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História Equal - Norminah. - Two Janes.


Escrita por: norminahanonimo

Notas do Autor


Mais um capítulo de Equal pra vocês!

Capítulo 3 - Two Janes.


Fanfic / Fanfiction Equal - Norminah. - Two Janes.

Outubro 2016. Santa Ana, Califórnia. 

Dinah Jane POV.

Depositei com firmeza o pé coberto por um scarpin preto no primeiro degrau metálico, levantando-me do macio estofado de couro preto e podendo ver com clareza a fina chuva bater contra o vidro do lado de fora. Logo, o ensurdecedor barulho das hélices do meu Bell 525 Relentless preto e vermelho se fez presente, fazendo as gostosas rajadas de vento bagunçar os meus cabelos. O comandante encarregado rapidamente surgiu segurando um guarda chuva preto e estendendo a mão direita para que eu pudesse assegurar-me em descer os degraus restantes. 

:- Bem vinda de volta à Santa Ana, Srta Hansen. Suas malas serão descidas o mais rápido possível para não tomarem chuva.

Disse numa mistura de inglês com sotaque alemão mais alto do que o normal, já que as hélices ainda rodavam fazendo aquele barulho chato ecoar todo o local. Olhei por cima do óculos escuro a grande entrada do aeroporto que dava para a pista principal, onde crianças penduradas no janelão de vidro, achavam o máximo a presença do helicóptero. 

:- Não esqueça a malinha do meu notebook, tenho arquivos importantes nele. Perdê-lo seria como perder um filho.

:- Sim senhora! — Assentiu com a cabeça, acompanhando-me com o guarda chuva até a área coberta.

Respirei fundo, podendo perceber a diferença de ar entre Califórnia e Alemanha. Confesso que amo o frio exagerado de lá, das roupas, da decoração antiga, mas, amo ainda mais o ar quente daqui, das praias, do estilo que só Santa Ana tinha. Era bom saber que, depois de dois anos, eu estava quase, definitivamente, de volta. 

Já dentro do aeroporto, mais especificamente na área onde aguardava os carros, fiquei entretida em meu tablet prata enquanto esperava o antigo e inseparável motorista que me levaria até em casa. Por mais que eu odiasse atrasos, daria um desconto por saber como o trânsito daqui era um caos, principalmente quando chovia. 

:- Querida, Dinah, devo me desculpar pelo atraso. — Virei sobre os calcanhares ao reconhecer aquele sotaque italiano, vendo o senhor de cabelos brancos e engravatado correr mancando em minha direção. Antes que ele dissesse mais alguma coisa, o abracei como uma criança abraça seu pai depois de longos dias longe. 

:- Joseph! — Soltei entre suspiros manhosos contra o seu cheiroso paletó preto. — Como é bom lhe ver novamente. 

:- Oh! Menina... — Afagou os meus cabelos com uma mão e a outra apalpou a parte de trás do meu ombro esquerdo coberto pela alça da camisa branca. — Como você está linda. Com todo o respeito, claro. 

Sorri da forma mais sincera com aquele elogio que ele sempre fazia quando me via, separando de seus braços. Joseph era motorista particular do meu avô, ainda era jovem quando resolveu sair da Itália para morar por aqui, passou dias perambulando pelas ruas à procura de emprego até achar o meu avô que, estava precisando de alguém que amasse carros tanto quanto ele para dirigir particularmente enquanto ao mesmo tempo testavam-os. Joseph logo aceitou, ganhando em troca um bom salário, teto, comida e uma família. Depois que vovô faleceu, ele continuou na família Hansen fazendo o seu trabalho da melhor forma possível. Desde então, não conseguimos mais viver sem ele. 

:- Como está elegante! — Me referi à sua impecável vestimenta. Ele sorriu tímido, pegando o carrinho cheio de malas ao meu lado. 

:- Hoje é um dia especial, não é todo dia que temos o orgulho da família por perto, menina. 

:- Creio que não esteja querendo me fazer chorar, Jo. Demorei horas para fazer essa maquiagem e colocar esses cílios que estão fazendo os meus olhos coçarem desde quando saí de Berlim.

Sua gargalhada gostosa foi iniciada, enquanto tomava a minha frente para abrir a porta de passageiro do Mercedes-Maybach Pullman preto. Um dos cinco carros recém lançados que enviei especialmente para ele e minha mãe há um mês atrás.

:- Estava sentindo falta desse seu bom humor, menina. 

