Às vezes, parece que tenho uma guerra na minha mente
Eu quero sair, mas eu continuo andando no passeio
Eu nunca percebi realmente que eu tinha que decidir
Para jogar o jogo de alguém ou para viver minha própria vida
E agora eu faço, eu quero mudar
Fora do preto (fora do preto)
No azul (no azul)
- Get Free - Lana Del Rey
- Bom dia. - Hinata disse baixinho, se sentando a mesa. O pai a olhou de rabo de olho, sério.
- Não vai a escola de novo? - Não esperou resposta. Ele nunca esperava. Estava sentado à cabeceira da mesa olhando Hinata reprovador. Como todas as manhãs. - Virou uma à toa agora? Não quer mais ir à escola. O que mais eu tenho que esperar de você. Um piscing. Virar uma bêbada, se drogar. Namorar um motoqueiro. Ficar grávida?
Hinata se encolheu, dolorosamente. Seus olhos marejaram. Engoliu seco o bolo se formando em sua garganta, a cabeça abaixada esperando o pai terminar de falar para dizer algo. Ele odiava ser interrompido. Fazer isso só pioraria o ataque. Anos de convivência lhe ensinaram muitas coisas. Estava acostumada a agressividade do pai e as críticas, mas a última fala foi como uma faca em seu coração. Era doloroso pensar no que houve. Resfolegou baixinho, buscando calma.
- Eu estava doente. - Murmurou.
- Doente. - Bufou irritado. - Desculpas e mais desculpas. Quando você vai fazer algo que realmente preste?
- Volto para escola hoje. - Disse bebendo um gole do suco. Parecia pedras em sua garganta, mas tinha que fingir comer antes de levantar e se livrar daquela tortura diária. Ela gostaria de não sentar naquela mesa, mas sabia que o pai nunca permitiria. Era muito apegado as tradições japonesas, da qual eram descendentes e gostava que as refeições fossem feitas com todos juntos. Mesmo que ninguém falasse com ninguém a não ser para brigar, criticar ou gritar.
- Como se você tivesse escolha. Espero que isso não se repita mais. - Avisou cortando um pedaço de queijo. O assunto havia terminado, era um aviso. Os olhos dele não mais encontraram o seu. Hinata agora seria ignorada até que ele tivesse alguma crítica à seu respeito.
- Não vai.
Hinata se manteve em silêncio o resto da refeição. Tentava não falar muito para evitar conflitos com o pai ou a irmã que as vezes podia ser pior que o pai, criando intrigas ou humilhando a irmã. Estranhamente Hanabi se manteve calada, apenas observando. Geralmente a garota colocava mais fogo na lenha deixando Hinata em situações bem difíceis.
Quando levantou para se retirar da mesa reparou que a irmã a observava. Uma expressão que nunca tinha visto antes na caçula. Não era raiva, desprezo ou deboche como de costume. Tão pouco era amigável. Ela apenas lhe olhava, sem expressão, talvez curiosidade. Mas foi breve, Hanabi logo sorriu falsa. E qualquer coisa que Hinata achou ter visto se perdeu no veneno de suas palavras.
- Boa sorte. - Debochou balançando os dedos.
Sem uma palavra Hinata deixou a sala de jantar e logo a casa. Na rua tirou os fones de ouvido da bolsa e conectou ao celular. Morava a uns vinte minutos a pé da escola e gostava de ir andando, em sua própria bolha, escutando música e esquecendo por alguns momentos a vida. As pessoas, as coisas, até de quem ela mesmo era. E era libertador. Seu coração até batia um pouco mais rápido, excitado. Sonhava com algo melhor, se permitia fantasiar. Ela queria gritar, mas em vez disso apenas fazia seus pés andarem mais rápido consumindo toda a euforia do seu corpo.
As aulas passaram como um borrão. Ela via mas não via nada. Não que alguém fosse notar que tinha algo de errado com ela. Ninguém se importava. Para eles ela era apenas uma esquisitona solitária. Seus cabelos cobriam parte do seu rosto enquanto desenhava no caderno, uma linda rosa desabrochando com seus espinhos caindo.
Hinata desenhava. Nada de coisas tristes. Ela gostava de coisas bonitas. De fazer os detalhes. Porque era bonito. Ela o fazia simplesmente pela sensação de criar algo, saber que aquilo tão bonito era seu. Saiu da sua imaginação. Era seu pequeno escape.
- Senhorita Hamilton. - Hinata levantou a cabeça em um rompante com o susto. O professor a olhava irritado apontando o quadro onde uma conta complicada estava. - Se não fosse interromper seu momento artístico você poderia responder minha pergunta?
