História Guerra Fria - Achei você

Eu dirigia em direção ao hospital que ficava próximo da mansão devagar,com um Bruno mau humorado do meu lado,de boné,óculos escuros e fones no ouvido.
- Você não vai falar comigo?
Ele não ouviu,também com um pagode tão alto tocando ele não escutaria mesmo.Puxei os fones com a mão e ele me encarou,parecia bravo.
- O que? – ele perguntou
- Perguntei se você não vai falar comigo!
- Bárbara,agora não!
- Ouvir um som tão alto só vai piorar sua dor de cabeça!
Ele tirou os fones e se acomodou melhor no banco do carona,eu escutava rádio como sempre.Meus olhos se encheram de lágrimas,mas engoli o choro,não daria esse gostinho á ele.Na verdade nem sei o que aconteceu,fiz o café da manhã pra ele,levei na cama,ele acordou meio zonzo e com dor de cabeça,ajudei a tomar banho e a se vestir e contei sobre o exame de sangue e minha suspeita,e foi aí que começou a desandar o caldo.
Ele ficou indignado,disse que Anitta jamais o drogaria,e que eu estava indo longe demais com esse meu ciúmes,que ela era uma amiga,e parceira nos negócios e que era pra eu controlar meu temperamento.Por fim,disse que queria conversar com o Fábio a sós.Como ele não podia dirigir no estado em que estava e todos estavam ocupados no casarão eu ainda – tonta que sou – me ofereci pra levá-lo e cá estamos.Respirei fundo tentando não chorar,era o último farol antes do hospital,felizmente respiraria ar puro.
“E agora a mais pedida do dia”,anunciou o locutor da rádio,e em seguida começou a tocar Photograph do Ed Sheeran.Só pode ser brincadeira né,não consigo mais segurar o choro enquanto ouço sua bela voz declarar:
“Loving can hurt, loving can hurt sometimes
But it's the only thing that I know
When it gets hard, you know it can get hard sometimes
It is the only thing that makes us feel alive”
Porra,que droga,chorar na frente dele era tudo o que eu precisava! Desliguei o rádio com raiva e me concentrei no trânsito.O sinal ficou verde e eu pisei no acelerador com mais força do que deveria e em poucos segundos já estávamos no estacionamento que ficava na esquina.Tirei o cinto,coloquei meus óculos escuros e saí do carro indo em direção ao elevador.Bruno desceu logo depois de mim e ficou parado ao meu lado.
- O que você tem? – ele perguntou colocando a mão no meu braço.
- Vai pro inferno,Bruno! – cuspi de volta e entrei no elevador.
Ele pareceu surpreso,mas não disse nada.Está pior que mulher de TPM com essas variações de humor.Entramos,e ele deu seu nome na recepção,fomos orientados a subir para o nono andar e aguardar que o Fábio iria nos chamar,e assim fizemos.Lá fingi interesse por uma revista pra não ter que olhar para a cara dele.
- Não se esqueça,duas vezes ao dia em?! – ouvi a voz de Fábio,que saía de seu consultório acompanhado de um senhor – te vejo em três meses Augusto!
- Obrigado Dr.Fábio – se despediu o simpático velhinho.
- Bah! – ele disse vindo em minha direção e me dando dois beijos no rosto – já ia ligar de novo!
- Oi! – eu disse tentando disfarçar minha voz embargada – desculpe,está um caos lá fora,muito trânsito!
- Aqui não tem jeito mesmo,é sempre assim – ele completou – Como vai Bruno?
- Melhor doutor – ele respondeu e os dois deram um breve aperto de mãos.
- Fico feliz,vou só dar uma ajeitada lá no consultório,pegar sua ficha e já chamo vocês tudo bem?
- Claro!
Quando some de vista Bruno dispara pra mim:
- Pra quem mora em São Paulo você conhece bastante gente por aqui!
- Amigo de longa data – tentei soar o mais indiferente possível
- Amigo – ele bufou
Ora,ora quem é que está tendo uma crise de ciúmes agora?
- Já foi um casinho a muitos anos atrás – completei enquanto olhava para a revista em minhas mãos – mas faz muito tempo!Controle seu temperamento!
Bingo! Bárbara 1,Bruno 1! Disse a ele exatamente as mesmas palavras que ele vomitou em cima de mim mais cedo.Antes que pudesse responder,Fábio colocou a cabeça pra fora da sala e o chamou.Pra minha surpresa,Bruno pega na minha mão e me puxa com ele em direção a ao consultório.Lá dentro,após alguns exames básicos,checagem de pressão e muitas perguntas,nos sentamos de frente para Fábio que digita algumas coisas no computador.