Adentrei ao veículo, depositando minha bolsa na cor azul juntamente da maleta do notebook. Meu corpo automaticamente relaxou sobre o estofado de couro enquanto ele fechada a porta e se direcionava até o porta-malas para colocar as minhas bagagens.  

Enquanto Joseph terminava de organizar as enormes malas, aproveitei para dar algumas checadas nos e-mails em meu celular e dar uma rápida olhada nas redes sociais. 

:- Agradeço por esse carro também. Não sabe o quanto fiquei feliz em estar realizando mais um sonho. — Ele disse imensamente grato e animado assim que adentrou ao carro, alisando o luxuoso painel na cor preta. Ergui a cabeça, retirando os olhos do iphone dourado.

:- Sabe que mandei mais pelo senhor do que a minha mãe, não é?! Ela não conhece absolutamente nada, apenas exige conforto, mas o senhor conhece e muito bem. Dirigiu até carroça para o meu avô, não iria deixar passar batido essa surpresa em ser o primeiro à testá-lo. 

:- Sou imensamente grato pelo o seu grande coração, querida. E devo admitir, ele parece uma nave.

Seus olhos azuis transmitindo animação correram pelo retrovisor e depois tornaram à fila de carros em frente. Suspirei ainda mais satisfeita em vê-lo tão feliz, tendo a plena certeza de que meu avô também estaria, de onde quer que esteja. 

:- O levarei até a Arbus na Alemanha, verás carros tão melhores quanto esse sendo montados. — Ter dito aquilo para ele, foi como dizer à um menino que o levaria para uma fábrica de video games. Seu sorriso era largo, de orelha a orelha.

:- Ah, menina! Que isso. Não precisa não, só com esse eu já me sinto muito bem. Alemanha?! Não, não... 

:- Não aceito um não como resposta. Quando eu me acertar por aqui e voltar para Alemanha, quero que fique uns dias em casa e vá até a fabrica comigo. 

:- Está bem... Você venceu. O que não faço por vocês? — Disse por vencido, eu sorri para ele que hora ou outra encarava-me pelo retrovisor. 

Ficamos o caminho todo jogando conversa fora, ele contando como estavam as coisas por aqui e eu dizendo como eram as coisas por lá. Estava me sentindo a mesma garota de dezessete que era levada por ele até a escola enquanto contava sobre os acontecimentos conturbados de uma adolescente. Acabou até me fazendo esquecer por um momento, os problemas que tinha para resolver.

Retirei o óculos escuro, percebendo a chuva agora cessada, saí de dentro do carro enquanto mantinha os olhos fixos na faixada da casa que me trazia boas lembranças. Ah! Aquela casa... Por mais que tenha mudado tanto, ainda me trazia coisas boas, afinal, cresci aqui dentro. Não é à toa que ajudei minha mãe à comprar todo esse terreno, podendo ficar com ela e mais duas casas ao lado, aumentando ainda mais o seu tamanho e aconchego. Adoro lembrar a cara que mamãe fez quando eu lhe entreguei o contrato, e adoro mais ainda, lembrar o fato de que posso ajudar, com qualquer coisa, a mulher que sempre esteve ao meu lado.

:- Dinah! — Eu reconhecia aquela voz de formiga. Meus olhos desceram até a garotinha de cabelos longos negros, usando uma adorável jardineira jeans e pés livres de quaisquer calçados,  correndo até onde eu estava com um imenso sorriso no rosto. — Você veio! Eu sabia que viria! 

Larguei a bolsa e a malinha do notebook no chão, indo de encontro à ela para sentir aqueles braços magrelos envolvendo meu pescoço e o cheiro gostoso de seus cabelos preenchendo os meus pulmões. Aquele bebê chorão que nos perturbava o tempo todo estava uma mocinha linda. É difícil de acreditar que até ontem, aos meus dezessete anos, minha mãe veio com a repentina notícia de que estava grávida do meu padrasto. 

:- O que você anda comendo, monstrinho? Daqui a pouco acaba me passando. — Apertei o seu nariz entre

os dedos, fazendo-a sorrir com os olhos cheios de lágrimas. Eu sabia o quanto ela sentia falta de ter-nos por perto. 

:- Mamãe anda me dando aquelas vitaminas ruins. — Fez uma careta engraçada, e eu acabei fazendo o mesmo ao lembrar daquele gosto horrível de peixe cru. 

:- Te entendo, ela dava aquele negócio ruim pra mim e Marie também.

:- Dinah, querida! 

