História Fantasma - Capítulo Único

Fantasma

(Inspirado em “EDEN – Chasing Ghost”)

Levanto a persiana de minha janela para dar uma ultima olhada na cidade antes de dormir, a luz ofusca um pouco minha visão, o som chuva caindo sobre o telhado era como uma sinfonia perfeita para dormir, era quase onze horas da noite. Me deito, e como de costume milhões de pensamentos invadem minha mente, me fazendo lembrar momentos vividos e sonhar com momentos que ainda não aconteceram, uma lágrima escorre, de imediato já a seco com meu lençol tentando disfarçar a solidão.

O despertar do alarme, o canto dos pássaros e aquele feixe de sol que entra pela persiana me faz perceber que já havia amanhecido ao me levantar da cama me vem um devaneio, minha visão se torna turbulenta (diria que essa não é a palavra certa para descrever, mas a que mais se aproxima), me sento aos pés da cama passando as mãos nos olhos numa tentativa falha de me livrar desse efeito, espero cerca de cinco minutos para me direcionar ao banheiro, no banho a água estava mais gelada que de costume, porém muito boa para fazer com que me perca novamente em meus pensamentos. Ao sair do banho, vejo uma estranha movimentação nos andares de baixo, olho pela minha janela, e tinha algo lá, uma sombra às vezes escura e às vezes desvanecendo.

Essa sombra acenava para mim, ela queria que eu fosse até ela, fazia meses que não saia de meu minúsculo apartamento, mas a curiosidade foi mais forte, resolvi descer e ir até ela. Pego meu suéter, e ao tocar a maçaneta da porta, me vejo paralisado, todas as lembranças do mundo lá fora vem a tona, todas as decepções, todos os sentimentos ruins já experimentados e, o vazio. Balanço a cabeça, respiro fundo, e finalmente após meses, minha porta foi aberta. Ao chegar à rua, a sombra ainda estava lá, mas no primeiro passo que iria dar, esbarro em uma moça que passava, ela parecia com pressa, meu coração acelerou, e ela era linda.

Olho rapidamente para o poste em questão, a sombra não estava mais lá. De imediato vou me desculpar com a moça, ela estava chorando, eu não sabia o que fazer, mas meu corpo se moveu sozinho, e de instantâneo à abraçei. Fechei meus olhos esperando a repulsa daquela bela moça que estava em meus braços, mas a reação não foi o que estava esperando, senti suas mãos em minhas costas, ela havia me abraçado de volta. Esse foi o meu primeiro contato com alguém depois de meses, eu realmente não sabia o que fazer, mas ao olhar o horizonte, a mesma sombra apareceu, só que em um lugar diferente. Perguntei o nome da moça, Melissa. Chamo-me Carlos. Ela não quis me dizer o motivo do choro, mas que aquele abraço era tudo que precisava para seu dia melhorar, então ela se despediu e voltou a andar rapidamente, e eu, fui à busca daquela sombra.

A sombra sempre estava distante e toda vez que estava quase a alcançando, algo surgia em meu caminho, e como sempre, meu corpo se movia sozinho e algo de bom acontecia, seguindo os padrões de aparecimento daquela sombra, percebo que era sempre em lugares familiares que eu costumava frequentar, mas eu nunca conseguia tocar essa suposta sombra, até que apareceu próximo ao guarda-corpo da ponte que cruzava um lago no centro da cidade.

Estranhamente dessa vez nada aconteceu, a sombra não sumiu, meu corpo não se moveu sozinho, corri para tentar em uma tentativa tola de toca-la, mas ela desapareceu, e no impulso, me vi caindo da ponte, a queda durou poucos segundos, ao atingir o lago, apenas deixei-me afundar, em um turbilhão de pensamentos, porque eu segui aquela sombra? Porque fiquei tanto tempo preso? Porque não pedi para acompanhar aquela moça? Porque estou aceitando afundar? Porque não resisto? Porque aceitei essa solidão? Porque não vivi ao invés de apenas existir? Agora já é tarde, aqui estou eu afundando, afogando, morrendo..  Enquanto meu ultimo vestígio de vida ainda sobrava em meu corpo, pude ver com aquela visão turbulenta o sol refletindo sob a água, mostrando aquele lindo céu, que por meses não aproveitei para admira-lo mais, e então a visão foi se desvanecendo e então eu morri, ficou tudo escuro, mas aquele barulho continuou em minha mente, mais alto e cada vez mais alto, de súbito acordo, vejo meu teto com alguns arranhões de tempo, o despertador tocando, tudo não passou de um sonho, a visão não estava mais turbulenta, e em meio as reflexões no banho, me lembro de cada mínimo detalhe daquele sonho, e então percebo, os lugares, as pessoas, a minha “morte”, foram lugares especiais para mim, a Melissa não era  Melissa, mas sim uma moça que toda vez que eu ia para o trabalho ela passava em minha frente chorando e eu nunca dei a mínima, a ponte foi onde recebi a noticia que estava desempregado e todas as outras noticias ruins, então finalmente a ficha cai, esse tempo todo e essa sombra, eu estava caçando meu próprio fantasma e que por algum motivo desconhecido me mostrou o que eu realmente preciso fazer para me livrar dessa maldita solidão e tristeza, seja lá o que for fazer, falar, amar, etc. Faça hoje, no agora, porque o futuro é um mistério, não pense que esta cedo demais para nada, porque nunca está, viva cada dia como se fosse o ultimo, porque nem todos poderão caçar seus fantasmas.