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História Eu, Eu Mesma e Minha Ignorância - Twenty One


Escrita por: MadeixasNegras

Notas do Autor


Espero que gostem! :)

Capítulo 21 - Twenty One


Fanfic / Fanfiction Eu, Eu Mesma e Minha Ignorância - Twenty One

Despertei naquela manhã de segunda-feira me perguntando por que eu não estava no Rich Motel. Demorei um pouco para me ambientar no quarto de visitas da casa de Miles, mas assim que o fiz, me senti melhor. Estava ainda escuro, talvez pelo blecaute da cortina, e não havia relógio ao lado da cama, então pensei que estivesse de madrugada. Vi na tela do meu celular que já era de manhã, e hora de eu levantar. 

Ao abrir a porta do quarto, percebi que o chuveiro estava ligado no banheiro principal e ouvi o tilintar de louças na cozinha. Cathy estava sentada na mesa da cozinha lendo o jornal do dia enquanto bebericava uma xícara de chá. Na mesa havia uma caneca cheia de café fumegante, alguns copos, e uma tigela com pães escuros e algumas frutas. 

-Bom dia. - falei, com a voz um pouco rouca.

-Bom dia, Amie. Passou a noite bem? - Cathy perguntou, tirando os olhos do jornal.

Esfreguei o rosto tentando desinchar meus olhos, talvez ficar menos sonolenta, mas foi inútil. Nas manhãs de inverno eu ficava excessivamente lenta. 

-Sim, dormi bem. Onde está Miles?

-No banho. Ele já vem.

Apenas assenti.

-O que você costuma comer no café da manhã? Pode pegar o que quiser na dispensa.

-Geralmente só um pouco de cereal e leite, quem sabe café, mas não precisa se incomodar. 

Nesse momento, Miles apareceu no corredor, já vestido e com sua mochila nas costas, e se sentou à mesa. 

-Bom dia. - ele disse, com um olhar gentil, e bebeu café da caneca que estava ali previamente.

-Não, imagine. Coma o que quiser. - Cathy terminou, voltando o olhar para o jornal em suas mãos.

-Do que você gosta, Amie? Esses pães de cacau são bons, experimente. Eu como com creme de avelã. - Miles disse, pegando um dos pães da tigela.

Acabei comendo uma das fatias de pão com um pouco de café. A mesa estava silenciosa, a não ser pelo barulho das xícaras e talheres. Parei para pensar que aquele era um momento que não costumava acontecer quando eu ainda morava com Lucy. A televisão estava sempre ligada, meu café era sempre o mesmo, tudo era tão corriqueiro que nem mesmo meu cereal colorido parecia ter gosto. Minha preocupação maior era saber se minha mãe estava se sentindo bem, e eu não tinha tempo para sentar e apreciar o sabor de uma fatia de pão como eu fazia hoje. Ali na casa de Miles, as manhãs pareciam ser menos desgastantes e apressadas, e eu tirei proveito daquele momento.

-Obrigada, terminei. - sorri e me levantei da mesa com minha xícara. 

Depois de me retirar, tomei um banho rápido e me senti realmente acordada. Antes de me vestir, olhei pela janela para saber do tempo. Parecia que a neve estava mais espessa a cada segundo e um vento frio uivava do lado de fora. Optei por usar minhas roupas mais quentes e quis que meu par de botas estivesse ali. 

"Quanto tempo essas roupas vão durar? Vou ter que voltar até Betty Lou e pegar mais? O que eu vou fazer?", pensei, ansiosa.

Sentei na beirada da cama e suspirei, porque eu tinha esquecido completamente que a casa de Miles não era minha. Eu não poderia dormir e comer da comida deles para sempre. Aquele quarto não era meu, as únicas coisas que realmente me pertenciam eram minha mochila, minhas roupas e minha bicicleta do lado de fora da casa. O que parecia ser tão certo no dia anterior, hoje já não era concreto. 

-Vou ter que ficar na Betty Lou. - murmurei.