- Então Fábio,está tudo bem? – perguntei
- Sim,tudo dentro da normalidade! Quero apenas tirar sangue mais uma vez pra me certificar de que não há mais nada no seu organismo Bruno!
- E do que exatamente você fala? – Bruno pergunta
Nesse momento a tela pendurada acima da cabeça de Fábio se ilumina e ele começa a nos explicar cada detalhe do exame de sangue de Bruno,que aparece na imagem.
- Foi encontrado em seu organismo Flunitrazepam,Ácido gama e Ketamina,componentes do famoso “Boa noite Cinderela”.Qualquer um deles isolado já tem o poder de derrubar um leão,porém foram administrados em doses muito pequenas,por isso você dormiu um pouco e teve todas aquelas reações!
- Ácido gama? – perguntei
- Na verdade,Ácido Gama Hidroxibutírico,nada menos que ecstasy líquido!
- Meu Deus – exclamei assustada!
- A sorte Bruno é que você é grande! Não me entenda mal,não quero dizer que você é gordo,mas se fosse a Bárbara quem tivesse tomado por exemplo,mesmo nas proporções mínimas,por conta do peso,ela teria tido reações bem mais severas!
- Entendo doutor.E agora? – Bruno perguntou
- Você é uma pessoa pública Bruno,pense em alguém que tenha motivos,ou que acha que os tem para fazer tal coisa.Sugiro procurar uma delegacia,e anexar o exame como prova.
Ele passa para Bruno um envelope com o exame impresso dentro.
- Tem três cópias pra você aí!
Bruno pega o envelope ainda sem acreditar no que ouviu.
- Olha,sou clínico geral,e gostaria que você fizesse mais alguns exames,principalmente um neurológico,porque acredito que essa dor de cabeça,possa ser na verdade enxaqueca,que é bem mais severa e tratada com remédio específico,em alguns casos até manipulado.
- Claro doutor,faço todos! – Bruno respondeu
- Vou pedir que a Drª Suzana te acompanhe na realização dos exames,ela é uma neurologista muito boa,prometo que não vai levar mais que duas horas.
Ele disca um ramal pelo seu telefone,troca palavras com alguém e cinco minutos mais tarde uma moça alta,morena de olhos grandes e escuros bate na porta e chama pelo Bruno que a segue pra fora do consultório.
- Não se preocupe – Fábio me diz com um sorriso no rosto – a morena é minha namorada!
- Uau – eu digo rindo – então não sou a única com novidades não é mesmo?
- Já que minha agenda está sempre cheia,e o Bruno vai demorar um pouco nós podíamos conversar lá na lanchonete do hospital,o que acha?
- Claro,vamos sim!
Já na lanchonete conversamos sobre tudo,o tempo que ficamos sem nos ver,nossas vidas,relacionamentos enfim...literalmente colocamos o papo em dia!
- Tenho que confessar Bah,que nunca vi você tão feliz!
- Obrigado Fábio,eu também nunca vi você assim!
- A Suzana é incrível mesmo,e me entende muito porque também é médica! Mas e você,me fala como é ser namorada de um famoso?
- Agitado – eu digo enquanto tomo um gole do meu suco de abacaxi – muito agitado!
Ele dá risada e pede licença pra pegar outro café.Fico sozinha na mesa observando as pessoas ao redor,e no fim do corredor,noto uma menininha de cabelos encaracolados andando em direção a lanchonete sozinha.Procuro ao redor alguém que possa ser a mãe ou pai dela,mas não há ninguém que pareça ter filhos na lanchonete.Continuo observando-a enquanto se aproxima,deve ter no máximo 4 anos.Pra minha surpresa ela para diante de mim e dá um largo sorriso.
- Oi – ela diz tímida
- Olá – sorrio pra ela
- Pra você! – ela me entrega uma rosa
Fico encantada e ao cheirar a rosa percebo que há algo entre suas pétalas.Tiro um papel dobrado e abro:
“Achei você bebê! Espero que tenha gostado do meu presente,notei que seu queridinho adorou! Até breve”
Eu congelo.A porra do vinho! Não foi Anitta!Sei de quem é,apesar de não ter assinatura de ninguém.Eu releio o bilhete,duas,três vezes e começo a varrer o local a procura dele.É aí que noto que a bela menininha não está mais lá,perdi tempo demais em meus devaneios e me esqueci de questioná-la.
- Bah? – pergunta Fábio retornando a mesa – está tudo bem? Você está pálida!
- Nada bem Fábio – eu digo assustada - Chame a segurança!