No centro oeste dos Estados Unidos, Illinois, se encontra Chicago. A maior cidade desse estado.
Hoje ela tem 2,7 milhões de habitantes, 27ª posição como aglomeração urbana mais populosa do mundo, 45,6 milhões de visitantes nacionais e estrangeiros, 4º maior PIB entre as áreas metropolitanas do mundo, 6 ª posição classificada pela Foreign Policy e a A.T. Kearney, logo depois de Paris e Hong Kong, como uma cidade “Global Alfa”. Reduto do Partido Democrata e lar de muitos políticos influentes, incluindo Barack Obama. Apelidos como “Windy City”, “Second City” e “Chi-City” a nomeiam a muito tempo. Ela sempre é notada em romances, peças teatrais, filmes, músicas, vários tipos de revistas... De esportes, entretenimento, negócios, comércio e acadêmicas, e nos meios de comunicação em geral.
Mas preciso falar sobre época na qual começou... Assim que Chanyeol nasceu, nos anos dourados, gloriosos anos 50, as saias rodadas, glamour, rockabilly, Hollywood, topetes, Elvis. Nessa época em Chicago, muitos cidadãos de classe média e alta deixaram o centro, movendo-se em direção aos subúrbios. A família do menino inclusive, levou-o para o centro. Ele cresceu no meio de todo tipo de gente, negros, brancos, trabalhadores honestos e gente como a família Wu...
Donos da maioria das fazendas do local, escravagistas nos seus alicerces, preconceituosos, maldosos... Mas Chanyeol sabia que naquele ninho de cobras, um tinha o poder de não se sujar com nada daquilo. Wu Yifan era seu melhor amigo. Desde que se mudaram, os Park, apesar de pensarem diferente dos Wu se tornaram amigos da família mais influente das redondezas e Yifan era seu primogênito.
Eles eram completamente diferentes, Yifan e Chanyeol, foram criados de maneiras opostas. Enquanto a educação de Park consistia em longas horas ouvindo música com a família, rindo, comendo bem e brincando. Wu era criado rigidamente por um pai que o queria como seu sucessor e cópia quando não o ignorava completamente, o culpando pela morte da mãe, no parto.
Conforme cresciam, eles ficaram mais próximos, confidentes, inseparáveis. Yifan, quando o pai não estava por perto, era tão carinhoso e divertido quanto Chanyeol era com sua própria família. A cada aniversário do mais velho, Chanyeol se assustada com o senhor Wu... Cada vez mais rude, mais irascível e imprevisível. Perdeu as contas de quantas vezes viu Yifan apanhar por algo que era ligeiramente emotivo. Algo que não se podia controlar. Algo... deles. O homem cruel, eternamente sobrevoando os dois, cismava com algo, farejava que a amizade era unida demais. Toda e qualquer liberdade “indevida” era punida na frente de Chanyeol, para que ele entendesse que, o que quer que era isso, que ele não compreendia, mas sentia no ar, todos podiam, essa ligação estranha, esse... amor, não era permitido. Era para ser cortado. Devia morrer.
As marcas dos dedos do homem permaneciam no rosto de Wu, mas ele nunca chorara na frente do homem. Isso era para mais tarde, quando uma pedra batia em sua janela encostada e Chanyeol entrava em seu quarto, o abraçando no choro na mesma cama que o menino dormia, até quase amanhecer, quando ele partia, deixando o herdeiro em seu lugar, sem nenhuma indicação que ele esteve ali... pois essas eram as regras.
Com 15 anos, algo aconteceu além do normal. Yifan foi surrado na frente de Chanyeol, quando o pai, sem querer, encontrou um disco de música que o mais novo deixou como presente de seu último aniversário. Mal sabia o pai que aquele ato de crueldade também desencadearia o último degrau do relacionamento adolescente. Na cama, naquela noite, nos braços de Chanyeol, as costas de Yifan ardiam pelo chicote de cavalo que havia deixado valas de sangue, onde antes houve pele, que formariam cicatrizes eternas.
Não só na sua pele, como em sua memória, e levaria a eventos futuros memoráveis. Mas, naquela noite, após molhar a camisa do mais novo com o choro silencioso de dor, fúria e impotência, Chanyeol tomou-lhe o rosto, com cuidado, sem dizer nada, ele nunca dizia... tinha tendência a estragar tudo ao abrir a boca em momento sérios, e lhe selou os lábios. A primeira promessa deles foi aquela, mesmo que não verbalmente dita. Eu sou mais que um amigo e eu estou aqui sob quaisquer circunstâncias. Os beijos escondidos não eram incomuns depois daquilo.
