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História Hades (Camren) - Sacrifício


Escrita por: lmfs13

Notas do Autor


Não me matem

Capítulo 20 - Sacrifício


— Estou vendo o seu jardim daqui! — gritou Veronica, triunfante. — Você precisa aparar a grama com urgência.

— Tem alguém aí?

— Não, a praia está vazia. Mas o dia está ensolarado e não há nuvens no céu. Tem alguém velejando e... Está tudo lindo aqui. O que está esperando? Venha, Mila.

Hesitei. Veronica havia atravessado o portal, mas o que aconteceria agora?

— Vero — perguntei com desconfiança. — Você acha que consegue ficar aí? Você ainda está...

— Morta — completou a minha frase com animação. — Sei que estou. Mas não me importa. Prefiro ser um fantasma, livre para vagar pela Terra para sempre a passar mais um minuto que seja nesse esgoto. — De repente, ela demonstrou pânico. — Ai, meu Deus. Tem alguém aqui. Estou escutando.

— Acalme-se. — Tucker a acalmou. O rosto dele também estava tomado pela animação da nossa descoberta. — Talvez seja só alguém na praia. Estamos do outro lado, lembre-se!

— É verdade. — E então ela demonstrou preocupação. — Não posso ser vista assim. E se for uma gatinha?

— Ainda que seja, ela não vai conseguir ver você — lembrei a ela.

— É mesmo —  Veronica pareceu desapontada. Não consegui conter um sorriso. Nem mesmo o Inferno e todos os seus terrores haviam conseguido mudar por completo a personalidade da Vero que eu conhecia.

Quando ela passou, relaxei um pouco. Havia menos urgência quando me ajoelhei diante do portal, pronta para tentar de novo. Queria me unir a ela para poder olhar o mar e sentir o vento em meus cabelos. A primeira coisa que faria depois daquilo seria correr para casa diretamente para os braços das minhas irmãs. Entusiasmada, tirei os sapatos de salto e me joguei de cabeça no portal. De repente, estava dentro dele, com meu corpo meio no Inferno e meio dentro de uma concha, olhando para a areia branca e delicada. Estiquei o braço. Quase senti o calor do sol nas mãos e quase escutei as ondas quebrando nas rochas. Eu não era uma assombração como Veronica e, ali dentro, o Portal pareceu me apertar, como se eu não devesse estar ali. A força magnética que havia me atraído para a frente agora me puxava para trás, mas me mantive firme. Logo escutei o som que havia alertado Vero para a presença de alguém. Dava para ouvir uma respiração forte, mais curiosa do que ameaçadora. De repente, senti um cheiro ainda mais familiar. Foi o incentivo de que precisava. Soube quem era antes mesmo de ver o pelo sedoso, dourado. Vi um olho brilhante e um focinho úmido.

— Fish! — gritei, animada. 

Só conseguia vê-lo em fragmentos, mas ainda assim era o meu amado cachorro. Escutei Veronica levar um susto com o entusiasmo de Fish. Ela nunca gostara de cachorros, mas a emoção que senti ao vê-lo foi quase insuportável. Estiquei o braço, e minha mão atravessou o portal. Fish a cheirou, feliz por me reconhecer. Fiz carinho atrás da orelha macia dele e senti um nó na garganta. Precisei me controlar para falar de novo.

— Oi, menino — murmurei. — Senti saudades. — Minha emoção era compartilhada por Fish, que agora já começava a choramingar e a arranhar o portal sem parar, tentando entrar. E então, de repente, lembrei que ele não podia estar na praia sozinho. Alguém tinha que estar com ele.

Alguém a quem amava podia estar a poucos metros dali ou andando na nossa direção! Talvez fosse Normani, que sempre levava Fish consigo quando saía para correr na praia. Imaginei escutar as pisadas dela na areia. Logo ela poderia me abraçar com aqueles braços fortes e reconfortantes. Quando isso acontecesse, todas as lembranças ruins desapareceriam. Normani saberia exatamente o que dizer para tudo ficar bem de novo. Controlei a vontade de gritar por ela, para evitar que alguma coisa desse errado. Era como se estivesse me equilibrando numa corda bamba, tomando cuidado para não cair.

