História Futatsu no Tamashii - Nintai

Paciência

29 de novembro, Tokushima.

Acordou quando ouviu passos cuidadosamente silenciosos, mas que não passaram despercebidos por sua audição, movendo-se no próximo cômodo da casa. Teve um sono pesado e sem sonhos, apenas silêncio. Olhando ao seu redor, viu que o seu futon estava cuidadosamente arrumado e percebeu que ainda se encontrava sentado encostando-se na parede do quarto.

Levantou aos poucos, sentindo seu corpo reclamar por novamente ter dormido de mal jeito. Olha pela janela a fora, a neve ainda caía, mas em escala menor de como estava na noite anterior. Ao ouvir novamente barulhos vindo do cômodo, que reconheceu sendo a cozinha, respira fundo, pois sabia de quem vinha os tais barulhos.

Apareceu na entrada do quarto, apenas observando a garota em frente à mesa, constatando que ela preparava chá. Quando percebeu olhos escuros atrás de si, a garota se vira para Sasuke.

— Ahm... Bom dia. — o cumprimenta, com receio.

— Hmm. — recebe como resposta do rapaz.

Estreita os olhos enquanto o via sentar-se a mesa, e perguntava-se qual a necessidade de ainda estar ali, sendo que ele não era nada hospitaleiro ou amigável. Vendo-o tomar o chá que ela havia preparado, fecha a cara quando recebe o comentário vindo dele.

— Está muito doce. — ele reclama.

— Achei que iria gostar. — retruca, já mudando de humor.

— Não gosto muito.

Bufando de frustração, ela se retira da cozinha indo em direção à entrada da casa e respira fundo o ar gelado do ambiente, para acalmar seus ânimos, antes que acabasse fazendo uma loucura. Vê que ele se levantou e depositou o copo na pia e seguiu para o outro cômodo da casa, o qual não se preocupou em saber qual era.

Minutos depois ele retorna, já com o rosto lavado e uma toalha por cima do ombro, entrando em seu quarto. Apenas ouve seus movimentos, percebendo que ele estava mexendo em algumas caixas, e reflete sobre o que ele estaria procurando, mas rapidamente tenta não se importar com aquilo.

Perdida em pensamentos, mal percebe a aproximação perto de si e o olha, ele apenas passa ao seu lado com uma pequena bolsa de alça em um dos seus ombros. Ele dá alguns passos, mas para, sem se virar.

— Preciso ir até a cidade, então fique aqui. — ordena.

— Não gosto do tom que você usa comigo e não ficarei aqui sozinha, então irei junto. — retruca.

— Não preciso que você venha junto, só preciso que fique aqui. — responde, seco.

— Acredite, eu não quero ir junto com você, mas alguma coisa, que não sei explicar, me impede de ficar longe de você. — retruca novamente, no mesmo tom.

— Hmm... — sussurra.

— O que? — questiona confusa.

— É porque você é minha regalia, Sakki. E você deveria se dirigir a mim como “sama”. — comenta, agora se virando para olha-la.

— Nem morta que irei te chamar assim e trate de encontrar outro nome para mim. — bate o pé.

— Sakki. — chama novamente, em tom de provocação.

— Não me chame assim! — grita, serrando os pulsos ao lado do corpo.

— Façamos o seguinte, enquanto eu estiver atrás de respostas, precisarei do seu auxilio. Quando eu obtiver todas as que preciso, eu te liberto.

— É sério?

— Sim, eu rompo o nosso contrato.

Agora parando em frente ao rapaz, percebe que eram da mesma altura, era fácil ver a expressão em seus olhos e via que ele falava sério. Pensando em sua liberdade, estende a mão direita, incentivando Sasuke a fazer o mesmo, ele reluta por alguns segundos, mas também estende a mão direita e aperta a mão da garota, fechando o acordo.

Vira-se para continuar sua caminhada até a cidade, agora sentindo uma presença o seguindo, apenas a alguns passos atrás de si. Decide ignorar a garota, não estava de bom humor e tinha muito com o que se preocupar no momento.

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Andavam pela multidão de pessoas, algumas comprando frutas, outras comprando tecidos para roupas. A garota olhava para tudo aquilo como se tivesse vendo o mundo pela primeira vez e talvez fosse o caso. Sasuke nada comentou, mas olhava de tempos em tempos, para ver se não havia perdido a garota de vista.

Parou em uma das barracas de fruta, poucas que davam naquela estação, e comprou algumas, agora guardando sua mercadoria na bolsa que trouxe, junto com alguns legumes que comprou em uma barraca anterior. Pagou a mulher, que se despediu com educação e continuou seu caminho.

