A semana seguinte foi um verdadeiro caos. Passei uma aflição sem fim com os “pedidos” de Saga.
Eu deixei por começar os dias com o exercício das duas coisas que achava boas em mim. Confesso que na ausência de ideias, apelei.
Como quem não quer nada, perguntei ao Shun o que ele achava de mim. Ver a alegria dele em conversar realmente mexia comigo por dentro. Claro que ao invés de duas coisas, o Shun deve ter falado umas cem.
E eu sei, eu deveria ter ficado feliz com aquilo. Mas não.
Eu sequer acreditava nele.
E antes que perguntem, fora Saori ninguém sabia realmente dos meus casos e motivos pra fazer as coisas que eu fazia. Nem Shun, que era minha família e definitivamente a pessoa mais querida da minha vida sabia de nada, que eu estava fazendo terapia ou que os muitos “acidentes” aconteciam por que eu me envolvia em...
Enfim.
Coloquei meu melhor sorriso no rosto e o agradeci ternamente. Coloquei tudo em um papel, tendo o cuidado de mudar a cor da caneta nos dias e pronto, missão cumprida.
Agora o exercício novo...
Que maldito inferno.
Saga exigiu que eu meditasse.
Exato. Dez minutos por dia, gravados em vídeo e que deveriam ser entregues na sessão da semana seguinte.
Eu me esforcei, juro, para ficar parado na mesma posição por dez minutos. Mas era impossível.
Falei sobre como aquilo me irritava com a Saori na nossa consulta. Ela me perguntou por que aquilo me incomodava tanto.
Mas eu ainda não sabia por em palavras.
Não saí com ninguém naquela semana também. Mas por que não tinha cabeça para isso.
Parando bem para pensar, eu já não saia com ninguém há algum tempo.
Talvez então a terapia estivesse funcionando.
Bem, com Saori apenas falei do que senti naquela semana e como as coisas estavam desde que comecei a ver Saga. Ela apenas inquiriu por que não contei a ele sobre o...
Céus, não. Queria muito que Saga não soubesse aquilo.
Mas eu estava ali por causa dele, então...
Falei a verdade. Saga me irritava. E o que ele me pediu me deixou cansado. Só fiz aquilo por respeito a ela.
Saori apenas disse, sem emoção que eu decifrasse, que era o melhor para mim.
No dia seguinte, fui sozinho ao consultório de Saga. Saori já estava lá quando eu cheguei. As boas vindas foram...
-Boa tar...
-Fez o que mandei? Se lembra do meu aviso.
Um “boa tarde” começaria bem. Cara estúpido.
-Está tudo aqui. Os vídeos e os exercícios anotados. Esqueci algo e posso nunca mais ver sua cara?
Saga apenas sorriu de maneira debochada e fez sinal com a mão para que eu me sentasse. Enquanto me acomodava ele correu os olhos pelas minhas anotações e checou os vídeos que fiz no meu celular.
Após um tempo tão longo que eu estava quase cochilando, pude ouvir a voz de Saga.
-Não respondeu minha pergunta da semana passada.
-Qual delas?
-Já se machucou com algum parceiro antes?
Certo. Eu não achava que isso era necessário, e depois do que contei, achava que era meio óbvio. Não queria responder isso. Mas precisava.
-Não ouviu o que te contei desde que cheguei? Meio óbvio. Já.
-E encarou isso...
-Do jeito normal. Fui ao médico e...
-“Jeito normal”? Você é doente, me explique o que é normal para você.
Eu ia arrebentar ele naquele momento. Mesmo. Me levantei e caminhei até a mesa dele, sentindo o sangue correr mais rápido nas minhas veias.
-Eu não sou doente.
-Não é?
-NÃO!
-Quem aqui nessa sala deixou um anão esfregar o rabo sujo na sua cara enquanto peidava e te cobria de catarro não fui eu nem Saori. Logo, você é o doente sim. Agora pare de graça. Não fico intimidado com qualquer porcaria dando gritinho e me olhando com carinha brava.
Bati na mesa. Aquilo estava indo longe demais.
-PARE de falar assim comigo. Não sou qualquer porcaria.
Saga me encarou por alguns segundos.
-Verdade. Não é.
Ele se levantou calmamente e deu a volta na mesa. Sentou-se nela enquanto me encarava.