Aquela voz calma e tão conhecida por mim, tocou em meus ouvidos como música, causando uma extrema aceleração em meu peito. Regina largou-se de mim, virando em direção à senhora emocionada que caminhava em nossa direção. Estava mais linda do que a última vez que lhe vi. Os cabelos mais longos, lisos e num tom meio chocolate. O corpo mais magro, provavelmente passou mais tempo na academia fazendo aquelas dietas loucas de sempre. Depois que teve Regina, ficou com medo de engordar mais do que o normal, já que toda a família infelizmente tem tendência.

:- Pensei que novamente não fosse dar certo de você vir. Como senti a sua falta. — Dizia distribuindo beijos estalados por todo o meu rosto. Eu poderia reclamar dela estar borrando em segundos as longas horas que passei fazendo a minha maquiagem, mas a saudade era tanta que eu não estava ligando. — Como é bom te ter por perto. Estava cansada de vê-la por video o tempo todo, precisava tocar pra ter certeza de que estava bem mesmo.

:- Ah, mãe! Como senti a sua falta. — Afundei o rosto na curva de seu pescoço, matando a saudade daquele abraço e o inconfundível cheiro de seu doce perfume. — Saudade do seu abraço, cheiro, voz, toques, puxões de orelha... Tudo. 

:- Então vamos matar o que está nos matando?! Vamos entrar! Sua irmã está aqui. 

:- Marie também está aqui? — Perguntei surpresa. Faz tanto tempo que não a vejo, nem sequer conversamos por mensagem, e-mail, video, qualquer coisa direito. Sentia falta de ver a minha metade dos olhos claros. 

:- Ela precisou ir até a editora para resolver mais alguns capítulos do livro, mas já já está voltando. Enquanto isso, você pode se instalar, tomar um banho e comer alguma coisa.

:- Eu topo! Estou precisando de um banho e bastante comida. — Falei com a voz manhosa, ela sorriu. — Joseph, você coloca as malas para dentro, por favor?

Ele que observava-nos encostado no carro, assentiu com a cabeça, mexendo-se rapidamente para pegar as minhas coisas. 

:- Dada, eu encontrei com a Mila quando estava indo para a escola. Ela trabalha na escola de música aqui perto. — Minha atenção foi tomada por Regina parada ao meu lado. — Ela perguntou como você estava, e disse que sente a sua falta. 

Camila! Há quanto tempo não a vejo?  Para ser mais exata, desde a última vez que vim à Califórnia. Não sei como ainda consegue sustentar aquela louca vontade de adolescente em continuar sendo a minha melhor amiga, afinal, atenção é algo que não estou conseguindo dar à alguém que não seja o meu inseparável notebook.

:- Vamos entrar antes que volte a chover, e você conta mais coisas lá dentro, Regina. 

A senhora me puxou pelo ombro, enquanto a pequena pegava as duas bolsas caídas no chão e corria de volta para a casa. 

Enquanto minha mãe aprontava algumas coisas para me alimentar, já que segundo ela, eu estava mais magra do que o normal, aproveitei para tomar um banho quente de banheira e colocar uma roupa mais confortável. Regina ficou alguns minutos dentro do quarto comigo, perguntando inúmeras coisas como toda criança de dez anos fazia. Estava sentindo falta disso também; do grude que ela era comigo e com Marie. Falando nela, estava mais do que ansiosa para revê-la, poder saber o que mudou, como está indo a sua vida e todas essas coisas de sempre.

:- Hmm! Sinto cheiro de coisa boa. — Desci os dois últimos degraus com os pés descalços, seguindo o delicioso cheiro que vinha da cozinha. Gina estava sentada no banco em frente ao balcão, balançando as pernas animada enquanto copiava alguma coisa em seu caderno rosa. Parei próximo à soleira entre o corredor da sala e a cozinha, vendo minha mãe lavar algo na pia. — Me diga que é aquele macarrão gostoso que só a senhora sabe fazer.

:- Acha que eu não iria fazer sabendo que é a sua comida preferida?! —  Ouvir aquilo me fez sorrir largamente, enquanto direcionava-me até o balcão e sentava no banco ao lado de Regina concentrada em sua lição. 

:- E é por isso que eu amo estar aqui. — Respondi risonha, vendo-a picar alguns pedaços de linguiça na tábua de carne sobre a pia de mármore preta. — Eu amo as comidas que Margaret faz, mas não chega aos pés da sua.

:- Fico feliz em ouvir isso, pensei que fosse preferir mais ela do que eu. 