- O senhor poderia repetir. - Pediu vermelha ouvindo alguns risinhos pela sala. O professor suspirou ainda mais irritado quando o barulho aumentou.
- As características. - Alguém disse atrás de si baixinho. Ao fundo ela pode ouvir o professor pedir silêncio a turma.
- O que? - Se virou levemente, tirando um pouco o cabelo da face para olhar melhor. Sabia quem sentava atrás de si, mas ouvir ele falando com ela a deixou surpresa. Ele nunca havia falando com ela antes.
- A pergunta. - Naruto apontou o quadro com uma caneta.
- Talvez o senhor Uzumaki queria nos agraciar com seus incríveis talentos matemáticos já que ele parece tão disposto a ajudar a senhorita Hamilton. - O professor disse olhando para Naruto quando a turma diminuiu o barulho.
Hinata odiava aquele professor. Primeiro porque ele nunca chamava os alunos pelo nome e sim pelo sobrenome. O que era um problema já que ela odiava o seu. A sorte era que havia convencido a diretora a colocar apenas o nome da mãe nas fichas da escola. Então para todos os efeitos ela era Hinata Hamilton. E, o professor também era um sádico. Sempre querendo fazer alguém passar vergonha ou sendo ruim apenas porque podia.
- Nah, tô bem aqui. - Naruto disse sorrindo, as mãos atrás da cabeça.
- Eu insisto. - Disse entre dentes, irritado. Algumas risadinhas podiam ser ouvidas pela sala.
- Melhor não.
- Agora.
- Se o senhor insiste. - Sorriu largo. Hinata se deixou olhar para ele um momento enquanto todos estavam muito ocupados fazendo o mesmo para notarem seu olhar. Naruto era muito bonito. Até demais. A pele bronzeada os cabelos loiros despenteados e o sorriso de dentes brancos o deixava devastador. Se vestia bem e era carismático. - A principal característica da matemática é a tortura. Sim. Porque, veja bem. Você passa horas fazendo uma simples equação para no fim um pequeno sinal fuder com tudo. E ainda tem aquela velha regra que diz que se tá fácil tá errado. Então se tá difícil vai ficar errado e se tá fácil tá errado. Isso é ou não é tortura. Muita complicação para no fim descobrir apenas um número. Mas não é isso que o senhor quer saber. Então, no meu ponto de vista a coisa mais importante na matemática é a regra de três. Você pode usar para tudo em caso de dúvida. Regrinha de três é o Jesus da matemática.
Alguns alunos já riam alto a essa altura. Mesmo enchendo linguiça Naruto mantinha a expressão seria, a voz de um palestrante, fazendo com que tudo que dizia parecesse realmente sua opinião de verdade. Hinata achou aquilo demais, o jeito como ele conseguia ser tão envolvente até mesmo quando era pentelho. O professor estava ficando vermelho, irritado com a gracinha. Odiava ser desrespeitado.
- Já que é tão torturante para o senhor, peço que se retire agora desta sala. - O tom de voz aumentando no final.
- Já que insiste. - Deu de ombros sorrido. Pegou a bolsa e caminhou para a saída despreocupado.
Depois disso o professor não consegiu mais manter a sala quieta até o sinal do almoço. Os alunos riam e conversavam alto. Sem escolha ele tentava gritar mais alto que as vozes. O que só piorava. Hinata continuou desenhando.
Na hora do almoço Hinata se viu em outro dilema. O vídeo da festa ainda circulava. Mas ela continuava a ser ignorada pela maioria dos colegas. O que era bom, lhe poupava constrangimentos.
Hinata olhou ao redor do grande refeitorio. Muitas mesas cheias dos mais variados tipos de pessoas se espalhavam por aquele lugar claustrofóbico. Ela olhava mais por hábito do que por qualquer outra coisa, a maior parte do tempo ela comia no banheiro escondida ou sozinha em alguma mesa afastada. Então o ato de pegar a comida e da uma pequena parada na frente das mesas era uma atitude tola, mas familiar e lhe trazia certo conforto na normalidade daquilo tudo.