[I’d Rather Go Blind]
Em 1968, uma grande manifestação popular ocorreu na cidade, em prol do assassinato e Martin Luther King Jr.. Onze pessoas morreram, tendo sido causados danos no valor de dez milhões de dólares. Foram implementadas medidas para melhorar os serviços sociais, como a educação, a saúde e o abrigo aos necessitados, mas subsistem até hoje grandes diferenças sociais e econômicas entre a população branca e afro-americana da cidade. E o senhor Wu acreditava que finalmente “a corja de negros nojentos ia voltar para onde eles nunca deviam ter saído” Chanyeol tinha 17 anos, trabalhava como locutor do rádio da cidadezinha.
Ao lado dele, no sofá da mansão, estava seu melhor amigo de infância e amante, vestido em um terno azul claro, novo, muito, muito bonito, Chanyeol pensava, ao seu lado, o cabelo colocado com brilhantina num topete lustroso e o perfume que ele exalava... Lindo. Yifan cresceu como um senhor. A juventude o fazia belo, Chanyeol tinha ciúmes de quão bonito ele tinha ficado, porque eles eram únicos um para o outro.
Quando eles saíam, para conversar, cúmplices como sempre, meninas de todas as idades olhavam para o mais alto. Yifan era mais alto agora, um porte bonito, ombros largos, olhos sérios, boca bem desenhada. Era sempre gentil, mal parecia ter saído da casa que saiu, todos da cidade o admiravam pelo seu desprendimento do material... Parecia com a mãe, todos lhe diziam... O sorriso era sincero aos lábios do mais velho quando ele era comparado com a mãe. Nada disso era pra si, entretanto, na frente dos dois, tinha uma moça bonita.
“Something told me it was over… When I saw you and that girl talkin’.
Something deep down in my soul said “cry, girl”,
when I saw you and that girl walkin’ ‘round
Whoo, I would rather, I would rather go blind, boy
Than to see you walk away from me, child, no.”
“So you see, I love you so much that I don’t wanna watch you leave me, baby.
Most of all… I just don’t I just wanna be free, no…”
Jessica Jung. Ela era idêntica em quesitos sociais a Yifan, a família era muito influente em outro lugar, provavelmente em outro estado, e queria juntar os laços com a família Wu, tão rica e influente quanto ele. O casamento seria riquíssimo... Bílis subia pela garganta do mais novo, ela olhava para Yifan com os olhos brilhando, escondia o sorriso atrás das mãos, mexia nos cabelos sutilmente, usava um vestido rosado, uma sombrinha na mão, recatada, bonita, rica, solteira... O par ideal. Trouxe bolo para eles, prova que ela cozinhava bem. Nenhum dos dois jovens comeu.
À Chanyeol, tinha sido dado o título de chaperone, uma pessoa, geralmente uma senhora solteira, que acompanhava uma moça ou um casal para assegurar à família que o encontro foi correto, pelo pai do agora compromissado como se ele fosse alguém de confiança. Mas o real motivo era que ambos estivessem envolvidos no namoro de Yifan, que Chanyeol visse com seus próprios olhos o outro se envolver com a menina e ele tivesse de acompanhar todos os encontros, porque se sentia ainda mais firmemente no ar, a ligação.
Na cabeça do moreno tudo que ele conseguia pensar era como ela não era digna para ele, não era boa, como ela não ia entender os pequenos sorrisos que ele dava, como ele sentia medo mesmo sendo tão forte, como ele muitas vezes queria dizer tudo com um olhar. Sentado ali naquele sofá, o estômago dele espiralava junto com o futuro de faz-de-conta que ele montou com Yifan em sussurros nas noites de amor partilhadas em sua casa.
Um brinde com champanhe, saudando o novo casal, cuja união foi criada na mesma tarde. Concordada por ambas as famílias. Era a primeira vez que o velho Wu sorrira.
“I was just... I was just, I just sittin’ here thinkin’... of your kiss and your warm embrace, yeah
When the reflection in the glass that I held to my lips now baby, revealed the tears that was on my face.”