:- Nunca! — Ela ergueu o olhar para mim e sorriu. Varri com os olhos toda aquela cozinha bem decorada; os armários num jogo preto e branco, o balcão de madeira branca no meio da cozinha, ao lado, a pia de mármore preta, o fogão elétrico localizado ao lado da pia, a geladeira bi-portas de aço e o chão brilhoso de pisos gélidos escuros. — O que a senhora fez com Denise? 

:- Tirando férias. Ela estava precisando mesmo, os filhos queriam viajar, ela não tinha tempo e nem dinheiro no momento, então, resolvi adiantar os três salários dela junto das férias. Nesse exato momento deve estar em Orlando com orelhas de mickey.

Neguei com a cabeça, imaginando a loucura que deve estar sendo a minha mãe se batendo com toda essa imensa casa. Ela tem o coração muito bom, principalmente quando se trata de Denise, que a ajuda em tudo desde quando me conheço por gente.

:- Também quero ir à Orlando. — Virei o rosto para dar atenção à minha irmã carregando um semblante emburrado.— Mamãe disse que só iria com a família toda, porque não tem graça ir só nós duas.

:- E ela tem razão. — Eu disse, vendo a senhora depositar o prato branco recheado de um suculento macarrão em minha frente. — Prometo que em breve iremos todas juntas te levar para conhecer. 

:- Você já foi lá?

:- Sim. Ganhei de presente de aniversário do meu pai quando completei quinze anos. — Enrolei o garfo dentre os fios de macarrão. — É incrível. Tenho certeza que irá gostar. 

:- Posso ir vestida de princesa? 

:- Deve! Você é uma princesa. — Seu sorriso se alargou com aquela resposta. 

Não faz nem duas horas que estou aqui, e já me sinto bem renovada, mais leve. Estar ao lado da minha mãe e da minha irmã trazia-me paz imediata.

:- E então, Dinah, como andam as coisas por lá?

Dei mais uma garfada no macarrão, levando o talher até a boca e gemendo em satisfação daquela delícia de comida. 

:- Uma loucura, a senhora sabe.— Limpei os lábios com o guardanapo.— Cada dia a empresa crescendo mais, modelos novos surgindo para distribuições das marcas famosas, coisas a pagar, propostas de expansão da loja, e assim vai.

:- Fico feliz com essa grande conquista sua, querida. — Suas palavras demonstravam sinceridade, o que me fez suspirar satisfeita com todo o meu esforço. — Por mais que tenha sido difícil aceitar que estivesse tão longe de mim, foi bom, valeu a pena todo esse seu esforço em estudar na Alemanha. 

:- Fico feliz em saber que todo o meu esforço valeu a pena não só à mim, mas para a senhora também. Eu tenho o seu orgulho e bem estar, que eram os objetivos essenciais que eu queria conquistar primeiro.

Ela sorriu abobada, carregando aquele mesmo brilho nos olhos de quando me formei em engenharia mecatrônica. Foi um dos dias mais emocionantes para mim, afinal, toda a família viajou de surpresa até a Alemanha somente para me ver formar. 

:- Agora mudando de assunto... E os homens de lá? Não se encantou por nenhum ainda?

Todo aquele clima carinhoso e fofo sumiu num piscar de olhos juntamente do meu semblante sereno e calmo. Eu sabia! Aquela maldita pergunta que ela insistia em fazer, sabendo que eu não tenho tempo para paquerar ninguém.

:- A senhora sabe que eu trabalho tanto dentro de uma sala, não tenho tempo pra ter olhos em qualquer outro lugar que não seja o notebook. 

:- Mas, sei lá, um que esteja trabalhando contigo pode lhe chamar a atenção, não? Os alemães são lindos, e duvido que não tenha reparado. 

Rolei os olhos por saber que ela tinha razão. Não posso negar, reparei em alguns, mas nenhum chamou a minha atenção do modo como eu queria. 

:- Eu reparei, nada que fosse tão extraordinário, só... Normal. — Dei de ombros e ela me olhou incrédula. — Talvez alemão não seja o meu tipo.

:- Para encontrar o seu tipo será necessário rodar o mundo todo?! Porque eu quero ter netos ainda, preciso ver vocês se casando na igreja, escolhendo vestidos, e eu poder chorar emocionada dizendo: "Essa é a minha filha! Ela está se casando."

:- Eu não vou me casar! — Regina rebateu, roubando as nossas atenções para si. Ela continuava concentrada em sua lição, rabiscando algo em seu caderno. — Meninos são nojentos. Eles fedem!  

