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História Halo (Camren) - A Aula de Francês


Escrita por: lmfs13

Capítulo 6 - A Aula de Francês


Alguém chamava meu nome. Mesmo tentando fingir que não ouvia, a voz persistia, e fui obrigada a emergir das profundezas cálidas e sombreadas do sono. 

— Acorde dorminhoca! 

Abri os olhos e vi a luz da manhã se derramando no quarto como ouro líquido. Sentei na cama, apertei os olhos e em seguida os esfreguei para afastar o sono. Ally estava parada no pé da cama com uma xícara na mão. 

— Experimente isso. É horrível, mas vai te despertar. 

— O que é? 

— Café. Muitos humanos acham que não são capazes de funcionar direito sem essa bebida. 

Sentada, dei um gole na bebida preta e amarga, resistindo ao impulso de cuspi-la. Perguntei a mim mesma como as pessoas podiam pagar para beber aquilo, mas não demorou muito para a cafeína bater na minha corrente sanguínea, e tive que confessar que realmente me senti mais alerta. 

— Que horas são? — perguntei. 

— Hora de você já ter se levantado. 

— Cadê a Mani? 

— Acho que foi correr. Estava de pé às cinco da manhã. 

— O que há de errado com ela? — gemi, empurrando as cobertas com relutância e falando como uma verdadeira adolescente. 

Passei um pente no cabelo e o prendi num coque frouxo, lavei o rosto e desci para a cozinha. Normani, de volta da corrida, preparava o café da manhã. Tinha acabado de tomar uma chuveirada. Usava apenas um short e um top, e seu corpo cintilava ao sol da manhã. Suas asas estavam contraídas e não pareciam mais que uma linha ondulada entre os ombros. Ela estava parado ao lado do fogão, segurando uma espátula de aço inoxidável. 

— Panquecas ou waffles? — perguntou. Não precisou se virar para saber quem tinha entrado na cozinha. 

— Não estou com muita fome, na verdade — disse eu, me desculpando. — Acho que vou pular o café da manhã e comer alguma coisa mais tarde. 

— Ninguém sai dessa casa de estômago vazio. — Ela parecia implacável. — Então, o que vai ser? 

— É muito cedo, Mani! Não me obrigue, vou ficar enjoada! — Eu falava como uma criança tentando não comer meu brócolis. 

Ela pareceu ofendida. 

— Quer dizer que a minha comida é enjoativa? 

Ops. Tentei consertar meu erro. 

— Claro que não. Eu só... 

Minha irmã pôs as mãos nos meus ombros e me olhou com atenção. 

— Camila, sabe o que acontece quando o corpo humano não é abastecido corretamente? 

Balancei a cabeça com irritação, sabendo que ela estava prestes a expor fatos que eu não seria capaz de contestar. 

— Ele não consegue funcionar. Você não será capaz de se concentrar e poderá até se sentir tonta. — Fez uma pausa para permitir que o impacto de suas palavras ficasse registrado. — Acho que você não quer desmaiar no segundo dia de aula, quer? 

A pergunta teve o efeito que ela esperava. Desabei sem cerimônia numa cadeira, já me imaginando caindo de joelhos por inanição com um monte de rostos preocupados olhando para mim. Talvez até o rosto de Lauren Jauregui, que de repente não desejaria ter o menor vínculo comigo. 

— Vou querer as panquecas — disse eu, desanimada, enquanto Normani virava para o fogão toda satisfeita. 

O café da manhã foi interrompido pela campainha, e eu me perguntei quem a estaria tocando a uma hora tão inconveniente. Havíamos tido o cuidado de evitar os vizinhos. Ally e eu olhamos ansiosas para Normani. Ela conseguia sentir os pensamentos das pessoas em volta dela, um talento útil em muitas circunstâncias. O dom celestial de Ally eram suas mãos curativas. Meu dom ainda estava para ser determinado — aparentemente emergiria na hora certa. 

— Quem é? — disse Ally baixinho. 

— A vizinha ao lado — disse Normani. — Vamos fingir que não a ouvimos, e talvez ela vá embora. 

