História Estaca Zero - Capítulo Único - a gente fica mordido, não fica?

“É como um poço sem fundo

Voltamos a sentir o apelo do nada

a tentação de cair,

de nos reajuntarmos

a uma obscuridade que nos convoca”

– Italo Calvino

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ESTACA

Z e r o

Eu realmente acreditei que dessa vez ia. Ia, mas não foi. E tudo o que eu consigo fazer sobre isso, Jiminie, é escrever. Sim, eu continuo escrevendo cartas de amor que parecem muito ultrapassadas para você, outros tantos textos e poesias cuja inspiração ainda é você; eu fico mordido com isso, pois mesmo que você se vá, e me deixe, eu continuarei voltando à estaca zero que é te amar.

Vivo indo e voltando, sem nunca realmente ir. Meu pés parecem estar fincados na terra, de onde eu não consigo mais sair; mas, no fim, acho que isso é amor.

Sempre fui intenso demais para qualquer coisa que fosse, talvez seja culpa de ser do signo primário do zodíaco; e não seria, de forma alguma, diferente com relação a você. A intensidade com que me apeguei a você chega ser assustadora, como se você fosse a gasolina que move a minha vida – totalmente insano, eu sei.

Mas nada disso importa mais. Nada do que vivemos parece importar agora, porque você se foi. Nenhuma das palavras bonitas que te disse ajudam, nem ainda as lembranças do meu toque grosso em seu corpo-travesseiro, nem o sabor do beijo. Isso tudo está no fundo da malinha de mão do meu coração, tudo o que nos era mais normal e lá coloquei. O mais engraçado é que cada lembrança coube lá perfeitamente.

E eu acabo nesse ponto morto, na minha maldita estaca zero. Sem saber se vou ou se fico, mesmo sabendo que sempre vou ficar te esperando através das vidas; sem saber se choro ou se só finjo que nada disso me sufoca, sem saber se respiro ou tranco o ar até o pulmão sucumbir, sem saber se limpo a casa pra te esperar ou deixo ela bagunçada como tu gosta.

Voltei para aquele sentimento de incerteza. E apesar de sempre ser confusa, odeio esse sentimento de não ter nada e não saber de nada do que pode acontecer, e isso dói. Essa maldita sensação de que vou simplesmente cair, sem você aqui.

Mas quer saber? Uma hora eu saio do zero. Uma hora você volta e a gente anda junto, de novo, casa por casa. Primeiro o um, depois o dois e assim sucessivamente.

Pode parecer loucura, ou até mesmo prazer em sofrer, mas eu vou continuar te esperando no zero pra gente recomeçar de novo. Quantas vezes forem necessárias, até chegarmos no infinito.