Continuou andando até frear seus passos ao perceber que não tinha ninguém o seguindo. Ele respira fundo, tentando se acalmar, não queria arrumar briga com ela em frente a outras pessoas para depois começarem a falar pelos cantos. Odiava ser o centro das atenções e não seria agora que isso mudaria.

Retoma o caminho que fez, procurando-a pela multidão. Andou alguns minutos, até que avistou aquela cor de cabelo incomum, sabia que seria fácil encontrá-la porque ela acabava se destacando dos demais com aquele cabelo. Estava pronto para brigar com ela sobre ter se afastado dele, mas fica em silêncio quando vê que ela olhava para algumas máscaras em uma das barracas.

— Sakki. — a chama apenas uma vez.

Ao perceber que ele estava chamando por ela, ela apenas vira o rosto com olhar de reprovação e ele sabia o porquê daquilo. Fechou os olhos e contou até dez mentalmente, tentando repor sua paciência.

— O que são isso? — pergunta a garota, apontando para as máscaras.

— São máscaras usadas em Matsuri. — responde o vendedor.

Sasuke apenas esperou e depois de alguns minutos ouvindo a conversa entre os dois, decide que já era hora de cortar o assunto entre eles, para poder continuar seus afazeres.

Pediu para que a garota, agora de cara fechada novamente, o esperar na entrada da loja de tecidos. Ela obedece, mas antes o envia um olhar matador, o qual ele tratou de ignorar, à medida que entrava em um outro estabelecimento. Fechou os olhos, já com impaciência, quando ouviu passos ao seu lado e reconhecendo o perfume que veio junto com a pessoa.

— Vamos.

— Já comprou tudo que precisava?

— Sim.

Retorna sua caminhada, sabendo que agora ela o seguiria sem desviar o caminho. Andaram em silêncio. Sabia que ele não esperaria por ela, mas continuou a passos lentos para que pudesse acompanhá-lo. Evitava olhar para ele, sempre lembrando de suas palavras secas.

Suspirou aliviada ao reconhecer o caminho que estavam seguindo, pois sabia que finalmente voltavam para a casa do rapaz, e enquanto olhava para o lado, nos locais usados para o plantio de arroz, ela percebe que Sasuke a olhava de canto de olho, mas desviou o olhar, voltando seu foco para frente.

Chegando à entrada da floresta, identificou que na entrada existia um Tori. Era alto, tinha a cor vermelha, mas estava gastado devido ao tempo. Na parte de cima, havia perdurado vários enfeites brancos feitos de papel. Diminuiu o passo para poder apreciar a imagem, que passou despercebido quando saíram mais cedo em direção à cidade. Quando voltou seu olhar para frente, percebeu que Sasuke também diminuíra o passo e o flagrou, novamente, virando um pouco seu rosto para observá-la.

Aquilo certamente estava começando a incomodá-la, mas ignorou mais uma vez e voltou a caminhar em passos normais, com o rapaz em seu encalço. Quando avistou a casa ao longe sentiu um alivio ainda maior, pois já não aguentava mais ter que aguentar Sasuke a analisando secretamente.

— O que foi? — solta de uma vez.

— Sakura. — ele responde.

— Como? — pergunta, não entendendo o que ele queria dizer.

— Sakura está bom para você? — questiona Sasuke, parando e virando para encará-la frente a frente.

Rapidamente a garota entende sobre o que ele se referia. Não achou um mau nome, e agora sabia o porquê de ele tanto olhar para ela em momentos em que estava distraída.

— Sakura... Está bom. — responde por fim, sentindo-se feliz pela primeira vez naquele dia.

Quando olhou para o rapaz, pode vê-lo dar um leve sorriso enquanto a olhava e retomou sua breve caminhada para a casa. Ficou parada, ainda absorvendo o novo nome, e abriu um belo sorriso pela escolha. Ela procura por Sasuke e vê o emblema atrás de seu yukata. Achou o emblema curioso e de certa forma... Bonito.

Correu em direção a Sasuke, o alcançando e continuando ao seu lado. Com o humor renovado, estava se perguntando sobre uma coisa desde o momento que perguntou seu nome, mas não teve a brecha para poder perguntar novamente. Percebendo a inquietação da garota ao seu lado, o rapaz decide colocar o assunto átona.

— Pergunte logo.

— Como você... Esquece. Bom, agora que você me deu um nome decente, poderia se apresentar com seu nome completo.

Ele apenas olha para a garota, que agora se chamava Sakura. Uniu as sobrancelhas, pensando sobre se deveria responder ou não, mas como sabia que esse assunto acabaria voltando a aparecer, decide dar um fim.

— Uchiha Sasuke. — responde, por fim.