Ficamos sentadas imóveis e em silêncio, mas nossa vizinha não era do tipo que desistia facilmente. Alguns minutos depois, ficamos surpresos ao ouvir o portão lateral abrindo, e logo depois vimos que ela estava na janela, acenando para nós com entusiasmo. Fiquei escandalizada com a intrusão, mas minhas irmãs mantiveram a compostura. 

Normani foi abrir a porta e voltou acompanhado de uma cinquentona com cabelo louro platinado e um rosto bronzeado. Ela usava várias jóias de ouro, batom de tom vivo e um conjunto de pluspara corrida. Enfiada embaixo do seu braço havia uma grande sacola de papel. Ela pareceu aturdida por um momento quando viu a nós três juntas. Não era para menos; deve ter sido uma cena intimidante. 

— Oi! — cumprimentou-nos alegremente, debruçando-se sobre a mesa para apertar nossas mãos. — Eu daria uma olhada na campainha se fosse vocês. Parece que não está funcionando. Sou Beryl Henderson, da casa ao lado. 

Normani cuidou das apresentações, e Ally, sempre a anfitriã perfeita, ofereceu-lhe uma xícara de chá ou café e pôs um prato de muffins sobre a mesa. Vi a Sra. Henderson olhando Normani mais ou menos como as garotas da escola haviam olhado. 

— Ah, não, obrigada — disse ela em resposta à oferta de comida. — Eu só queria dar uma passadinha para cumprimentar vocês, agora que já estão instaladas. — Pôs a sacola de papel na bancada. — Achei que poderiam gostar de umas geléias feitas em casa. Trouxe de damasco, figo e morango. Não sabia ao certo de qual vocês gostariam. 

— É muita gentileza sua, Sra. Henderson. 

Ally transbordava cortesia, mas eu via Normani contraída de impaciência. 

— Ah, me chamem de Beryl. Vocês vão ver que somos todos assim por aqui. Muito bons vizinhos. 

— Que bom saber disso — disse Ally. 

Fiquei admirada de ver como ela parecia ter uma resposta pronta para todas as situações. Quanto a mim, minutos depois já tinha esquecido o nome da mulher. 

— Você é a nova professora de música da Bryce Hamilton, não é? — insistiu a Sra. Henderson. — Tenho uma sobrinha que gosta muito de música e está louca para começar a tocar violino. É o seu instrumento, não é? 

— Um deles — respondeu Normani, com um ar distante. 

— Normani toca vários instrumentos — disse Ally, lançando um olhar exasperado para Mani. 

— Vários! Nossa, como você deve ser ttalentosa! — exclamou a sra. Henderson. — Ouço você tocando quase toda noite da minha varanda. Vocês duas também se interessam por música? Que boa irmã você é para tomar conta das duas na ausência dos pais. 

Ally suspirou; a notícia da nossa chegada e nossa história pessoal pareciam não ter demorado a virar o assunto da cidade. 

— Seus pais já vêm se juntar a vocês? — perguntou a Sra. Henderson, olhando em volta com curiosidade, como se esperasse ver um casal de pais pular do armário ou cair do teto. 

— Esperamos que seja logo — disse Normani, olhando para o relógio da cozinha. 

Beryl ficou ansiosamente aguardando que ela prosseguisse, e, quando ela não o fez, ela seguiu outra linha interrogativa. 

— Vocês conhecem alguém na cidade? 

Achei graça de ver que, quanto mais ela tentava sacar informações de Normani, mais ela se fechava. 

— Não temos muito tempo para sair — disse Ally. — Temos andado muito ocupadas. 

— Não têm tempo para sair! — exclamou Beryl. — Jovens bonitas como vocês! Vamos ter que dar um jeito nisso. Há umas boates muito descoladas na cidade. Vou ter que levar vocês. 

— Acho uma ótima ideia — disse Mani com um tom monótono. 

— Olha, Sra. Henderson... — começou Ally, percebendo que a conversa não acabaria tão cedo.

— Beryl. 

— Sinto muito, Beryl, mas estamos com um pouco de pressa para ir à escola. 

— Claro. Que tolice a minha ficar tagarelando. Agora, se precisarem de alguma coisa, não hesitem em pedir. Vão ver que somos uma pequena comunidade muito unida. 


