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História Hades (Camren) - Tristeza Gosta de Companhia


Escrita por: lmfs13

Capítulo 30 - Tristeza Gosta de Companhia


Voltar às limitações do meu corpo físico foi um choque para mim. Estar com minha família e sentir-me parte da vida delas de novo fizeram com que me esquecesse da minha situação atual. Agora, estava de volta à cela apertada nas câmaras de Hades, onde o espaço era tão exíguo que mal conseguia ficar em pé. Como se para aumentar o meu sofrimento, o ar ao meu redor estava tomado pelo cheiro forte de enxofre, além de lamentações constantes e pedidos de ajuda. Não fazia ideia de quanto tempo vinha projetando, mas sabia que já devia estar há muito, porque todas as minhas articulações estavam rígidas e meus músculos doíam quando me movia. Alguém lançara cascas secas e colocara uma lata pequena de água na minha cela. Vestia a minha camisola, tão manchada de lodo que quase não dava para ver a cor original. Tentei acalmar a respiração para diminuir o pânico que só crescia dentro de mim. Fiquei recolhida no canto com a cabeça baixa. Um capataz sombrio às vezes caminhava por ali para aumentar ainda mais o tormento às almas presas. Era identificável apenas pelos olhos amarelos e pelas hastes de metal que ele passava pelas barras. Por algum motivo, ele não parou na minha cela. Quando tive certeza de que ele se afastara, me aproximei da lata e bebi um gole-d'água, que tinha um gosto metálico desagradável. Meu corpo todo estava dolorido, mas a dor mais pungente vinha das costas, na altura dos ombros. Agora que já não podia mais me esticar, minhas asas doíam demais. Se não as soltasse em breve, ficaria maluca. Para me distrair, pensei em Dinah e Normani. Meu coração estava apertado pelas duas. A conexão esquisita que existia entre elas não tinha chance de se desenvolver. Dinah não entendia nada do conceito de amor divino. Aquilo era amor em sua forma mais pura, não alterado pela interpretação humana, e envolvia todas as criaturas vivas. Era uma celebração da Criação. Apesar de Normani estar confusa pela intensidade das emoções de Dinah, eu sabia que ela ficaria bem. Não se desviaria de seu propósito. Não teria nem mesmo que pensar nisso. Dinah, por outro lado, sofreria muito pela rejeição. Desejei que Lauren a ajudasse a passar por aquele momento. Ela saberia o que dizer. MGK logo apareceria, e, como previsto, sua silhueta surgiu em seguida, na escuridão. Seu rosto apareceu atrás das barras, iluminado pela tocha que ele carregava. Senti o cheiro de perfume forte e percebi que a presença dele já não me assustava tanto quanto antes. Na verdade, era a primeira vez em que me sentia aliviada por vê-lo. Eu me arrastei para a frente, raspando a pele no chão de concreto da pequena cela. Adoraria tê-lo mandado embora, mas não podia. Adoraria expressar a minha raiva, mas não estava forte o bastante. Sabíamos que eu precisava da ajuda dele se não quisesse morrer naquele buraco da parede, enterrada viva até meu corpo apodrecer e meu espírito ser arrasado.

— Isso é um absurdo — disse ele, baixinho, quando a luz da tocha revelou a minha situação. — Nunca vou perdoá-lo por ter feito isto.

— Pode me tirar daqui? — perguntei, detestando a mim mesma pela falta de coragem. Mas ao me lembrar de como havia sobrevivido à fogueira no pilar, pensei que talvez não estivesse fadada a ser um mártir.

— Por que você acha que eu vim? — perguntou ele, parecendo feliz consigo mesmo. Tocou o cadeado da cela, que queimou e caiu no chão.

— Será que o Grande Pai não vai descobrir isso? — perguntei, surpresa por me referir a Lúcifer desse jeito.

— É só uma questão de tempo. —MGK não parecia preocupado — Há mais espiões aqui do que almas.

— E depois? — Precisava saber o que o futuro me guardava. 

Será que MGK oferecia apenas um alívio temporário? Ele pareceu ler meus pensamentos.

— Vamos nos preocupar com isso mais tarde.

Ele segurou a porta da cela e a abriu um pouco, o suficiente para que eu passasse.

— Vamos — me chamou, mas não me mexi. 

