História Estrelas - Pontos

Jimin

            - Jimin? O que está acontecendo? Deixe-me ver. – Senti o aperto de Astrid em minha mão e percebi que estava cobrindo todo o espaço. Ela não tinha visto nada.

            - As, eu...

            - Deixa logo eu ver, nem deve ser nada de mais... – Ela me deu um empurrãozinho e se enfiou por baixo de meu braço, abrindo a porta e vendo a cena que eu não desejaria que nem meu pior inimigo visse. – Jin? – Perguntou com a voz fraca, como se alguém estivesse sufocando-a. Jin soltou Ambre e lentamente virou para trás, os cabelos bagunçados, a camisa amassada e o rosto manchado de batom. Nunca quis tanto arrebentar uma pessoa na vida.

            - As? – Ele parecia surpreso de verdade, os olhos arregalados como os de uma criança depois de ter feito arte. Astrid estava parada ali, ao meu lado, suas mãos ficaram tão frias quanto gelo e seu aperto diminuiu gradativamente, sua voz saiu num murmuro.

            - Eu... eu... nunca mais quero ver você... – Seus dedos se soltaram dos meus, e sem impedi-la, deixei que ela corresse para longe dali. Seokjin finalmente esboçou alguma reação, caminhou em passos rápidos em direção à porta. Eu o empurrei com força, fazendo com que ele se afastasse.

            - Eu preciso falar com ela, Park!

            - Você é um completo idiota, Seokjin. E eu juro por Deus que se você chegar perto de Astrid novamente, eu farei de sua vida um inferno. Deixe ela em paz.

***

Astrid

            Aquela cena não saía de minha cabeça. Por mais força com que eu fechasse meus olhos, por mais rápido que eu corresse, aquilo sempre voltava e se repetia. Jin nunca me beijou daquela maneira, tão desesperadamente, tão sem fôlego e apaixonado. Eu fui uma idiota, realmente acreditei que isso jamais aconteceria, que ele jamais fosse capaz disso.

Sinto que estou afundando

Mas eu sei que conseguirei sair viva

Se eu parar de te chamar de meu amor

E seguir em frente...

            Por que isso tinha que acontecer? Por que tinha que ser assim? Não era mais fácil simplesmente terminar tudo e seguir em frente? Seria muito menos doloroso. Nunca imaginei que pudesse me sentir é assim, é como estar caindo num abismo que não tem fim. Agarro-me em uma corda, na esperança de ser apenas uma ilusão, mas a cena continua voltando e voltando, até que a dor em meu peito seja demais para eu suportar.

Você me vê sangrar até que não possa mais respirar

Eu estou tremendo, caindo de joelhos

E agora que estou sem seus beijos

Vou precisar de pontos

            E Jin está ali, me observando sofrer com seu olhar assustado. As palavras ficam presas em minha garganta, me sufocando, sequer reconheci minha voz quando ela saiu. Queria ter dito tantas coisas, gritado e tirado toda a frustração que sentia. Tristeza, a dor de um coração partido – fui tola em acreditar que isso nunca aconteceria?

            Minha mãe sempre disse que isso poderia acontecer, é um dos riscos que aceitamos quando nos entregamos de cabeça ao amor. Como que em um segundo, dois anos não significam nada? Tudo parece ter sido uma ilusão. Talvez Jin nunca tenha me amado de verdade, pelo menos não como eu o amei, pura e verdadeiramente, com todo o meu coração.

Estou tropeçando em mim mesmo

Pedindo, implorando pela sua ajuda

E agora que estou sem seus beijos

Vou precisar de pontos

            Voltei para meu apartamento, deixei meus materiais na escola mesmo, torcendo para que Jimin os trouxesse mais tarde para mim. Agradeci por Yoongi não estar em casa, não queria que ninguém me visse assim. Triste. Jogada de lado. Humilhada. As lágrimas que corriam pelo meu rosto cortavam como facas, a garganta doía sufocada e os olhos ardiam. Da última vez que senti tanta tristeza assim foi quando meu pai faleceu. E de certa forma não deixava de ser um sentimento parecido. Eu perdi Jin, definitivamente.

            Em meu quarto, num excesso de raiva, arranquei todas as nossas fotos juntos da parede. Rasguei-as e joguei-as no lixo. Queria tirar tudo que me remetesse a Jin de minha vida, minhas emoções oscilavam entre excessos de raiva e excessos de tristeza, com um pêndulo. E a cena sempre voltando e voltando. Seus dedos envolvidos nos cabelos dela, a outra mão nas costas, puxando seu corpo para próximo do dele com voracidade. Aquele era mesmo meu namorado? Meu Jin? Sequer o reconhecia.

