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História Êxodo - Capítulo Único


Escrita por: Yume-ni

Notas do Autor


Bem, eu demorei muito tempo escrevendo essa fanfic. Paralisei todos meus outros projetos, pq esse é um plot que demorou bastante tempo pra amadurecer. Pra vcs terem ideia, eu mudei umas três vezes de plot jsjsjsjsj por isso to chegando no bond das atrasadas heuebheeh, mas é a vida!
Eu gostei muito de eacrever, por isso espero que gostem de ler!
Mais explicações nas notas finais. ^^

Capítulo 1 - Capítulo Único


TOMO 1

A Profecia

Minseok esfregou as mãos sentindo os dedos dormentes. Ele estava a uma distância relativamente boa da fogueira, mas o calor ainda não era capaz de aquecer seus músculos tensos e suas juntas doloridas. Com seus olhos felinos observou os homens da aldeia, aguardando com muita ansiedade, a volta do Chefe de dentro da caverna da velha Sacerdotisa.  Dentro das tendas feitas de couro animal, as mulheres estavam enroladas em suas peles e com suas crianças adormecidas em seu seio. Seus sonhos eram cheios de preocupações com o futuro dos homens e de suas crias. As crianças maiores que já comiam carne da caça e bebiam do gelo, espreitavam escondidas a cheias de curiosidade a entrada da caverna. Mal sabiam que depois daquela noite seu destino seria mudado drasticamente.

O vento era gélido e cortante, mas nenhum dos caçadores se movia para seu leito, apreensivo pela profecia que seria entregue ao líder dos caçadores. Todo o destino da tribo estava sendo decidido entre a velha Sacerdotisa e o caçador. Não havia mais caça suficiente para as mulheres e crianças. O frio se intensificava a cada novo pico solar, deixando todos apreensivos e com medo de um dia amanhecer azul como o céu e frio como gelo. O medo já se instalava no coração de todos e, como única esperança, aguardavam a solução para seus demônios. Minseok compartilhava dos mesmos medos e tinha suas próprias ideias sobre o que deveria ser feito. Assentado em seu canto, mastigava sem vontade as ervas do estoque que as mulheres trouxeram do antigo assentamento.

Há várias luas, ele havia finalmente se tornado caçador. Assim que alcançou o número de circunferências lunares suficiente, a velha sacerdotisa pintou seu rosto de escarlate e entregou a ele sua lança. Sozinho, Minseok foi atrás de sua primeira caça. Como um astuto felino, empunhou sua lança rústica e abateu uma raposa das neves. Mesmo que tivesse conseguido, não se sentia satisfeito e o amargo das más notícias incomodava sua língua. Queria ele não ser portador de mais maus presságios para o povo. 

Ao chegar no centro da aldeia, as mulheres saíram e fitaram abatidas o resultado da caça do jovem Minseok. Ele relatou a dificuldade de encontrar animais e as tocas vazias por onde passou. O chefe o escutou com o rosto sombrio. Foi confirmado o que todos os outros caçadores já haviam constatado. Era hora de mudar. A questão difícil era: Para onde? Estavam entre o deserto gelado e uma tribo inimiga com armas melhores e mais homens. Não havia saída segura para todos.

Sentou-se, então, isolado de todos por doze picos solares. Não comeu, não bebeu e nem o seio de uma parceira procurou. Sua mente de caçador trilhava planos e mapas mentais em busca de uma solução para salvar sua gente. Nunca em tantos anos guiando os seus, ele se sentiu tão impotente e encurralado como naquele momento. A angústia parecia para ele como um tigre faminto por sangue, lhe devorando a carne até não restar nem mais os ossos. Numa noite seu sono foi conturbado e cheio de imagens perturbadoras. Aflito então, no fim do décimo segundo pico solar, ele ergueu-se de seu canto e caminhou sem hesitação até a caverna onde a velha mãe habitava. Os homens e as mulheres da tribo ergueram seus rostos, fitando com seriedade o caçador que entrou no lugar sagrado e não voltou por um bom tempo.

 

 

O jovem Minseok e seus irmãos se levantaram quando o chefe caçador saiu da caverna com o rosto frio como gelo e os ombros caídos pela responsabilidade que lhe havia sido dada. Ele fitou o rosto de seus companheiros e sentou junto a eles, perto da fogueira para espantar o frio que lhe congelava as falanges.