Ele começou a ganhar dinheiro, sendo bem pago pelos seus trabalhos. Ele andava com músicos conhecidos, tocava com eles, era bom musicalmente e ótimo como cantor. Yifan lhe dizia que a voz dele devia ser um pecado que só ele poderia ouvir. Chanyeol ria, corado, na pequena casa que ele agora tinha, mais próxima da rádio, tamanho seu sucesso. Os encontros entre Jung e Yifan eram definitivamente seu pior dia da semana. Aos sábados, a menina vinha encontrar com o sucessor do velho Wu. Yifan já tinha tomado o lugar do pai em todos os afazeres, mas o velho continuava o humilhando e prendendo... Yifan passou a seguir os passos do pai com tanta maestria que velho já não o seguia para todos os cantos.
“And baby, baby, baby I’d rather be blind, boy! Than to see you walk away from me!”
Seus domingos... e todos os seus minutos livres, na verdade, eram dentro da rádio. Enquanto o jazz tocava ao fundo, os corpos suados moviam em cadência, ritmados, quentes. Movimentos fluidos, sons musicais saiam das gargantas dos homens à portas trancadas, ninguém no prédio. Mesa, sofá, cadeira, banheiro, e até mesmo a pequena dispensa do rádio já tinham sido usados como palco para o maior show de todos, onde Chanyeol considerava a melhor música, os gemidos de Yifan.
Era naquele momento, com os cabelos em desalinho, a roupa colocada cuidadosamente em um cabideiro para não amassar, que ele perdia toda sua realeza, todos seus modos, xingava, até, quando o fogo o consumia. Yifan nunca foi em nenhum momento, frio, mas quente como ele era na cama, só seria com Chanyeol. Quando o ápice os abateu, caíam em um abraço longo, carinhos lânguidos nos cabelos, nos rostos, beijos leves e extensos com a preguiça de terminar, de os separar.
Era sempre assim. O peso no peito retornava com força ainda maior. Seria essa a última vez? Quando se tocariam novamente? Fica não-dito no longo olhar silencioso cheio de dúvidas e medos que nenhum dos dois ousava pronunciar. Colocar os medos em voz alta era dar corpo aos fantasmas de um futuro indesejado. Era pecado acabar com a pouca paz que eles tinham.
[All I Could do Was Cry]
Num desses sábados, Chanyeol chegou na mansão Wu estranhando a movimentação excessiva. Yifan tinha acordado com barulhos de gente movendo os móveis, pessoas chegando. O dia tinha algo estranho, ambos sabiam. Ao cruzar a porta de entrada do grande salão, um brinde era feito. Jessica sorria, pulando em pequenos saltos no mesmo lugar, na frente de um Yifan sem nenhuma expressão. Seus olhos se cruzaram no mesmo instante, mas nada pode tirar o foco dos olhos de Chanyeol do brilho no anel de noivado da menina.
Um anel novo, de diamante, um solitário, simples, mas bonito, pomposo, o tipo de anel que dizia que não havia sido colocado ali pelos planos de Yifan... Chanyeol podia ter certeza que Yifan o amava, não poderia? Com qual razão ele então não tinha sido convidado para o noivado? Yifan se ajoelhou? Fora obrigado? Num terno cinza escuro, Yifan se negava a encontrar os olhos do mais novo outra vez, fugia de cruzar seu caminho, mantinha os olhos baixos... O peito do moreno apertava, não lhe ver os olhos era como levar um murro. Tinha a sensação na boca do estômago que ele tinha cometido algo terrível e tudo entre eles estava terminado. Não tinha certeza de mais nada.
O velho Wu o saudou sorrindo, uma mão espalmada entre suas omoplatas, o empurrando até o casal, “Padrinho” foi como ele foi nomeado agora. “O melhor amigo do meu filho, agora um homem da música, influente... Quem melhor para padrinho?!”
Naquela noite, ele se sentia com 15 anos novamente. Os braços rodeavam o corpo a sua frente, cujos braços rodeavam o seu corpo em resposta. Yifan e Chanyeol abraçados, chorando em silêncio por tudo que não haveria mais. Era o fim. Em 15 dias o casamento se daria conta. Todos os dias de sol estavam nublados. Após esses, todos seriam chuvosos e sem vida.