Ele era realmente alto. Ajeitou algumas mechas de cabelo atrás das orelhas e falou em uma voz calma:
-Você não passa de lixo humano. Chamá-lo de porcaria seria um elogio, e se você não consegue se elogiar, não vejo por que eu teria que fazê-lo.
Tudo ficou escuro por um segundo.
Não enxerguei nada. Senti minhas mãos crispando e parti pra cima de Saga.
-- --
-Agora me conte como se deu o caso...
Saga remexia nos papéis refrentes ao meu histórico médico. Não precisa se perguntar como ele teve acesso a isso, eu explico.
Saori tinha controle de milhares de ramos de atuação. Entenda, ela tinha sociedade ou era dona de mais da metade do país, sem sequer divulgar isso. Obviamente, ela tinha parte do controle de muitos hospitais e clínicas.
E todos os sócios dela tinham convênio médico idêntico. Éramos sempre redirecionados a um hospital de ponta quando tínhamos alguma necessidade de saúde. O mesmo.
Portanto, o prontuário com meu histórico que estava nas mãos de Saga viera das mãos dela.
-Essa cirurgia aqui.
Tudo que eu não queria falar.
-Há dois anos e meio você foi internado para uma cirurgia de...
Saga riu de maneira debochada.
-Reconstrução anal. A que se deu esse episódio?
O olhei com raiva. Meu queixo ainda doía por conta do soco que levara dele, que sequer pareceu que havia me golpeado com aquela facilidade toda.
Sim. O psiquiatra maluco me xingou e quando parti pra cima dele, levei um soco tão forte que apaguei por alguns minutos. Quando acordei, recebi apenas uma bolsa de gel fria e ordem para continuar sentado e prosseguir com a consulta.
Saga nem pareceu se incomodar com a situação. Mexia nos arquivos com curiosidade.
-Foi após isso que começou a consultar-se com Saori?
-Exato.
-E isso foi de forma voluntária?
-Não. Ela me ofereceu a consulta de uma forma irrecusável.
-Que forma?
-Ou eu me tratava ou ela contaria o motivo da minha internação para minha família e os amigos mais próximos.
Saga parecia se divertir com aquilo.
-Antes de seguir com algumas perguntas imprescindíveis, me conte como chegou ao ponto de ter que operar para... Enfim, como se deu essa situação.
Céus, eu realmente gostaria de matar aquele cara.
Se eu pudesse...
-- --
Minha família se resume atualmente ao Shun, meu irmão caçula. Nossos pais faleceram muito cedo, Shun era um bebê praticamente. Ficamos ao cuidado de um orfanato sustentado pela empresa que eles trabalhavam.
O orfanato “Filhos das estrelas” foi o lugar que eu tive por referência de lar. Sim, eu e os outros tivemos muita, mas muita sorte ao sermos criados lá. Reconheço isso. Não era um orfanato qualquer.
Era praticamente um colégio interno.
Recebemos uma educação de nível de colégio particular dos melhores do país. Tínhamos acompanhamento médico, orientação vocacional quando íamos ficando mais velhos, suporte financeiro e ao sairmos receberíamos uma espécie de poupança acumulada ao longo do tempo que passamos lá, referente ao que nossos pais ou tutores nos deixariam caso estivessem vivos. A quantia que seria equivalente ao salário dos nossos pais era depositada em uma conta, portanto ninguém saia de lá de mãos vazias.
E quem era o mantenedor desse local? Idealizador também?
O avô de Saori, o Sr. Kido. Que aliás, a mantinha por lá. Ela cresceu com o pessoal da minha geração. A diferença é que ela voltava para uma casa com o avô dela para dormir e contar como foi o dia.
Já nós permanecíamos ali.
Mas não pensem que eu achei ruim ou sofri em demasia. De maneira alguma.
Nós fomos abençoados.
Foi lá que conheci meu grupo de amigos que se tornou minha família. Lá conheci o amor da minha vida.
Lá conheci ele.
Agora pensem comigo: acham mesmo que eu permitiria que as pessoas mais importantes da minha vida soubessem que eu, logo eu, me envolvera em uma situação...
Nunca.
Por isso iniciei o tratamento com Saori.
