"Um dia, tudo se modificou
O burgo se internacionalizou
Nas ruas, o alegre do my friend
Moçada, pela mímica, se entende
Natal entrou fardada na História
Para ser o Trampolim da Grande Vitória
Valeu o sacrifício do seu povo
Na guerra, meu Natal nasceu de novo!"
(Autor desconhecido)
Natal, Rio Grande do Norte, Brasil - 12/06/1943
Acordou mais uma vez com aquele inglês resmungão do seu lado. Já haviam passado 6 meses desde que Alfred tirou Arthur da África. Sabia o quanto ainda era um pouco difícil para o loiro se adaptar naquela cidade ainda provinciana que já começava a sofrer profundas alterações em seu estilo de vida, cultura, além do aumento repentino da população, que abrigava mais de 10 mil soldados norte-americanos em suas terras pacatas.
No início, Arthur era bastante arredio. Reclamava o tempo todo da atmosfera provinciana da cidade e vivia comparando a pequena Natal com Londres, algo que irritava João, o amigo nativo de Alfred. Certa vez, os dois tiveram uma briga que quase terminou em pancadaria, se não fosse o americano para impedir que a discussão chegasse ao viés de fato. Era nesse período que o mais alto estava empenhado em ensinar um pouco de língua portuguesa para o inglês, para que ele pudesse se virar naquela cidadela. Foi quando Luciano, um jovem rapaz de pele escura e comportamento amistoso surgiu. Ele era um dos recrutas recém-chegados de um dos novos quartéis construídos em Natal e que prestavam auxílio em Parnamirim Field.
Logo mostrou ser o único que conseguia dar um jeito no péssimo humor de Arthur, algo que nem Alfred conseguia.
Luciano logo ficara amigo dos dois estrangeiros e era ele quem ajudava o loiro nas lições de português. A primeira coisa que Arthur rapidamente aprendeu foram os palavrões. Agora podia entender os xingamentos que João e outros nativos lhe dirigiam quando este discutia com eles. O moreno também não deixava barato quando o inglês começava a ficar arredio e costumava dizer-lhe sempre que gente ruim era obrigada a comer urubu e cocô de jumentinho, o que fez o estrangeiro cair feito um patinho e manter-se controlado. O truque do nativo era infalível, algo que caiu rapidamente nas graças de Alfred.
Ainda deitado na cama, Alfred ainda tentava entender como conseguiu se aproximar... de uma forma diferente de Arthur. Não sabia de fato o que havia dado em si para que um dia, sentisse o coração palpitar quando o loiro chegou perto. Passou a ver ele com outros olhos, como um homem apaixonado dos filmes de Hollywood observando sua amada nos filmes exibidos no Rex*. Nunca chegou a sentir a mesma coisa com Alice, sua namorada inglesa dos tempos de RAF. Com Arthur o sentimento ia mais além. Nunca chegou a confessar de fato o que sentia por ele, por medo. Isso mudou quando o próprio Arthur o procurou em Parnamirim Field. Lhe bombardeando de perguntas sobre o porquê estar se comportando de maneira estranha e estar se distanciando um pouco dele. Alfred não soube como responder... até ver que o inglês chorava. Falando do quanto aquilo estava lhe machucando. O americano o abraçara e lhe dera um beijo, próximo do avião "Maria Boa"**. Deram sorte de não haver ninguém no hangar que abrigava o famoso B-52.
- Good morning... - a voz do inglês lhe despertara de todos os pensamentos que estava tendo até agora.
- Desde quando está acordado? - o maior olhara para Arthur de soslaio, cujo corpo ainda estava coberto pelo fino lençol do luxuoso quarto que ambos passaram a dividir no Grande Hotel***.
- Desde a hora que eu ouvi você suspirando igual uma adolescente. Estava sendo engraçado observar o teu semblante de idiota. Pensava no que?
- Primeiro, idiota o cacete. E segundo... estava somente me lembrando da nossa estadia aqui. - dera a língua para o loiro, que mostrara o dedo do meio como resposta.
- Hunf... acho melhor a gente se levantar. Quero aproveitar esse dia de calor e ir naquela praia do forte**** estrelado. - um dos locais que Arthur passou a adorar naquele lugar foi essa praia. As águas calmas atraíam não somente os nativos como também os estrangeiros que estavam em Natal.