Mover-me em qualquer direção era difícil.

— Há quanto tempo estou aqui?

— Dois dias, mas fiquei sabendo que você dormiu a maior parte do tempo. Venha, dê-me a sua mão. Sinto muito por as coisas terem ficado desse jeito.

O pedido de desculpas me pegou desprevenida. MGK não costumava aceitar responsabilidade pelos problemas que causava. Ele olhou para mim com atenção, e percebi que estava pensando em alguma coisa. Sua sobrancelha estava levantada e um olhar de preocupação substituíra a ironia de sempre. Mas continuava com os olhos de águia em mim.

— Você não está bem — observou ele. 

Tentei imaginar como ele podia pensar que, naquelas circunstâncias, eu pudesse estar bem. MGK era como um camaleão: conseguia mudar suas atitudes de acordo com a situação. Naquele momento, seu comportamento solícito estava me deixando confusa, e não resisti em fazer um comentário sarcástico.

— Ficar dentro de uma jaula não deixa a pele muito bonita — murmurei.

— Estou tentando ajudar você aqui... Poderia pelo menos demonstrar um pouco de gratidão.

— Será que já não me ajudou o suficiente? — perguntei, mas, quando me ofereceu apoio, segurei sua mão.

Lentamente, e usando o braço dele para apoiar meu peso, saí do compartimento. Descobri que, apesar de ter ficado de pé, não conseguia dar mais de um ou dois passos sem que as pernas ameaçassem ceder. MGK olhou para mim antes de me entregar a tocha e de me segurar em seus braços. Saiu das câmaras com confiança e, apesar de eu ter certeza de que vira olhos intensos nos observarem sob a luz, ninguém tentou nos parar. A moto de MGK se encontrava do lado de fora. Ele me colocou na garupa com cuidado, subiu e ligou o motor. Segundos depois, eu estava segurando nele enquanto as câmaras sufocantes de Hades desapareciam atrás de mim.

— Aonde estamos indo? — perguntei, vendo o ambiente desconhecido.

— Tenho uma ideia que acho que poderá fazer você se sentir melhor. 

MGK dirigiu sem parar até chegarmos à entrada de um desfiladeiro profundo com paredes íngremes e água preta corrente que parecia entrar num canal subterrâneo. Ele desceu, observando-me com maior agitação. 

— Você está com dor? 

Assenti sem nada dizer. Não havia motivos para esconder informações dele agora. Não havia nada que ele pudesse fazer com isso que piorasse a situação. MGK parecia ter previsto o que estava acontecendo comigo e parecia mais bem-informado do que eu. 

— Conte-me — pediu. — Como estão as suas asas? 

A pergunta me pegou desprevenida e me senti corar. Havia algo ali que eu considerava questionável. Minhas asas definiam a minha existência. Eu me esforçara muito para impedi-las de serem vistas por seres humanos. Elas faziam parte de mim e não sabia se queria discutir a condição delas com MGK, o Príncipe de Hades.

— Não dou muita atenção a elas — disse de modo evasivo.

— Bem, então dê atenção agora.

Quando MGK chamou a minha atenção para elas, percebi como estavam latejando em meus ombros, precisando ser soltas. De vez em quando, uma dor forte percorria as minhas costas. Eu me irritei com ele por chamar a minha atenção para o problema. Havia decidido ignorar a questão das minhas asas. Qual era o sentido em me preocupar com elas em Hades?

— Precisamos fazer alguma coisa com elas — disse de modo decidido. — Isso se quiser mantê-las. 

Eu não gostava do uso do plural nós em vez de você. Dava a impressão de que estávamos atuando em equipe, como se tivéssemos problemas que poderíamos resolver juntos. Olhei para ele de modo inexpressivo.

— Talvez o que estou tentando dizer possa ser demonstrado.

Quando me dei conta da situação, MGK estava tirando a jaqueta preta de couro e jogando-a no chão. Ficou de costas para mim e tirou a camiseta. E então, ficou em pé, as costas eretas e a cabeça levemente abaixada, uma posição de submissão que ficava muito estranha nele.

— O que você está vendo? — perguntou ele, baixinho. Observei o contorno de suas costas. Os ombros de Jake eram magros, mas bem-formados. Não tinha músculos protuberantes, mas eles ficavam visíveis no corpo em forma quando ele se movia. Ele parecia bem preparado e perigoso.