Um dos secretários e assistentes pessoais do Sr. Kido se chamava Tatsumi. Ele cuidava de vários negócios na ausência de seu chefe. E cuidava em orientar os jovens que atingiam a maioridade em relação ao dinheiro recebido e a melhor forma de investir ou aplicar, de acordo com as ambições de cada um.
Ele era figura presente no orfanato e nos negócios dos Kido.
Tatsumi nunca gostou de mim, essa era a verdade. Ele nos humilhava com frequência. Era um tipo careca, robusto, que se achava superior por estar ao lado do homem mais poderoso do país.
Acho que se achava poderoso por isso.
Lacaio de merda.
Quando completei a maioridade, tratei dos negócios com ele e me decidi a nunca mais encará-lo. Eu realmente o detestava. Mas os conselhos dele foram certeiros. Eu deveria fazer um curso de artes marciais ou uma faculdade de educação física e investir depois em uma academia.
Segui a contragosto os direcionamentos dele, e nenhum deu errado. Ele sabia o que fazia.
Após alguns anos sem notícias, eu o encontrei por acaso em uma das reuniões dos sócios de Saori. Continuava o mesmo arrogante de sempre, com olhos escuros e cheios de uma altivez que não lhe cabia. Parecia ainda mais forte, lembrei-me que ele praticava luta com espadas de bambu, era um atleta frequente. Por isso a boa forma física.
Ele estava com o mesmo ar de superioridade de sempre. Motivado pela bebida, decidi que seria um bom dia para lhe enfiar algumas verdades goela abaixo.
Precisava apenas de uma ocasião.
E ele mesmo a proporcionou.
Eu o ouvi ralhando com um dos rapazes mais novos dali, provavelmente um novato nos negócios, o chamando de idiota que deveria ter seguido seus conselhos e toda a baboseira do tipo quando o mandei calar a boca.
Tivemos um bate e boca acalorado. Quando eu era mais novo, ele me dava certo receio, admito.
Ainda mais pelas histórias que ouvia sobre as manias e taras dele. Aquele cara era doente.
No calor do momento, acabamos trocando alguns socos. Mas o cara era muito mais velho que eu e estava bêbado, não demorou muito até que eu estivesse com o pescoço dele entre meus braços.
Havia um prazer enorme em estrangular aquele pedante, devo confessar.
Fomos separados por Shun e pelos outros. Saori sutilmente se aproximou e nos ordenou que a seguíssemos. O resort em que nos encontrávamos era imenso. E ainda assim ela nos colocou em um quarto afastado, e foi bem clara em dizer que só voltaria no dia seguinte, afinal, tinha que dispersar o mal estar que nós havíamos causado entre as pessoas ali presentes. Esperava que nos comportássemos como homens civilizados naquela noite e não queria ouvir um pio. Ou...
Ou.
O “ou” dela realmente era algo a se considerar.
Quando nos vimos sozinhos naquele quarto afastado e eu enjoei de gritar pra que me tirassem de lá, o velho maluco começou a rir.
-Qual a graça?
-A graça? É que eu estou trancado no meu próprio quarto seu imbecil. A Srta. Saori me permitiu ficar onde eu estou hospedado. Não fosse você aqui, acho que poderia passar a noite tranquilo.
Quando reparei em volta, havia algumas malas por ali, e uma ou outra peça de roupa espalhada. Tatsume cambaleou até uma das malas e puxou uma garrafa.
-Bem, a noite mal começou. Minha amiga aqui vai ser melhor companhia do que você.
-Há, vá se foder seu bêbado doente.
Não tinha jeito. Eu passaria a noite ali, com aquele homem que eu detestava e ainda tinha que permanecer quieto.
Só conseguia pensar na expressão dele...
Ele pareceu incrédulo quando me viu brigando. Coitado, deve ter se assustado com meu rompante.
Sentei-me na porta mesmo e fiquei ali, enquanto o velho louco bebia, resmungava e ria sozinho. Após alguns minutos aquilo me incomodou.
-Do que tanto ri afinal?
-Da vida. Rio da vida.
-Já tá mais do que pirado. Me surpreende saber que Saori permite que um velho bêbado continue trabalhando para ela.
-Me surpreende o fato de você, aquele molequinho de nariz empinado ter virado alguém na vida.
-Como assim?
-Eu lembro de você. IkkI. Lembro bem. Sempre reparei em você.