:- Está vendo? Se eu for esperar até que Regina perca essa inocência de criança, estarei velha caquética. 

:- Mãe, não exagera! — Apertei minhas têmporas extremamente cansada para ter de aturar seus dramas. — As coisas não acontecem quando a gente quer. Tudo tem a sua hora, e quando for, a senhora nos verá casando. 

:- Espero que não demore! E quero no mínimo, cinco netos seu e mais cinco de Marie. 

:- Céus, mãe! Não. 

:- De onde vem os bebês? — Regina novamente perguntou atraindo as nossas atenções. Ela mordia a ponta do lápis, como se pensasse sobre aquela pergunta que havia acabado de fazer.

:- Gina, querida, faça a sua lição quietinha, vai. 

:- Monstrinho, quando você estiver mais velha, te contarei melhor.

Toquei seu ombro direito, fazendo-a concordar com a cabeça e dar-me aquele sorriso lindo faltando alguns dentes. Regina retornou sua atenção ao caderno rosa, arrastando o lápis sobre a folha para escrever algo que lia no livro ao lado.

:- Cadê o capeta do seu marido? — Perguntei, voltando a atenção para a minha mãe curvada sobre o balcão beliscando um pouco de macarrão em meu prato. Ela imediatamente ergueu a visão ao ouvir o carinhoso apelido que lhe dei quando ainda era nova e não aceitava que ela estivesse com outro que não fosse o meu pai.

:- Já mandei você parar de chamá-lo assim. — Chamou-me a atenção, eu dei de ombros e segurei o riso. — Deve estar trabalhando. 

:- Bom mesmo que trabalhe, porque deixei bem claro que os meus fundos seriam somente para a minha família. 

:- Você não tem mais dezessete anos, deveria parar de ter essa mentalidade infantil. 

:- Ok, mamãe, ok... Não vamos brigar por besteira. Quero aproveitar esse tempo que tenho para acertar a filial daqui e matar as saudades de vocês.

:- Vai abrir uma filial da Arbus por aqui?!

Antes que eu pudesse entreabrir a boca para lhe dar a resposta concreta, a porta da sala foi batida e uma voz cantarolando rouca ecoou desde a sala até a cozinha. Meus olhos desesperadamente encontraram com aquelas esmeraldas verdes, causando-me um transtorno mental e a emoção de reencontrá-la novamente tomar conta de mim. Ah! Como sentia falta daquela projeto de gótico hippie. Continuava a mesma de sempre, usando aquele estilo Londrino de blusa com touca por baixo da jaqueta de couro.

Ela largou a sacola que carregara em cima do balcão, ainda não acreditando no que estava vendo e veio em minha direção abraçar-me fortemente como se segurasse a metade de seu mundo. Era bom sentir aqueles braços envolvendo-me, o cheiro suave de seu perfume.

:- O que faz por aqui, Alemã? 

Se separou do abraço, deixando com que pudéssemos ver aquelas adoráveis covinhas por conta de seu largo sorriso.

:- Negócios, como sempre. — Respondi entre suspiros cansados.. — O que fez no cabelo? 

:- Nada, apenas tomei chuva. — Colocou alguns fios lisos para atrás da orelha e continuou encarando-me deslumbrada. — Mamãe não me disse que viria. 

:- Não tinha certeza se ela viria mesmo. — Ela respondeu enquanto observava aquela cena entre a gente.

:- Mar, Dada disse que irá me levar para a Disney. 

:- Oh, pequena, você está ai? — Mandou um beijo no ar para ela. Seus olhos tornaram a encarar-me enquanto seus lábios se curvavam em um sorriso tímido. — Senti sua falta, Alemã. E devo admitir, você está cada vez mais maravilhosa. Está bem bronzeada para alguém que mora em um lugar frio.

:- Heiliger Gott! Já ouviu falar em bronzeamento artificial e que na Alemanha também existe verão? — A loira deu a volta no longo balcão branco, pegando um pouco do macarrão no meu prato e depositando um beijo no topo da cabeça da senhora que nos analisava abobada. Mães. — E você, Londrina, o que anda fazendo para estar tão linda assim? Não me diga que está apaixonada.

:- Não exatamente. — Abriu um largo sorriso e suspirou pesado, arqueei uma sobrancelha em desconfiança. — Estou me sentindo bem, apenas. Meu livro está prestes à lançar em uma editora grande.