— Tuck — chamei com urgência. — Como faço isso?

— Lentamente — disse ele, com um olhar de determinação. — Um pouquinho por vez, sem pressa.

Meu coração batia tão alto que pensei que todos estivessem ouvindo.

— Continue — incentivou Tucker. — Devagar.

Eu me esforcei para passar pelo portal, atravessando para o outro lado bem devagar. Quando minhas mãos passaram, Fish começou a lambê-las sem parar e precisei me segurar para não rir. O barulho agradável do mar em Venus Cove e a respiração ofegante e familiar de Fish encheram meus ouvidos. Forcei minha passagem, sentindo o portal resistir e depois relaxar, permitindo que o atravessasse. Foi uma tarefa lenta, mas eu estava chegando lá. E então escutei os rosnados. O som foi tão aterrorizador que pensei que meu coração fosse parar de bater. Os rosnados baixos e guturais se uniram ao som de patas raspando a terra. Um pouco mais para a frente, estava o rosto de Veronica, agora pálido, e as mãos de Tucker pararam moles em minhas costas. Antes mesmo de compreender o que estava acontecendo, percebi que tinha que tomar uma decisão. Tucker ainda estava preso no Inferno.

— Continue! — repetiu, desesperado. — Você está quase lá. Não volte. — Ele não conseguiu esconder o terror em sua voz. Mas eu podia tanto continuar quanto parar de respirar.

Tucker fora um irmão para mim em Hades, e eu nunca o abandonaria. Logo depois, eu me livrei da pressão do tufo de folhas secas e fiquei em pé ao lado dele. Ele se surpreendeu, arrasado com a minha decisão. Olhei para a área seca que só tinha alguns galhos para mudar a paisagem. O som que escutara estava vindo de algum lugar próximo e se tornava mais insistente a cada segundo. O terror fez com que eu procurasse me proteger, mas também me fez perder o equilíbrio, e acabei escorregando e caindo de joelhos. Tucker me ajudou a ficar em pé, coberto por terra vermelha daquela paisagem surreal.

— Não se mexa — disse ele.

Nós nos seguramos um ao outro quando as criaturas se aproximaram. Por fim, consegui vê-las com clareza; seis enormes cães pretos na nossa frente, prontos para atacar. Eram grandes como lobos, a saliva pingando das presas e o olhar feroz. Eles tinham cicatrizes pela cara toda, mas seus corpos eram robustos e fortes e as garras afiadas como facas. Tinham o focinho manchado de sangue, e o fedor do pelo desgrenhado era forte demais. Tucker e eu ficamos paralisados, e o portal foi abandonado.

— Mila... — disse ele com a voz trêmula. — Você se lembra dos perseguidores sobre os quais falei?

— Lembro. — Eu me esforcei para não demonstrar fraqueza na voz.

— Eles estão aqui.

— Cães do Inferno — suspirei. — Perfeito.

As criaturas sabiam que nos tinham prendido e nos rodearam com diversão, curtindo o poder que exerciam. Quando saltaram, eu sabia que agiriam com tanta rapidez que pareceriam apenas um borrão. A matilha se aproximou rosnando, feroz. Vi o pelo duro e manchado, os olhos amarelados. Rajadas de vento espalhavam o fedor deles.

Não havia muito o que fazer. Se tentássemos correr, eles nos pegariam num instante. Não tínhamos armas nem defesa, nenhum lugar onde pudéssemos nos esconder. Senti vontade de abrir as asas e nos colocar em segurança, mas elas pareciam um peso morto nas costas: o Inferno tirava a força delas. Fechei os olhos quando os cães se abaixaram e se lançaram em nossa direção. Ao mesmo tempo, escutamos um grito vindo de trás e, um momento depois, Veronica apareceu, colocando-se entre nós e os cães, que ficaram confusos e acabaram parando.

— O que está fazendo? — gritei, tentando segurar seu corpo sem matéria. — Volte!