Apanhei minha mochila e me certifiquei que tinha pego tudo que era meu. Saí do quarto quando Miles e Cathy aparentemente me esperavam na sala de estar.

-Podemos ir? - perguntou Miles.

-Sim, desculpem o atraso. 

Cathy sorriu e pegou as chaves do carro no balcão. Saímos de casa um pouco mais tarde do que eu costumava sair da minha antiga casa. O carro já estava do lado de fora da garagem, com uma fina camada de neve por cima do capô. Ao entrarmos no carro, procurei pela minha bicicleta no quintal e não a avistei. Um arrepio percorreu meu corpo e pensei que ela pudesse ter sid levada durante a noite. Miles deve ter percebido minha preocupação, e então esclareceu:

-Guardei sua bicicleta na garagem hoje de manhã. Acho que não é bom deixar ela ao relento.

Respirei fundo e me sentei apropriadamente no banco do carro enquanto deixávamos a rua de Miles. 

-Você pode voltar aqui depois da aula e buscar. - ele completou.

Sorri, assentindo, e depois disso não dissemos mais nada um ao outro. Cathy parou na frente do colégio poucos minutos antes de o sinal bater. Agradeci a ela antes de descer, e ela, muito gentil, falou que eu poderia passar lá quando eu quisesse. 

"Vou levar a proposta a sério", pensei, esperando Miles no meio fio. 

O dia se passou sem muitas novidades até a aula de Álgebra antes do horário do almoço. O sr. Campbell disse que nós faríamos um teste preparatório para os exames que viriam dali a algumas semanas, e como essa avaliação seria "num nível bem elevado, crianças", o sr. Campbell disse que nós faríamos em dupla com um colega de sala. Felizmente, eu e Miles fazíamos essa matéria juntos. A aula terminou e automaticamente nós nos olhamos, como se lendo o pensamento um do outro. Saímos da sala e andamos juntos até o refeitório.

-Você acha que esse teste vai valer muita nota? - ele perguntou, depois de deixar os livros de álgebra em seu armário.

-Não sei, o que me preocupa é se vai ser difícil mesmo ou não. E nós dois não somos lá essas coisas em álgebra.

-É verdade. - Miles riu de nervosismo - Mas vai dar certo, é em dupla. Confio no seu potencial.

Ambos rimos. Entramos na fila do refeitório antes que lotasse, então conseguimos pegar algumas fatias frescas de pizza e os refrescos mais gelados. Avistei minha mesa habitual vazia e apontei para Miles ir até lá. O que eu não esperava era que Hazel teria a mesma ideia. Assim que Miles e eu nos sentamos, pude ver Hazel bem próxima da mesa com sua bandeja na mão. Ela me olhou, com um olhar de (talvez) hesitação, e contrária às minhas expectativas, se sentou com a gente. Miles não pareceu ligar muito.

-Oi, gente. - ela disse, num tom mais baixo que de costume.

-Oi. - respondi, sem tirar os olhos da bandeja.

-Quais aulas vocês tiveram hoje? - Hazel falou, entre mordidas em seu sanduíche.

-Álgebra. - Miles disse - Vamos ter um teste fodido semana que vem.

-Maldito Campbell. - Hazel riu, com deboche - Falando na semana que vem, o Carter vai dar outra festa na casa dele. Dizem que vai ser melhor que a de Halloween, vocês podiam ir.

Mais ou menos mil formas de negar o convite de Hazel passaram pela minha mente naquele momento, mas Miles e sua boca grande falaram antes que eu.

-Você já sabe quem vai?

-Ah, o povo todo. Talvez mais gente de outros colégios, não sei. Só sei que vai ser louco! - ela disse, empolgada.

Pude ver que Hazel desviou o olhar para mim, esperando uma resposta, mas eu não disse nada. O meu silêncio iria deixar ela mais incomodada do que se eu dissesse não. Hazel se aproximou um pouco de onde eu estava e empurrou sua bandeja com metade do sanduíche mordido para o centro da mesa. 

-Aliás, Am, fiquei sabendo de umas coisas aí. - ela falou, apoiando a cabeça em uma das mãos.