“I heard church bells ringing. I heard a choir singing…
I saw my love walk down the aisle on her finger he placed a ring, ohh, oh”
Pela noite inteira, olharam-se nos olhos, alcançando o ápice várias vezes, sem conseguir parar de tocar o outro, gravar cada pedaço, como uma última dança. Yifan levantou, então, sentando na cama. Os dedos longos de Chanyeol tocaram as cicatrizes da surra de alguns anos atrás, o que fez o mais velho sorrir um sorriso triste. Passaram por tudo juntos, apenas para nunca mais se verem...
Era irônico, vestir-se na frente do moreno enquanto ele observava com um olhar duro. Não era para ser assim. O que antes era uma brincadeira, hoje era algo morto. Wu ajoelhou-se na cama, colocando um último beijo nos lábios do seu amigo, eterno amigo, eterno amante, e, sem dizer nada, saiu. O terno bonito, blusa social branca por dentro, gravata de seda. Chanyeol arrumava o noivo sem o encarar. Yifan fazia o mesmo e por mais que os toques fossem vagarosos e saudosos, nenhum dos dois teve coragem de falar ou fazer nada a respeito. Como padrinho, ele só podia aceitar sua função. E fazê-la bem.
“I saw them holding hands... She was standing there with my man!
I heard them promise ‘til death do us part… Each word was a pain in my heart”
Na igreja, no altar, tudo acontecia em câmera lenta. Ela entrou vestida de branco, pura e linda, longos cabelos presos num coque austero, maquiagem sutil que ressaltava todos os pontos bonitos do seu rosto. O terno sufocava, Yifan, também de branco, esperava de pé ao final do corredor coberto de flores da igreja católica e rica. Enormes ornamentos tomavam cada ponta dos bancos, homens e mulheres influentes levantavam-se para ver a bela noiva passar com seu véu.
O padre deu início a cerimônia. Ele dizia coisas belas que tiravam o ar. A gravata sufocava, o peito pesava, o pulmão parecia não mais funcionar. O senhor Wu observava Chanyeol com o rosto fechado, quase como se pudesse ver as engrenagens de seu corpo parando de funcionar a cada palavra do padre. Pela cabeça do moreno só se passavam imagens da infância dos dois. O dia que Chanyeol cortou a mão e chorou até que Yifan o levou em silêncio ao banheiro, lavou o machucado, colocou antisséptico que ardia demais, mas Chanyeol não conseguiu tirar as mãos das mãos do outro, olhando como se fosse pela primeira vez ao menino que tinha o rosto concentrado ao tratar da ferida como se ali ele estivesse empregando seus dons cirúrgicos. Os cílios longos que emolduravam os olhos tão expressivos agora olhavam à noiva.
“Estamos reunidos na presença de Deus e destas testemunhas para solenizar diante do Todo-Poderoso o casamento deste homem e desta mulher. O casamento é um estado honroso estabelecido por Deus e santificado pela presença do nosso Senhor.”...
“All I could do, all I could do was cry… All I could do, all I could do was cry…
I was losing the man that I love and all I could do was cry”
“Você, Jessica Jung, aceita Yifan Wu como seu legítimo esposo, prometendo amá-lo e respeitá-lo, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, na alegria e na tristeza, até que a morte os separe?”
‘Não...’
Yifan correndo de mãos dadas com Chanyeol, ambos com 12 anos, escondendo-se do pai dele e das empregadas, para não ter que viajar e deixar o mais novo sozinho no aniversário dele onde ele tinha planejado um bolo, que ele ia comprar com o próprio dinheiro, que juntou depois de meses.
O ar congelou no meio da tarde de verão.
“Sim.”
‘Não.’ A garganta secou, fechou-se os dedos em punho, unhas cravando na pele. Mordeu os lábios para não gritar.
Chanyeol chorava de raiva, tentando passar o mesmo cuidado que Yifan sempre tinha consigo enquanto fazia curativos nas pernas lanhadas de chicote do mais velho. Yifan mordia o travesseiro, chorando em silêncio para ninguém ouvir, acostumado a ficar sem mostrar o sentimento que sempre correu solto em si. Chanyeol, num impulso, beijou as feridas na parte de trás das coxas brancas jamais expostas ao sol, rapidamente mudando o choro do menino para uma confusão de borboletas internas.
“And now the wedding is over... Rice, rice has been thrown over their heads!
For them life has just begun but mine is ending.”
“Você, Yifan Wu, aceita Jessica Jung como sua legítima esposa, prometendo amá-la e respeitá-la, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, na alegria e na tristeza, até que a morte os separe?”