— Não estou vendo nada — respondi, desviando os olhos.

— Olhe com atenção — pediu dando um passo para trás para poder ficar mais perto, as costas curvadas diante de mim num arco claro.

Algo chamou a minha atenção naquele momento, e observei curiosa. A pele de suas costas era lisa e não tinha manchas, apenas duas fileiras de nódulos do tamanho de ervilhas que corriam como um conjunto extra de vértebras sob cada omoplata. As fileiras de bolinhas sob sua pele, separadas por um ou dois centímetros, pareciam marcas de ferimentos que não tinham sido cicatrizados adequadamente. Não precisei perguntar o que era aquilo.

— O que aconteceu com elas? — perguntei com a voz rouca, entendendo o sentido do que ele estava me mostrando.

— Elas se desgastaram com o tempo e acabaram caindo — disse ele abruptamente.

— Por falta de uso? — perguntei, incrédula.

— Sim, mas mais por retaliação — disse ele. — A questão é que já as tive, e, pode acreditar, elas eram espetaculares.

Será que tinha mesmo escutado algum arrependimento em sua voz?

— Por que está me dizendo isso?

— Porque quero evitar que a mesma coisa aconteça com você.

— Mas como pode impedir isso? — perguntei com meus olhos marejados. — Estou sempre presa. A menos que... Vai me deixar voar?

— Não exatamente — disse MGK antes de eu começar a imaginar um pensamento incompreensível. — Seria mais como uma atividade supervisionada.

— O que isso quer dizer?

— Eu vou deixar você voar, mas com duas condições. Preciso ter certeza de que você está segura... E que não seja vista. — De repente, percebi por que estávamos ali: o desfiladeiro era perfeito para o voo.

— Não confia em mim? — perguntei.

— Não se trata de confiar. Você não poderia ir longe nem se tentasse escapar. E mais uma questão do que pode encontrar sozinha por aí.

— Então, como você vai garantir a minha segurança? — perguntei. — Você não pode voar comigo.

— É onde entra a minha ideia — disse. — Pode parecer estranho para você a princípio, mas procure abrir a mente. É a única maneira que você tem de sobreviver como um anjo.

— Qual é a sua ideia? — Eu estava curiosa. 

Minhas asas pareciam saber que falávamos sobre elas e se esforçaram para se abrir. Precisei de todo o meu autocontrole. Não sabia se conseguiria mantê-las daquela maneira por muito tempo.

— Não tem nada demais — respondeu MGK. — Você só terá que usar um equipamento de controle.

— Você quer que eu use uma coleira! — Fiquei ofendida quando entendi o que ele queria.

— Para a sua própria segurança — contra-argumentou ele.

— Você só pode estar de brincadeira! Não vou permitir que você voe montado em mim como se eu fosse um animal! Que coisa absurda. Obrigada, mas a resposta é não.

Recusei a ideia dele bem decidida, mas, ao mesmo tempo, tinha consciência de minhas asas, loucas para serem libertas. A dor em minhas costas começava a ficar mais forte.

— Então, você prefere deixá-las sem uso? Você sabe que não tem muito tempo antes que elas comecem a apodrecer e caiam como gesso velho. Tem certeza de que é o que quer? — perguntou.

— Por que está tão disposto a me ajudar?

— Digamos apenas que estou protegendo meu investimento. Pense bem, Mila. Não precisa decidir agora, apesar de estarmos na posição ideal.

— Se eu concordar, não vou querer fazer nada diante de outras pessoas. — De repente, eu já estava pensando em como seria.

— Só estamos nós dois aqui. Não há mais ninguém. Não quero vê-la perder as asas, e você não quer perdê-las. É uma situação favorável para nós dois, não acha?

— Se eu fizer isso — avisei — será apenas para poder cumprir o propósito que Deus me deu.

— Sempre otimista — sorriu ele.

— Isso se chama fé — rebati.

— Independente do nome, acho que devemos fazer o possível para manter sua essência angelical intacta, não acha?

A oferta de MGK era ofensiva e tentadora também. Se ele estivesse certo e eu corresse o risco de perder uma parte essencial de quem eu era, será que eu tinha opção? Minhas asas eram uma das coisas que me distinguiam dele e das criaturas de sua raça. Minhas asas eram um presente abençoado dado pelo meu Pai. Se saísse de Hades, o que faria sem elas? E como Lauren se sentiria se eu voltasse sem uma parte essencial de mim? Afastei as lágrimas que já rolavam pelo meu rosto e respirei profundamente.