:- Meus parabéns! Espero que não esteja escrevendo algo sobre aquele seu relacionamento chato com a sua ex louca. — Falei divertida, fazendo-a revirar os olhos impaciente com aquela velha história. Amava perturbar Marie com a sua primeira namorada pirigótica ciumenta que ela tinha arrumado. A garota ou era insegura demais, ou tinha problemas demais. Meu Deus! Eu sei que a minha irmã é linda de morrer, mas, nem precisava de tanto. Curvei-me para pegar um pedaço de pão, mergulhando-o no molho.

:- Se forem começar a falar sobre esses papos furados de vocês, me avisem, porque a Regina está aqui. 

Mamãe alertou-nos, cambaleando a cabeça em direção à garota que, analisava a nossa conversa com o cenho franzido. 

:- Você quer falar o que?! Pelo menos não foi eu quem namorou o Siope por seis anos e levou chifre.

Rolei os olhos com aquele comentário, dando mais um motivo para ela gargalhar alto. Odiava o fato de Marie sempre saber os meus pontos fracos, ainda mais em querer lembrar desse maldito acontecimento que fiz questão de esquecer. 

:- Eu pensei que as duas fossem matar as saudades, e não se matarem. — Comentou sarcasticamente a senhora.

:- Coisas de irmãs, mãe. É assim que matamos as saudades. — A loira comentou carregando um sorriso irônico e convencido nos lábios. — Não é, Alemã?

:- É sim, Sapatinha.

                            *  *  *

:- Estoy en Califórnia por ahora y no voy a salir tan temprano. — Enquanto falava com um dos meus advogados no México, meu corpo não parava de se movimentar de um lado ao outro no meio do quarto. O barulho suave das gostas de chuva batiam incontáveis vezes contra o vidro da janela, sendo assim, o único som ecoando o meu quarto. — No quiero una Arbus en México, este país no quisiera tenermos en el inicio, porque iran tenermos por ahora? Porque tenemos nombre? Mucho diñero? No!

Espanhol; O único, entre tantos idiomas, que demorei anos para aprender. Precisei de longas e tediosas horas de aula todos os dias para praticar. Como vovô me dissera um dia; —"se você quer dominar o mundo com qualquer negócio, sendo ele o mais complicado ou simples possível, primeiro precisa-se dominar a si mesmo". E por consequência dessas palavras que atormentaram-me, tive de ter força de vontade em aprender tantas coisas sobre esse mundo, incluindo suas línguas tão difíceis.

:- Srta, tienes que estar acá conmigo. Los compradores estan locos quierendo Arbus Monterrey o cuanto antes. Dicen que las bajas viendas estan dejando las compradoras en crise, y que por tenermos nombre y buenos vehículos, las personas quieren Arbus. — Ele dizia rapidamente em uma voz rouca e arrastada. — Si no aceptar, perderá mucho diñero. 

Bufei irritada, jogando as mechas de cabelo caídas em meu rosto para atrás. Essa ladainha chata dos sócios compradores do México quererem sair por cima da minha empresa porque as outras lojas de carros estão sem recursos e com nomes sujos por venderem latas velhas, está me deixando de saco cheio. Quando eu precisei de ajuda para criar um nome forte no mercado com uma simples parceria, onde eu ofereci uma boa quantia, eles disseram não aceitar marcas desconhecidas e pequenas. Agora a Arbus carrega um grande nome, carros com peças ótimas, qualidade extremamente confiável e reparável, onde todo o público está preferindo comprar um tipo nosso e de mais ninguém. Adoro as voltas que o mundo dá. 

:- Yo soy el propietario desta mierda! Yo comando y tu apenas obedece. Digan que se jodan todos con la crise. No quiero una filial ahí. Si las pernosas quieren un Arbus, vengan para otro lugar y compren. Punto! 

:- Y lo que hago con los-

:- Más una palabra tuya y adios de mi equipo!  

:- Perdoname, Srta. No vamos aceptar la propuesta.

Antes que prosseguisse com a mesma ladainha, desliguei a ligação e fechei os olhos, soltando um suspiro pesado. Se eu realmente ligasse para dinheiro, estaria abrindo uma filial em cada canto do mundo, mas, eu apenas quero um trabalho reconhecido, quero que reconheçam o trabalho que o meu avô dedicou-se durante muito tempo. O dinheiro que eu tenho veio por consequência do árduo trabalho da minha parte, mas tudo o que estou fazendo é um objetivo íntimo meu em enaltecer o homem que tanto lutou para ter o nosso sobrenome em alta. Se não fosse pelas vendas das geringonças antigas dele, minha família não teria uma boa vida desde sempre. Eu não estudaria em uma boa escola, teria uma casa, comida na mesa e etc. Então, eu dei continuidade nisso como uma forma de agradecimento e amor por carros que herdei dele.