Por causa da "passadinha" de Beryl, perdi a primeira metade de um trabalho de inglês, e Mani encontrou sua turma da sétima série jogando papel no ventilador de teto para se entreter. Como em seguida eu tinha um tempo livre, fui me encontrar com Dinah perto dos armários. Ela encostou o rosto no meu como forma de cumprimentar, depois me fez um resumo das aventuras da noite passada no Facebook enquanto eu tirava os livros da pasta. Aparentemente, um garoto chamado Siope se despediu com mais beijos e abraços que o normal antes de ficar off-line, e Dinah estava teorizando se isso marcava ou não uma nova fase no relacionamento deles. Como os agentes da luz haviam esvaziado nossa casa de quaisquer tecnologias que "impedissem a concentração", eu não sabia muito bem do que Dinah estava falando. Mas tive o cuidado de fazer que sim com a cabeça a intervalos regulares, e ela pareceu não notar minha ignorância. 

— Como você pode saber o que uma pessoa realmente sente on-line? — perguntei. 

— É por isso que temos emoticon, boba — explicou Dinah. — Mas mesmo assim não é nada bom você ficar tentando interpretar muito as coisas. Sabe que dia é hoje? — Eu via que Dinah tinha o hábito desconcertante de pular de um assunto para outro sem avisar. 

— Seis de março — respondi. 

Dinah sacou um diário de bolso cor-de-rosa e uma caneta com pluma na ponta. 

— Faltam apenas 72 dias — disse ela, o rosto corado de tanta animação. 

— Para quê? 

Ela me olhou incrédula. 

— Para o baile de formatura, sua tonta! Nunca esperei alguma coisa com tanta ansiedade. 

Normalmente, eu teria me ofendido por ela ter me chamado de tonta, mas não demorei muito a perceber que as garotas daqui usavam insultos como uma forma de carinho. 

— Não é um pouco cedo para pensar nisso? — sugeri. — Ainda faltam mais de dois meses. 

— É, eu sei, mas esse é o evento do ano. As pessoas começam cedo a fazer planos para a festa. 

— Por quê? 

— Você existe mesmo? — Dinah arregalou os olhos. — É um rito de passagem, o único acontecimento de que você se lembrará pelo resto da vida, além talvez do seu casamento. É o pacote completo: limusines, roupas, garotos  e garotas quentes, dança. É a única noite que a gente tem para agir como uma princesa. 

Ocorreu-me que algumas daquelas meninas já agiam assim diariamente, mas preferi me manter em silêncio e me abstive de comentar. 

— Parece divertido. 

Na verdade, a coisa toda parecia ridícula, e resolvi naquele instante que iria evitá-la a qualquer custo. Eu já imaginava o quanto Normani desaprovaria um evento como esse, com tanta ênfase na vaidade e em todas aquelas coisas superficiais. 

— Já tem ideia de com quem você quer ir? — Dinah me cutucou sugestivamente. 

— Ainda não — me esquivei. — E você? 

— Bem — Dinah falou mais baixo — Keana disse a Veronica que entreouviu Austin dizer ao Shawn que Siope está pensando em me convidar! 

— Uau! — exclamei, tentando fingir que tinha entendido tudo que ela havia dito. — Que máximo! 

— Eu sei! — guinchou Dinah. — Mas não conte a ninguém. Não quero estragar a surpresa. 

Ela riu e circulou uma data em meados de abril na minha agenda escolar, desenhando um coração vermelho enorme em volta antes que eu pudesse impedi-la. Devolveu-me a agenda e jogou a dela na bagunça do seu armário. Havia livros empilhados de qualquer maneira, pôsteres de bandas famosas colados nas paredes internas, embalagens de lanche vazias, uma garrafa de refrigerante diet pela metade e todo tipo de brilho para os lábios e latas de balas de menta jogados no fundo. Num contraste gritante com tudo isso, meus livros estavam enfileirados na mais perfeita ordem, meu blazer estava pendurado no gancho próprio para este fim, e o horário das minhas aulas codificado por cores estava afixado na parte interna da porta do meu armário. Eu não sabia como ser bagunceira como um humano; todos os meus instintos gritavam por ordem. O provérbio que dizia que "a pureza caminha com a santidade" não poderia ser mais exato. 