— Tudo bem — disse. — Aceito.

MGK ergueu o meu queixo com o polegar, com seus olhos estranhos, porém bonitos, analisando o meu rosto.

— Boa decisão — disse ele antes de nos levar a uma rocha próxima dali. — Coloque o pé direito aqui — instruiu antes de aprumar o conteúdo de uma caixa pequena que ele tirou de debaixo da moto. Uma corrente brilhante composta por elos prateados, presa a uma manilha numa rocha. Parecia um objeto mágico de um mundo mitológico. Queria perguntar qual era a origem, mas me contive.

MGK enrolou uma das pontas da corrente no pulso e envolveu a manilha em meu tornozelo. Por ser feita de malha, ela era muito flexível, envolvendo a minha carne como se fizesse parte de mim. Olhei ao redor na pedra onde podia levantar voo. A face da rocha ficava muito íngreme dos dois lados e terminava numa profunda escuridão. A queda-d'água preta fluía silenciosamente. Era como uma abertura na pedra, um abismo estranho e fantasmagórico iluminado apenas pelos faróis da moto de MGK, que lançava uma luz opaca ao nosso redor.

— Você deve se soltar — disse ele.

Apesar de relutante em mostrar minhas asas a ele, elas agora pareciam ter vontade própria. Estavam tão desesperadas para serem soltas, que não tiveram de esperar por um sinal meu. Não tentei impedi-las, e, um instante depois, minha camisola de linho estava rasgada nas costas. Pensar em voar havia me dado energia e minhas asas pareceram ranger pela falta de uso ao serem erguidas. Emitiram uma luz prateada, e senti que elas tremiam com a força. Meus outros músculos também retomavam vida agora que minha circulação estava normal.

MGK observou-me fascinado, mas em silêncio. Havia quanto tempo ele não via asas de anjo de perto? Ainda se lembraria da sensação contagiante? Não tinha tempo para pensar nisso. Minhas asas se ergueram como um dossel de penas acima de nós. Ele olhava para elas com nostalgia, e me senti orgulhosa. As asas eram o único traço físico que nos separava apesar de nossa origem comum. Elas me lembravam de quem eu era e de onde eu vinha. Sempre seria diferente dele. Meu voo pela escuridão seria uma lembrança de tudo o que ele e sua raça haviam perdido escolhendo o orgulho e a cobiça. Girei o tornozelo de um lado para o outro, testando a amarra. E então, encostei o queixo no peito, corri alguns passos e deixei as asas me erguerem. Assim que meus pés deixaram de tocar o chão, senti um alívio imediato, como se algo seco e velho dentro de mim tivesse ganhado vida de novo. Eu me lancei contra a escuridão envolvente sem graça e sem ritmo. Mergulhei, batendo as asas, e a escuridão pareceu abrir passagem para mim. Quando um puxão no tornozelo indicara que eu fora alto demais, não despenquei sobre meu captor, apenas me abaixei, permanecendo assim. Deixei meus pensamentos se desligarem e permiti que meu corpo assumisse o comando. Não senti a mesma emoção de quando voei com minha família em Venus Cove, mas a profunda libertação física valeu a pena. MGK estava em pé na pedra abaixo, olhando para cima e segurando a corrente ao redor do pulso. De onde eu estava, ele parecia muito pequeno e irrelevante. Naquele momento, apenas eu existia. Não havia preocupações ou medos nem meu amor por Lauren. Estava de volta à minha essência, nada além de energia, voando pelo espaço. Voei até que minhas asas começassem a relaxar e depois não parei mais. Quando finalmente pousei, MGK olhava para mim encantado. Sem dizer nada, ele me entregou um capacete e virou-se na motocicleta. 

— Vamos — disse ele. — Você pode passar a noite no Ambrosia. Segredo nosso. 

— Não há como esconder algo de Lúcifer — falei. — Saiba que haverá repercussão. 

— É verdade. — ele deu de ombros. — Mas, neste momento, não me importo.


Notas Finais


MGK ta muito "bonzinho" ultimamente...


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