O emaranhado de emoções ruins que tomou meu corpo me fez subir aqui para olhar o quão pequena e brilhante essa cidade pode ser em relação aos meus problemas. Hoje deve ser o pior dia da minha vida.
Seria tão diferente caso o mundo não fosse tão estupidamente ignorante, eu poderia trazê-lo para conhecer meus pais, dar uma volta em um parque não muito longe daqui, com nossas mãos emaranhadas sem receber em troca olhares julgadores, poderia mostrar que estava feliz por amá-lo sem medo, poderia não estar condenado a ser parte das minorias que lutam por uma miséria de direitos sociais que elas deveriam já nascer com, talvez pudesse ter orgulho de mim mesmo.
Hoje minha família descobriu que nutro sentimentos por um garoto. Não pense que foi como naqueles filmes que “tratam sobre o assunto”, não fui recebido com um abraço de aceitação e protetor de minha mãe, com um “Tudo bem John, sua felicidade é o que importa” vindo de meu pai, muito pelo contrário, eu ouvi coisas que nunca pensei que ouviria de minha família, palavras duras, que me queimavam e machucavam sem pudor algum.
“Onde errei em você?”, “Por que você está se voltando contra seus pobres pais?”, “Isso é errado! É pecado!”, “O mundo não vai te aceitar, prepare-se para sofrer, John”, “Nós nunca iremos te aceitar”, “Você escolhe, ou vai para o caminho correto, longe dessa imundície ou nunca mais ouse pisar em minha casa”.
Eles me bateram, me xingaram e me expulsaram de casa, mas porque?
Por que eu deveria lhes apresentar uma garota? Por que eu deveria ser um cristão exemplar, com uma suposta família perfeita? Por que eu deveria parar de ser eu mesmo para ser alguém que a sociedade aprove? É difícil de entender o que há de errado comigo.
Aproximei-me do muro que separava o terraço onde estava do abismo brilhante que se formava abaixo de mim e observei o movimento de carros que trafegavam apressadamente por ali, com um pequeno sorriso amargurando em meu rosto.
Mal pude perceber que meus olhos tentavam liberar toda aquela dor que carregava dentro de mim, fechei-os e respirei na tentativa de me acalmar, mas minhas lágrimas caíram sem permissão ou pudor algum, molhando meu rosto ainda dolorido pelos tapas recebidos anteriormente.
Não culpava meus pais pelo ocorrido, nunca culparia, quem merecia minha raiva, decepção e lágrimas era a droga desse mundo que gosta de ser cego, ignorante, com pessoas que jogam outras a margem só por serem diferentes do tal “padrão”.
Busquei um maço de cigarros e um isqueiro no meu bolso traseiro, assim que encontrei acendi um e traguei-o profundamente, sentindo meu interior queimar como consequência. Sentei-me no muro precário e liberei aquela fumaça cancerígena por meus lábios.
Encarei o tubinho branco que jazia entre meus dedos pensando em como seria se minha vida queimasse junto até virar míseras cinzas sem valor algum, igual a todas as outras.
Eu queria ser forte o suficiente para aguentar o peso de ser eu mesmo, cansei de carregar todas essas pessoas cegas em minhas costas, não quero carrega-las até o fim de minha vida, o peso é insuportável.
Ter a oportunidade de ser feliz é pedir demais? Poder amar e ser amado por alguém que escolhi parece-me algo tão longe, como os contos de fadas que costumava ler para a minha irmã.
Queria que aquelas princesas me puxassem para os seus mundos, que meus heróis me salvassem e fizessem que minha vida voltasse a ser colorida de novo. Acho que é tarde demais para ser um adolescente comum.
Dei mais uma tragada em meu cigarro.
... Desculpe-me por não ser o homem que deveria ser.
Libero-a.
.... Desculpe-me por ter nascido errado.
Trago-o novamente.
... Desculpe-me por apenas ser homossexual.
Libero-a.
.... Desculpe-me por ainda respirar.
E finalmente não havia mais nada para ser tragado.
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