– Eu conversei com a Mãe sobre o destino que nossa tribo deve tomar, agora que não existe caça ou plantas para se comer aqui

           Nem mesmo a velha soube dizer qual a saída, mas ela disse que entre nós há um caçador que sabe a resposta. – Os homens se entreolharam curiosos e com o semblante mais aliviado – Ela disse que antes o caçador deve provar seu valor e há apenas uma maneira de se fazer isso.

– Conseguir o pelo de um Urso do gelo. – Minseok respondeu. O chefe acenou com a cabeça confirmando.

– Mas isso é impossível! – Um dos caçadores mais experientes pontuou – Se não há mais caça, significa que nem mesmo ursos serão encontrados. Até mesmo os tigres não caminham mais por entre as árvores à procura de uma presa. Por que arriscaríamos nossas vidas no gelo para procurar algo que não vai estar lá?

– Então você se opõe irmão? – Disse o chefe – A participar da grande caçada? – O homem não respondeu. Ele podia sentir os olhos de todos os outros em cima dele. A sensação de desconforto o fez calar-se permitindo ao chefe que continuasse a falar. A grande caçada era o evento mais sagrado de toda aldeia. O caçador que trouxesse o pelo do urso branco em seus ombros, seria tido como abençoado dos espíritos. Era chamado de “Aquele que bebeu do seio da grande mãe”.

– Aquele que trouxer a pele e a carne do último urso da neve, não apenas terá a benção da mãe, como será o chefe depois de mim! Essa é a minha vontade e a vontade dos grandes espíritos. – Sentenciou finalmente. Os jovens caçadores logo se animaram cheios de ideias mirabolantes, enquanto os mais velhos se moveram até seus leitos de maneira taciturna, ruminando todas as palavras que lhes foram ditas.

No próximo pico solar seria a grande caçada e Minseok sentia seu coração já acelerado de tanto nervosismo. Ele pensou se havia a remota possibilidade de conseguir tornar-se o chefe e salvar a todos. Ser um herói. Logo afastou tais pensamentos se martirizando por pensar apenas em si mesmo sem considerar a todas as vidas que estariam em suas mãos se fosse lhe dada tal tarefa. Quando finalmente conseguiu adormecer, seus sonhos foram cheios de imagens distorcidas e premonições de um futuro próximo. Ele apenas não sabia disso.

 

TOMO 2

A Caçada

Os caçadores saíram todos juntos, aproveitando que o vento estava a seu favor. Aos poucos, cada um seguiu sua trilha à procura do Urso branco que lhes daria a glória. Era proibido matar seu irmão, matar um urso mãe e matar filhotes. Seguindo cada uma das regras espirituais, a probabilidade dos espíritos os ajudarem era maior. Minseok atravessava uma camada de gelo fina, onde se você prestasse mais atenção poderia ver gelo líquido. Com cuidado ele pisou exatamente nas pegadas gigantescas que claramente indicavam ser de um Urso da neve, macho e jovem.

Quando Minseok o encontrou, a fera estava cavando em busca de alimento, alheia a movimentação do humano que manejava sua lança enquanto maquinava a morte do animal. Seus pés se moveram na neve com cautela até que se atirou sobre ele com fúria. O urso rugiu e moveu o corpo tentando tirar o humano de seus ombros. 

Nos dentes de Minseok havia uma faca de osso polido, já pronta para ser usada. Agarrou o pelo do animal com as unhas e, com um grito gutural, enfiou a faca na jugular da fera que se contorceu enquanto perdia sangue. Minseok e o urso caíram na neve juntos. Rapidamente o jovem caçador se afastou a procura de sua lança, pronto para atacar o animal que ainda se movia em sua direção, grunhindo de dor. 

Com destreza, Minseok saltou para longe da boca do monstro que se aproximava e transpassou o abdômen do urso, fazendo com que ele caísse novamente, dessa vez sem força alguma para se reerguer. Minseok se aproximou, tocando o cabo da faca que ainda estava enterrada na carne do animal, cotando-lhe o pescoço. 

Estava feito. 

Minseok havia matado um urso da neve como em seu sonho no último descanso.

A realidade lhe abateu como uma grande rajada de vento. Atordoado, caiu de joelhos ao lado do corpo do urso com os olhos arregalados e a respiração alterada. Ao longe ele pôde escutar o grito dos caçadores à sua procura. Assim que eles chegaram a clareira e avistaram Minseok ao lado do urso soltaram um grito de júbilo, que chegou a ser escutado até mesmo pelas mulheres em suas tendas.