Poupe-me!

Duas batidas foram dadas na porta entreaberta, dispersando os meus pensamentos e obrigando-me à virar o corpo para ver Marie, com roupas mais confortáveis e secas, entrando no quarto. 

:- Atrapalho?!

:- Não... Apenas estava resolvendo alguns problemas.— Joguei o celular de qualquer jeito sobre a cama, fazendo-o rolar até parar próximo dos macios travesseiro brancos.

:- Você parecia bem brava, falando em espanhol então... 

A mulher dos olhos claros sentou-se na ponta da cama de casal, cruzando as pernas como índio e mexendo na corda de sua calça de moletom cinza.

:- Meu advogado do México queria tentar me convencer a abrir três filiais por lá. Heiliger Gott! Não acha uma falta de respeito? 

Neguei com a cabeça ainda incrédula com tamanha cara de pau desses malditos.

:- Aqueles caras que renegaram-nos no começo? — Franziu o cenho, concordei com a cabeça e cruzei os braços abaixo dos seios. — Como podem ainda terem a cara de pau em querer falar contigo?! 

:- Estão desesperados. E eu adoro as boas voltas que o mundo dá. — Falei carregando um sorriso diabólico nos lábios. — Mas fala aí, Londrina, o que anda pegando contigo? Não veio ao meu quarto pra me dar flores, certo?!

Ela enrugou a testa, puxando com mais rapidez a corda de sua calça e pude ver seus olhos claros correrem desesperadamente de um lado ao outro na tentativa de esconder o que transmitiam.

:- Como assim?! 

:- Fiquei grudada contigo durante nove meses à um cordão umbilical, temos conexão. Acha mesmo que não percebi aquela suspirada na cozinha? — Puxei a macia cadeira de rodinhas encostada na escrivaninha, sentando-me de frente à ela. 

:- Você não deixa passar uma, não é? — Suspirou vencida, jogando um travesseiro em mim. Lhe sorri abertamente, sabendo que havia ganhado mais uma vez. — Não queria contar nada na frente da mãe, porque, você conhece a peça... Bem, eu conheci uma pessoa há um mês, uma mulher, pra ser mais específica. Desde a primeira vez ela me chamou a atenção, é linda, inteligente, se interessou pelo o meu livro, tem um sorriso encantador e... 

:- E? 

:- Eu não sei, só a vi três vezes, conversamos bastante e acho que estou me apaixonando por ela. Pode parecer loucura, mas ela me chamou a atenção desde os primeiros segundos que os meus olhos bateram nela.

Umedeci meus lábios, tendo a vaga lembrança de quando Marie, quando tinha acabado de completar dezesseis anos, resolveu se assumir primeiramente para mim dentro de seu quarto em Londres. Lembro-me o quanto chorou contando que estava perdidamente apaixonada por uma garota de sua sala. 

:- Bom...— Pigarreei, retirando alguns resquícios de saliva em minha garganta. — Não acha que seja apenas uma atração? Digo, de momento, Mar, por ela ter todas essas qualidades, acaba te chamando a atenção, não?

:- Não! É mais forte do que qualquer outra coisa que já senti por outra pessoa. — Colocou uma mecha atrás da orelha, deixando à mostra seu piercing. — Está tudo correndo muito rápido aqui dentro de mim, sabe? Só consegui vê-la das duas últimas vezes porque arrumei qualquer desculpa, pois eu já estava com saudades, acredita?!

Concordei com a cabeça, tentando sentir, de alguma forma, o que ela estava sentindo no momento. Fazia tanto tempo que eu não sentia um afeto por alguém que não fosse da minha família, não sentia uma atração física ou tivera uma relação sexual. O último foi Alfredo. Péssimo, por sinal. 

:- Tenta chamá-la para sair em qualquer lugar, peça o número. Se está sentindo coisas boas por ela, vá em frente!

:- Eu dei o meu número, mas ela não ligou. Da última vez que a vi, ela conversou bastante comigo, eu a convidei para sair e tomar alguma coisa durante a noite, mas ela não aceitou, disse que não podia, tinha que trabalhar. 