-Hazel, você sabe que eu não gosto de fofoca.

-Eu sei, mas é sobre você! 

Meu coração acelerou na hora e senti vontade de gritar só de pensar que inverdades sobre mim poderiam estar circulando pelos corredores. Boatos sendo espelhados eram algo bem comum em qualquer colégio de ensino médio.

-O que é? - Miles se mostrou mais interessado no meu boato do que eu.

-Disseram que o Luke Warren tá super afim de você, mas tá com medo de chegar porque vocês são brigados e ele já vacilou feio com você. Eu ouvi dizer até que vocês já ficaram escondido naquela festa do Carter.

-Quem te disse isso? - indaguei, irritada.

-Por quê? É verdade?

-Claro que não, isso nunca aconteceu. E isso do Luke é pura invenção, se ele quisesse realmente falar comigo ele já teria feito isso. 

-Ah, nunca se sabe, né? - Hazel provocou, com as sobrancelhas arqueadas e um sorriso bobo.

-Eu sei que não é verdade isso aí. - Miles falou, terminando sua fatia de pizza - Porque a Amie gosta é de outro menino, não do Luke.

Vi os olhos de Hazel faiscarem e seus lábios se entreabrirem. Olhei feio para Miles, que só sorriu de volta. Aquela situação parecia com algo que aconteceria entre crianças de 12 anos, e eu estava totalmente sem paciência. 

-Você tem que aprender a ficar calado, Miles. Eu não gosto de ninguém. - falei, olhando fixamente para Hazel.

-Tudo bem, já vi que acabei te irritando. Acho que a notícia termina aqui então. Você devia procurar o Luke, no fim das contas.

Hazel se levantou e saiu da mesa, deixando sua bandeja para trás. 

-Acho que eu já vou. Te vejo na saída. 

Não deixei que Miles respondesse. Antes de sair do refeitório, comprei uma Sprite e fui tomá-la do lado de fora, porque eu queria ar fresco e havia parado de nevar. Andei um pouco pelo pátio, refletindo sobre o almoço. Miles tinha sido um pouco ridículo, mas eu não estava brava com ele nem nada. Ele poderia só ter ficado quieto, porque eu tenho certeza de que Hazel vai dizer para alguém que eu gosto de algum menino aleatório e a notícia vai correr. Eu sabia que ele estava falando de Griffin, mas nem eu sabia direito o que sentir por aquele garoto. Nós mal tínhamos conversado desde o dia da máquina de refrigerantes e nós éramos basicamente estranhos. 

Quanto a Hazel, eu sabia que o que ela tinha ouvido não era de todo mentira. Luke realmente tinha vacilado comigo e eu continuava sem vontade de vê-lo. Talvez porque o que ele fez me magoou muito - tanto o incidente da festa quanto saber que ele continuava revendendo drogas - e porque eu não tinha admitido a mim mesma que estava criando sentimentos por ele. Desde o dia em que ele me levou ao Wendy's na rodovia e fumou um cigarro na minha frente. Eu não sabia o que sentir. Talvez diálogo pudesse resolver as coisas. 

Passei todo o resto do horário do almoço andando pelo pátio e logo me toquei que meu refrigerante havia acabado. Quando fui jogar a latinha fora, percebi que alguém estava sentado na parte coberta do pátio, perto dos arbustos, encostado no muro do refeitório. Eu poderia simplesmente ignorar, mas ao ver que era Griffin - pelo cabelo ruivo vibrante - me aproximei. Ele me reconheceu e sorriu ao me ver. Sentei ao lado dele no chão de concreto frio.

-Não sabia que você almoçava aqui fora. - observei ele terminar de comer uma fatia de bolo red velvet envolto num papel.

-É, eu fico aqui mesmo nos intervalos. Lá dentro é muito barulhento, não dá pra cochilar. - ele riu, contagiante.

Conversamos algum tempo sobre aleatoriedades. Ele estava com as pernas cruzadas e eu com os braços ao redor dos joelhos.

-E como você tá com relação ao luto? - ele perguntou, com delicadeza.