Nos ombros de seu irmão mais velho, Minseok foi levado de volta até a aldeia. Os outros caçadores carregavam o urso animados, já imaginando o cheiro da gordura enquanto queima na fogueira e o gosto da carne em sua língua. O festejo durou três picos solares. Homens e mulheres cantaram e dançaram agradecendo aos espíritos pela caça concedida. Comida significava mais dias de vida. Significava esperança para todos.

A única coisa que passava pela cabeça de Minseok naquele momento era que, aquele urso estava mais magro que os outros que havia encontrado antigamente. Ele tinha menos força e menos músculo, o que tornou seu abatimento mais rápido.

“Se fosse um urso saudável – pensou Minseok – eu teria morrido”

Havendo comido o suficiente, afastou-se da fogueira andando sem rumo por entre as tendas. Ocasionalmente encontrou o chefe sentado atrás da própria tenda, assando alguns pedaços de carne. Compelido pela curiosidade, aproximou-se e sentou afrente do caçador curvando-se.

– O que faz longe da festa, Minseok? Seu lugar não é nas sombras junto a um velho caçador.

– O velho caçador que salvou minha vida mais vezes do que se pode contar. – Minseok sorriu para o irmão ajudando a reavivar as brasas que perdiam seu calor.

– Grande chefe...

– Eu não sou mais o chefe. – O caçador ergueu o olhar cheio de diversão – Você é que é, jovem tigre.

– Isso me parece um sonho, como aqueles que tenho todas as noites. – Minseok murmurou - Espero que se concretize e que encontremos comida.

– Você já tem um plano. Apenas execute-o. – Disse, dando de ombros.

– Eu queria que fosse simples assim. – Disse cheio de medo.

– Se ainda não está seguro com seu plano, apresente a velha sacerdotisa e peça suas instruções. A sabedoria dela lhe será de grande ajuda.

– Tem razão, amanhã durante o pico solar falarei com ela. – Minseok falou mais aliviado – Espero que eu possa contar com sua sabedoria também, Grande Chefe. – Minseok sorriu sem se importar por chamar o irmão pelo antigo título.

– Sempre que precisar, jovem tigre.

 

 

A mesma cena se repetia.

Todos apreensivos aguardavam a volta de Minseok de dentro da caverna. Dessa vez seus corações estavam mais leves, pensando na esperança de uma solução para a falta de comida. Quando ele saiu, a velha sacerdotisa veio junto, trazendo seu estandarte de crânio de Tigre. As presas afiadas brotavam da mandíbula e se curvavam delicadamente para frente. Deslizar os dedos pelo osso polido podia acarretar cortes finos e doloridos, que infeccionavam rapidamente pelo veneno encrustado na lâmina.

Os homens se levantaram e as mulheres junto as crianças espiaram das tendas com apreensão. Seus corações acelerados batiam juntos com expectativa pelas palavras do jovem líder.

– Como sabemos, a comida tem se tornado escassa e a iminência de um ataque inimigo se torna mais próximo a cada instante. – Minseok disse duramente – O deserto gelado a nossa frente é aterrorizante e cruel, mas eu vejo como nossa única saída. – Um burburinho se instalou entre os membros da tribo, desacreditados pelo que acabaram de ouvir.

– A profecia, - começou a anciã, fazendo todos se calarem novamente – Fala sobre um caminho de terra que existe além do deserto gelado. Os espíritos deram a Minseok sonhos com as instruções que devem ser seguidas para que a tribo chegue do outro lado do caminho, onde existe muita caça e o frio não corta nossas peles como uma faca mal polida.

– Essa é nossa chance. Se minhas visões estiverem certas, nós sobreviveremos até o fim da viagem – Continuou o líder – e chegaremos a salvo.

Minseok deslizou os olhos pelo pequeno grupo de pessoas que formavam sua tribo. Ele não os culpava por ter medo, ele mesmo sentia seu coração tremer só de pensar nas feras que habitam o grande deserto gelado. Ele sabia que dessa vez seu inimigo não seria um urso jovem e magro, quando finalmente chegasse nas planícies cobertas por camadas intermináveis de neve.