:- Durante a noite?! Ela trabalha no que? Não me diga que se apaixonou por uma garota de programa. 

:- Não! — Respondeu rapidamente.— Ela é enfermeira do hospital central daqui. Aquele onde nascemos, sabe? 

:- Sim, sei... — Respondi pensativa.

:- E você, se emaranhando com alguém? — Ergueu os dois braços, indicando para que eu jogasse o travesseiro de volta.

:- Emaranhar?! — Arqueei uma sobrancelha e o joguei em seus braços. — Devo estar muito tempo na Alemanha que estou esquecendo das gírias americanas.

:- Primeiro; gíria Inglesa. Segundo; significa se você está se enrolando em alguém.

:- Oh! Então quer dizer que os Ingleses não são tão formais assim?! E não! Eu não estou me "emaranhando" em ninguém.

:- Não acredito! Ficou tão traumatizada com o chifre que não quis mais ninguém? — Perguntou boquiaberta, o que me fez rolar os olhos com a volta daquele assunto. 

:- Nós conversamos e tínhamos dado um tempo até que eu pudesse voltar da Alemanha, mas ele foi um otário fraco e a minha fila andou. Graças ao todo poderoso, Deus nos deu a procriação para que existisse mais homens no mundo e ao longo desse tempo existiu o Maicon, Klaus, Dracco e Alfredo...

Dei de ombros e a olhei com desdém. Ela continuava boquiaberta.

:- E eu achando que você estava por lá sofrendo.

:- Eu?! Jamais! E você, Mariezinha, já perdeu a virgindade ou está se guardando pra sei lá quem... Huh?

Fomos interrompidas por um furacão chamado Regina correndo por todo o quarto, o que nos obrigou a cessar aquele assunto e a minha dúvida ainda prevalecer por mais um tempinho. 

[...]

Após passar mais longas horas no celular resolvendo inúmeras coisas, olhando à cada segundo a caixa de e-mail para ver se não chegava nenhuma mensagem sobre a filial que seria aberta por aqui, resolvi correr para me exercitar. Algo que eu sempre fazia todas as manhã na Alemanha antes de trabalhar. Sabe, ter mais disposição para enfrentar tantos problemas e responsabilidades. Ainda estava claro, fim de tarde, ótimo horário para isso.

 Iniciei a música escolhida em meu ipod, deixando-a ecoar alto em meus fones a ponto de não ouvir nada à minha volta, coloquei a touca da blusa para proteger-me dos respingos de chuva e dei os primeiros passos pela calçada úmida. A chuva forte havia dado uma cessada, apenas choviscos, deixando as ruas de Santa Ana com clima calmo, ar ameno e nem tão abafado como sempre em épocas assim.

Cantarolei o refrão da música, dando um pique à mais em minha caminhada, sentindo as minhas pernas se aquecerem por baixo da legging preta e os pés ferverem dentro do tênis esportivo braco. Aproveitei para passar na frente da CSE, antiga escola na qual estudei, podendo ver a drástica mudança em praticamente tudo. Desde os portões da frente, o estacionamento, a faixada na parte de cima e etc. Também passei na frente da lanchonete na qual sempre íamos após as aulas para conversarmos enquanto comíamos aqueles enormes lanches. Era bom relembrar de cada momento, das risadas, dos conselhos... Mesmo que não fôssemos o melhor grupo, pelo menos éramos unidos, havia uma amizade de verdade ali. Principalmente com as amigas que eu tive. 

Travei os passos para admirar a faixada toda de vidro do enorme hospital na qual eu e Marie havíamos nascido, enquanto retomava o fôlego perdido. Todo o suor já escorria em cada parte do meu corpo, dando-me a certeza de que já havia perdido pelo menos algumas gramas. Continuei observando algumas pessoas descerem ou subirem as longas escadas que dava acesso a entrada do hospital. Uma nova música foi iniciada, preenchendo a minha audição e trazendo-me à realidade. Varri com os olhos toda a faixada novamente, parando-os sobre uma mulher aparentemente alta, de cabelos negros e cacheados até a cintura, debruçada no corrimão da janela e acenando para mim com um largo sorriso. 

Tombei a cabeça para os dois lados achando que ela pudesse estar falando com outro, afinal, eu não fazia ideia de quem era. Ela fazia gestos colocando os dois dedos no punho, como se perguntasse, talvez, o horário de alguma cirurgia, ou sei lá o que. Não sei exatamente o que queria me dizer, então, apenas virei sobre os calcanhares retornando à minha boa caminhada.



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