Opa...
-Reparou em mim? Por quê?
-Por causa do seu jeito arrogante. Querendo ser superior sempre. Se achando acima da média. Há, se o Sr. Kido tivesse permitido eu teria te corrigido moleque, com certeza.
Tatsume bebia direto da garrafa, e me olhava com uma expressão estranha.
Mas estava me olhando.
-Me corrigido por quê?
-Por ser um metidinho de merda. Eu teria te ensinado, há sim eu teria, como se comportar direito. Você seria um bom garoto, obediente e disponível.
-Disponível?
-A SERVIR seu idiota. A SERVIR.
Confesso que não estava entendendo muito daquela conversa.
-Servir pra que? Velho, você é mesmo doente.
Ele se levantou e veio cambaleando até próximo de mim. Admito que ele sabia viver bem, ainda que como empregado, vestia-se com as roupas mais elegantes que eu podia lembrar, e naquela noite não era diferente. O sapato de couro, com certeza italiano, brilhava de forma indecente. O terno super bem cortado parecia ter sido feito sob medida.
Provavelmente era. Tatsume era um gentleman em aparência. Usava um perfume caro, com cheiro de coisa velha e importante.
Além de cheirar a charuto e bebida também.
-Eu sou especialista em ensinar as pessoas como elas devem se comportar. Você deveria ter sido educado para ser um garoto obediente, independente da situação. Com certeza não estaríamos aqui se isso houvesse sido feito antes.
Eu só não o arrebentei por que ele estava ali, me dando atenção.
-E você iria me ensinar?
-Com certeza. Um homem bonito e que sabe ser servil? Você iria muito longe garoto, muito longe...
Bonito?
-Eu sou bonito?
-E meio burro ao que parece. Não venha esfregar sua juventude na minha cara rapaz. Sim, você é bonito. Sempre foi. Não sei dizer se é por que sempre foi mais forte que os outros, ou pelo jeito mais arrogante. O rosto quadrado, a pele mais morena que dos outros, sempre pálidos e sem graça...
Ele colocou a mão no meu rosto, acariciando de um jeito nada gentil.
-Se soubesse usar o que tem a seu favor, conquistaria muito mais do que qualquer um aqui. Mas não. Sempre foi um metidinho. Metido a selvagem. E eu deveria ter domado você, afinal, isso é o que fazemos com selvagens. Domamos.
Afastei a mão dele com um safanão.
-Eu lembro bem do que diziam sobre seu jeito de “domar” os outros. Sempre me perguntei se você pensaria o mesmo se enfiassem aquela sua espada de bambu na sua bunda.
Tasume me encarou algumas vezes e piscou. De repente ele começou a rir. Gargalhar na verdade.
-Qual a graça?
-Vou te mostrar a graça.
Ele se afastou um pouco, e pousou a garrafa na mesa. Percebi que ele afrouxava a gravata, e ouvi o barulho do cinto se abrindo.
-O que diabos...
-Cale a boca e observe garoto. Só observe.
Eu estava curioso. Tatsume retirou o cinto, o sapato e as calças. Suas pernas eram fortes, nunca diriam que o dono de um corpo como aquele tinha a idade que tinha. De cuecas e meias, ele foi até uma das malas, e voltou sorrindo de maneira sádica.
-Acha mesmo que essa espada aqui só serve para lutar? Não seu imbecil, ela serve para educar. Acha que eu fui educado como?
Meu senso de perigo começou a apitar. A espada de bambu que ele usava não passava de um pedaço de madeira, a ponta redonda e ligeiramente curva, mas eu já presenciara lutas de verdade e sim.
Aquilo podia fazer um belo estrago.
Tatsume tirou a cueca e se ajoelhou a minha frente. Curvou-se após colocar a espada a sua frente e então se ergueu.
-Tenho reverência a ela. Agora veja, eu jamais aplicaria uma lição em alguém que não houvesse experimentado na própria pele.
Arregalei os olhos e fiquei com a voz presa na garganta ao observar que ele introduzia lentamente a espada no próprio ânus sem sequer lubrificar ou coisa do tipo. Ele me encarava com olhar desafiador e introduziu acho que um terço daquilo dentro de si sem sequer piscar.
-Me olhe bem. Vê? Depois de um tempo você se acostuma e percebe que não é tão ruim quando você facilita as coisas.