— Uchiha? É um bom sobrenome. — ela comenta, inocentemente. E então apressa o passo, ficando em frente à Sasuke. Ele para bruscamente e a encara, um questionamento silencioso que ela entendeu ao ver sua expressão. Estende a mão, como fez mais cedo, mas agora por motivos diferentes.

— Prazer Uchiha Sasuke. — ela fala, sorrindo.

Não entendendo o porquê de ela fazer aquilo, e nem a diferença de saber seu nome completo ou não, viu que ela ainda mantinha a mão estendida, decide, finalmente, também estender a sua apertando novamente a mão da garota. Sentindo um leve formigamento na marca desenhada na palma.

— Prazer Sakura.

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Estavam novamente na cozinha da casa com vários mantimentos espalhados sobre a mesa, os mesmos que Sasuke havia comprado durante a passagem deles pelo mercado da cidade. Algumas frutas, alguns legumes e carne, a maioria seca, as quais ele dizia ser bom para gerar energia, já que o frio não proporcionava muita coisa.

— Tomates? — diz, encarando o rapaz.

— Tomates são bons, o que tem? — ele responde calmamente.

— Pra falar a verdade nada, só é um pouco estranho.

Ele a olha com uma das sobrancelhas erguidas e Sakura continua o encarando, sentindo certa graça pela cara que ele fez, mas achou melhor não provocá-lo, agora que seu humor havia melhorado um pouco. Viu que ele voltou a encarar o mapa, enquanto ela apenas observava, sem entender nada que estava desenhado ali.

— Vamos sair em viagem amanhã cedo. Pensei em sairmos a noite, para evitar contratempos, mas com essa nevasca será difícil. — informa para ela.

— Já sabe para onde vamos?

— Vamos em direção à Osaka. — indica com o dedo em um ponto no mapa.

— E temos tudo o que precisamos?

— Até chegar lá, sim, mas precisaremos comprar mais quando estivermos por lá. — fala, encostando-se as costas da cadeira.

— Só espero que a gente não morra com o frio.

Sasuke se atenta ao comentário, ele imaginava que teriam situações piores para encararem, o frio seria o de menos. Quando deu outro gole em seu chá, preparado por si mesmo já que não gostava de nada doce, reflete sobre uma situação que ainda não aconteceu.

— Você sente necessidades, Sakura?

— Necessidades? Como comer ou beber? — ao olhar para a cara de questionamento de Sasuke, continua — Nunca experimentei, mas ainda não tive a sensação de precisar.

Ele afasta o copo de sua boca, pensando sobre o que ela tinha lhe dito, olha para o copo em sua mão observando o líquido verde, de onde era visível sair vapor por estar quente. Em um ato impensado, ele estende o braço em direção à garota, oferecendo a bebida. Sakura apenas o olha em dúvida sobre o que ele queria que ela fizesse, afinal, desde que se conheceram percebeu que ele era muito fechado, e essas ações que ele tinha ás vezes a deixavam em dúvida.

Aceitando finalmente a oferta dele, pega o copo de sua mão. Sasuke observa em silêncio a cada reação da garota. Primeiramente, ela apena observou o líquido, pensando que gosto teria aquilo, quando fez o chá para ele de manhã, não provou a bebida, apenas sabia que ele gostava, por ter bastante nos armários.

Hesita um pouco, até aproximar o copo de seu rosto, sentindo o aroma do chá, não era um cheiro ruim, era até agradável. Decidindo de uma vez, coloca o copo na boca e toma um gole. Sente o gosto da bebida e acha horrível, amargo demais.

— Argh... Como consegue tomar isso? — resmunga, devolvendo o copo.

Ele aceita novamente, com um leve sorriso pela careta que ela fez ao provar o chá. Ouviu outros resmungos vindos da garota, mas como sempre ignorou e tomou outro gole da bebida.

— Não é ruim, você que é fresca demais. — responde, fechando os olhos.

— Ora seu... — ela ergue um dos punhos em frente a ele, o ameaçando, e recebe um balançar de cabeça vindo do rapaz.

Sasuke se levanta de seu lugar, colocando o copo sobre a mesa. Sentindo necessidades humanas, anda até o banheiro fechando a porta e certificando que estava trancada. Sabia que Sakura não entraria ali, mas se fosse o caso, queria se assegurar que ela não conseguiria.

Ela se mantém no mesmo lugar, enquanto olha para um ponto qualquer da cozinha, quando ouve som de passos, olha em direção a Sasuke, que estava com a cara um pouco cansada.

— Vamos dormir, amanhã acordaremos cedo.

— Você sempre dá ordem pros outros assim?

— Não. Só com quem me irrita por causa de um nome.

Apenas revira os olhos sentindo a ironia, retrucar a provocação dele não levaria em nada, então levanta e segue os passos dele para o quarto. Vê Sasuke sentar no mesmo lugar que dormiu na noite passada, encostado na parede, mas dessa vez, pegou a coberta que pertencia ao futon que ficava ao lado do seu.

