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História Forsaken - O Choro dos Abandonados - A Priori


Escrita por: NicholasVernett

Capítulo 2 - A Priori


Sempre fui meu próprio carrasco. Sempre fui o único ponto de vista capaz de me fazer rever minhas ideias. Perdido no mundo eu estava, desde que nasci. Era uma mentira terrível alguém dizer que nossa sociedade era uma coisa agradável. Havia pressão, sim, desde sempre. Uma necessidade terrível de que as tendências fossem seguidas. Podíamos ver isto claramente nos períodos de nossa história, na moda, música e até mesmo nas guerras.

A vida inteira parecia ser um enorme campo de batalha onde quem não lutava era chamado de covarde, onde quem questionava acabava morto sozinho. O poder estava nas mãos dos grandes, de quem não se importava. Os que eram bons não eram sagazes o suficiente para ter o suficiente para dar. Isto não era equilíbrio, nunca seria. Haviam dois lados, sempre. Este era o conceito dos homens, cujo qual o princípio era incerto, mas que só tinha um final: caos. Assim era, bem e mal, certo e errado, moral e imoral... você podia se encontrar em um dos dois grupos, você queria estar em um dos dois. Eram nossos maiores ídolos. Era sobre isto que o mundo falava.

E a verdade? Os homens não eram assim no seu interior, não poderiam sê-lo, porque eram ainda, e sempre haveriam de ser, humanos. Animais conscientes, ou não, que tinham o imenso poder das ideias em suas mãos, a ferramenta maravilhosa das palavras, o poder de construir e destruir mundos.

Todos éramos criaturas que para sobreviver, precisávamos de equilíbrio. Em algum momento de nossa história nós havíamos começado a fingir, ou acreditar na ideia de que éramos mais do que animais, de que precisávamos perder a essência de nossa própria espécie e começar a adotar rótulos, que precisávamos provar para o mundo que éramos bons em espécie, que éramos dignos de salvação.

O equilíbrio não era ser bom, ser livre de desejos e pecados, pois se assim fosse, não seríamos nada. Para comer nós precisamos matar, para tudo há uma competição. Não consegui jamais enxergar onde éramos superiores as outras espécies do mundo, a não ser em relação as ideias.

Não podíamos ser perfeitos, isto não seríamos jamais. Nós não tínhamos tempo para isto, nós crescíamos sabendo que iríamos morrer. Precisávamos passar o que sabíamos adiante para que fossemos lembrados. Precisávamos criar algo, mudar o mundo de alguma forma para continuar o lento processo que era a nossa evolução.

Mas é necessário lembrar que não é evolução o que nos tornou conscientes, isto era mutação. No momento em que começamos a pensar, que críamos ideias errôneas a nosso respeito, foi aí que a evolução começou. Um processo ainda mais lento do que a mutação que nos fez assim. E o mais interessante era que sabíamos desta necessidade, sempre sabemos quando algo está errado. Não é difícil ver o que nos falta, a dificuldade está em mudar o que já foi firmado. Como fazer isto sem derrubar os pilares da sociedade?

Um homem mortal não poderia sozinho mudar o mundo, descobri que nem um imortal poderia. Mas não morrer me proporcionou a oportunidade de conseguir enxergar mais claramente quem eram os homens, onde estava o erro deles. Por não fazer mais parte de sua roda do tempo, por não sentir mais as suas necessidades, eles acabaram por se tornar o meu experimento. Não que eu fosse perfeito, pelos deuses, eu não desejaria sê-lo! Não sei o que é perfeito, não é possível idealizar isto, sempre há um erro. O perfeito não deveria ser coletivo? Uma ideia geral que todos tivessem? Mas é interessante pensar: O que é perfeito poderia… morrer? Ou degradação era o que nos tornava assim?

Foi com estas ideias que cresci, que me tornei um homem. Eu não era necessitado, pelo contrário, eu era rico. Meu pai, Heinrich Raven, era um empresário que trabalhava com petróleo e metalurgia. Isto ainda na década de 30, na América.

Mas diferente do meu pai eu não tinha desejo de ser grande desta forma. Eu não queria ficar sentado vendo meu patrimônio crescendo. Eu queria mudar o mundo, embora soubesse que era impossível. Eu queria ser um criador.

A juventude havia sido turbulenta, havia me feito desejar ir para longe. Foi o que fiz, eu não queria estar lá em São Francisco ao lado de meu pai. Meu irmão queria isto, eu não. Mas eu era o filho mais velho e as responsabilidades maiores eram depositadas sobre mim. Ignorando isto, parti para Londres aos dezessete anos, parti para viver e para conhecer o mundo.

E embora meu desejo tenha se realizado, não durou muito. Conforme o tempo passava e eu percebia ser capaz de criar, de convencer as pessoas, a ideia de minha própria mortalidade destruía o meu interior. Era o que os homens chamavam de depressão. Eu não tinha prazer em estar vivo pois acreditava que estava morrendo lentamente. Eu criava coisas que não poderiam morrer, ideias, arte, mas eu mesmo, minha carne, tudo estava destinado a uma sepultura.

Aconteceu quando eu tinha vinte e dois anos. Meu pai faleceu, minha mãe implorou para que eu voltasse e assumisse o que era meu por direito. Ela não queria meu irmão sentado na cadeira que pertencia ao meu pai, acreditava que ele acabaria com tudo. Ele não havia nascido para isto. Eu não podia convencê-la de que eu também não havia.