Para o meu desespero, vi o portal se fechar atrás dela, imagens de Venus Cove sendo substituídas por nada além de uma confusão de ervas. Vero olhou para trás e para mim, com os olhos marejados. Ela era muito pequena em comparação aos cães, os membros eram frágeis e os cabelos, que já tinham sido bem cuidados, estavam cobrindo seu rosto. Deu um sorriso breve e triste e balançou a cabeça.

— Veronica, é sério! — gritei. — Não faça isso. Você tem uma chance de se libertar. Aproveite.

— Quero fazer as coisas direito — retrucou ela.

— Não. — Sacudi a cabeça veemente. — Não dessa maneira.

— Por favor — pediu ela — permita que eu, pela primeira vez na vida, faça a coisa certa.

Os cães mostraram os dentes, a saliva formava poças no chão. Eles se esqueceram de mim e de Tucker enquanto se concentravam no novo alvo. Afinal, foram treinados para procurar almas que tinham fugido para as Terras Miseráveis, esperando alcançar a liberdade. O instinto natural os levou a Veronica. Ela foi rápida. Não havia muito tempo.

— Se eu voltar, apenas vagarei na Terra pela eternidade. Mas vocês... — Ela olhou para mim com intensidade. — Vocês podem fazer a diferença, e o mundo precisa de toda a ajuda que conseguir. Preciso fazer a minha parte. Além disso — continuou, rindo — o que eles podem fazer comigo?

Não consegui dizer mais nada, porque Veronica se virou para encarar as criaturas.

— Ei, vocês! — Os cães se viraram para ela, com as presas brilhantes sob a luz fraca. — Sim, vocês mesmos, seus vira-latas — continuou ela. — Peguem-me se forem capazes!

E então ela partiu. Era o sinal que os cães selvagens estavam esperando. Os seis correram atrás dela, esquecendo-se totalmente de nós. Observei horrorizada quando um deles segurou o bolso do short dela com a boca e a arrastou pela terra como uma boneca de pano. Veronica não tinha massa, mas isso não os impediu de morder seu corpo sem vida, como urubus. E então, o líder da matilha a prendeu com os dentes antes de jogá-la de novo, e os cabelos de Vero foram arrastados pela terra. A matilha continuou logo atrás. Comecei a chorar, quase soluçando. Veronica partiu, e o portal já estava desaparecendo, sem qualquer utilidade. E então Tucker segurou o meu braço com tanta força que doeu.

— Corra! — comandou ele, desviando o olhar dos restos ensanguentados no chão. — Precisamos correr.

E então corremos. Quando voltamos à boate Maldição, estávamos tão desalinhados e ofegantes que o leão de chácara olhou para nós e impediu a nossa entrada. Tivemos de chamar Asia para nos liberar. Quando chegou à porta, não conseguiu esconder o choque por nos ver de volta.

— Que diabos estão fazendo aqui? — resmungou ela com os dentes cerrados. O leão de chácara olhou para Asia com desconfiança, e ela rapidamente nos levou para dentro. Quando a escuridão e as batidas da música nos envolveram, ela se virou de novo.

— Os cães selvagens deveriam ter estraçalhado vocês.

Olhei com atenção para ela, vi a ferocidade em seus olhos pretos, os ombros erguidos e hostis, e me dei conta do que ela quisera o tempo todo. Ela nos mandara para as Terras Miseráveis sabendo que os cães arrastariam Tucker para o buraco e me desmembrariam. Mas não esperava que Veronica aparecesse e salvasse a nossa pele.

— Você devia ter falado sobre eles — comentei da maneira mais suave possível. Só queria chorar, mas me recusei a dar esse gostinho a ela. — Encontrar os cães nos atrapalhou.

— Por que você não morreu? — Asia deu um passo à frente como se quisesse cortar o meu pescoço.

— Acho que tive sorte — respondi de modo desafiador.

— Parem com isso — interrompeu Tucker, abalado demais com o que havia acontecido para se lembrar de qual era o seu lugar. — Vou levar Mila para casa.