-Você... Você é louco.
-Eu fui educado com uma dessas exatamente onde você está vendo. Tiraram toda rebeldia de mim, e isso só me fez bem. Olha pra mim, desde sempre eu estou no topo. Ladeio os maiores. Tenho tudo que a vida me ofereça de conforto. E por que fui domesticado. Eu já fui um bruto como você, Ikki. E não chegaria a lugar nenhum. Mas tive sorte, sim...
Ele retirou lentamente a espada de dentro de si.
Sequer estava suja.
-Você é um doente arrombado.
-Será? Ouça a voz da experiência. Me deixe te mostrar como eu te educaria rapaz. Garanto que não vai se esquecer de como pode ser benéfico.
-- --
-Um minuto. O cara enfiou a espada de bambu na própria bunda?
Eu não era lá muito refinado no meu vocabulário de forma proposital. Mas confesso que ver um psiquiatra falando daquele jeito me deixava meio incomodado.
-Ikki?
-Desculpe. Sim.
Saga me encarou da mesma maneira tranquila que me irritava.
-Se eu não soubesse o quão louco você é diria que isso é mentira. Uma hora você vai ter que admitir que quis se colocar nesse tipo de situação, sabe disso não é?
Olhei feio para ele.
-Eu posso ter sim entrado em algumas situações diferentes, mas foi apenas por...
-Diferentes? Diferente é fazer sexo em local público e deserto a noite. O que você fez só mostra que você é extremamente perturbado.
Acho que Saori também podia ver a veia na minha testa latejando.
-Eu sou normal.
-Normalmente perturbado. Então ele enfiou a espada no seu rabo, e isso levou você a uma mesa de cirurgia para refazer o que sobrou do que você chama de cú?
Pisquei algumas vezes, incrédulo com o que estava ouvindo.
-Como...
-Se tem uma coisa que eu detesto é ficar repetindo as coisas. Já perguntei se você era surdo, não? Foi uma espada no rabo que te fez operar a bunda?
Ouvi um barulho de movimento, e vi Saori se remexer de leve na cadeira que ocupava. Ela estava com os olhos arregalados, coçando a nuca, mas nada disse.
-Na... Não.
-Oras... O que foi então? Ele enfiou a garrafa de bebida?
-Céus, não.
-Então como foi que o seu...
-Posso continuar, por favor?
-- --
-O que você ganharia com isso? Ou melhor, o que eu ganho com isso?
Tatsume riu.
-Eu ganho uma consciência limpa, e você uma amostra de como é bom ser servil e obediente. O que acha?
Só entrei no jogo pela forma com que ele me olhava. Um jeito curioso, cheio de expectativa e ansiedade.
-Não acredito muito em você. Mas está bem. O que terei que fazer?
Tatsume sorriu e ordenou que eu me sentasse na cama.
-Espere aí. Tenho que fazer um telefonema.
E foi o que ele fez. Dez minutos depois eu ouvi a campainha tocar.
-Atenda. Nosso jantar chegou.
Recebi o serviço de quarto. Havia uma bandeja coberta e mais nada.
-O que é isso?
-Lição. Apenas lição. Agora tire a roupa.
-Como é?
-Tire a roupa. Devagar, quero ver você bem.
Queria me ver...
Bem, lentamente me despi diante dele. Apenas com a camisa, o paletó e a gravata frouxa ele me olhava como um predador diante da caça.
-Bom...
A medida que ele me elogiava eu me sentia mais tranquilo. Parecia que Tatsume estava em êxtase.
-Agora ouça bem minhas instruções e tudo ficará bem. Lembre-se que eu estarei te aplicando técnicas que irão te deixar mais brando para o que vier a frente na sua vida. É imprescindível que me obedeça.
-Hum...
Bem, lá estava eu. Nu diante de um maluco que acabara de enfiar uma espada de bambu na bunda.
-Deite-se de barriga pra cima. E coloque os braços atrás da cabeça.
Fiz o que ele disse.
-Afaste as pernas.
Feito.
-Agora feche os olhos e relaxe. Vou introduzir um dedo em você.
-O que?
-Quieto. Vou introduzir um dedo em você. Me obedeça.
Eu comecei, ia terminar. Fechei os olhos e aguardei.
-Ai.