– Eu preciso saber se estarão dispostos a vir comigo e sobreviver. – Sua voz ecoou no vale repleto de silêncio - Até o último minuto.

 

TOMO 3

A Viagem

 

Quando a caminhada começou, todos tinham os passos cheios de pressa e o medo nublando suas mentes. A divisa entre a floresta e o deserto gelado já poderia ser vista. As crianças foram postas no colo das mulheres e nas costas elas carregavam suprimentos para a viagem, enquanto os homens se encarregaram de levar as tendas e as armas. Seus olhos não estavam presos no caminho, mas em Minseok que guiava a todos com sua passada firme e decidida.

O jovem caçador sentia o peso da responsabilidade lhe sufocar a cada minuto que passava. Ele percebia os olhos apreensivos da tribo em suas costas, cada movimento seu era observado e julgado. 

Estariam todos indo para a morte ou para a vida? 

Minseok tinha a certeza e a confiança da anciã e do antigo chefe. Ambos disseram confiar cegamente em seus sonhos, afirmando que haviam sido dados pelos espíritos e que ele seria, com certeza, o salvador de todos. Mesmo depois de suas palavras de apoio, a confiança desconfiada de seus irmãos o fazia pensar se o caminho escolhido era realmente o certo.

Depois de muito tempo de viagem, os nômades pararam para descansar e comer. As mulheres levantaram as tendas para proteger as crianças do vento frio e deitar para descansar um pouco.

Minseok levantou os olhos, observando o início do deserto. A partir dali seria apenas a planície gelada e nada mais, não sabia a distância, ou quanto tempo levaria até percorrer toda aquela imensidão branca. Não sabia se haviam feras ou se seria possível encontrar comida durante o percurso. Havia apenas os seus sonhos e a promessa de que chegariam vivos do outro lado.

Quando todos se sentiram fortes o suficiente para continuar, se levantaram e prosseguiram viagem. Minseok e outros caçadores mais experientes, iam à frente resguardando a passagem das mulheres e crianças que vinham atrás de si. A preocupação de um ataque inimigo ou de alguma besta da neve os faziam ser cautelosos em qualquer passo tomado. 

A falta de elevações e da folhagem das árvores causava uma estranheza tamanha e, Minseok, que mesmo dormir tornou-se difícil. Ele se deitava na neve durante as paradas e observava o céu, buscando qualquer coisa que o diferenciasse do que havia deixado para trás. Fazia dias que não via animais ou plantas de qualquer tipo. As vezes fechava os olhos e tentava recriar o barulho do vento que dançava por entre as folhas das árvores, trazendo a canção dos espíritos.

Ele sabia que nunca mais voltaria para aquele lado do deserto.

– Já estão todos prontos para uma nova marcha, senhor – Um dos garotos mais novos se aproximou.

Minseok assentiu e levantou-se, tirando o excesso de neve das roupas. Com a lança nas mãos, colocou a pele de urso nas costas e esperou a tribo se ajuntar atrás de si. Depois de algumas horas de viagem, foi possível encontrar algumas elevações. Pequenos montes de neve um pouco distantes um do outro podiam ser avistados ao longo do deserto. Uma animação sem igual tomou Minseok, que saiu na frente para fazer o reconhecimento da área.

Ele cutucou os montes de neve à procura de alguma explicação para aquilo. No momento em que tocou percebeu que havia algo congelado por debaixo da cobertura esbranquiçada. Limpou a neve para poder identificar o que era e não evitou a exclamação de surpresa ao perceber que eram arbustos congelados. Não tinha folhas, apenas os galhos nus e rígidos por causa do gelo. Minseok deslizou os dedos pela superfície dos galhos tentando reconhecer aquela espécie. Era parecido com os que existiam no antigo assentamento.

Um barulho estranho chamou a atenção de Minseok, que se virou com a lança em riste. Nunca andar com a guarda baixa foi um dos primeiros ensinamentos que recebeu e tornou-se algo incrustado em sua mente. Seus passos eram leves como os de um tigre contornando mais um arbusto congelado, bem à sua frente, havia a carcaça de um animal gigantesco e peludo. 

O caçador nunca havia visto um animal como aquele. Com cuidado aproximou-se e percebeu que os olhos da fera estavam abertos e esbugalhados, ele não se movia, por isso constatou que estava morto. Tocou no pelo dele, percebendo que a carne ainda estava quente e propicia para o consumo. Com as mãos na boca, mandou um chamado aos caçadores da tribo avisando que havia encontrado algo, enquanto contornava o corpo desfalecido.