‘Não.’ Os dedos longos seguraram o rosto do mais velho, já havia uma diferença de tamanhos entre os dois, Yifan era mais alto agora, o que apenas deixava as bochechas do Chanyeol avermelhadas pela necessidade de usar os pés para dar um impulso e beijar os lábios rosados do maior, cujas mãos rapidamente encontravam-se em sua cintura. O primeiro beijo veio com uma flor atrás da orelha, vermelha, que ainda estava guardada dentro de um livro, envelhecida, mas não menos bela. Não. Não!!
“Sim.”
[At Last]
O coração doloroso eclodiu dentro do peito, jorrando sangue negro pelas veias das promessas quebradas, líquido vil e quente que escorria pelos olhos, cristalino, como lágrimas de diamante... Brilhavam tanto quanto as alianças dos noivos, idênticas, círculo dourado que forjado em brasa era forjado para remeter o círculo da vida, ao laço que agora era eterno perante a Deus e todos. O choro descia fresco, límpido.
A resignação tinha tomado conta da sua alma, ele perdera tudo. Jamais encontraria ninguém como ele. Mesmo que “errado”... Era preferível continuar sem jamais tentar, do que aceitar alguém que era apenas bom. Quando já se teve o melhor, ele pensou vendo o arroz cair pelos rostos sorridentes dos noivos à sua frente, comparando, nada é tão bom. Tudo é ruim. Amor só se tem um.
“At last... My love has come along...
My lonely days are over and life is like a song, oh, yeah, yeah!”
“Yifan Wu?” O padre questionou novamente, tirando Chanyeol dos seus devaneios irreais.
“Senhor Yifan, o senhor me ouviu? O senhor aceita Jessica Jung como sua legítima esposa, prometendo amá-la e respeitá-la, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, na alegria e na tristeza, até que a morte os separe?”
Yifan olhava pra noiva, que esperava confusa, antes de num sussurro pedir desculpas e lhe dar um beijo no rosto. As pernas fortes davam passadas longas até onde Chanyeol estava em pé e como a anos atrás, os dedos se entrelaçaram e eles correram. Os barulhos de surpresa não sobrepunham o batimento erradico dos corações acelerados de adrenalina, pés batendo com força na terra e as mãos pareciam se esmagar, o medo de soltar-se era tão grande que pesava na garganta.
Ainda Chanyeol não tinha compreendido, mas ele seguiria. Entrou no carro correndo, que já dava a partida. As mãos ainda unidas e pelo retrovisor via-se pessoas saindo da igreja, vendo o carro dar partida.
“At last... the skies above are blue; my heart was wrapped up in clover the night I looked at you!”
“Não posso! Não posso, você entende, não é? Entende, eu sei que entende. Casa comigo, Chanyeol, não me deixa, nunca mais.”
O riso nervoso que escapou da garganta do mais novo quebrou o clima, que pergunta idiota! Claro que ele entendia, ele largaria tudo, tudo! A voz embargada mal conseguia sair.
“P-para onde vamos?”
“Longe. Bem longe. Pro sul, terra do blues... do jazz... Eu vou ouvir você cantar todo dia, vou morar com você, dentre pessoas boas, sem segregação... Os 70 estão aqui, é a nova era, é o nosso tempo. Qualquer lugar, nós iremos. Meu laço é com você, não com lugar algum.”
“I found a dream that I could speak to;
I dream that I can call my own.”
Luisiana. Nova Orleans. Um centro de muitas culturas... Influências francesas, espanholas e afro-americanas são a base da cultura, mas ao longo dos anos, alemães, irlandeses, italianos, ingleses, nativo-americanos estão na mistura. Também é conhecida pela culinária. Soul food. Comida para a alma. Aquela comida que te energiza, te faz pensar em casa. Alimenta não só o estômago. É um dos portos mais movimentados dos Estados Unidos, visualizado pela indústria petroleira, tem um histórico musical tão bom e grande, que é conhecida como “The Big Easy” referência feita por músicos por ser fácil encontrar trabalho por lá.