-Eu disse quieto e de olhos fechados.
-Isso dói seu idiota.
-Mandei você relaxar. E ficar quieto. Lição número um: se obedecer de cara, as coisas fluem muito facilmente.
-Mais fácil seria se você cuspisse ou passasse um lubrificante.
A resposta dele foi retirar o dedo.
E introduzir de uma vez logo dois dedos.
-AI!
-Qual a primeira ordem que eu te dei?
Gemi de dor. Eu não podia arrebentar a cara dele por que Saori com certeza ouviria e isso traria problemas logo depois. E eu tinha topado aquela porcaria, então...
Resolvi obedecer. Só por que ele estava me olhando também.
-Relaxar e ficar quieto.
-Obedeça. Vai ver como tudo melhora.
Respirei fundo. Tentei relaxar.
E infelizmente, funcionou.
Não. Não ficou prazeroso. Não diminuiu a dor e virou prazer. Longe disso.
Apenas doeu menos.
Tatsume moveu os dois dedos em um vai e vento lento e seco. Quando estava mais relaxado, ele sorriu.
-Sei que não é confortável mas você chega lá. Como obedeceu direitinho, agora vou te mostrar uma recompensa.
Ele se virou para a bandeja. Retirou os dedos de mim, e sorriu ao pegar uma cenoura nas mãos.
-É, essa aqui está boa para começar.
Ele caminhou até uma das malas e remexeu ali.
-Há. Achei que não tinha trazido. Melhor assim.
Quando ele se virou para me encarar, senti um arrepio. Um misto de medo e expectativa.
-Você não vai enfiar isso...
-Calado. Já disse que vou te mostrar os benefícios de ser servil. Como se comportou como um bom garoto agora a pouco, vou te dar um pouco de prazer. Mas preciso que fique quieto.
A minha frente, vi ele abrir o tubo de lubrificante que tirara da mala. O gel frio foi generosamente distribuído pela área entre minhas pernas.
E ele começou a me masturbar vagarosamente.
-Feche os olhos. E mantenha as pernas afastadas.
Obedeci. Não me excitei pela estimulação de Tatsume. Não sentia atração nenhuma por aquela múmia pervertida.
Imaginei que seria ele. Ele estava ali, me tocando, silenciosamente.
Sendo ele, podia fazer o que quisesse.
Me perdi na fantasia de ser tocado por ele. Fechei os olhos com força e me deixei levar.
Por aquele sorriso bobo.
Pelos olhos grandes, cheios de uma teimosia infindável.
Mal senti quando Tatsume iniciou uma nova penetração, ainda com os dedos.
Ia e vinha, sem pressa.
E pensando no meu amor enquanto me entregava aquilo, mal notei quando ele trocou os dedos pela cenoura.
-- --
-O cara introduziu uma cenoura em você?
-Sim.
-E como você se sentiu?
-Um pouco incomodado, mas a expressão dele era de deleite. Deixei que continuasse por conta disso.
Saga arqueou uma sobrancelha.
-E depois?
-Ele ficou algum tempo brincando com a cenoura. Depois trocou ela.
-Trocou? Trocou pelo que?
-Um pepino.
Saga segurou uma risada.
Sério? Aquele era o comportamento de um psiquiatra renomado?
-Pepino comum, do mais grosso, ou pepino japonês, aquele fino e comprido?
-Comum.
-Foi aí que você se machucou?
-Ainda não.
Saga piscou.
-O que mais ele enfiou em você?
-Depois do pepino, uma banana. Então ele tentou colocar uma berinjela pequena, e aí que aconteceu o acidente.
-Continue.
-- --
Tatsume enfiava os legumes em mim e parecia se deliciar em me ver obedecendo cada ordem sua. Ele me mandava gemer, rebolar, me virar de lado...
E eu obedeci.
Após a cenoura, o pepino e a banana serem deixados de lado, e eu sentir uma ardência infernal naquela área, vi ele colocar mais gel na mão.
-Posso perguntar algo?
-Senhor...
-Senhor Tatsume, posso perguntar algo?
-Bem melhor. O que quer saber?
-Nós... Podemos parar? Eu não me sinto bem...
Tatsume sorriu.
-Pelo jeito aprendeu alguma coisa já. Apenas mais uma lição e pronto, eu termino o que comecei. Agora você já deve estar relaxado o bastante, mas vai ter que relaxar ainda mais.