Quando girou o corpo para repetir o som, seu corpo retesou imediatamente. A fera a sua frente era menor, mas muito mais assustadora. Um tigre adulto, saudável e faminto. O animal rosnou enquanto rondava Minseok pronto para atacar a qualquer momento, suas presas de marfim, afiadas e pontiagudas se projetavam para frente tornando qualquer ataque frontal sinônimo de suicídio.

Minseok engoliu o próprio pânico, segurando a lança com firmeza. Suas pernas tremiam levemente, mas sua coragem o mantinha de pé. Ele não podia morrer. Não agora. Não sem terminar a travessia e deixar seus irmãos em segurança.

O tigre se lançou contra ele, rosnando e projetando suas presas para dilacerar o caçador. Minseok rolou na neve, fugindo da boca mortal da fera. Se jogou contra o lado do corpo do tigre, perfurando com sua lança o pelo do animal, de forma superficial permitindo que ele fugisse do ataque. Mesmo sangrando, o tigre se pôs de pé com seus grandes olhos amarelos fixos no humano.

O tigre atacou novamente dessa vez com êxito. O peso de seu corpo derrubou Minseok, que tentava a todo custo desviar o rosto da boca da fera. Prendeu sua lança nos dentes do tigre e, com uma força que nunca imaginou ter, segurou a cabeça dele impedindo que suas presas o estraçalhassem. 

O grito de caça foi ouvido e os caçadores da tribo de Minseok chegaram se lançando contra o tigre. Suas lanças lhe atravessaram a carne e o corpo da fera caiu por cima do chefe da tribo. Com o coração batendo como um tambor, Minseok se arrastou debaixo do corpo do tigre sendo recebido pelos braços de seus companheiros aflitos que examinaram seu corpo em busca de ferimentos.

– Eu estou bem. – Ele dizia, apenas para acalmar seus companheiros. Minseok sabia que seus sonhos agora teriam um novo vilão. 

Ele não olhou mais para o corpo do tigre. 

 

Quando as mulheres chegaram, preparam a carne da fera peluda para ser levada na viagem e arrancaram a pele do tigre, limparam seu pelo e foram até Minseok para entregar sua nova capa. No momento em que os olhos dele se puseram sobre a pele, recusou veementemente a tomar posse dela e as instruiu que a dessem para a anciã. Ele se recusava a olhar para aqueles olhos amarelos e assustadores todos os dias.

Sentado na divisa do acampamento, analisou o horizonte a procura de algum sinal de que estavam perto do fim da caminhada. A partir daquele ponto específico onde estavam acampados existiam fileiras e mais fileiras de arbustos congelados. Minseok pensou que talvez aquele fosse um sinal de que o deserto estava quase no fim. A presença do tigre e do grande animal peludo que encontrara há algumas horas, eram mais provas de que sua jornada estava próxima do fim.

Todos da tribo estavam animados e com as esperanças renovadas, pela certeza de que logo chegariam ao fim do deserto gelado.

 

Não haviam mais arbustos ou qualquer sinal de que o deserto estava no fim. A imensidão branca chegava a cegar em determinados momentos de tão nivelado que aquela parte do percurso era. Era o pico solar mais quente que haviam passado. As crianças nem conseguiam respirar direito porque o ar estava seco, sangramentos nasais haviam se tornado comuns e os lábios de todos estavam tão rachados a ponto de machucar.

Minseok sentia o sangue descer novamente até seu lábio. Enxugou usando a pele de urso e continuou a caminhar de maneira apressada. Todos sabiam que o ciclo luminoso estava para acabar e que logo a escuridão chegaria e a lua tomaria o lugar do sol. Viajar nessas condições era extremamente perigoso. Eles poderiam se perder no deserto gelado, ser atacados por tigres sem perceber e, é claro, a comida poderia acabar e eles não seriam capazes de conseguir mais.

O chefe sentiu a visão embaçar e as pernas tremeram pela fraqueza que o tomava. Usou a lança para se apoiar e não cair na frente de todos, observando a respiração que saía de sua boca cada vez mais pesada. Todos atrás dele pararam de andar, aguardando Minseok voltar a se mover, quando ele deu mais um passou, desabou.