Sakura não precisou perguntar, apenas deitou no futon de Sasuke, se embolando em meios às cobertas, esperando seu corpo começar a relaxar. Ouve um suspiro alto e olha para o rapaz, que já havia pego no sono. Ressoava baixinho, enquanto seu rosto se tornava calmo, de certa forma em paz. Olhando para a imagem de Sasuke dormindo, ela finalmente sente o sono a atingir.

***

30 de novembro.

Quando acordou na manhã seguinte, olhou em direção a parede e Sasuke não se encontrava mais lá, assim concluindo que ele já estava acordado. Levantou-se lentamente, enquanto se espreguiçava. Arrumou o futon, e saiu rumo à cozinha, encontrando Sasuke organizando as coisas que iriam levar.

Ela se aproxima e recebe um breve olhar do rapaz, e soube imediatamente para onde ele olhava. Retorna ao quarto, parando em frente ao espelho para arrumar seu cabelo que estava totalmente bagunçado. Soltou-o, ele era comprido, chegava na altura das costas, e enquanto o arrumava, viu pelo reflexo do espelho Sasuke passar em direção ao outro cômodo da casa, percebeu que ele virou o rosto para observá-la, mas tratou de não dar importância.

Voltou para cozinha assim que terminou seu coque, encontrou Sasuke com uma das bolsas em seu ombro e colocou uma capa preta com capuz, tentou reconhecer a peça e lembrou que ele comprou naquela loja de tecidos, enquanto ela esperava do lado de fora. Perdida em pensamentos, voltou a si quando viu o braço dele estendido, lhe oferecendo também um tecido de cor marrom claro, e ao ver do que se tratava ela devolve um olhar em questionamento.

— Comprei por causa do frio, pegue logo. — oferece novamente a capa.

— Ahm... Obrigada.

Passa por cima da cabeça, sentindo que o tecido era um pouco pesado então entendeu a parte de ser “por causa do frio”. Ao terminar de se vestir, pega a bolsa de mantimentos que Sasuke ofereceu para ela depois que se vestiu.

Como programado, saíram cedo naquele dia. Sasuke trancou a porta, depositando a chave em uma parte falsa de madeira ao lado da casa. Esperou ele voltar e quando ele o fez iniciaram a caminhada, um ao lado do outro. Não sabia como seria o caminho a tal cidade Osaka, mas tinha que confiar em Sasuke. Queria que acabasse logo tudo isso.

Seguia os passos de Sasuke calmamente, ele nada havia dito, mas imaginava que estava pensando, graças a expressão franzida. Andaram por alguns minutos,e quando deu por si estavam em um pequeno vale.

Existia um pequeno córrego congelado e pequenas árvores em volta. Por ter diminuído o passo para observar o local, ficando alguns passos atrás de Sasuke, acabou esbarrando em suas costas, pois não tinha visto que ele havia parado.

— Ai, desculpa.

Ao perceber que ele não brigou ou olhou feio por ela ter esbarrado nele, dá alguns passos ficando ao seu lado. A expressão de Sasuke era de extrema calma, enquanto olhava para um ponto em sua frente. Ela segue o olhar dele e percebe que existia uma pequena lápide de pedra, com o mesmo símbolo das costas de Sasuke esculpido e com kanjis gravado nela, formando o nome “Uchiha Mikoto”.

Não era tão ingênua, percebeu imediatamente sobre quem se tratava, apenas respeitou o silêncio de Sasuke. Assistiu-o abaixar-se e depositar uma pequena flor em frente à lápide, era uma pequena flor de cor rosa. Perguntou-se aonde ele tinha arrumado aquela flor, porque estava com ele em todos os momentos, teria percebido se ele tivesse ido colher alguma.

Ele se levanta, encostando a mão na lápide, retirando um pouco da neve acumulada. Respirando fundo, pensando em como seria tudo daqui em frente. Abre novamente os olhos, e vira o rosto para Sakura que o encarava em silêncio.

“Eu voltarei... mãe” pensa Sasuke sem pronunciar nada, pois não queria que Sakura visse esse seu lado.

Começa a caminhar novamente passando pela garota, mas alguns passos à frente decide parar, virando e encontrando Sakura que ainda se mantinha parada em frente à lápide de sua mãe.

Para sua surpresa, a garota se curvou, em um gesto de educação e respeito. Voltou seus passos para aonde ele estava esperando por ela. Parou ao seu lado, com um leve sorriso.

Sasuke achou aquilo engraçado, e em resposta apenas levantou uma sobrancelha dando de costas e continuando seu caminho com Sakura novamente ao seu lado, o acompanhando.