-Está... Certo...
-Fique de quatro. E empine o quadril ao máximo. Assim...
Ele colocou muito lubrificante ali.
-Bom. Agora relaxe ao máximo. Aquele bolo de cenoura, a banana com foundue e o pepino com café foram descartados por que você os sujou, mas com essa aqui não vai aparecer muita coisa.
Demorei a entender a piada nojenta dele sobre o fato de ter resquícios de fezes nos legumes. Antes que eu visse o que vinha pela frente, ele começou a introduzir algo em mim. Um pouco mais macio.
Mas bem mais largo.
-Relaxe. Esse entrando, e você obedecendo, vai ver o que é uma boa recompensa.
Ele começou devagar, mas em dado momento eu comecei a ficar nervoso e acabei apertando aquilo com...
Enfim, vocês entenderam.
-Não seu idiota, não faça assim ou vai estragar.
-Me... Me estragar?
-Não imbecil, estragar a berinjela. Relaxe logo ou ela pode amassar. Em um caso pior, até se partir dentro de você.
Há, sim, claro que eu relaxaria com a possibilidade iminente de ter uma berinjela quebrada na bunda. Qualquer um relaxaria.
-Se não relaxar não me dá outra escolha...
Antes mesmo que eu pudesse sequer reclamar, soltei um urro.
Ele empurrou o máximo que pode daquilo em mim.
De uma vez.
-IDIOTA!
Me coloquei de pé, nervoso e dolorido. Tatsume pegou a espada de bambu.
-Idiota. Você é uma maldito idiota, moleque burro. E eu achando que ainda havia esperança pra você. Não... Você sempre foi um merda, e vai continuar sendo. Se tivesse ficado quieto...
Ele assumiu posição de luta.
-Agora vou ter que te castigar.
-- --
-E foi então que ele atolou a espada na sua...
-Não Saga, que coisa. Nós brigamos, eu o desmaiei, e quando chegaram ao quarto, nos levaram ao hospital A berinjela realmente se partiu dentro de mim, e teve que ser retirada no hospital.
Saga começou a gargalhar.
Gargalhar insanamente.
-Con... Continue...
-Após retirarem as sobras daquilo, eu... Fiquei com uma fissura. Não tive que operar, fazer uma reparação anal. Tive que... É...
Saga ainda ria.
-Aqui diz... Haha... Reconstrução anal.
-Não foi dessa vez. Nesse episódio eu tive que... Hum... Aplicaram botox na região.
-Botox? A substância que usam no rosto para preencher rugas e coisa do tipo?
-Me explicaram que quando há problemas de fissura anal ou hemorroidas, se aplica Botox para melhorar a cicatrização na área, e ajuda na vascularização. Eu sentiria menos dor e me recuperaria mais rápido.
Saga sacudia a cabeça.
-Então eles escreveram errado aqui?
-Não.
-Espera aí. Me explica isso direito. Você fez a reconstrução anal, mas não foi por que enfiaram legumes na sua bunda?
-Exato.
-Foi por que motivo então?
Definitivamente eu não aguentaria mais nada naquela sessão.
-Enfim, depois desse episódio, Saori me visitou. Ela disse ao meu irmão e aos outros que precisava de mim em um evento de artes marciais e por isso eu me ausentaria as pressas por um período de três meses. Esse era o período previsto para recuperação completa. Tatsume foi afastado, enviado para tratar de coidas na Europa, e ela após ouvir a história, sugeriu que eu começasse a terapia. Mas ainda não havia me obrigado.
-Eu não quero saber disso. Quero saber por que motivo passou pela reconstrução anal.
-Por favor... Eu... Não quero falar disso hoje.
Saga estreitou os olhos.
-Muito bem. A próxima sessão será exclusiva para que me conte o motivo dessa cirurgia. E se bem me lembro, você me disse que teve um relacionamento um dia, certo?
-Há muito tempo. Tive sim.
Saga pensou por algum tempo, me encarando com um olhar inquisidor.
-Muito bem. Pode sair. Darei novas instruções a Saori.
-Mas... Acabou?
-Não me ouviu dizer para sair? Antes da próxima consulta, passe em um otorrino. Me cansa repetir as coisas pra você.
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