 

O sonho foi o mais confuso de todos. Uma grande ave sobrevoava sua cabeça, mostrando o caminho por entre árvores que o cercavam. Havia neve fofa sobre seus pés, mas não tinha tantas peles protegendo seu corpo do frio. 

Quanto mais andava, mais quente ficava. A neve foi se dissipando, tornando-se terra e folhas sob seus pés. Ele podia escutar o som da floresta vibrando a sua volta. Era como se bem ali, tudo pulsasse como um grande coração. 

A grande ave sumiu subitamente, e a frente de Minseok uma figura brilhante surgiu. Seus olhos e seus cabelos eram como fogo e sua pele da cor da terra e dos troncos das árvores. A entidade carregava uma lança e armas que ele nunca havia visto durante sua curta vida.

– Se apresse, humano. Tupã espera por você. – A voz grave do espírito da floresta fez todos os pelos da pele de Minseok eriçarem. – Eu não o guiei até aqui para morrer.

– Como devo chama-lo, Espírito? – O de cabelos cor de fogo riu da audácia do jovem a sua frente. Aproximou-se, assustando Minseok que abaixou o olhar, ficando petrificado. Os pés do espírito estavam para trás.

– Você já sabe. Criança tola. 

 

“Chanyeol”

Minseok acordou em sua tenda, cercado de peles e com a respiração acelerada. Aquele sem dúvida havia sido seu sonho mais perturbador. A figura do guerreiro dos cabelos cor de fogo e dos pés para trás estava pregada em sua mente e parecia lhe perseguir ao logo do dia. As mulheres o alimentaram e limparam, permitindo apenas depois de muito tempo que ele saísse do abrigo. 

Estava realmente menos frio, apesar do ar estar ainda muito seco. Minseok analisou o estoque de suprimentos junto com os outros caçadores. Daria para quinze picos solares e isso deixava o chefe preocupado. O horizonte ainda era incerto. Na sua mente, ele lembrava do espírito lhe dizendo que não o havia trazido até ali para morrer. Confiando nas palavras dele, ordenou que o acampamento fosse desfeito e a marcha fosse reiniciada.

 

TOMO 4

O Caminho de terra

No momento em que avistou o grande caminho de pedra, Minseok foi tomado por uma euforia sem tamanho. Ele voltou até os seus e alertou que já estavam próximos de seu último obstáculo. O êxodo de suas vidas estava quase no fim. Toda a tribo se levantou animada. Desfizeram as tendas e apagaram a fogueira. Com os suprimentos seguros em suas costas, o grupo se moveu, seguindo seu chefe até o caminho que ele dizia ter encontrado.

Desceram o planalto onde estavam, a neve se desfazia revelando a terra seca. Dos dois lados do caminho havia tanto gelo líquido que se perdia de vista e o azulado de suas ondas. Um grande paredão se erguia dos dois lados do percurso, nem mesmo as ondas eram capazes de destruí-lo. As crianças seguraram as mãos das mulheres, apreensivas pelo desconhecido que se desdobrava diante de seus olhos.

Minseok ajudou a anciã descer. Os olhos da velha mulher percorreram a paisagem de maneira deslumbrada. Como uma criança, ela riu e andou mais à frente chamando os jovens que caminhavam apreensivos atrás de si. O chefe caminhava ao lado dela e, junto dele, o velho chefe também o acompanhava. Absortos em todas as novidades que apareciam diante de seus olhos.

O jovem caçador lembrou da manada das grandes criaturas peludas que encontraram assim que saíram do deserto gelado. Eram iguais ao que haviam encontrado morto tempos antes. As tocas estavam cheias de roedores, a quantidade de plantas comestíveis era abundante daquele lado. 

Todos ficaram tentados a ficar ali mesmo e deixar de procurar o caminho de terra da profecia. A anciã deu um sermão em todos e os advertiu das consequências de se desobedecer aos espíritos. Mesmo contrariados eles concordaram em apenas ficar pelo tempo necessário para recobrar suas forças e aumentar o estoque de mantimentos. 

Minseok sentiu-se aliviado. As contendas durante a viagem existiram e não foram poucas, mas em nenhum momento a tribo se separou ou desistiu de sua marcha. As únicas vidas perdidas foram de velhos que já estavam próximos do fim de seu ciclo. Muitos lamentaram não poder ver o caminho de terra e o que havia do outro lado. 

