoto? — bronqueou o Roberto.

— Por isso que eu digo que não devemos desconfiar dos santinhos — resmungou o Vinny.

Senti um alívio imenso, fui levado para onde estava o restante do grupo.

— Achamos ele! — Gritou o Roberto.  

Assim que fui colocado no chão, a Fran e as demais meninas me rodearam, fazendo um milhão de perguntas ao mesmo tempo. A Amanda segurava a irmãzinha do Thiago no colo, que apontava para a minha perna e gritava assustada: “dodói, dodói”. Mas foi na direção de um “me solta” que minha atenção se voltou. O Guilherme tentou impedir o Thiago de vir na minha direção, mas ele se desvencilhou do agarre dele e o grupo abriu espaço, então ele se ajoelhou para me alcançar e me abraçou.

— Porra, porra! O que pensa que está fazendo, caralho? Você é idiota, Caio? Quer nos matar do coração, é?!

De fininho a Fran foi afastando o pessoal de perto da gente.

— Vamos levá-lo para o hospital e... — ele sugeriu e ao olhar em volta percebeu que estávamos sozinhos. — Mas para onde foi todo...

Eu toquei o rosto dele.

— Eu estou aqui. E estou bem.

— Claro que não está bem. Sua perna está machucada, seu rosto está arranhado e...

Eu o interrompi. Ter a boca dele se movendo tão perto da minha foi tentador, então fiz ele se calar ao puxá-lo pela nuca e colar minha boca com a dele.

O Thiago ficou sem entender a princípio, mas não demorou a corresponder ao meu beijo. Ficamos assim, nos beijando, acho que por uns dez minutos. Quando finalmente nossas bocas se afastaram, eu fiz aquele comentário idiota.    

— Não era mesmo por 20 centavos, afinal.

Ele riu.

— Thi, eu...

— Eu sei — ele quem me impediu dessa vez, colocando um dedo sobre meus lábios. — Eu quase enlouqueci quando a Fran apareceu dizendo que você estava indo na direção do tumulto. Só me impediram de ir junto com o Vinny e o Roberto porque a Vitória não parava de chorar.

— Eu também quase enlouqueci no meio daquela bagunça. Meu coração quase parou quando imaginei você quebrando e queimando as bandeiras dos partidos e os caras pirando e tentando te bater.  

— Nem tive tempo de fazer isso, assim que a discussão começou os vândalos apareceram aumentando o tumulto, estavam apenas esperando um estopim. Acabou que o professor Roberto tinha...

— O professor Roberto é um babaca, Thi. A merda de uma agência com portas quebradas não cobre os quinhentos anos que o povo brasileiro vem sendo estuprado pelo governo. Essas vozes que gritaram hoje e ecoaram pelos quatro cantos do nosso país valeram muito mais que isso. Foi você quem me ensinou isso.

— Eu? Quando?

— Quando você me acordou no meio da aula, depois de ter peitado o professor Roberto gritando e batendo na mesa: “Não é só por 20 centavos!” — eu ri, ao tentar imitar a voz dele, então voltei a ficar sério. — Aquele momento eu senti algo revirando dentro de mim. Foi naquele momento que eu me apaixonei por você. Eu amo você.

O Thiago segurou meu rosto e estava se aproximando da minha boca quando uma mão em seu ombro o impediu de continuar, era o Gui. Franzi o cenho na direção dele. Pelo jeito, ele não iria mesmo desistir.

— Será que podem deixar a lua de mel pra depois do casamento? Essa perna vai apodrecer se não levarmos a noiva para o hospital agora.

— Não seja tão dramático, Gui — resmungou o Thiago. — Vem, me ajuda a erguer ele.

— E por que eu tenho que ajudar o meu rival? Eu quero mais é que a perna dele infeccione e ele morra com tétano.

— Tá. E você veio nos chamar por que então?

— Para interromper outro beijo de meia hora? — falou irônico, como se fosse óbvio.  

— Larga de baboseiras e me ajuda a erguer ele.

— Você ouviu que ele está falando que não aguenta te carregar porque está gordo, não é?

Fiquei envergonhado com aquela observação, que, de alguma forma, era verdadeira.

— Para de falar merda, Guilherme! — retrucou o Thiago. — Me ajuda, porra.  

— Sabia que você é extremamente chato quando começa a mandar nas pessoas, Thiago?

— Vai logo, pega as pernas dele.

Dei uma alta gargalhada e estranhamente eu me vi naquela posição: entre os olhares confusos de dois amores do passado.

Não tenho a mínima ideia do que me reserva o futuro e se no final haverá “felizes para sempre”. Aliás, tenho uma única previsão. E essa eu sei que será certeira: terminarei a noite com uma bela bota de gesso.

Fora isso, a única certeza que quero ter é de continuar morando por muito tempo dentro daquele amplo e espaçoso coração o qual eu havia invadido sem bater.

Sabe de outra coisa? Cansei. Não quero ser só mais um invasor, um visitante, estabelecerei residência fixa a partir de agora. Também não vou mais me incomodar ou me intimidar com os antigos moradores... (Guilherme).

Observei de soslaio o loiro que continuava resmungando enquanto pegava minhas pernas. Ele tinha chegado primeiro, tem seus direitos, mas na realidade eu também tenho os meus e decidi que vou continuar me manifestando e lutando por eles.  

Continua...

    

Notas:

[1] Resolução Nº 175 de 14/05/2013 - Dispõe sobre a habilitação, celebração de casamento civil, ou de conversão de união estável em casamento, entre pessoas de mesmo sexo. (Referência: Site: cnj.jus.br/atos-normativos/documento=1754)

[2] LGBT – é o acrônimo das palavras Lésbicas, Gays (homossexuais masculinos), Bissexuais, Transgêneros, Travestis. Em 1990 foi incluído o “I”, para interssexuais. Porém, ainda não é um termo popularizado (Fonte: Wikipédia).  

[3]Proposta de Emenda Constitucional 37/2011, abreviada como PEC 37 - foi um projeto legislativo brasileiro que se aprovado proibiria investigações pelo Ministério Público. Como resultado das Jornadas de Junho de 2013, o PEC foi rejeitado como antidemocrático. (Fonte: Wikipédia);

[4] Coquetel Molotov - O coquetel molotov (português brasileiro) é uma arma química incendiária geralmente utilizada em protestos e guerrilhas urbanas.

 

No Brasil, a posse, fabricação ou o uso de tal artefato configura crime de "posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito", estando o infrator sujeito à pena de reclusão de, no mínimo, três anos até o máximo de seis anos e multa, conforme disposto na Lei 10.826/03, Art. 16, Inciso 3º.

 

A sua composição inclui uma mistura líquida inflamável e perigosa ao ser transportada, como petróleo, gasolina, ácido sulfúrico, clorato de potássio, álcool e éter etílico, misturados no interior de uma garrafa de vidro, e pano embebido do mesmo combustível na mistura dum pavio. O pavio pode ser desnecessário dependendo da mistura se for arremessado sobre o alvo, dependendo da composição química no interior e a faísca produzida no choque da garrafa ao se arremessar contra o alvo (Fonte: Wikipédia).



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