Acabei por voltar, sem vontade alguma, para São Francisco, abandonando tudo que eu tinha em Londres. Isto havia feito-a feliz, ela já estava velha e doente, a pressão que meu irmão colocava sobre ela era muita.

Meu irmão, Allan, não havia ficado feliz com o meu retorno. Ele sabia que isto seria o fim de seus planos. Ele queria aquilo que eu não queria, ele queria atenção e o poder, queria impressionar através das coisas que eu julgava absurdas.

E foi isto que me levou a morte.

Uma noite antes da reunião com o advogado, sócio e amigo íntimo de meu pai, um homem chamado Frederick Verne, que viria a se tornar um grande amigo meu, Allan planejou o meu assassinato.

Quando eu saía de um bar perto da mansão onde morávamos, dois homens apareceram e me pegaram. Eu estava bêbado, estava pensando longe, e não consegui me libertar deles enquanto me levavam de carro até os limites da cidade.

Havia um refúgio lá, um lugar onde eles se reuniam. Estes dois homens me atiraram no chão imundo, enquanto eu usava todo o raciocínio que tinha para pensar em uma forma de escapar. Fingia estar inconsciente e machucado, mas estava acordado enquanto eles discutiam o meu destino.

- Temos que matá-lo agora. - Dizia um deles.

- Podemos conseguir mais. Podemos pedir um resgate por esse aqui. - Dizia o outro.

- Allan vai acabar com a gente se fizermos isto.

- Ele é um idiota, você sabe disso. Ele tem medo de nós. Estou dizendo, podemos conseguir muito mais com o resgate dele.

Foi enquanto eles conversavam que eu descobri o que acontecia. Eles haviam sido contratados para me matar, a pedido do meu próprio irmão. A raiva que eu senti não fora o suficiente para inibir os pensamentos.

Enquanto eles discutiam eu disse:

- Posso conseguir muito mais dinheiro para vocês do que ele. Vocês sabem disso.

Eles ficaram em silêncio, eu me sentei, fingindo sentir dor. Eu não sentia nada. Eles não haviam me amarrado. Não me pareciam grande coisa, eram dois homens apenas. Não eram muito inteligentes, não eram verdadeiros assassinos, eram apenas assaltantes que não sabiam o que fazer em uma situação como esta.

- Cale a boca. Você tá louco?! - Um deles gritou avançando na minha direção.

O outro o segurou.

- Vamos ouvir o que ele tá dizendo, cara. - Disse ele. - Ele tem uma herança.

- Me solta! - O outro o empurrou e ele veio até mim. Se abaixou na minha frente, eu podia sentir o seu mau hálito. - Quanto dinheiro?

- Quanto ele ofereceu para vocês? - Perguntei.

- Não interessa. - Ele disse.

- Vocês sabem que ele não é muito inteligente. Vão ir atrás de vocês, todos sabem que eu não partiria assim. Que história vão contar? Vocês tem muito mais a ganhar me deixando vivo.

Depois disto eles continuaram a discutir. O que estava mais perto de mim tinha uma faca na cintura, eu sabia que poderia pegá-la, ele estava tão perto.

Conforme eles falavam, eu percebia que não havia uma boa forma de escapar daquilo. Eles não confiavam em mim, eu havia visto o rosto deles. Acreditar nisto era a única forma que eles tinham de serem espertos.

Eu nunca havia matado uma pessoa, já havia brigado, sim, mas não havia matado. Nunca perfurara a carne de alguém. Porém para sobreviver se fazem coisas deste tipo. Aproveitando que estavam distraídos eu puxei a faca que ele carregava na cintura rapidamente e tentei cortar a sua garganta. Consegui arranhá-lo antes dele se atirar em cima de mim. Ele não me desarmou, confiou na própria força e me bateu. No terceiro soco eu estava tonto, ele segurou o meu pescoço enquanto o outro observava atônito gritando para ele não me matar. Foi neste momento que levei a faca com toda a força em direção ao pescoço dele. A lâmina cortou com dificuldade e senti o sangue quente em meu rosto. Ouvi o barulho do seu engasgar, senti o peso dele ao cair em cima de mim.

O outro gritou o seu nome, eu tentei empurrar o corpo para o lado. Eu não tinha a certeza se algum deles tinha uma arma ou algo do tipo, ele havia puxado uma faca também. Veio na minha direção com raiva, tentei lutar com ele. Lutei com todas as minhas forças, tentando matá-lo como havia feito com o outro. A faca dele entrou na minha barriga e eu senti uma dor tremenda. Estávamos contra a parede de madeira da pequena casa. Eu sabia que aquilo não me mataria de imediato, reuni as últimas forças que tinha e o empurrei para longe. Quando ele voltou correndo para cima de mim eu empurrei seu braço para o lado e enfiei a minha faca em seu estômago.

Não fiquei para ver o estrago, meu objetivo era escapar dali. Saí pela porta, sem nem ao menos pensar em pegar o carro deles. Corri em direção a cidade, mas conforme meu corpo esfriava, conforme eu perdia sangue eu ia ficando mais fraco, a dor aumentava, eu começava a perceber que o que eu mais temia aconteceria. Eu iria morrer!

Em meio a uma estrada de terra eu caí no chão, não senti a queda, apenas soube que caía. Já me movia havia muito tempo. Foi então que apaguei.


Notas Finais


Este é o primeiro capítulo da história.
"A Priori" é uma expressão em latim que significa: "A princípio, ou algo relacionado ao início."


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