Os homens caçaram e as mulheres colheram, logo tudo ficou pronto.

Atravessar todo o percurso do caminho de terra se mostrou mais perigoso do que imaginaram inicialmente. Ao longo do percurso, o caminho foi se afunilando e tornando-se mais estreito. Minseok ergueu os olhos para cima vendo a crista das ondas bater no topo do paredão. A água respingava para dentro, molhando os nômades. O grupo passou a caminhar com todos mais próximos uns dos outros. Os corpos tremiam por causa da água gelada, sabendo que nem parar poderiam mais. Não havia onde armar tendas ou um lugar para todos se aconchegarem em volta de um a fogueira. Caminharam por horas, picos solares inteiros, apenas com algumas pausas. A água estava acabando mais rápido que a comida e os homens pensavam se havia uma maneira de subir o paredão e pegar a água fria que os circundava para dar as crianças.

Vários deles desmaiaram de exaustão. Estavam todos andando apoiados uns nos outros, pedindo aos espíritos que o seu martírio acabasse. Minseok rogou ao espírito do fogo que olhasse para eles e não os deixasse morrer ali, tão perto de seu objetivo.

Depois de mais uma parada a tribo voltou a caminhar. Uma grande curva apareceu fazendo com que o medo de ser esmagado pelas paredes de pedra tomasse conta de Minseok. As crianças começaram a chorar e as mulheres sentiram o corpo tremer de pânico. 

Depois de algumas horas o caminho se abriu de maneira radical. Uma grande área plana surgiu diante de seus olhos e estava claro que o caminho continuaria assim até o fim. As paredes de pedra ficavam cada vez menores e as ondas não batiam mais com tanta violência na rocha.

A tribo, então, levantou suas tendas e acendeu a fogueira para que as mulheres assassem a carne que ainda estava propicia para o consumo. Todos se alimentaram em silêncio. Minseok estava afastado e introspectivo. Seus olhos vagavam desfocados pelas grandes paredes, que ainda cercavam o caminho de terra, procurando qualquer sinal de que aquelas paredes poderiam desabar e a água engoliria a todos.

 

Ele não percebeu quando a visão o tomou. Estava novamente a floresta em que havia conhecido Chanyeol, o espírito cor de fogo. Olhando ao redor, perdido, o caçador se moveu incerto de qual caminho seguir. Barulhos estranhos vinham de todos os lados e a folhagem verde o confundia cada vez mais. Estava andando em círculos, sabia disso. Aos poucos o pânico se esgueirou pela sua mente. O sentimento de medo, tão conhecido por ele, parecia nublar todos os seus sentidos fazendo com que não conseguisse mais se mover.

O barulho de passos foi tornando-se cada vez mais próximo e diante de seus olhos, a figura de Chanyeol com seus pés virados apareceu. Seus olhos e sua cabeleira continuaram os mesmos, como se chamas ardessem em seu rosto. Quando ele se aproximou, as pernas de Minseok perderam as forças e os braços do espírito seguraram o corpo do caçador.

– Descanse, Criança. Tudo terminará bem. – A voz dele acalmou seu medo. Os braços de Chanyeol embalaram Minseok até que os olhos dele se fecharam.

– Minseok. Minseok. – Alguém balançava o corpo do chefe que dormia escorado na parede de pedra. – A anciã está te chamando. – O caçador pulou de pé rapidamente e correu até a tenda, deixando o rapaz para trás. Entrou na tenda rapidamente, encontrando as mulheres em volta do leito da velha.

– Chegou a hora dela. – Uma das mulheres disse.

Minseok caiu de joelhos ao lado dela e tomou as mãos da sacerdotisa. O jovem caçador começou a chorar como uma criança, sem se importar com as mulheres que o assistiam. Como ele conseguiria sem ela? Como conseguiria sem seus conselhos e sua força? Durante todo o percurso até ali a velha sacerdotisa não deixou de apoia-lo mesmo quando o medo e a desconfiança assolaram a tribo que quase desistiu de sua grande empreitada.

O velho chefe já havia falecido também, e agora seria ela. Quantos mais morreriam para que as crianças alcançassem o outro lado do caminho de terra? Quantas vidas seriam perdidas para que essa profecia idiota se concretizasse?

– Meu jovem tigre. – A velha começou – Não encha seu coração de culpa. Você está apenas fazendo o que deve ser feito. – Ela segurou a mão de Minseok e indicou com a cabeça que uma das moças se aproximasse com a pele de tigre em seus braços. 