Acompanhei Dinah à cantina, onde ficamos fazendo hora até ela ter que ir para a aula de matemática e eu, para a de francês. Mas primeiro eu precisava voltar ao meu armário para pegar os livros de francês, que eram uns trambolhos. Empilhei-os em cima da pasta enquanto me abaixava para pegar o dicionário de inglês/francês, que estava no fundo. 

— Ei, sumida — disse uma voz atrás de mim. Levei um susto e me pus de pé num pulo tão rápido que bati com a cabeça na parte de cima do meu armário. — Cuidado! 

Virei e dei de cara com Lauren Jauregui, parada ali com o mesmo meio sorriso de que eu me lembrava, do nosso primeiro encontro. Ela estava vestida com um uniforme esportivo — calças azuis de corrida, camisa polo branca e uma jaqueta de náilon com as cores da escola pendurada no ombro. Esfreguei o topo da cabeça e fiquei olhando para ela, me perguntando por que ela estava falando comigo. 

— Desculpe por ter te assustado. Você está bem? 

— Estou ótima — respondi, admirada de me ver mais uma vez deslumbrada com a beleza impressionante dela. Seus olhos verdes estavam grudados em mim, as sobrancelhas semi-erguidas. Ela passou a mão pelo cabelo que lhe caía no rosto, jogando-o de lado como sempre fazia. 

— Você é nova na Bryce Hamilton, não é? Não tivemos muita chance de conversar ontem. 

Não conseguindo pensar em nada para dizer em resposta, fiz que sim com a cabeça e me concentrei nos meus sapatos. 

Erguer os olhos era um erro terrível. Cruzar com o olhar dela me causou a mesma reação física intensa que eu tivera da última vez. Tive a sensação de estar caindo de um lugar muito alto. 

— Ouvi dizer que você morou fora — continuou ela, sem desanimar com o meu silêncio. — O que uma garota viajada como você está fazendo num fim de mundo como Venus Cove? 

— Estou aqui com as minhas irmãs — murmurei. 

— É, já as vi por aí — disse ela. 

— Difícil não notá-las, não é? 

Ela hesitou por um momento. 

— Assim como você. 

Pude sentir meu rosto enrubescendo e dei alguns passos para trás. Sentia a temperatura do meu corpo tão alta que tinha certeza de que eu estava emanando calor. 

— Estou atrasada para a aula de francês — falei, pegando depressa os livros mais próximos que pude encontrar e seguindo pelo corredor aos tropeços. 

— O centro de línguas é para o outro lado — gritou ela para mim, mas não me virei. 

Quando finalmente achei a sala certa, fiquei aliviada de ver que o nosso professor também tinha acabado de chegar. O Sr. Collins, que não tinha cara nem jeito de francês, era um homem alto e magro de barba. Vestia um paletó de tweed e um fular. 

A sala de aula era pequena e estava quase lotada. Olhei em volta à procura da carteira vazia mais próxima e sufoquei um grito quando vi quem estava sentado bem ao lado dela. Meu coração disparou enquanto eu ia andando em direção a ela. Respirei fundo e me acalmei. Afinal, ela era só uma garota.

Lauren Jauregui pareceu achar graça quando me sentei ao seu lado. Fiz o possível para ignorá-la e me concentrei em abrir o livro na página que o sr. Collins escrevera no quadro. 

— Vai ser um pouco difícil você aprender francês lendo isso — ouvi Lauren murmurar no meu ouvido. Vi constrangida que, na confusão, eu pegara o livro errado. Diante de mim, não estava a gramática francesa, mas sim um livro sobre a Revolução Francesa. Senti meu rosto corar pela segunda vez em menos de cinco minutos e inclinei a cabeça para a frente, tentando esconder o rosto com o cabelo. 

— Srta. Cabello — chamou o Sr. Collins —, leia por favor em voz alta a passagem na página 96 intitulada À Ia bibliothèque

Gelei. Eu não podia acreditar que teria que anunciar para todo mundo que havia trazido os livros errados logo na primeira aula. Quão incompetente eu pareceria? Abri a boca para dar uma desculpa bem na hora que Lauren empurrou o livro dela disfarçadamente para cima da minha mesa. 