Agulha e a linha

Tenho que tirar você da minha cabeça

Agulha e a linha

Vou acabar morta

            Ex-namorado. Não é mais meu Seokjin. Tinha que aceitar isso e não deixar que a dor me dominasse. Seguir em frente. E a melhor forma de fazer isso é com a Netflix e um pote enorme de sorvete de chocolate – meus amigos inseparáveis. Assisti metade da quinta temporada de Pretty Little Liars até meu celular vibrar novamente, tinha minha própria –A e só tinha me dado conta agora.

            From: Anonymous

            Foi para o seu bem, minha querida. Se quer saber, isso já rola tem bastante tempo, você merecia saber. Pense pelo lado positivo: finalmente provou a existência dos tais unicórnios ao se tornar um!

            Okay. Isso sim foi bizarro. Não pela frase em si, sabia que agora levaria a fama de garota traída, mas pelo significado oculto. Um unicórnio, o que ele representava. O que quero dizer com isso: logo que me mudei para Busan, quando fui matriculada em uma nova escola e conheci Jimin e Yuri, fizemos uma atividade, ela basicamente tinha o objetivo de responder perguntas simples para que todos se conhecessem.

            - Qual o seu animal favorito, Astrid? – Perguntou a professora.

            - Unicórnio. – A sala toda riu, inclusive a professora, não entendi porque.

            - Unicórnios não existem, querida.

            - Existem sim! Meu pai me disse!

            - Eu gosto de grifos, professora – respondeu Jimin, levantando-se no meio da sala que não parava de zombar de nós. – Não vejo porquê Astrid não poderia gostar de unicórnios.

            - Mas eles não existem – disse a professora com um sorriso gentil.

            - Existem se acreditarmos.

            Lembrar disso foi reconfortante, Jimin sempre esteve comigo nos momentos em que eu mais precisei. Ele é meu ponto seguro, meu anjo da guarda. Mas também foi assustador. Significa que a tal stalker sabe disso: ela estudou conosco nessa época.

***

            Adormeci no sofá, acordei com a televisão desligada e uma manta sobre mim. Yuri estava lendo em uma poltrona, Jimin estava ao meu lado, mexendo em meus cabelos, e Yoongi estava lendo um jornal.

            - Desde quando você lê jornais, Yoongi? – Minha voz saiu num sussurro, abri os olhos sonolentos sem me mexer, os três olharam para mim com rostos que expressavam um misto de emoções.

            - Olha sé quem acordou! – Jimin afastou os cabelos de meu rosto e deu um beijo em minha testa, sua voz soava suave e doce, me senti uma criança.

            - Desde que preciso arranjar um emprego, irmãzinha. Alguém tem que bancar seus potes de sorvete – Yuri deu uma cotovelada e um olhar repreendedor para Yoongi, que revirou os olhos com um meio sorriso. – Como está se sentido?

            - Incompleta, eu acho.

            - Não deveria. Devia é ficar feliz por ter se livrado daquele babaca do Seokjin.

            - Yoongi! – Yuri bateu seu livro na cabeça dele, o que quase me fez rir, mas acho que estava um pouco triste demais para isso.- Sei que deve ser difícil, As, mas tenta esquecer um pouco dele e do que aconteceu, se punir relembrando não fará bem algum.

            - E nós estamos aqui para você, As, não esqueça disso – Jimin parou de mexer em meu cabelo e me levantou do sofá, forçando-me a sentar. – Leve o tempo que precisar, estaremos aqui.

            Namjoon não me deixou trabalhar naquela tarde, disse que minha cara inchada afastaria os clientes, o Senhor Pyon me serviu um chocolate quente com bolinhos e disse que também estaria ali caso eu quisesse conversar. Recebi algumas mensagens de Seokjin ao longo do dia, as quais eu ignorei e exclui, e entre todas elas, encontrei uma de Taehyung.

            From: Taehyung

            Jimin me contou o que houve (não fique brava com ele por ter me contado). Não sei muito bem o que dizer nessas ocasiões, só queria que você soubesse que estarei aqui também caso precise. Não tenho o melhor abraço do mundo, mas ele pode valer pra uma coisa ou outra... Fica bem, okay? – Tae.

            Era incrível o fato de conhecer Taehyung a tão pouco tempo e já me sentir ligada a ele por nossa estranha amizade. Agradeci às estrelas por ter amigos tão maravilhosos, o que me fez lembrar do último pedido que fiz, que não se realizou.

            - Papai.

            - O que foi, querida? – Ele estava lendo o jornal em sua poltrona vermelha, me colocou em seu colo e mexeu em meus cabelos, devia ter oito anos.

            - Fiz um pedido às estrelas e ele não se realizou. Por que, papai?

            - Às vezes as estrelas têm um plano maior para nós. Sei que na hora ficamos tristes, mas acredite, Astrid, as estrelas não erram.

            - Nem uma vez só?

            - Nem uma vez sequer.

            De certa forma era nisso que eu preferia acreditar: que foi por um motivo maior. Era nisso que meu pai ia querer que eu acreditasse. Mas o buraco em meu peito é tanto que acho que vou precisar de pontos, pontos que só poderão ser dados pelo tempo.