O mesmo tigre do deserto gelado.

– Carregue essa pele como uma lembrança minha e a lembrança de sua vitória e a vitória da tribo contra o grande tigre selvagem. Por isso hoje além de ter bebido do seio da grande mãe, você também recebe o título de Tigre pela sua coragem e força, meu solitário caçador. – A voz dela foi se tornando mais baixa até que nada mais foi dito. Minseok pegou a pele de tigre e deixou que as mulheres preparassem o corpo da anciã para o ritual de passagem.

Fora da tenda, todos da tribo puseram seus olhos sobre o chefe à procura de alguma instrução. Eles perceberam os olhos dele vermelhos de tristeza e a pele do tigre nas mãos do caçador. O entendimento caiu sobre todos e cânticos fúnebres foram entoados até chegarem ao fim do grande caminho de terra.

 

Epílogo

Minseok observou as árvores que se erguiam a sua volta com confusão. Aquela floresta não se parecia nem um pouco com a que ele sempre encontrava Chanyeol em seus sonhos. 

A tribo havia se instalado e assentado finalmente satisfeita. Mas o caçador se sentia inquieto. Até mesmo o som da floresta era diferente! Caminhou mais um pouco, capturando alguns roedores para incrementar a refeição. Os outros homens haviam encontrado bastante comida, então não havia necessidade de que Minseok tirasse mais vidas.

Mesmo insatisfeito, resolveu voltar até o acampamento e ajudar os festejos que seus irmãos organizavam. Minseok pensava seriamente em passar o cargo de líder novamente. Seu objetivo era trazer a todos até esse lado do caminho de terra e havia sido bem-sucedido, mesmo com os percalços do trajeto. Não havia mais necessidade de permanecer como chefe.

Minseok dormia em sua tenda. O ciclo da escuridão havia começado e haviam certos períodos lunares que era mais indicado ficar abrigado. Enrolado em suas peles de urso e tigre, o caçador se sentia seguro pelas lembranças boas que elas lhe traziam.

Quando o sonho começou, Minseok sorriu esperando Chanyeol aparecer. Quando o espírito surgiu a sua frente, o humano decidiu analisa-lo como nunca tinha feito antes.

Chanyeol não usava muitas peles ou couro animal para se cobrir. Sua pele amorenada estava quase toda exposta. Penas, folhas e cores no corpo era a única coisa que cobria a pele do espírito. As armas que ele carregava eram estranhas demais e é claro, nada chamava mais atenção que seus pés. 

Os olhos cor de fogo acabara por prender a atenção de Minseok, enquanto ele se aproximava. Os dois sentaram juntos, enquanto Chanyeol assava o peixe que havia trazido para a refeição. Quando terminaram de comer o espírito olhou para o caçador duramente, fazendo com que todos os músculos dele enrijecessem.

– Sua jornada está apenas em uma pausa criança. Você deve ter percebido a diferença entre essa floresta e onde vocês estão acampados. – Minseok assentiu. – Ali ainda não é o lugar de vocês. Assim que o ciclo de luz começar novamente levante o acampamento e continuem a marcha em direção aos locais mais quente.

– Como posso obrigar meus irmãos a continuar viagem depois de todos os agouros que nos sucederam? Suas almas estão quebradas. Sei que não me seguiriam mais.

– Você subestima a si próprio, Minseok. – Chanyeol continuou – Acredite no que digo. Sua tribo te seguirá para onde a guiar. – O espírito se levantou e colocou na mão do humano uma haste finíssima com ponta de pedra lascada. – Leve isto que de muito te servirá. Já me viste usar uma destas, não é? – Minseok assentiu, tomando com cuidado a haste em sua mão. – Use-a bem. Sei que irá conseguir.

E Minseok acordou.


Notas Finais


Esse plot é baseado em uma das teorias de ocupação americana, que diz que os primeiros humanos a chegarem nas américas eram asiáticos que viajaram através de uma ponte no estreito de Bering que é a divisão entre a Ásia e a América. Segundo a teorias, durante o período glacial, o mar era mais raso o que tornou possível o surgimento de uma ponte de terra.
Isso ficou na minha cabeça por um tempo, e quando vi já estava pesquisando e escrevendo. Kkkk
Muiyo loco né? ^^


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