Lancei-lhe um olhar agradecido e comecei a ler a passagem com facilidade, embora nunca tivesse lido nem falado a língua antes. Conosco era exatamente assim: bastava começarmos alguma coisa para sermos bons nela. Quando terminei, o Sr. Collins estava parado ao lado da nossa mesa. Minha leitura tinha sido fluente — fluente demais. Vi que era para eu ter pronunciado mal algumas palavras, ou pelo menos gaguejado uma ou duas vezes, mas isso não me ocorrera. Talvez eu estivesse inconscientemente tentando me exibir para Lauren Jauregui para compensar as trapalhadas de antes. 

— Você é fluente como uma falante nativa, srta. Cabello. Já morou na França? 

— Não, senhor. 

— Já esteve lá, talvez? 

— Infelizmente, não. 

Olhei para Lauren, cujas sobrancelhas erguidas indicavam que ele estava impressionado. 

— Então pode-se dizer que se trata de um dom natural. Você vai se sentir melhor na turma avançada — sugeriu o Sr. Collins. 

— Não! — disse eu, sem querer chamar mais atenção e desejando que o Sr. Collins deixasse aquele assunto morrer. Jurei ser menos perfeita da próxima vez. — Ainda tenho muito o que aprender — garanti. — A pronúncia é o meu forte, mas me atrapalho muito com a gramática. 

O Sr. Collins pareceu satisfeito com aquela explicação. 

— Jauregui, continue a partir de onde a Srta. Cabello parou — disse, depois olhou para Lauren e contraiu os lábios. — Onde está seu livro, Jauregui? 

Rapidamente passei o livro de volta para ele, mas Lauren não fez nenhum movimento para pegá-lo. 

— Sinto muito, professor, esqueci meus livros hoje; fui dormir tarde ontem. Obrigado por me emprestar, Camz. 

Quis protestar, mas o olhar de advertência de Lauren me calou. O Sr. Collins fuzilou-a com os olhos, escreveu alguma coisa no seu caderno e voltou resmungando para a sua mesa. 

— Não está dando um exemplo muito bom como aluna representante da escola. Venha falar comigo depois da aula. 

Quando a aula acabou, fiquei no corredor esperando Lauren terminar de falar com o Sr. Collins. Achei que pelo menos eu lhe devia um agradecimento por ter me poupado o embaraço. 

Quando a porta abriu, Lauren saiu com a displicência de quem dava um passeio na praia. Olhou para mim e sorriu, feliz por eu ter esperado por ela. Lembrei-me de ter combinado de encontrar Dinah no intervalo da manhã, mas na mesma hora a ideia me fugiu. Quando ela olhava para mim, era fácil esquecer até de respirar. 

— De nada, e não foi nada de mais — disse ela, antes que eu pudesse sequer abrir a boca. 

— Como sabia o que eu ia dizer? — perguntei, irritada. — E se eu quisesse lhe dar uma bronca por ter se metido em encrenca? 

Ela me olhou com um ar irônico. 

— Está zangada? 

Havia de novo aquele meio-sorriso, brincando nos lábios dela, como se estivesse decidindo se a situação era engraçada o suficiente para merecer um sorriso inteiro. 

Duas meninas passaram e me fulminaram com o olhar. A mais alta acenou com o dedo para Lauren. 

— Oi, Lauren — disse com uma voz melosa. 

— Oi, Lana — respondeu ela, com um tom simpático, mas neutro. 

Para mim, estava na cara que ela não tinha interesse em falar com ela, mas Lana aparentemente não percebeu isso. 

— Como você foi no teste de matemática? — insistiu ela. — Achei dificílimo. Acho que talvez eu precise de um professor particular, ou então uma professora... 

Não pude deixar de notar o jeito como Lauren olhou para ela — um olhar inexpressivo, do tipo que se daria a uma tela de computador. Lana não parava de falar e arqueava as costas para que Lauren pudesse ver bem todas as suas curvas. Qualquer outra pessoa não conseguiria resistir a dar uma olhada e apreciar o corpo dela, mas Lauren continuou olhando fixo para o seu rosto. 

— Acho que fui bem — disse. — O Marcus Mitchell dá aula particular; você poderia pedir a ele, se achar mesmo que precisa. 