Viu Sakura Haruno sentada em uma mesa sozinha, uma bandeja intocada a sua frente enquanto ela mexia desinteressada no celular, digitando e revirando os olhos. Lembrou da noite da festa, uma semana antes quando a Haruno lhe ajudou. Hinata sentiu o impulso de ir até ela. Em outra epoca o pensamento seria no minimo estranho. Ninguem em sã consciencia se aproximava de Sakura Haruno sem um motivo. A garota colocava medo na maioria das pessoas naquele lugar. Não que ela fosse má com as pessoas, mas tinha uma lingua ferina e uma constate atitude arogante. Seu olhar fazia as pessoas se sentirem um inseto lhe incomodando, um incomodo chato e desnecessario que ela poderia acabar com um tapa. Ninguém fora do seu seleto circulo de amizade falava com ela. E por incrivel que pudesse parecer as pessoas queriam ser sua amiga. Hinata se perguntou se isso era algum tipo de tendência submissa natural do ser humano, se rebaixar a um ser potencialmente mais forte que ele.
O caso era que o apelido dado a ela se encaixava bem. Rainha do Gelo. Hinata não sabia quem era o autor, mas lhe deu credito, Sakura passava justamente isso as pessoas, algúem impenetravel e sombria.
Sua bandeja voou de sua mão em uma velocidade impressionante nesse pequeno momento de distração. Comida se espalhou no chão, o barulho chamando atenção das pessoas que cessaram suas conversas para olhar o que acontecia. Uma risada baixa ao seu lado lhe indicou o cupado de seu pequeno incidente. Karin.
- Ops, não te vi aí. - Disse fingindo inocência, mas sua expressão logo ficou maldosa. - É que eu não coloquei meus oculos de enchegar perdedores hoje. Geralmente eles não ficam no meu caminho.
Antes que Hinata pudesse responder algo Karin seguida das amigas passaram por ela. A ruiva na frente, Mei e Ino logo atrás. Tenten não estava por perto. O pequeno empurrão que Karin lhe deu quando passou por si fez o seu sangue ferver. Andava na borda a alguns dias. Estava cansada de ser saco de pancada dos outros. De deixar o outros fazer o que quisessem com ela. Anos de humilhção passando por sua cabeça como uma apresentação de slides. Sakura tinha razão, era patetica. Pensou olhando a comida no chão, ouvindo os risos ao redor e depois o andar confiante da ruiva até sua mesa.
Foi tomada por um impulso e o seguiu.
Não foi até parar na frente da mesa da Haruno, que ainda mexia no celular ignorando tudo a sua volta, que percebeu o que estava fazendo. As pessoas ainda a encaravam, talvez imaginano se ela iria atras do trio, mas as expressões de susto das pessoas indicava que nenhuma imaginou que ela fosse direto para Sakura.
- Você devia comer. - Murmurou sem saber como iniciar uma conversa. Parecia tão errado, mesmo depois do que havia conhecido. Mas não desistiria. Sakura levantou os olhos, uma expressão irônica no rosto bem maquiado.
- E você devia parar de ser otaria. - Respondeu sarcástica. Voltou a digitar. - Agora senta e diz o que você quer de mim.
- Por que acha que eu quero algo de você?
- Porque ninguem vem até mim sem uma razão. - Sakura largou o celular se recostando na cadeira. - Principalmente você.
- Talvez eu só esteja tentando ser sua amiga depois que me ajudou. - Se sentou. Sakura revirou os olhos.
- Ah, por favor, não insulte a minha inteligencia. Fala logo, não tenho o dia todo.
- Tudo bem. Você tem razão. Eu quero pedir sua ajuda. - Hinata abaixou o tom, olhando ao redor rapidamente. Algumas pessoas encaravam descaradamente as duas. Curiosos filhos da puta.
- E por que eu te ajudaria? E para que?
- Porque eu quero me vingar de Karin e companhia. E preciso da sua ajuda para isso. E além disso, é a única pessoa nessa escola, sem ser um dos professores, que fala comigo.
- Então você finalmente vai revidar. Pensou no que eu disse, né. Que gracinha. - Se inclinou para frente, colocando os braços em cima da mesa, uma expressão divertida. Como se estivesse assistindo uma criança tentar enganar algúem. Pegou uma batata e mordiscou. - Eu topo.
- Topa? - Perguntou surpresa.
- Sim. Vai ser uma boa distração. - Empurrou sua bandeja para ela. - Pode comer, estou enjoada.
- Tá. - Olhou para a bandeja desconfiada. Sakura entregou o celular para Hinata.
- Anota teu número. Precisaremos nos comunicar de agora em diante. - Hinata devolveu depois de agendar.
- E o que mais? - Perguntou curiosa, esperando uma aula de vingança ou seja lá o que Sakura queria fazer. A Haruno riu.
- A paciência é uma virtude. - Pegou suas coisas levantando. Antes de sair, deu uma última olhada em Hinata, penetrante. - E a vingança, um prato que se come frio.
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