- Só mais uns cinco minutos e eu levanto. - ao ver o sobrancelhudo erguendo um travesseiro, levantou-se rápido. - Ok, você venceu... vou sair daqui e tomar uma ducha. Esse calor daqui é de matar. Só não é pior do que o deserto.
Arthur ainda ficou deitado, admirando a silhueta nua do americano que andava em direção ao banheiro.
x-x-x-x-x
"Natal, que dormitava sonolenta
Natal, dos tempos idos de 40
Recordo os belos bailes do Aéro
Num banco da Pracinha, ainda lhe espero
No Rex, sessão das moças, Quarta-feira
Natal, Cidade Alta e Ribeira
O bom você não sabe e eu lhe conto
O footing, à tardinha, no Grande Ponto!"
(Autor desconhecido)
Natal, Rio Grande do Norte, Brasil - 23/08/1943
Hoje era mais um domingo de festa na base de Parnamirim Field, o chamado for all*****. Mas entre as meninas de Maria Boa, os nativos que se divertiam ao som do jazz e os animados estrangeiros, Alfred e Arthur estavam no lugar onde eles costumavam ficar: o hangar do avião que nomeava a mais famosa cafetina de Natal. Entre garrafas de Coca-Cola e uns beijos sorrateiros, ambos conversavam sobre a mudança em suas vidas a partir do momento em que se conheceram. Alfred deixou um pouco de lado o heroísmo que tanto admirava e que o levou para a guerra. Ao ver como a vida em outros lugares fora daquele evento horrível era, sentia vontade de poder estar ali para sempre, ser como João ou Luciano. Pessoas que eram pacatas até então. O americano via o quanto gente como eles se tornaram mais amistosos e permitiram a mudança em suas vidas, algo que o loiro de óculos demorou um pouco para aceitar.
Já para Arthur, o peso que ele carregava desde El Alamein acabou se dissipando ali em Natal. Foi difícil para ele, mas acabou por se contagiar pelas pessoas e principalmente, por Alfred. Com o americano, o loiro sobrancelhudo sempre ia ao Rex, na praia de Ponta Negra, de onde voltou todo queimado uma vez e na Cidade Alta, onde ficavam os clubes de jazz e swing. Outra coisa que contribuiu para a sua mudança foi o que passou a sentir pelo loiro mais novo. Até se acostumou a chama-lo de galego, algo que sempre acontecia na hora do sexo. Corou ao lembrar dessa parte. Ainda era virgem quando conheceu Alfred. O americano estranhou ao ver as bochechas de Arthur vermelhas, mas quando iria fazer uma pequena surpresa, nota a presença de uma pessoa no hangar, que ele logo reconheceu como Rita, uma das meninas de Maria Boa, que se tornou uma grande amiga de ambos.
Voltaram para a festa ainda a tempo de ver um Luciano bêbado ao lado de dois americanos e um inglês recém-chegado da RAF, cantando em um português horroroso. Quando o for all terminou, voltaram logo ao Grande Hotel. Arthur ainda queria aproveitar o dia seguinte para ir à praia, um costume adquirido em Natal. Alfred prometera isso somente depois de cuidar da horta e das galinhas que os soldados criavam, num pequeno aviário****** construído pelos estrangeiros. Já no quarto, os dois se entregaram a um momento rápido de sexo, algo que não acontecia com frequência devido às patrulhas que o americano fazia entre Natal e Recife, além dos costumeiros blackouts, o que não permitia a eles deixar o abajur do quarto aceso.
Aquele período que ambos compartilhavam teve um fim no dia 2 de setembro de 1943, quando tiveram que partir para a Itália, para expulsar os alemães e derrotar Benito Mussolini. Enquanto Alfred desembarcou em Salerno, como parte do pelotão presente na Operação Avalanche, desencadeada após a bem-sucedida invasão na Sicília, Arthur estava no contingente adicional que foi para a cidade de Tarento, na região da Apúlia. O casal prometeu que se reencontraria em Natal, caso não conseguissem se reunir na Itália. Eles rezavam todos os dias para estarem vivos, pois eles ainda queriam reviver as boas lembranças que tiveram na pequena Natal antes de voltarem para a triste realidade da guerra.
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