Lana franziu os olhos irritada por ter dado tanto e recebido tão pouco. 

— Obrigada — disse secamente antes de sair rebolando. 

Lauren pareceu não notar que a ofendera ou, se notou, não se incomodou com isso. Tornou a se virar para mim com uma expressão muito diferente. Tinha o semblante mais sério, como se estivesse tentando resolver algum enigma. Tentei não sentir uma onda de prazer diante disso; ela provavelmente olhava para um monte de garotas do mesmo modo, e Lana era só uma exceção infeliz. Lembrei-me do que tinham me dito sobre Lucy e me repreendi por ser tão vaidosa a ponto de achar que ela estava demonstrando interesse por mim. 

Antes que pudéssemos retomar a conversa, Dinah nos viu e pareceu espantada. Aproximou-se com cautela, com uma expressão meio preocupada, como se receasse interromper algo. 

— Oi, Dinah — disse Lauren, quando ficou óbvio que ela não iria iniciar a conversa. 

— Oi — respondeu ela, puxando minha manga como se fosse dona de mim. 

Quando falou, foi com uma voz infantil de adulação. 

— Mila, venha comigo para a cantina. Estou morrendo de fome! E depois da escola na sexta-feira, quero que vá lá em casa. Vamos todas ganhar tratamentos faciais da prima de Veronica, que é esteticista. Vai ser incrível. Ela sempre traz um monte de amostras para a gente poder fazer o nosso próprio tratamento em casa. 

— Parece incrível mesmo — disse Lauren, com um entusiasmo fingido que me fez rir. — A que horas devo ir? 

Dinah fingiu que não q ouviu. 

— Você vem, Mila? 

— Vou ter que perguntar a Normani, e então lhe dou a resposta. 

Vi uma expressão de surpresa no rosto de Lauren. Seria a ideia de passar uma noite fazendo tratamentos faciais ou a necessidade de pedir permissão a minha irmã o que a intrigava? 

— A Ally e a Normani são bem-vindas — disse Dinah, com uma voz mais animada. 

— Não sei se seria a praia delas. — Vi a expressão de Dinah e acrescentei rapidamente: — Mas vou perguntar, de qualquer jeito. 

Ela abriu um sorriso para mim. 

— Obrigada. Ei, posso te perguntar uma coisa? — Olhou furiosa para Lauren, que continuava ali parada. — Em particular? 

Ela ergueu as mãos fingindo-se derrotada e foi embora. Resisti ao impulso de chamá-la de volta. Dinah passou a falar aos sussurros. 

— A Normani... hã... falou alguma coisa sobre mim? 

Normani e Ally não haviam mencionado Dinah desde o nosso encontro na sorveteria, a não ser para repetir a advertência de praxe sobre os perigos de fazer amigos. Mas percebi em seu tom de voz que ela estava encantada com Normani, e eu não queria desapontá-la. 

— Na verdade, sim -— respondi, esperando soar convincente. 

Só havia uma circunstância em que era permitido mentir: para evitar causar um sofrimento desnecessário. Mesmo assim a mentira não veio com facilidade. 

— É mesmo? — O rosto de Dinah se iluminou. 

— Claro — disse eu, pensando que, tecnicamente, não estava de fato mentindo. Normani mencionara Dinah, só que não no contexto que ela esperava. — Ela disse que era bom ver que eu tinha encontrado uma amiga tão simpática. 

— Ela disse isso? Não posso acreditar que ela sequer tenha reparado em mim. Ela é tão deslumbrante! Mila, desculpe, sei que ela é sua irmã e tudo, mas ela é quentérrima. 

Eufórica, Dinah pegou meu braço e me puxou na direção da cantina. Lauren estava lá, sentada numa mesa qualquer. Dessa vez, quando nossos olhos se encontraram, não desviei. Enquanto olhava para ela, senti minha mente ficar inteiramente vazia e não consegui pensar em nada senão no seu sorriso — aquele sorriso perfeito e carinhoso que fazia seus olhos franzirem muito de leve nos cantos.


Notas Finais


Talvez poste mais um hoje.
Compartilhem a fic com outras pessoas, comentem e favoritem se gostarem.
Obg 😁


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