— Não — Asia segurou o meu braço, afundando as unhas parecidas com as de gavião em mim. — Quero que você morra.

— Não toque nela. — Tucker me livrou das garras do demônio e olhou para Asia com raiva. 

Ela estreitou os olhos.

— Com quem acha que está falando, rapaz? — disse ela. — Acho que deveria contar ao MGK sobre o passeio que você acabou de fazer.

— Pode contar — Tucker deu de ombros. — Ele vai ficar meio bravo quando descobrir que você nos ajudou. Sou apenas um caipira, mas ele achou que podia confiar em você.

Asia recuou um passo, com a fúria exposta em seus traços felinos.

— Venha, Mila — disse Tucker. — Vamos embora.

— Não pensem que não vou encontrar outra maneira de me livrar de vocês — disse Asia enquanto nos afastávamos. — Ainda não acabou!

Eu não me preocupei com a inveja nem com a antipatia dela comigo. Não conseguia esquecer a imagem da alma de Veronica entre as presas daqueles cães. Ela estava em algum lugar da cratera, enfrentando horrores inimagináveis por minha causa. Independente do que acontecesse a partir daquele momento, teria que me esforçar para fazer com que o sacrifício dela valesse a pena.


*** 


Quando voltamos ao hotel Ambrosia, eu tinha um único objetivo: ir para o quarto e conversar com Tucker a respeito do próximo passo. Se Asia estivera preparada para nos ajudar uma vez, pode ser que conseguíssemos convencê-la a nos ajudar de novo. Sabia que ela queria muito que eu desaparecesse de cena e estaria disposta a fazer de tudo para que isso acontecesse. Asia tinha bons contatos e era guiada pelos próprios interesses. Na recepção, olhei para um dos corredores acarpetados e vi a sala de reunião. A porta estava entreaberta e fiquei tentando imaginar o que podia estar acontecendo de tão importante para MGK não conseguir escapar para me ver. Em geral, ele aproveitava todas as oportunidades para ficar comigo. Espiei mais de perto, apesar da apreensão de Tucker. Pela abertura, consegui ver as sombras de cerca de seis demônios, iluminados pelo fogo aceso na lareira. Eles estavam sentados ao redor de uma mesa comprida com um decantador de uísque e copos vazios espalhados. Todos seguravam blocos de anotações, exceto um, que estava em pé, presidindo a reunião. Uma apresentação estava sendo realizada; as imagens passavam os acontecimentos mais catastróficos da história da humanidade. Só consegui ver alguns: Hiroshima, Adolf Hitler num palanque, tanques de guerra, pessoas chorando, casas reduzidas a montes de entulhos após desastres naturais. Vi apenas uma parte do palestrante, mas foi o suficiente para perceber como ele era diferente dos outros. Para começar, era muito mais velho e usava um terno branco de linho, enquanto os outros vestiam peças pretas. Calçava botas de caubói, daquelas com costuras decorativas. Não enxerguei o rosto dele com clareza, mas escutei algumas coisas que ele dizia ao grupo. Sua voz era grave e parecia preencher todos os espaços da sala.

— O mundo está vulnerável — dizia ele. — As pessoas nunca estiveram tão perdidas em relação à fé, nunca demonstraram tanta incerteza a respeito da existência de Deus. — Ele gesticulava para enfatizar suas ideias. — Agora é a nossa hora. Quero ver multidões caindo no Buraco. Lembrem-se de que a fraqueza humana é seu maior bem: a ambição, o amor ao dinheiro, os prazeres físicos... São suas melhores armas. Quero que pensem grande. Não se concentrem em presas fáceis. Ultrapassem as próprias expectativas... Quero ver um número de mortos como nunca antes foi visto. Quero que derrubem bispos, cardeais, generais, presidentes! Fiquem tranquilos, pois vocês serão ricamente recompensados. 

E então Tucker me puxou pela manga, levando-me de novo ao salão. 

— Já chega — disse ele, baixinho. — Já vimos o suficiente.


Notas Finais


Trust no bitch
Asia fdp
Até o próximo capítulo


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