O codinome “The City that Care Forgot” mostra como os habitantes são amistosos... O lema não-oficial é “Laissez les bons temps rouler”. Deixe os bons tempos rolarem. Propício, não é? Era um novo começo e aqui eles estavam. Sem nada, sozinhos, mas se encontraram facilmente. A conexão de Chanyeol com a rádio o colocou a frente de uma das principais rádios nacionais que tinha sede em Nova Orleães, participava de eventos importantes, festivais... Nos anos 70 o turismo era impressionante na cidade, Yifan decidiu apostar em ser guia turístico... Muito estudioso e sempre aplicado, todo seu trabalho com o pai administrando grandes finanças, conquistou uma amizade com o prefeito da cidade, sendo bem visto e quisto por todo lugar que ia. Sua educação era o que o fazia tão requisitado e Chanyeol não sentia ciúmes, sinceramente, ele tinha Yifan pra si só todas as noites, não tendo passado nenhum dia sem dormirem juntos, mesmo que sem sexo, desde que conseguiram uma casa. Um tempo depois que chegaram a comprar a casa, Yifan presenteou Chanyeol com um anel.
“Meu pai escondeu, mas eu o encontrei... Eu acho que minha mãe ia gostar que você usasse, Chan.”
“I found a thrill to press my cheek to, a thrill that I have never known!”
Essa amizade com pessoas influentes gerou uma alegria imensurável. Chanyeol e Yifan eram um casal, não escondiam de ninguém, mas também não demonstravam nada demais em público. A comunidade gay mesmo nos dias de hoje não é bem aceita, naquela época muito menos. Os amigos mais íntimos, entre eles o prefeito, Jongin e seu declarado parceiro Kyungsoo, sabiam dos desejos de se unirem dos dois, e planejaram um aniversário especial. As datas eram próximas, e não era um presente comum.
Eu tinha dois anos quando conheci meus pais, na festa do aniversário dos dois, comemorada pelos amigos. Eu não entendia tanto porque eles choravam, mas meu vestido rosa era lindo. Todos os dias, eu sentia um carinho maior pelos dois, me ensinaram coreano, cuidaram dos meus machucados, pentearam meus cabelos, me levavam a todas as festas, passeios e os feriados, principalmente os natais, eram reservados a nós. Papai, Yifan, era para quem eu corria quando precisava contar algo doloroso, quando precisava de silêncio e conforto rodeados de cuidados gentis.
Mesmo sendo sempre tão calado, não tão brincalhão quanto meu Pai, Chanyeol, ele era o mais gentil. Secava minhas lágrimas com sorrisos e os dedos passavam pelas minhas bochechas, rapidamente calando meus lamentos. Todos os machucados, ele cuidava de melhor jeito. (Não deixem meu pai saber disso.) Eu tinha sempre um desejo de o deixar feliz e o ver sorrir. Não que fosse raro, mas era um sorriso que você precisava ser merecedor... (Ele tem fama de difícil até hoje!)
“Yeah, yeah! You smile, you smile… Oh, and then the spell was cast…”
Meus avós se mudaram para Nova Orleans um pouco depois dos meus 10 anos. A era do rock se aproximava e apesar de sempre estar perambulando pela parte musical com meu pai, eu estudava como papai em todo meu tempo livre. Meus avós por parte de pai, no caso. O velho Wu morreu um pouco antes, e mesmo com ódio de papai, ele não pode tirar-nos nada. A herança era de minha avó, que no leito de morte deixou tudo para papai. Meus pais nunca brigaram, meus avós não discutiam com eles, mas de certa forma eu sabia que eles aceitavam o relacionamento dos dois.
Éramos uma família completa. Papai vendeu a fazenda, colocando tudo no banco para “faculdade” que eu disse não querer fazer. Ele deixou lá mesmo assim, cuidadoso e silencioso como sempre. Investiram num negócio musical, uma gravadora, os discos eram vendidos mais baratos se comprados com ele e em pouco tempo viraram febre nacionalmente.
Nossa família cresceu quando eu casei depois da faculdade de gestão. Ambos choraram muito no meu casamento, já completando aí facilmente uns 40 anos de casados... Eu nunca parei pra fazer as contas, sinceramente. Meu pai tinha o mesmo sorriso largo com as orelhinhas um pouco pra fora. Papai com suas sobrancelhas e altura de dar inveja a jogadores de basquete... Eu já chegava ao peito deles. Uma mão em cada uma das minhas, iam um de cada lado comigo até o altar, me entregar ao meu noivo. Meu melhor amigo.
Dizem que a fruta não cai longe da árvore afinal.
“And here we are in heaven”
No ultimo natal, lhes dei um único presente. Dois pares de sapatos pequenos, um rosa e um azul que os fez chorar me apertando num abraço.
“For you are mine at last”
Os gêmeos chegarão em julho.
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