-Luto? - perguntei, genuinamente confusa.

-É, da sua mãe. 

Por alguns breves momentos, tinha esquecido completamente de Lucy, e me senti tola. Eu me distraía muito fácil estando rodeada de tanta gente. Talvez isso significasse que eu já estava superando a morte dela.

-Tô melhorando. Superando um pouco a cada dia.

-Fico feliz. - ele desviou o olhar para a rua de trás do colégio.

Suspirei. Estar com Griffin era bom, mas eu sentia um peso nas costas e uma ansiedade incessante. Acho que pelo fato de eu ter me sentido atraída por ele na semana em que o conheci, e por ter comentado isso com Miles. Mas o que Hazel havia dito sobre Luke mudou totalmente as coisas. 

-Você... - ia perguntar algo que talvez fosse pessoal demais, e então hesitei.

-O quê? 

-Você tinha muitos amigos lá no País de Gales? Namorada, algo assim? - fiquei com medo de ter sido invasiva ou boba.

Griffin olhou para o lado e sorriu, com um ar de desconforto. Ele esfregou as mãos e deu uma risada.

-Ah, eu tenho alguns bons amigos. Mas namorada não, nunca tive. Não tenho vontade de ter, na verdade.

Prensei os lábios e me arrependi de ter perguntado. Minhas bochechas queimaram na hora, e então coloquei as mãos geladas no rosto, para disfarçar.

-Não tem? Então...?

-Eu não sou muito de relacionamentos, não é algo que eu sinta necessidade. E também não é algo que as pessoas compreendem, logo não falo muito disso. Eu sou assexual, sabe? - ele me olhou, um pouco mais sério, mas ainda sim com um olhar suave - Acho que você não vai me julgar. 

"Como eu poderia te julgar se eu nem sei o que é isso?", pensei, me sentindo estupidamente burra.

A partir daí, Griffin e eu começamos a conversar sobre sexualidades, especialmente a dele, que era novidade para mim. Minha mãe não costumava falar sobre isso em momento nenhum, e eu não tinha nenhum amigo que fosse, então não sabia do que se tratava. Já Griffin fez questão de contar a experiência dele e me explicar qualquer coisa que eu não soubesse. Terminei aquela conversa me sentindo mais informada sobre a realidade de pessoas que não faziam parte da minha bolha. 

-Valeu por me contar tudo isso. - sorri, meio sem graça.

-Não tem de quê. Você é minha amiga. - ele também sorriu, sincero.

Depois de um tempo, o sinal bateu e tivemos que voltar para dentro. Passei o resto do dia calada, e só fui retornar a realidade na saída, quando Miles me encontrou no corredor principal. Eu estava pegando minha mochila excessivamente pesada no meu armário quando Miles apareceu.

-Amie, tive uma ideia. Você podia ficar lá em casa agora durante a tarde pra gente estudar pro teste do sr. Campbell. O que você acha?

-Acho que tudo bem, eu não tenho nenhum plano mesmo. - falei, sem muitas expectativas.

Conhecendo Miles, eu sabia que por uma hora nós estudaríamos e pelo resto da tarde nós ficaríamos só conversando a toa, então não pude recusar. Eu não tinha mesmo para onde ir. Miles e eu esperamos no pátio até que Cathy chegasse, quase no final da tarde. Assim que eu entrei e fechei a porta do carro, ela me cumprimentou e perguntou a Miles quais seriam os planos dele.

-A gente vai estudar pra um teste de álgebra que vai ser em dupla. Diz o sr. Campbell que vai ser de alto nível.

-Mesmo? Bom, façam bom proveito. - ela olhou para nós pelo retrovisor - E Amie, se você quiser ficar lá hoje, você também pode. Só avise os seus pais, feito?

A oferta de Cathy me pegou de surpresa. Eu apenas sorri, assentindo. Desviei meu olhar e encostei a cabeça na janela, sentindo meu coração vibrar de alegria por ter mais um lugar para passar a noite. Era muita sorte.


Notas Finais


Espero que tenham gostado! :)


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